“...
Eu passei a sucumbir, sentia-me na beira de um precipício e precisava só de um empurrãozinho para chegar ao ponto em que cheguei.
O dono da próxima fita fez questão de me empurrar com tudo para a queda-livre.
Se conseguiu chegar até aqui e estiver ouvindo isso em alto e bom tom, sugiro retirar as crianças da sala.
Isso não é brincadeira.
É nesse ponto que minha queda livre se inicia... Sem chance de volta.”
No vestiário masculino fui obrigado a engolir todo tipo de comentário e piadinha sobre meu “relacionamento” maravilhoso com Brooke Primolli, aparentemente minha vida amorosa era pauta urgente após o treino meia boca de Lacrosse.
- Newt só tem cara de bobinho, gente! Enquanto todos aqui estávamos estudando para as provas do trimestre o garanhão foi direto ao pote de ouro. – ouço um dos meninos dar sua opinião na área dos chuveiros, junto com os outros caras.
- Brooke é uma piranha, não sabia que tinha decaído tanto de nível depois da April e Maeve. – outro jogador diz completando o debate.
- Pois é! – murmuro sentado no banco arrumando minhas coisas.
Thomas O’Brien me encara a todo segundo e posso afirmar que sua face não é uma das melhores, o moreno guarda seu equipamento com raiva e a cada palavra sobre o novo casalzinho do BSHS parece mais e mais incomodado, tanto é que após o último comentário maldoso de Aaron sobre como deve ser nossa performance na cama, Tommy pega a alça da sua mochila e vaza dali como um tornado.
Demoro alguns minutos para digerir como minha vida ficou desse jeito em menos de 24 horas. Ontem de manhã Tommy me prensou debaixo da arquibancada da quadra e quase esfolou minha boca com tantos beijos, já a noite enfiou um soco na minha cara e eu quase transei com a sua irmã. Hoje cedo o jogo mudou e mais pareço um fantoche nas mãos de Brooke, sem ter notícias de Poppy e com uma alta propensão a matar meu trabalho agora a tarde para descobrir uma maneira de me livrar da maluca.
NEWT
16h07min
Infelizmente não estou me sentindo bem, terei que faltar no trabalho. Eu sinto muito por deixá-lo na mão tão em cima da hora.
Mando a mensagem para o dono do parque comunicando minha ausência. Espero alguns minutos até que ele envia uma resposta.
MCGUINNES
16h09min
Tudo bem, Newton.
Melhoras pra você. Se precisar de algo não hesite em pedir.
Problema número um resolvido com sucesso. Detesto ter que decepcionar o senhor McGuinnes, conquanto tenho coisas mais urgentes para resolver e por sorte ele é um chefe paciente e gosta do meu trabalho.
Agora o problema número dois: Brooke.
Como sempre espero todos dos caras saírem do vestiário para só depois me arrumar. Faço isso rápido pois sei que há um risco real da loira invadir os chuveiros e tentar algo que não, obrigado, não estou a fim de fazer.
E como suspeitei durante o banho...
Ao sair do local encontro com ela me esperando, conversando animada com Blair e Tory. Assunto principal entre as garotas: como sou um ótimo namorado desde hoje cedo. Ao menos é isso que consigo captar no papinho sem graça delas.
- Newtie, que tal irmos com as meninas até o Burguer Lab mais tarde? – Brooke pergunta empolgada, me abraçando.
- Uh, eu não estou me sentindo muito bem. Na verdade já avisei o senhor McGuinnes que não irei trabalhar hoje.
- O que você tem? – Tory questiona mascando um chiclete e mexendo no seu celular.
- Dor de garganta, dor no corpo, talvez febre...
- Ih, sai fora! Não quero ficar doente e nerd como você!. – Blair é a primeira a se afastar.
Menos uma!
- Meninas, fica para outro dia nosso jantarzinho. Vou cuidar do meu bebê hoje. – Brooklyn fala acariciando meus cabelos e apertando minhas bochechas, me tratando como seu filhote de cachorrinho.
- Melhoras pra você, loirinho. – Tory se afasta, largando-me com a bomba relógio nas mãos.
Brooke gira sobre o calcanhar, ficando frente a frente comigo. Em menos de 1.5 segundos sua feição muda bruscamente de fofinha e amiga das líderes de torcida para uma louca controladora tarada por garotos como eu.
- Que merda de historinha é essa? – ela pergunta brava.
- Não é historinha. Não estou me sentindo bem, Brooke.
- Se é assim vamos pra sua casa que eu cuido de você.
Eu sabia que ela usaria essa desculpa, no entanto sou salvo pelo gongo, ou melhor, pela senhora Ava Sangster. Tiro o celular do bolso e atendo a ligação.
- Oi, mãe. – falo baixinho e um pouco desanimado.
- Será que liguei para o número certo? Esse não parece meu Nutella! – Ava ri sozinha – Está tudo bem, filho?
- Mais ou menos, só com dor de garganta e mal estar. – minto.
- Escuta, o computador aqui da loja deu pane outra e eu não sei o que fazer.
- Que tal ligar para a assistência técnica? – sugiro como se fosse óbvio demais. E é, mas não para mamãe.
- Eu já liguei, espertinho. Tanto Owen quanto os outros meninos estão super ocupados hoje e só poderiam dar uma olhada nele amanhã cedo.
- Que puxa... – suspiro já prevendo a manobra dela.
- Você pode passar aqui na loja e dar uma olhadinha? Eu juro que tentei ligar para o Atticus antes, mas seu irmão não atendeu a ligação.
Claro que Att não atendeu a ligação, ele é esperto e eu não!
- Tudo bem, mãe. Em uns quinze minutos estarei ai.
- Ai minha Nossa senhora dos filhos perfeitos! Eu amo você!!! – ao que parece Ava dá pulinhos do outro lado da linha.
- Nos vemos daqui a pouco. Beijos.
Desligo rápido antes que a mesma invente que preciso passar antes no marcado ou na farmácia, ou até quem sabe na lavanderia do senhor Yamashita para buscar o vestido que ela usou na colação de grau do Att anos atrás e que até agora deve estar lá na arara pendurado esperando pela dona desmiolada.
- Eu vou com você! – Brooke anuncia empolgada.
- É claro que vai. – faço uma careta e já saio andando o mais rápido possível até o estacionamento da escola, sem esperar pela loira stalker.
“Talvez esse tenha sido o primeiro erro que cometi, dando abertura para uma sequência de merdas acontecerem. Não devia ter mentido ao senhor McGuinnes. Se tivesse ido até meu trabalho, como deveria ser, quem sabe as coisas teriam acontecido de uma maneira um pouquinho diferente durante o resto do dia.”
No caminho até a loja da minha mãe ouço Brooke tentar escapulir do trabalho no Love&Bites, parece que Sun e Angie precisam dela lá, então bem “P” da vida e irritada a loira pede que eu a deixe na cafeteria, o que faço com MUITO PRAZER!
Quando ela se despede com um beijo possessivo só faltando arrancar minhas roupas com os dentes e desce do carro, parece que tirei um peso de cinco mil toneladas das minhas costas. A loja de Ava é ali perto, no centro. Estaciono o carro numa boa vaga e desço entrando no lugar onde minha frequência não tem sido tão assídua quanto a escola nos últimos anos.
Mamãe se formou em moda na faculdade, tinha o sonho de um dia se tornar uma estilista de nome ou quem sabe alguma editora possuída pelo demônio como Meryl Steep em “O diabo veste Prada”. Acontece que no meio do caminho ela conheceu meu pai, um nerdzinho atraente e ativo na faculdade, cheio de ideais revolucionários. Os dois engataram um romance, que virou namoro, que virou noivado, que passou a ser um casamento e aí Carrie nasceu nessa abençoada família, depois eu e por último Att, que foi claramente um acidente de percurso nesse conto de fadas.
Até onde sei Ava deixou de lado seus planos para se dedicar a família, mas papai sabia que por um lado ela não estava 100% feliz sendo apenas mãe, dona de casa, esposa, enfermeira, cozinheira, faxineira, despertador, psicóloga infantil, babá e afins, por isso ele pegou uma parte das economias da família e deu de presente para ela a loja de roupas femininas no centro da cidade, onde mamãe poderia fazer o que gosta e ainda assim estar perto dos filhos.
Não é uma mega loja e nem chega a se comprar com uma Chanel ou uma Juice Couture. Diria que está mais para uma Forever 21 de 45 anos de idade adequada para os moradores retrógrados de Bonner Springs.
- Meu Nutella chegou!!! – mamãe comemora minha presença VIP nessa tarde agradável. Ela corre até a porta e pula no meu colo, empolgada. A vendedora arqueia a sobrancelha e segura um riso, já ciente de que Ava tem um parafuso a menos e só faz aquilo porque posso ser o salvador do dia e tirar o computador dela da merda.
- Oi. – falo encabulado, indo direto para o balcão checar a máquina. – O que aconteceu? – pergunto religando ele.
- Ele simplesmente morreu após passarmos uma compra. Não dá pra ficar sem o sistema! Ajude a sua mãe, por favorzinho! – ela implora com um sorriso encantador. O mesmo que o meu!
- Tudo bem, vou ver o que você fez contra ele! – brinco e checo tudo, tendo ao menos um minuto de sossego.
Fico uns quarenta minutos na função que não sou bom mas entendo parcialmente. Nesse meio tempo alguns clientes entraram e saíram da loja, movimentando o caixa, até que...
“... Você entrou com sua família, descontraído e bem animado. Deixou que a esposa e a filha se divertissem entre as araras e provadores, escolhendo o que elas quisessem.
Você me viu.
E veio até mim.
E naquele instante quando nossos olhares se cruzaram eu sabia que essa pequena ação tinha a força e a potencia igual a um bater de asas de uma simples borboleta, capaz de causar um tufão do outro lado do mundo.
Isso é a teoria do caos. Ou como você desencadeou minha destruição.
Está é a sua fita, Mr. D.”
- Newton Sangster! Não sabia que trabalhava aqui! – Daniel Dornan apoia os cotovelos no balcão me fitando.
- Na verdade só estou ajudando minha mãe a arrumar o computador. – digo me levantando ao solucionar o problema.
O conselheiro me encara pensativo, tem a droga de um olhar analítico que detesto. Para ser honesto eu não gosto dele, sei lá, há algo nesse homem que não cheira bem. Por isso finjo que ele não existe.
- Mãe, seu computador está funcionando normalmente agora. Passei um antivírus, fechei as mil abas que estavam abertas e deletei tudo que era besteira como correntes de oração e aquele blá, blá, blá que você acredita.
- Muito obrigada, filho. – ela agradece de qualquer jeito, dando atenção a outra mulher que entra na loja para olhar as peças.
- Já vi que estou sobrando aqui. – murmuro ao pegar meu celular no balcão e seguir para a saída.
Ava mal olha na minha cara, mas eu entendo, sério mesmo.
Deixo ela lá com suas clientes e a pequena Rachel Dornan, filha do Mr.D, aterrorizando a vendedora ao derrubar alguns sapatos e bolsas no chão.
Só por garantia antes de ir pra casa posso com o carro na frente do Love&Bites e certifico-me de que Brooke está mesmo trabalhando lá e ocupando sua mente com coisas que não sejam como ela vai me bolinar de novo.
Quando chego na residência dos Sangster subo direto para meu quarto, trancando a porta com chave e tudo. Não é um costume que eu tenho, mas após as revelações da loira vou passar a acatar essa medida de segurança.
Encaro meu notebook sobre a cama, ele ainda está com o DVD que Brooke fez com as filmagens da festinha a três. Decido que vou assistir aquilo até o final já que fui interrompido de manhã e desconfio que possam haver outras informações ou fatos relevantes sobre o que aconteceu.
Dou o play a partir da parte onde parei, observando com a mão na boca uma Brooke dominadora e manipuladora, socando um comprimido de ecstasy na minha língua, mesmo após me negar a continuar com aquilo. A garota e eu continuamos transando até gozar nela e ficar alucinando sozinho na cama.
Brooklyn vai até o banheiro e destranca a porta, arrasta Maeve de volta para a cama e finge que nada aconteceu, deitando-se do meu lado direito, querendo transar mais.
Avanço as imagens sem paciência para ver aquilo, para ver o meu estado drogado ao extremo enquanto transo com uma Brooke doida e minha garota está destruída do lado, sem ter a menor noção do que está acontecendo.
Me sinto um idiota.
Acabo fechando o notebook e escondendo o DVD. Minha primeira reação é ligar para May e tentar contar o que aconteceu, o que descobri sobre aquele dia, mas a morena ignora minhas chamadas e nem retorna as mensagens que deixo no seu whatsapp.
Após um tempo deixo meu quarto e vou para o jardim ficar com Brownie, chorando mais um pouquinho na espreguiçadeira ao pensar em como minha vida virou de cabeça pra baixo. Tudo acaba repentinamente ao notar que mamãe voltou pra casa e está procurando por mim.
- Nutella, preciso da sua ajuda de novo. – Ava vem fincando seu salto 15 no gramado do jardim, açoitando seu scarpin nude e praticamente arando a terra.
- O que foi? – consigo limpar o rosto a tempo dela chegar perto e sequer reparar que eu estava chorando.
- Encontrei essa coisinha hoje na loja. – ela retira algo da sua bolsa e repousa na minha fuça.
- Um pen drive, você quis dizer.
- É. Essa coisinha! – ela balança o dispositivo preto – Maureen encontrou no chão da loja quando estávamos fechando. Você pode checar e ver de quem é para devolvermos?
- Isso seria invasão de privacidade. – alego arqueando a sobrancelha ao capturar o objeto.
- Deixa de ser chato, Nutella. Não faremos nada de mais. Só abra e descubra de quem é - minha mãe dá a ordem e volta pra dentro anunciando – Já que está em casa na hora do jantar e não naquele parque maluco, vou fazer seu risoto de frutos do mar preferido. Não suma, hein!
Me animo um pouco mais com a oferta gastronômica, criando forças para levantar da espreguiçadeira e voltar para meu quarto, onde insiro o pen drive no notebook e aguardo alguns segundos até ele reconhecer o dispositivo.
Ao fazer isso as letras DHD aparecem no canto da tela.
Clico ali e uma infinidade de pastas abrem, com nomes desde “Trabalho experimental de sociologia”, “Curso avançado de Excel” e “Relatórios”. Não há uma pasta com o nome “fotos”, “família” ou algo do gênero.
Escolho a pasta sobre o trabalho experimental e ao abri-la não há arquivos do Word, que era o mínimo que eu esperava. Há vídeos e algumas fotos salvas. Já que tenho que descobrir o dono daquilo, clico em uma foto aleatória.
Franzo a testa quando o arquivo abre e vejo Taylor Davis de calcinha e sutiã numa cama espaçosa, fazendo caras e bocas.
Curioso - não para ver Taylor seminua, coisa que já fiz, mas sim para descobrir mais sobre o dono daquilo -, abro outra foto, dessa vez vejo uma garotinha de no máximo seis anos sentada no chão usando apenas uma calcinha e chupando um pirulito.
- Mas que merda é essa? – me questiono decidido abrir um vídeo.
Clico no primeiro arquivo que aparece e assim que a imagem passa a reproduzir fico chocado com as cenas a minha frente. Há uma adolescente de no máximo uns quinze anos amarrada numa cadeira, sendo obrigada a fazer sexo oral em um cara.
Chocado, clico em outro vídeo.
Dessa vez uma menininha de aproximadamente cinco anos, trancinhas nos cabelos e um ursinho no colo recebe as mãos grosseiras do cara em seu rosto enquanto a outra se encarrega de masturba-lo.
A identidade dele não aparece de maneira alguma, o que me frustra. Está claro pra mim que essa pessoa é um pedófilo nojento pervertido, com arquivos bizarros no seu pen drive.
Abro as outras pastas e o conteúdo só piora a cada clique.
Cenas e mais cenas de sexo brotam na tela do meu notebook, fazendo-me enjoar.
“Eu devia ter parado com aquilo. Devia ter retirado na hora o pen drive do meu computador e levado a polícia ou sei lá o que, mas fiquei totalmente sem reação quando decidi abrir um arquivo chamado “Especial””.
E lá estava ninguém menos que Felicité Walsh no corredor da sua casa sendo estuprada há quase dois anos atrás, o estupro ao qual eu fui acusado injustamente de cometer. Não contenho as lágrimas e o pavor com a cena dela chorando alto e murmurando para o cara parar enquanto é violentada. Nesse meio tempo dá pra escutar um barulho na casa e o homem de rosto desconhecido para, saindo de cima dela.
Tenho certeza que foi nessa hora que eu cheguei na casa da menina, assinando meu atestado de culpa.
O cara arruma sua roupa rapidamente e puxa os cabelos dela pela nuca, sussurrando algo em seu ouvido, algo como uma ameaça pra ela ficar de boca fechada, caso contrário iria matar toda a família dela.
É nessa hora que por um descuido dele vejo seu rosto saltar claramente na frente da câmera.
“Daniel Hartigan Dornan.
DHD.
Nosso querido, comportado, brilhante coordenador, esposo dedicado e pai de família, que nas horas vagas gosta de transar com adolescentes da escola, estuprar meninas inocentes e abusar de criancinhas, sendo o pior monstro que Bonner Springs já conheceu.”
- Newt! Está na hora do jantar! Desça! – papai me chama empolgado, muito provavelmente parado ao pé da escada.
Pela movimentação no corredor Att acaba de cruzar a porta do meu quarto e Carrie já deve estar na sala de jantar. Eu demoro ainda alguns minutos para descer, preciso primeiro fazer uma cópia disso e em seguida preciso assimilar que Liz sofreu nas mãos de Mr.D.
Chego na sala de jantar com uma cara péssima, sendo incapaz de esconder que uma coisa muito grave aconteceu, mas todos da família Sangster andam ocupados demais para prestar atenção nas minhas ações.
Mamãe como sempre fez um risoto maravilhoso e enquanto escuto e observo Carrie comentar empolgada que acha que vai ficar noiva daquele embustre em breve, papai degusta seu bom e velho vinho e Att finge interesse na vida social da irmã, a campainha de casa toca, deixando-me tenso.
Seria Brooke capaz de aparecer em casa na hora do jantar e filar uma boia, aproveitando para anunciar aos meus pais que em breve vamos nos casar e viver de amor?
Seria. Essa é a resposta.
Mas para minha surpresa não é a loira tarada.
Ava me chama ao atender a porta, revelando Daniel Dornan ali após me fazer largar o prato de comida.
Meu coração para assim que o vejo. Não esperava por esse golpe durante o jantar.
- Tem certeza de que não quer entrar, senhor Dornan? – mamãe pergunta toda simpática, dando a chance do filho da mãe entrar na nossa casa.
- Eu não quero atrapalhar. – Mr. D sorri.
- O senhor Dornan veio aqui porque aquela coisinha é dele, filho - encaro o moreno na hora – Ele suspeitava que havia esquecido na loja quando a pequena Rachel mexeu na sua pasta de trabalho e precisava dos arquivos para trabalhar agora a noite, por isso veio até aqui para que eu gentilmente abrisse a loja, mas eu já disse que encontramos a coisinha e que ela estava com você para descobrir de quem era.
Ótimo, Ava Marie Sangster! Coloque seu filho na forca mesmo.
- Você poderia entregá-lo a mim, Newton? – Daniel pergunta sorrindo, usando todo seu charme que pra mim não cola mais.
- Claro! Eu já volto.
Volto para dentro de casa e corro até meu quarto pegando o pen drive. Ao descer as escadas, praticamente jogo aquilo na cara dele, desejando que esse pervertido nos deixe em paz.
Mr. D captura o dispositivo no ar e lança uma piscadinha ordinária pra mim antes de se despedir de mamãe como um perfeito cavalheiro, beijando o dorso da mão dela.
“Naquela noite eu não dormi.
As cenas que assisti iam e vinham na minha mente, como flashes de um pesadelo.
Estudei as chances de ir até a delegacia e expor o cara. Decidido, faria isso assim que saísse da escola amanhã.”
Estou eu agora nos corredores do Bonner Springs High School fugindo de qualquer encontro com Mr. D., tendo Brooklyn grudada em mim. Quem é Brooke Primolli comparada a esse nojento?
Ninguém.
Passo até a apreciar a companhia dela, vendo a loira como uma aliada, pois acho difícil Daniel Dornan me colocar na parede e fazer perguntas sobre seu pen drive com a “minha namorada do lado.”
Chego a ver o crápula circulando pelo refeitório na hora do almoço, só que esse sequer dirige um olhar para onde estou, como se eu fosse invisível. Eu gravo e memorizo os passos dele como minha tática de defesa... Ao menos até conseguir sair da escola e ir para a delegacia.
Tudo fluí conforme o planejado.
É sexta-feira, já treinei e estou terminando de calçar o tênis após finalizar o Lacrosse e meu banho. O senhor McGuinnes que me desculpe, mas hoje darei o cano no trabalho também. Guardo de qualquer jeito minhas roupas na mochila e logo ao despontar no corredor o professor de história cruza por mim freando meu corpo agitado para sair rápido da escola.
- Newt, ainda bem que achei você. Você precisa cumprir isso. – o homem me entrega um papel da coordenação alegando que...
- Detenção? O que foi que eu fiz? – pergunto chocado.
- Parece que precisa fazer um trabalho agora na escola para repor sua nota zero na minha prova.
- Mas eu não posso fazer isso agora!!! – Protesto – Tenho... coisas para fazer.
- Eu sinto muito, Newt. Só cumpro ordens.
Brooke fica irritada por não fazer parte do castigo e sai para o Love&Bites me deixando na escola. Sigo até a biblioteca e encontro meia dúzia de pessoas na detenção também, respiro aliviado ao perceber que não estou sozinho por ali. Leio atentamente as instruções sobre o trabalho de história, passando a fazê-lo com o auxílio dos meus livros e pesquisas na internet.
De cabeça abaixada, focado nas informações ao digitar o trabalho, sinto que alguém para seu corpo na frente da minha mesa. Lentamente ergo a face, constatando meu pior pesadelo ali diante de meus olhos.
- Quando terminar seu trabalho de história preciso que vá até a minha sala, Sangster. – Mr. D anuncia girando no calcanhar e partindo sem dizer mais nada e nem olhar para mais ninguém.
Fico tão tenso e desconcertado que esqueço por um tempo da detenção e não consigo focar em mais nada que não seja minha visita na sala daquele pedófilo. Vejo um a um dos adolescentes deixando seus lugares e partindo para casa enquanto ainda estou paralisado, apenas encarando o relógio digital do meu celular andar tão acelerado que quando dou por mim já são seis da tarde e eu nem terminei meu dever.
- Newton, precisamos fechar a biblioteca. Se não terminou seu trabalho sugiro conversar com o senhor Dornan. – a bibliotecária diz.
“Eu tentei adiar ao máximo esse encontro, mas a verdade é que a cada minuto tudo só piorava ainda mais.
Não teve jeito.
Meus passos tornaram-se pesados. As salas vazias e corredores parcialmente escuros pareciam um filme de terror no qual eu era o protagonista, e ao invés de sair correndo pela porta da frente como toda mocinha indefesa deveria fazer, eu fui burro o suficiente para subir as escadas e me trancar no quarto.
Eu tinha ido direto para o abatedouro.”
- Achei que tinha se perdido nas dependências da escola, Sangster! – Mr. D dá um sorriso de lado quando entro na sua sala.
Faço questão de deixar a porta bem aberta. Sei que talvez não haja mais ninguém nas dependências da escola, mesmo assim parece a saída mais inteligente que encontrei.
- Estava fazendo meu trabalho de história, só isso. – alego.
- Por favor, sente-se.
Relutante acato a ordem dele, sei que pareço desconfortável na sua frente e não consigo esconder meu pânico com nossa aproximação.
- Eu fiz alguma coisa, senhor? – pergunto encarando o homem.
- Tecnicamente sim, Newt.
Dornan estala a língua e se levanta.
Finco meus dedos no estofado de couro da cadeira, procurando me controlar.
O castanho passa a caminhar pela sua sala. Primeiro ele segue até a janela e sutilmente fecha as persianas, barrando a minha visão do campo parcialmente escuro lá fora. Em seguida Daniel anda sem pressa até onde estou, colocando sua mão direita sobre meu ombro.
- Precisamos ter uma conversinha séria.
Meu corpo todo gela ao sentir sua respiração quente tocar minha nuca. Viro devagar minha cabeça para trás bem a tempo de ver Dornan fechar a porta da sala. E o pior de tudo: dar duas voltas na mesma com a chave.
É agora que devo correr?
Com certeza!
Dou um salto da cadeira, ficando bem em frente ao seu corpo e a porta.
- Eu quero sair agora! – digo firme. Ao menos é o mais firme que eu consigo.
- Newt... isso não é uma opção. – ele inclina a cabeça para o lado e sorri enfiando um soco no meu rosto. Um soco capaz de me desestabilizar por inteiro, fazendo todos os dentes da minha boca sambarem lá dentro.
Chocado, levo a mão até o rosto após cambalear para trás.
- Temos problemas, Newt. Você sabe o que eu fiz.
- Eu juro que não vou contar pra ninguém. – saio em minha defesa ao ser prensado por ele na parede.
- Eu sei que não vai.
Sibila ele saindo de perto, indo até um pequeno detalhe que havia passado despercebido por mim desde que cheguei tenso nessa sala. No canto leste do cômodo há um tripé preto e uma pequena câmera HD. Dornan liga o equipamento, ficando ao lado dele em seguida, onde me encara com seus olhos em fendas.
- Vamos falar a verdade, Newt. Sei que você abriu meu pen drive e viu algumas coisinhas desnecessárias, descuido meu, eu sei. – ele coça a cabeça, afrouxando sua gravata – Confesso que sempre admirei você, especialmente por ter ido pra cadeia no meu lugar por causa da sua amiguinha Liz. Te devo meus parabéns!
O homem estica a mão para trás sem desgrudar os olhos da minha figura acuada na parede, retira um livro grande de fundo falso onde há uma garrafa prateada, daquelas que guardam bebidas alcóolicas. Ele abre a tampa e toma um longo gole, produzindo uma pequena careta depois.
- Você fez uma cópia daquilo? – pergunta retirando a gravata.
- Não. – respondo de imediato, engolindo a seco.
- Tem certeza? – agora o castanho passa a desafivelar o cinto da sua calça social.
- Absoluta, senhor.
- Bom... muito bom.
Dornan dá mais um gole da bebida, colocando o líquido de lado depois da minha resposta. Enquanto me encara o cretino abre um por um dos botões da sua camisa, expondo seu peito.
- A coisa vai funcionar da seguinte maneira, Newt... – ele chia arrastado, dando os primeiros passos na minha direção. – Sua boquinha vai ficar fechada sobre esse assunto. Caso conte para alguém, ou descubra que tenha feito uma cópia dos arquivos, ou até mesmo tente procurar ajuda para foder a minha vida, dou um jeito de colocar aquelas fotos e vídeos no seu computador e acusar o estuprador de Felicité Walsh de ser um pedófilo nojento e sem escrúpulos, totalmente atormentado pelos meses em que ficou recluso na penitenciária de Kansas City. Vamos combinar que você não tem a menor chance entre um homem maduro, responsável e pai exemplar de família como eu, ninguém vai acreditar em você, um adolescente problemático e desequilibrado.
Bingo! Filho da mãe!
Dornan sabe jogar pesado.
- Ok. – entrego a primeira resposta que vem em mente.
- Mas não paramos por ai, loirinho – ele para seu corpo na minha frente, erguendo e apertando meu rosto. – Em troca do meu silêncio, você fica me devendo alguns favores.
Observo sua mão livre escorregar até o zíper da calça social, ele desce o metal com agilidade, fazendo sua peça ruir até o chão. Eu sei o que ele quer e fica impossível de controlar o marejado dos meus olhos. Dornan coloca suas mãos em meus ombros e empurra meu tronco para baixo, colocando-me de joelhos diante da sua figura assustadora.
- Seja um bom menino, Newt. Sei que já fez isso antes na prisão – o nojento abaixa sua boxer, expondo sua intimidade – Vamos ver se você é tão bom em tudo que faz como falam por ai.
“Acho que o pior de tudo não foi ser forçado a fazer aquilo de novo, sendo incapaz de controlar as minhas lágrimas enquanto você fodia a minha boca, urrando de prazer. Nem o fato de estar filmando tudo para poder bater uma depois enquanto sua esposa e sua filha dormem tranquilas em casa, amparadas pela vidinha perfeita que elas acham que tem.
O pior de tudo foi ser obrigado a transar com você e por mais que eu tentasse pensar em Thomas O’Brien, ou Leo, ou até mesmo Aaron, eu só conseguia ver um monstro ali me violentando, sendo muito mais rude e agressivo do que Durden na cadeia.
Você abriu a ferida que eu achei que estava cicatrizada, você fez questão de desenterrar todos os sentimentos e lembranças negativas que escondi por tanto tempo, fingindo pra mim mesmo que nada daquilo tinha acontecido na minha vida.”
- Abra os olhos, Newt. Você não vai querer perder isso!
O cretino comprime com força minha cabeça contra sua mesa de vidro, encaixando seu corpo logo atrás do meu, de novo.
Ele faz questão que meu rosto fique virado na direção da câmera, Dornan deve ser do tipo que gosta de apreciar a dor e as lágrimas das suas vitimas, é isso que o excita.
Já não tenho forças para lutar.
Perdi todas elas no instante em que ele jogou todos os seus pertences no chão de me colocou deitado sobre a mesa, invadindo meu corpo sem pedir permissão. A cada estocada um tapa, um puxão de cabelo ou uma mordida de presente, deixando marcas que vão muito além da minha pele, marcas profundas sentidas com sofrimento pela minha alma.
- Ah, Newt... tão apertadinho e manhoso.
Sua voz no meu ouvido... Sua barba rala pra fazer roçando com agressividade contra minha pele da nuca... Suas mãos ágeis e frias puxando todo meu corpo contra o seu, também tampando minha boca, abafando meu choro de desespero. Isso é um pesadelo.
Tento correr para um lugar quente e feliz na minha mente, recuperar lembranças boas que vivi. Tento Thomas, depois Maeve, busco por April, Poppy, Brooke... pode ser qualquer pessoa.
Eu preciso de qualquer uma!
April me traindo.
Thomas me humilhando.
Maeve abortando nosso bebê.
Brooke me perseguindo.
Poppy me deixando.
Todos os momentos ruins que passei vem a tona de uma só vez, elas chovem com a força de uma avalanche, me derrubando de vez nos braços de Daniel Dornan.
Liz.
Cadeia.
Estupro.
April.
Johnny.
Adeus Stanford.
Zeeke.
Amy Green morta.
Angel.
Meus pais bravos.
Att no hospital.
Cassie.
Mais pais bravos.
Castigo.
Rachel e Lacrosse.
Maeve.
David.
Assalto.
Tiro.
Thomas.
Coração partido.
Poppy.
Brooke.
Medo.
Culpa.
Lágrimas.
Vazio.
“É isso.
Minha vida é um vazio.
E todo esse tempo passei sozinho, acreditando que tinha amigos, um amor, e talvez algo que valesse a pena lutar.
Eu estava enganado.
Agora eu percebo o que me assusta de verdade. Não é a solidão e todo esse mal que cada um de vocês fez questão causar na minha vida. O que me assusta é nunca mais ser capaz de encontrar as pessoas certas para compartilhar minhas conquistas, minhas vitórias, o meu amor.
Sabe, às vezes se fica tanto tempo sozinho, que esse vazio deixa de ser ausência e passa a se tornar companhia.
Daniel Dornan não abriu só feridas e um buraco na minha alma.
Ele abriu meus olhos e não há ninguém para me olhar de volta e dizer: “vai ficar tudo bem, Newt.”, porque nós sabemos que não, não vai ficar nada bem.
Nada nunca fica bem.”
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