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História 2012 - A última festa


Escrita por: Mallagueta

Capítulo 62 - A última festa



No capítulo anterior, finalmente Carmen, Cotinha, Tonico e Fabinho embarcaram para o MT. E no abrigo do Licurgo, algumas picuinhas estão surgindo.

21 DE JULHO DE 2012

22:00

A festa na fazenda do prefeito estava sendo um sucesso. Não só o governador e sua esposa estavam ali como também pessoas da alta sociedade, artistas e celebridades do momento. Alguns tinham até chegado de helicóptero.

Sr. e Sra. Frufru desfilavam pela festa exibindo seus melhores sorrisos. Ela tinha escolhido o vestido azul com pedras semipreciosas, um colar e brinco de diamantes e em sua mão ela levava uma pequena bolsinha também cravejada com pedrinhas azuis para combinar com o seu vestido. Seu cabelo estava elegantemente arranjado em um coque preso por uma presilha também de diamantes. A maquiagem feita de forma perfeita e caprichada deixava o seu rosto parecendo uma pintura, sem nenhuma ruga ou defeito.

Seu marido vestia um terno azul marinho bem escuro com um prendedor de gravata e abotoaduras de ouro dezoito quilates. Ele cumprimentava todos os figurões da festa como se fossem velhos amigos e ambos posavam de boa vontade para os fotógrafos das colunas sociais.

Os pais de Fabinho, assim como os de Felipe e Luisa também aproveitavam a festa conversando com pessoas importantes e posando para as fotos.

- Festa maneira, mas esse paletó pinica! – Felipe reclamou com a irmã se remexendo para tentar amenizar o incômodo. Ele não era acostumado a usar terno e gravata.
- E você pensa que eu gosto de usar salto alto? Ih, coisa mais chata! Ah, mas o Guga ficou um gatão de terno, ah se ficou!
- Blé! O chato é que a Juliana não veio. Ainda bem que tem muita gatinha aqui pra eu conhecer!
- Seu safadinho!

Um garçom passou carregando uma bandeja de canapés com patê de ricota com ervas finas e um montinho de caviar em cima de cada um. Luisa pegou um enquanto Felipe se serviu de três para não ter que perder tempo correndo atrás do garçom.

- Hum! Tá bom pra caramba! A Carminha tá perdendo, essa festa tá bombando!
- Quem mandou ela ser boba? Eu até fiquei com pena dela, mas tenho que admitir que dessa vez foi demais! Nem eu sou tão doida assim pra responder nossos pais desse jeito!
- Pois é! Que perigo que nada, olha como tudo tá numa boa! Amanhã de noite a gente volta e vai estar tudo na mesma!
- Quando ela perceber que tudo tá tranqüilo, vai chorar um mês inteiro por ter perdido essa festa.

Os dois deram uma risada e continuaram comendo os salgados finos e elegantes que eram servidos. Luisa também se serviu de um copo de vinho apesar da preocupação de Felipe.

- Ó, não abusa não que a mãe vai achar ruim!
- Relaxa, Lipe! Uma tacinha não vai matar ninguém, vai?

Ângelo olhava a festa de cima. A decoração era de tirar o fôlego com tantas luzes, flores e o Buffet com o que tinha de mais requintado. Aquele lugar se destacava em meio a escuridão por suas luzes. De onde estava, ele podia ver também Felipe e Luisa rindo e se divertindo.

- Não se esqueça, “queridinho da D. Morte”, você só está aqui para dar apoio aos espíritos deles, não para salvá-los.

Ele soltou um dos palavrões que tinha aprendido com a morte e voltou a observar os amigos. O que ele não daria para poder tirá-los dali a tempo! Mas não, D. Morte foi bem taxativa. Não havia mais salvação para eles.

- Mesmo que você os salve do terremoto, não poderá levá-los ao MT. Mais cedo ou mais tarde, a inundação do tsunami virá e eles morrerão de qualquer jeito.
- Eu sei...

Ao ver que o rapaz tinha ficado muito triste, ela prometeu que a morte deles ia ser rápida, indolor e que ele podia estar perto para amparar seus espíritos. Talvez fosse por isso que os emissários tinham birra dele e o chamavam o tempo inteiro de “queridinho da D. Morte”. Ela sempre dava um jeito de fazer o que ele pedia enquanto que para os emissários não havia nenhuma consessão ou favorecimento.

Os emissários se colocaram em seus lugares e Ângelo viu o local ser coberto de escuridão. Lá em baixo, ninguém notou porque estavam distraídos demais com a festa.

- Chegou a hora... não vai ter mais jeito. – ele se posicionou ao lado de Felipe e Luisa para lhes dar apoio e só lhe restou esperar pelo inevitável.

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Dentro do avião, Carmen pensava em sua família e se eles ainda estavam bem. Uma coisa ruim parecia se revirar dentro dela, lhe dando a sensação de que algo terrível estava para acontecer. Olhando pela janela, ela reparou que à medida que o avião se aproximava do destino, a quantidade de emissários diminuía. Apesar de o vôo ter se atrasado por quarenta minutos, nada de mais aconteceu depois que o avião decolou.

Cotinha admirava o céu pela janela do avião e Fabinho dormia com a cabeça pousada em seu colo. Tonico tirava uma soneca tentando se acomodar nos incômodos bancos da classe econômica e ela procurava se distrair lendo uma revista. Toda vez que ela tentava ler alguma reportagem, sua mente divagava para a festa na fazenda do prefeito.

Ela imaginava como o lugar estaria decorado, quais roupas sua mãe estava usando e se ela tinha escolhido mesmo aquele colar de diamantes que seu pai lhe dera no último aniversário de casamento. E como estariam Felipe e Luisa? Será que estavam se divertindo? Eles nunca gostaram muito desses eventos formais por causa das roupas. Eles sempre preferiram algo despojado. Ainda assim eles sabiam aproveitar a festa do jeito deles. E sua tia Mirian? Estaria sentindo alguma falta do Fabinho? Certamente não. Ela só lembrava do filho para fazer mil restrições e tratá-lo como se fosse de cristal. Fora isso, ele só ficava com as babás. Aquela tola... ela não devia estar fazendo a menor idéia de que nunca mais ia ver o filho novamente.

Ainda assim ela guardava uma esperança, ainda que remota, de que se algo acontecesse, sua família ainda pudesse se salvar. Então no futuro ela tentaria encontrá-los novamente. Não custava sonhar.

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- Ô Luisa, manera no vinho aí mulher!
- Ah, só mais uma taça!
- Só mais uma? Você já bebeu quatro!
- É a última, eu prometo!
- Olha lá, heim! Se você chapar o côco, eu não vou te carregar nem a pau!
- Seu chato!

O copo, que estava em cima da mesa, virou deixando o vinho cair na toalha branca. Antes que Felipe pudesse lhe dar uma bronca pelo descuido, o enfeite do centro da mesa também tombou e ele viu os pratos e copos trepidando até cairem fora da mesa.

- Caramba, o que é isso?

O tremor foi ficando cada vez mais forte a ponto de ninguém mais conseguir ficar em pé. Todos os enfeites foram caindo no chão, as luzes começaram a piscar, as lâmpadas caíram e os fios elétricos soltavam faíscas enquanto as pessoas tentavam correr dali para algum local mais seguro.

Felipe pegou a irmã pela mão e tentou tirá-la dali tropeçando e esbarrando nas outras pessoas. O tremor, que tinha começado fraco, se tornou algo estrondoso e violento.

O casal Frufru corria de um lado para o outro e acabaram se separando no meio da multidão que gritava histericamente. Os pais de Felipe e Luisa chamavam seus filhos enquanto tentavam salvar a própria vida e o pai do Fabinho se esforçava para tirar a esposa daquele lugar.

Vários buracos foram abrindo no chão, sugando as pessoas.

- Lipe! Socorro! – Luisa gritou quando um buraco abriu sob seus pés. Felipe tentou puxá-la, mas mal conseguia segurar a si mesmo.
- Eu não consigo! Segura firme Lu! – ele gritava tentando puxar a irmã para fora do buraco.

O chão pareceu ter se desmanchado mais ainda, sugando aqueles que ainda tentavam escapar. Felipe olhou para cima e viu alguém conhecido.

- Ângelo? Cara, ajuda a gente pelamordedeus!

Ele abaixou a cabeça, fazendo um sinal negativo. O chão onde Felipe se apoiava desmanchou-se totalmente e os dois caíram no buraco.
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- Minha nossa! – Franja exclamou quando viu a agulha do sismógrafo dar um grande salto.

Ele tinha conseguido remontar o aparelho no abrigo do Licurgo e continuava monitorando as atividades sísmicas. Pelo salto que a agulha tinha dado, aquele terremoto deve ter sido de grandes proporções.

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- Luisa? Você tá bem? Acorda! – ele gritava para a irmã desmaiada. Tinha sangue na sua testa e suas roupas estavam totalmente sujas de terra e lama. – Ângelo, qualé cara? Ajuda a gente!

O tremor voltou e ele viu as paredes do buraco como que se fechando entre os dois. Blocos de terra foram caindo sobre eles e Ângelo tentou envolvê-los com suas asas e disse para os dois emissários que estavam junto dos irmãos.

- Andem logo. Se eles sofrerem um pouco que seja, eu conto pra D. Morte!

Com medo de um castigo certo, os emissários fizeram logo o serviço e Ângelo tirou dali os espíritos dos dois. Eles estavam tontos e não tinham percebido sua nova condição. Melhor assim.

- Deixa que eles eu levo.

O local, que antes estava bem decorado, repleto de luzes, flores e mesas elegantemente decoradas e forradas com toalhas de linho, agora estava um grande caos. Foi como se tivessem relexido a terra com uma grande pá, abrindo buracos enormes, elevando algumas partes e rebaixando outras. Algumas pessoas ainda agonizavam pedindo socorro e os emissários voavam levando as almas dos que já tinham morrido.

Ele viu o pai da Carmen ser levado, mas sua mãe ainda agonizava sob um tronco de arvore que tinha caído. Os pais de Felipe e Luisa foram soterrados e estavam inconscientes. Sua morte viria logo em seguida. E os pais do Fabinho tinham acabado de morrer e seus espíritos também estavam sendo levados pelos emissários para o portal. Ninguém que estava naquela fazenda sobreviveu. Toda a região tinha sido afetada pelo terremoto.

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Foi com grande alivio que Carmen colocou os pés no chão. Embora ali ainda não fosse o abrigo do Licurgo, ela imaginava que eles deviam estar perto o bastante para estarem a salvo dos terremotos. Após pegarem toda a bagagem, eles foram até uma lanchonete para fazerem um pequeno lanche.

Se não fossem as circunstâncias, Tonico e Cotinha estariam fascinados com sua primeira viagem de avião. Tudo para eles era novidade e foi preciso que Carmen cuidasse de todos os procedimentos porque o casal não sabia como agir em uma viagem aérea. Já Fabinho estava bem acostumado.

Eles se acomodaram a mesa da lanchonete e Carmen resolveu ir ao banheiro antes de fazer o lanche. Após se aliviar, ela tirou o celular da bolsa e tentou ligar para seus pais mais uma vez torcendo para que o roaming oferecido pela operadora de celular valesse a mensalidade caríssima que seu pai pagava todos os meses.

- “Não foi possível completar a ligação. O número para o qual você ligou encontra-se desligado ou fora de área”
- Grrr! Eu não acredito! Todo mundo desligou o celular? Aff!

Ela guardou o celular de volta na bolsa e ia deixar o banheiro quando um emissário apareceu na sua frente. Mesmo já estando acostumada com eles, ela acabou deixando sua bolsa cair de susto.

- Ai, tá querendo me matar criatura? O que foi?

Ao invés de responder, ele abriu uma das mãos e estendeu para ela. Na palma da mão dele, tinha um prendedor de cabelos que Carmen reconheceu ser de sua mãe. A jóia estava um pouco suja de terra e ela entendeu tudo.

- Quer dizer que...

Ele fez que sim com a cabeça lhe entregando a jóia que Carmen pegou com o corpo tremendo e o rosto pálido como cera. Suas pernas falharam e ela caiu de joelhos no chão.

- E-espera... sobrou alguém, não sobrou? – após ver a resposta negativa por parte do emissário, ela sentiu como se tivessem lhe dado um soco no estomago. Sua família inteira morta? Não tinha sobrado ninguém? Embora estivesse esperando por isso, ela não estava de fato preparada para ouvir aquela notícia.

Como não tinha mais nada para fazer ali, o emissário desapareceu deixando a moça sozinha com sua dor. Os lábios dela tremiam e Carmen acabou não agüentando e se curvou no chão num pranto desesperado.

- Ara, a Carminha tá demorando dimais sô! – Cotinha falou segurando Fabinho no colo e preocupada com a demora da moça.
- É mió ocê ir inté lá. Deixa qui eu fico cum o mininu.

Cotinha foi até o banheiro procurando Carmen e deparou-se com uma mulher saindo de lá parecendo preocupada.

- Olha, tem uma moça chorando demais lá no chão do banheiro! Você sabe quem é?
- Vixe Maria!

Ela entrou e viu Carmen sentada no chão encostada na parede chorando como uma criança pequena. Outra mulher estava ali do lado sem entender nada e tentando falar com a moça.

- Você conhece ela?
- Cunheço, ela tá cum nóis! O qui aconteceu?
- Eu não sei! Eu entrei aqui e ela estava chorando desse jeito. Coitada, dá até dó!

A outra mulher saiu, deixando as duas sozinhas e Cotinha sacudiu Carmen algumas vezes tentando fazê-la voltar a realidade.

- Carminha, o qui aconteceu? Fala logo, criatura!
- M-m... – ela tentou falar, mas sempre que tentava dizer algo sua garganta se apertava de tal forma que ela não conseguia dizer nada e Cotinha resolveu tirá-la dali.

De longe, Tonico viu a esposa amparando Carmen que estava em prantos e mal conseguia se manter em pé. Ele pensou em ir até lá, mas ficou preocupado com Fabinho e decidiu ficar ali mesmo acreditando que sua esposa seria capaz de lidar com a situação.

Cotinha fez com que ela se sentasse num banco e Carmen continuava a chorar sem se importar com as pessoas que passavam ali perto e olhavam desconfiadas para as duas. A mulher correu até a lanchonete para conseguir um copo de água com açúcar e Tonico perguntou disfarçadamente.

- O qui deu na Carmen, muié?
- Num sei! Eu intrei no banheiro e ela tava naquele chororô! Vou tentá acarmar ela i ocê fica aí cum o Fabinho.

Quando voltou, Carmen parecia estar se acalmando um pouco e após fazê-la tomar da água com açúcar, ela peeguntou.

- Menina, o qui tá acontecendo?
- Meus pais... eles morreram! Morreu todo mundo! Meus tios, meus primos... não ficou ninguém! – ela respondeu soluçando e mostrando para a mulher a presilha de diamantes suja de terra.
- Onde ocê arrumô isso?
- O emissário da morte trouxe. Era da minha mãe!
- Crendeuspai! – a mulher se benzeu várias vezes. – Di onde ocê tira essas coisa?
- De lugar nenhum, Cotinha! Meus pais morreram mesmo e o emissário veio me avisar!

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Na televisão da lanchonete, Tonico viu um local que lhe parecia familiar e procurou chegar mais perto para ver melhor.

- Ave Maria! Ô moça, ocê podi armentá o volume pra mode eu iscutá a notícia?

A balconista olhou para a televisão e como também tinha se interessado pela notícia, fez o que o homem pediu. Apesar do barulho ao redor, ele ainda pode ouvir alguma coisa.

- ... Os especialistas dizem que o terremoto foi de 9.2 na escala Richter. Nunca um terremoto dessa magnitude foi registrado na história do país antes. A destruição é inimaginável e toda a região foi afetada.
- Gente, que horror! O senhor conhece esse lugar? – a balconista perguntou.
- É o Grotão da Mata, fica lá na minha terra!

Quando Carmen conseguiu se acalmar, Cotinha a levou para onde estava o marido e Fabinho e o viu assistindo a televisão da lanchonete com cara de quem tinha visto uma assombração.

- O qui foi, homi?
- Ocês num vão querditá! Óia lá como o Grotão da Mata ficou todo estrupiado! Nunca vi coisa inguar!
- Cruiz-credo-ave-Maria! Num é lá qui fica a fazenda do prefeito?

Ele fez que sim com a cabeça e perguntou, preocupado com o estado da Carmen.

- Fia, ocê acha qui sua famia...
- Sim, eu acho.

A balconista entrou na conversa de novo.

- Quer dizer que sua família mora lá?
- Eles estavam numa festa em uma das fazendas...
- Nossa... e o que vocês vão fazer?
- Eu...
- Nóis inda num sabe, moça. – Tonico cortou ao ver que Carmen parecia confusa. Aquela mulher certamente imaginava que eles deviam voltar para sua cidade, mas aquilo estava fora de questão. Eles pegaram um lanche e levaram a mesa. Fabinho logo notou o abatimento da prima.

- Carminha, o que foi?
- Ai, xodozinho! Eu... eu... er... perdi minha pulseira preferida, é isso!
- Ah, fica triste não, você tem um monte!
- Você tá certo, eu ainda tenho muitas! Vamos comer!

Os dois ficaram com pena da Carmen, que apesar da sua dor tentava se manter tranqüila na frente do menino. O problema era que mais cedo ou mais tarde ele ia perguntar pelos seus pais e eles nem faziam idéia de como dar aquela notícia para ele. O jeito era adiar aquele momento o máximo possível.  



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