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História 2012 - Algumas ovelhas se desviam


Escrita por: Mallagueta

Capítulo 49 - Algumas ovelhas se desviam



No capítulo anterior, os pais de Carmen se recusaram a seguir com eles para a Chapada dos Guimarães, achando que eles ficarão seguros na sua casa de campo.

14 DE JULHO DE 2012

13:00

Seu Quinzão tinha separado os itens mais importantes. Além de roupas e objetos pessoais, ele também tinha colocado na mala os principais livros de receita, alguns utensílios de cozinha e outros objetos para quem sabe um dia ele poder recomeçar seu negócio, caso fosse possível.  

Ao terminar, ele olhou desolado para sua padaria. O terremoto do outro dia tinha danificado as paredes, deixando grandes rachaduras. O alarme tinha deixado de funcionar e na noite anterior tinham entrado na padaria e roubado praticamente tudo o que tinha lá dentro. Mesmo sabendo que não poderia levar tudo e que dentro de alguns dias a padaria ia deixar de existir, ele ainda assim ficou muito aborrecido com aquele saque.

- Pai, o senhor já arrumou tudo?
- Já, filho. E as passagens?
- Estão aqui. A gente vai amanhã.
- E a faminta?
- A família dela vai hoje a noite. Não deu pra comprar todas as passagens no mesmo vôo.
- Ora, pois! Espero que não haja problemas!
- É... olha, eu vou na casa dela pra me despedir. O senhor sabe...
- Sim, filho, tu podes ir. Só não demores muito. Sua mãe está muito preocupada com esses terremotos.

Quim pegou a bicicleta e foi para a casa da namorada. A família inteira já estava com as malas prontas e só aguardando a hora de irem embora.

- Ai, fofucho! Você veio!
- Eu não podia deixar de vir!

Ele deu um grande beijo na namorada e logo recuou quando percebeu que o pai dela tinha entrado na sala.

- O-oi seu Carlito... é que eu tava me despedindo da Magali.
- Oi, Quim. Tudo bem, fiquem à vontade. Nós vamos às três horas.
- Tão cedo assim? O vôo de vocês não tá marcado pras nove da noite?
- Sim, mas o aeroporto fica longe e a gente não quer facilitar. Preferível passar umas horas no aeroporto e ficar seguro do que correr o risco de não conseguir chegar até lá. vocês deviam fazer a mesma coisa.
- Vou falar pro meu pai, mas não sei se ele vai gostar de dormir no aeroporto...
- Muita gente da turma vai pra já hoje mesmo, até os que vão viajar no dia 16!
- Caramba, então eu vou correndo falar com o meu pai! Nossas coisas já estão prontas mesmo, então é melhor a gente ir de uma vez!

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- Mãe, pai! Eu já acabei! – Mônica falou descendo as escadas carregando cinco malas bem pesadas.
- Mônica, você não acha que exagerou um pouco?
- Que nada, mãe! Eu ainda tive que deixar muita coisa pra trás! Pena que não dá pra levar tudo...

Seu Souza entrou na sala puxando uma mala enorme e disse.

- Se der excesso de bagagem não tem problema. Eu tirei o dinheiro do banco e dá pra pagar numa boa. O que não pode é a gente deixar coisas importantes para trás.
- Isso mesmo, pai!

Mônica voltou correndo para o seu quarto e depois voltou trazendo uma mochila enorme e outras duas malas. Mesmo não podendo levar tudo, ela queria pelo menos levar o que fosse mais importante e torcer para que o resto conseguisse sobreviver aos terremotos.

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Antenor e Lurdinha estavam colocando as últimas coisas no carro.

- Cascão! Anda logo que daqui a pouco a gente vai sair!
- Tô indo, pai! – o rapaz saiu de casa levando suas coisas, lutando para equilibrar tudo sem deixar nada cair. – Poxa, pena que não dá pra levar minha bike!
- Sua bicicleta é muito grande pra gente poder levar. Esquenta não que depois a gente dá um jeito de comprar outra.

Lurdinha voltou para dentro de casa a fim de conferir se nada estava faltando e algumas lágrimas brotaram em seus olhos ao pensar que teria que deixar tudo aquilo para atrás. Eles viveram ali por muitos anos, antes do Cascão nascer. Quando ela e Antenor ainda eram noivos, os dois estavam procurando uma casa para comprar e ficaram encantados com aquela, que era bonita, graciosa e ficava em um bairro muito bom e tranqüilo.

Ela ainda se lembrava do dia em que assinaram a escritura e receberam a chave. E também do cuidado com que ela tinha decorado tudo usando os presentes do casamento e chá de panela. E desde então eles moravam ali sem grandes problemas, como uma família feliz. Agora eles se viram forçados a deixarem todo seu passado para trás e morar numa casa que seria dividida com outras famílias e refugiados.

- Não fique assim, querida. Quando tudo acabar, nós tentaremos voltar.
- E se não pudermos voltar?
- Então o jeito vai ser recomeçar a vida em outro lugar. O importante é a gente ficar junto. O resto se arranja.

Sua esposa deu um sorriso. Sim, o importante mesmo era a família toda estar unida.  

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Magali olhou para seu quarto pela última vez. Sua cama, seu armário, sua penteadeira, a mesa de estudos e a cama dos seus gatos. Ela engoliu ruidosamente para evitar o choro. Será que seus gatos tinham chegado bem? Licurgo tinha telefonado dizendo que sim, mas como toda dona superprotetora ela ainda tinha medo de que algo tivesse acontecido. Eles podem ter se enjoado, ficado doentes ou talvez não consigam se adaptar ao clima de um estado diferente. Será que estavam se alimentando direito? Como ela ia fazer quando a ração acabasse?

Antes que ela entrasse em pânico, sua mãe entrou no quarto lhe chamando.

- Magali, está na hora. A gente tem que ir.
- Tá bom, mãe.

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Mônica foi trancar a porta dos fundos quando viu que tinha alguém no quintal.

- Tchau Mônica!
- DC? O que você tá fazendo aqui?
- Vim me despedir, ora!
- Ah, não fala isso! Daqui a pouco a gente se vê lá na casa do louco!
- É... com todo mundo amontoado e o chato do Cebola marcando em cima. Aí eu não vou poder fazer isso:

Ele a pegou pelos braços sem nenhum aviso prévio e colou os lábios nos dela, num beijo longo e cheio de paixão. No início ela quis resistir e acabou se deixando levar. DC a apertou com força enquanto explorava a boca dela com a língua tentando aproveitar cada segundo. Ninguém sabia do amanhã e talvez ele nunca mais tivesse outra oportunidade para beijá-la.

- DC, melhor a gente ir. Nossos pais estão esperando! – ela falou com o rosto vermelho.
- Sabe... eu me arrependo de não ter aceitado namorar com você, de verdade! Será que eu não vou ter nenhuma outra chance? – ele perguntou olhando-a bem nos olhos.
- Você sabe que eu amo o Cebola...

O rapaz deu um sorriso triste.

- É... eu sei... Mas precisava tentar ou nunca ia saber se teria ou não conseguido. Ainda assim, caso você fique enjoada do ceboludo, vai saber onde me encontrar.
- Seu bobo!

Antes de deixá-la ir, DC lhe deu mais um beijo, o último que eles iam trocar naquela vida, e pulou o muro do quintal para voltar a sua casa onde sua família o esperava. Ele não pode deixar de rir ao imaginar a cara do Cebola caso visse os dois se beijando daquele jeito. Com certeza a cabeça dele ia explodir e voar miolos para todos os lados!

Mônica trancou a porta e foi até o carro com o rosto vermelho e as pernas tremendo como gelatina. Embora amasse o Cebola, ela não pode deixar de se sentir mexida com o beijo do DC. Ele era um rapaz muito bonito e atraente e ela pensou que se o Cebola não existisse, com certeza estaria namorando com aquele gatão de olhos pretos.

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Após dar mais uma olhada em seu quarto, ela seguiu sua mãe pela casa, despedindo-se de tudo com lágrimas nos olhos. Chegando na rua, ela viu que os seus amigos também já estavam prontos para irem embora. Eles se olharam com os rostos tristes e cada um entrou em seus carros, prontos para deixarem o bairro onde cresceram e que tanto amavam.

Um a um, os carros foram andando pelas ruas em direção ao aeroporto da cidade. Eles olhavam pela janela vendo as paisagens conhecidas e familiares passando diante dos seus olhos cheios de lágrimas. O campinho onde os meninos jogavam bola e as meninas brincavam de casinha, os muros onde Cebola e Cascão pintavam caricaturas da Mônica, o parquinho, a padaria do seu Quinzão, a escola... cada lugar daquele bairro lhes trazia várias lembranças que agora ficariam apenas nos seus corações.

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Aquilo não era uma simples mudança. Era um êxodo. Não somente roupas e objetos pessoais tinham sido colocados naquele caminhão como também todos os objetos mais valiosos da família também tinham sido cuidadosamente embalados e acomodados para a viagem.

Sr. Frufru acompanhava tudo esperando os carregadores colocarem a última caixa no caminhão para eles poderem ir embora. Carmen esperava dentro do carro da família. Dali eles iam para a casa de campo, onde segundo seu pai a família toda estaria segura e bem acomodada.

Parte dela torcia para que seu pai tivesse razão e que ali fosse mesmo um bom lugar para ficar. Assim todos estariam bem acomodados. Em seu colo, uma pequena bagagem de mão levando objetos essenciais. Entre eles, várias passagens de avião para o Mato Grosso que Cebola tinha comprado para ela.

- Tá aqui. O vôo tá marcado pro dia vinte e um. Não pude comprar pra depois disso e também acho que nem ia adiantar.
- Obrigada, Cebola...

Mônica a olhou com um olhar triste.

- Puxa, Carmen... a gente sente muito...
- Eu também. Ai, que droga!
- Agora a gente tem que ir. Nosso vôo sai hoje a noite, mas a gente vai pro aeroporto bem mais cedo que é pra não ter problema. Boa sorte.
- Obrigada...

- É... acho que a gente vai precisar de muita sorte mesmo! – ela murmurou para si mesma olhando seu pai vigiando os carregadores e sua mãe preocupada em saber se suas jóias iam mesmo viajar em segurança.
- Você vai mesmo precisar de sorte, pirralha.

Ela levou um susto tão grande que acabou pulando e batendo com a cabeça no teto.

- Aaai! Quer me matar de susto?
- Algum problema, Carminha? – sua mãe falou do lado de fora. Ela abriu a janela um pouco e respondeu.
- Não, mãe! Eu só... er... quebrei uma unha.
- Ai, que horror!

A moça fechou a janela novamente e se irritou com as risadas da D. Morte.

- Tá rindo, é? O negócio é sério!
- Mas parece que seus pais não estão entendendo muito bem. Acho que toda sua burrice é genética mesmo.  
- Grrrrr! Olha que eu meto a mão na sua cara! Ai, porcaria! Por que meu pai é tão teimoso?
- Teimoso não. Arrogante mesmo. Ele se acha acima de todos e que nunca vai precisar de ninguém.
- Também não precisa falar assim, ele é meu pai!
- Grande coisa.

Após dar mais uma olhada e ver que seus pais ainda estavam ocupados, Carmen perguntou.

- Você sabe se o lugar pra onde a gente vai é seguro mesmo ou se vai ter problema?
- Claro que sim. Eu conheço todos os lugares seguros e problemáticos da Terra.
- Ai, que bom!

Alguns segundos se passaram e nada da D. Morte falar. Carmen não agüentou.

- E?
- E o quê?
- Você disse que sabia se o lugar pra onde a gente vai tem problemas.
- E sei.
- E tem? É seguro ou não?

D. Morte lhe deu um puxão de cabelo e Carmen teve que apertar os lábios com força para não gritar.

- Por que fez isso?
- Acha mesmo que eu vou revelar alguma coisa? você e sua família terão que descobrir sozinhos!
- Mas a gente pode acabar morrendo!
- A semeadura é livre, mas a colheita é obrigatória. – ao ver que Carmen não tinha entendido nada, a morte lhe deu mais um puxão de cabelo e falou. – Eu quero dizer que as pessoas são livres para fazerem suas escolhas, mas devem arcar com as conseqüências. Se seus pais e seus tios escolheram esse caminho, eles terão que suportar tudo o que acontecerá depois.
- Isso não é justo! Nem eu nem meus primos escolhemos nada! A gente tá indo contra a vontade.

A ceifadora soltou o cabelo da moça e falou com um tom de voz mais brando.

- Entenda uma coisa, pirralha. O que tiver que ser, será. Você fez a sua parte, agora precisa aguardar e confiar. Se for pra você e seus primos saírem vivos dessa, então nada irá mudar isso. Apesar de todas as tragédias naturais, vocês irão sobreviver. Agora, se tiver chegado a hora para algum de vocês, então não terá mais jeito.

Carmen afundou no banco do carro com os olhos cheios de água e D. Morte resolveu ir embora antes que aquela garota resolvesse chorar no seu ombro.

- Eu não posso fazer muito por você, pirralha, mas posso te dar um pequeno conselho. Separe quatro dessas passagens e guarde muito bem.
- Só quatro? Por quê?

A morte desapareceu dali sem dar a resposta, deixando mais uma vez Carmen sozinha e sem entender nada.
 



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