História 21 Primaveras - Montanha Russa

O ruivo resmungava alguma coisa, contrariado, jogado no sofá comprido da casa de Hoseok. Ele cobria com o braço o feixe de luz que batia em seu rosto, como se este pudesse queimar os seus olhos. O sol deixava seus fios de um alaranjado queimado quase loiros, ou como a cor do outono, como o melhor amigo costumava dizer. 

Jogou as pernas pra cima, enterrou o rosto no braço do sofá e se remexeu umas mil vezes até acordar, insatisfeito e já reclamando de uma dor nas costas. Como sempre. — Aaah, mas que merda. — Bufou, sentando-se e então permanecendo calado enquanto se espreguiçava e ouvia suas juntas estralarem. Foi nesse mesmo instante em que começou a ouvir um múrmurio, algo que soava mais como uma canção, e de imediato seus olhos encontraram os cabelos negros do rapaz que cantarolava na cozinha. Franziu o cenho, esfregou os olhos, e, vendo que aquilo não adiantara de nada, deu de ombros e seguiu até a cozinha, como se não fosse nada. Afinal, devia ser a ressaca. Beliscou o antebraço do outro, que proferiu um grito de dor. A pele de Hoseok era fina e sensível, então aquilo com certeza ficaria marcado. — Hoseok, que porra é essa?

— Eu que pergunto! Me beliscou por que?

— Porque você 'tava cantando! Você nunca canta.

— E isso é motivo pra...Esquece. Você não tem que voltar pra faculdade não? Ou pretende escalar o muro do campus de novo?

— Talvez, mas ficar aqui é bem melhor. — Murmurou, abrindo a geladeira e abaixando-se. — Hoseok... — O ruivo chamou, com a voz quase falhando.

— Hm? 

— Por que sua geladeira 'tá cheia de comida? Tem mais comida do que debaixo do meu colchão!

O moreno riu. — Eu passei no mercado mais cedo.

Yoongi fechou os olhos por três segundos. Respirou fundo, abriu-os de novo e então alternou o olhar entre a geladeira, a imagem de Hoseok fritando ovos bem à sua frente, naquele fogão que ele não via ligado há mais de meses. — Cara...se isso foi efeito do Taehyung, precisamos trazê-lo mais vezes pra cá. — Sorriu malicioso, ao passo que o amigo lhe mostrou o dedo médio. — Faz um tempo que você não faz ovos pra mim. — Fechou a porta da geladeira, depois de tirar de lá uma lata quase vazia de cerveja — a mais barata possível, é claro, daquelas que nem chegavam perto de ter gosto de álcool — que havia deixado ali sem Hoseok perceber alguns dias atrás, e então sentou-se no balcão.

— Não são pra você. — Hoseok colocou os ovos já temperados em um prato, sentando-se então de frente para Yoongi, um sorriso falso estampado nos lábios. Yoongi odiava aquela expressão, porque sabia o quanto não passava de uma máscara. O ruivo caminhou com os dedos pela bancada de mármore, até chegar ao prato de Hoseok, arrancando um pedaço da omelete para si. 

Então o celular em cima da mesa vibrou. Uma, duas, três vezes. Yoongi rapidamente o desbloqueou e franziu o cenho ao ler o começo da mensagem no visor da tela. Era um número desconhecido, mas a foto era de um rapaz fazendo uma cara engraçada. Riu abafado. — Como ele conseguiu meu número...?

— Quem é? — O outro perguntou, de boca cheia, os olhos brilhando, como se cada mordida valesse a pena.

— Seu namoradinho. — Clicou na conversa para ler o resto da mensagem, dando um suspiro.

Kim Taehyung: Oi, hyung! 

Você e o Hoseok estão livres hoje? Eu e o Jin hyung estamos indo para um parque de diversões.

Achei que seria legal ter vocês aqui...

Jin hyung está mal-humorado porque o Nam não quis sair com ele hoje.
 

— Ele 'tá com vergonha, mas pediu pra eu dizer que 'tá te convidando pra um encontro. — Yoongi disse sério, roubando o último pedaço de omelete e engolindo-a quase que de uma vez só, caindo em gargalhadas alguns segundos após ver a expressão perplexa de Hoseok. — Ele perguntou se a gente quer ir num parque com ele e o Seokjin. 

O moreno ficou em silêncio, tentando não se sentir incomodado ao sentir os olhos predadores de Yoongi sobre si, que tentavam encontrar uma pequena brecha em sua feição para assim poder adivinhar todos os seus pensamentos. Odiava quando o fazia, porque se sentia completamente transparente, de mãos atadas. E Yoongi sabia muito bem como fazer os outros caírem em seus joguinhos psicológicos. Apertou as mãos de baixo da bancada. 

— Não sei se é uma boa ideia.

— Por que não? — Aquele maldito olhar de novo.

—  Eu não falo com o Jin há meses. Ele deve me odiar.

Yoongi suspirou.

— Duvido muito. Hoseok, você não quer continuar assim pra sempre, quer? É a sua chance, cara. Você tem que voltar a viver a sua vida. Você até acordou mais animado hoje por causa do Taehyung, não foi? Aposto que nem lembra como se beija. E o Seokjin não consegue odiar nem uma mosca, você sabe como ele é.

— Você 'tá certo.

— O que?

— Eu disse que você está certo, Yoongi. Acontece que eu não posso simplesmente mudar da noite pro dia. E se eu tiver um ataque de narcolepsia de novo?

— Você vai estar com a gente, além disso, o Seokjin 'tá fazendo medicina, sabia? Ele vai saber dar conta. É só você tomar os remédios, como sempre. 

Não, Hoseok não sabia. Já não tinha mais tanta certeza se conhecia Seokjin. Não sabia muito nem mesmo da vida do próprio Yoongi, que conhecia desde que brincavam de ser espiões quando tinham onze anos. Aquilo o incomodava. Ele que o tinha afastado. Quando o acidente aconteceu, Hoseok não tinha ninguém para culpar além de si mesmo. Mas ele precisava de alguém, porque ele não poderia carregar o fardo sozinho, não é? Ele devia ter me impedido. Ele devia ter nos impedido. Então, um dia, ele parou de retornar as ligações de Seokjin. Abandonou as redes sociais, não respondia as mensagens, e evitava contato o máximo possível. Se odiava por isso. Se odiava porque quando abandonou a si mesmo, abandonou todos a sua volta também. E aquilo era irreversível.

Comprimiu os lábios e levantou a cabeça, analisando o rosto pálido de Suga. 

— Ok, eu vou. Acho que eu devo uma explicação a Seokjin.

— Ótimo. — Yoongi forçou um sorriso, engolindo em seco. Sua cabeça latejava, e sabia que aquilo não era um bom sinal. — Vai se trocar então, que eu vou... — Tampou a boca antes mesmo de terminar a frase, correndo em disparada ao banheiro, colocando pra fora tudo o que podia da bebedeira da noite passada. Limpou a boca com a manga da blusa, fraco. — Hoseok... — Chamou o de cabelos negros, que àquela altura já estava parado prontamente ao lado de Suga, então se abaixando para acariciar as costas do amigo, de maneira afetuosa.

— Eu falei pra você não exagerar. Melhor você ficar em casa, eu posso ir sozinho.

— Hoseok...

— Tudo bem. Eu quero ver o Jin. Vou ficar bem. Mas é melhor pegar um balde, porque eu te mato se eu chegar e meu chão estiver sujo.

✖

Quer dizer, parques de diversões não eram um dos lugares preferidos do Taehyung, principalmente para passar o dia. Primeiro que era muito movimentado, tinha crianças correndo por todo o lado, e segundo que nem se lembrava de qual era a sensação de se estar no alto. Estava com um pouco de medo. Mas, de alguma forma, estava ali, naquele momento, sentado em uma mesinha de um pequeno café do maior parque de diversões de Seul, escutando Jin falar há mais de uma hora sobre como estava indignado com Namjoon.

— Cara, ainda não consigo acreditar que ele me deixou plantado aqui. Eu entendo que ele tem que ajudar os pais às vezes, mas apenas hoje ele não podia dizer "não"? — Cruzou os braços, irritado, balançando a perna como se fosse a pessoa mais nervosa do mundo. — Também tenho que participar de várias reuniões com meu pai no consultório, mas nem por isso eu furo nossos encontros. E ainda em cima da hora! Custava avisar, duas horas atrás, antes de eu começar a me arrumar? Acho que não. — Revirou os olhos, aos resmungos, e mordeu o canudo do refrigerante, como sempre fazia. Nam costumava brincar com isso, porque Jin passava mais tempo mordendo o canudo do que bebendo a bebida em si, e antes que percebesse, nem uma única gota passava por ali. 

Taehyung fitou Jin. Contava os minutos para que Yoongi e Hoseok chegassem.

— Não sei, hyung. Talvez ele não quisesse te desapontar.

— ...Se fosse um imprevisto, eu até entenderia, mas já tínhamos conversado sobre isso. Achei que ele fosse desmarcar...será que ele esqueceu? — A mente de Seokjin se iluminou, como se agora tudo fizesse sentido, ao mesmo tempo que ia se sentindo ainda mais traído.

Taehyung riu baixo. Não queria caçoar do mais velho ou algo do tipo, mas era engraçado quando fazia tanto drama assim.

— Espero que não. Mas duvido que tenha sido de propósito...AH! Hyung! — O mais novo se levantou de prontidão, quase derrubando a cadeira, abrindo aquele sorriso quadrado que há tempos não mostrava. Seokjin virou para trás antes de se levantar, pasmo.

— Hoseok...o que você veio fazer aqui? 

— Há quanto tempo, hyung. — Hoseok sorriu torto, e ficar frente à frente com o outro após tanto tempo, de repente, lhe deu vontade de chorar. Mas não o fez, é claro. 

Taehyung engoliu em seco, confuso. De alguma forma, parecia que todas as pessoas com quem falava conheciam Hoseok. Por que ele era o único a não saber disso? — É...hyung, eu convidei o Hoseok e o Yoongi hyungs pra passar o dia com a gente...mas acho que ele não veio?

— Ele estava passando meio mal, então ficou em casa.

— Ah, entendi...tudo bem, então.

E de repente aquele silêncio desolador e constrangedor novamente. Não sabia por quê, mas de repente, o clima tornou-se tenso e extremamente pesado, e em questão de segundos, Taehyung se sentiu completamente invisível ali, como sempre. 

E aquilo perdurou por pelo menos uns cinco minutos, todos olhando para o chão, sem saber o que dizer, antes de Seokjin finalmente tomar partido. Passou a mão pelos cabelos castanhos, sem jeito, respirou fundo e abriu aquele sorriso meigo único dele.

— Já que o idiota do meu namorado não está aqui, vamos nos divertir em dobro, ok? — Quase cantarolou aquelas palavras, tentado ser o mais otimista possível, começando a marchar em direção à um dos primeiros brinquedos, que era um navio viking enorme. — Vem, gente! 

Para a surpresa de Taehyung, aquela primeira experiência fora bem melhor do que imaginava. Ele e Seokjin gritavam e levantavam as mãos junto com o resto das pessoas. Para o desapontamento de Hoseok, o seu medo de brinquedos não tinha diminuído nem em um por cento. 

— Se é pra morrer, eu preferia que não fosse desse jeito! — Gritou, assustado, segurando a barra protetora com toda a força que tinha nas mãos, quase se fundindo ao próprio metal. Então pela primeira vez Taehyung riu, deu aquela risada gostosa de criança, e ver aquilo foi o suficiente para Hoseok sentir, por um segundo, que sair de casa havia valido a pena. 

— Espero de verdade que vocês não me arrastem para uma montanha russa... — Disse, enjoado com o balanço do barco, quando os três finalmente desceram e começaram a caminhar pelo parque. Arrastou-se seguindo os outros dois até finalmente achar um banco onde pudesse se sentar, jogando a cabeça para trás. Aquele tipo de coisa realmente não era pra ele, ainda mais pra uma pessoa que mal saía de casa.

— O que?! Como assim, hyung? Mas a montanha russa é a melhor parte do parque todo! — Protestou Taehyung, e Seokjin riu, com o braço apoiado nos ombros do mais novo, como se o estivesse protegendo.

Hoseok estava com calor. O sol tinha aumentado consideravelmente e a movimentação também. O fluxo de pessoas que vinha e voltava por aquele mesmo caminho era enorme. Tirou a blusa, deixando à mostra seus braços magros, e percebeu que Jin o olhava. Sorriu para Taehyung, fingindo estar bem com a ideia de ir a uma montanha russa e se levantou.

— Ok...ok...mas por que a gente não come alguma coisa antes? E tem várias barraquinhas de brincadeiras bem mais seguras do que ficar a mais de trinta metros do solo, não acha? — Propôs, tentando conseguir alguns minutos para se preparar psicologicamente para tudo aquilo. 

Então, depois de mais ou menos uma hora, indo de barraca em barraca, colecionando bichinhos de pelúcia e até prêmios em dinheiro, estava finalmente na hora. Deixaram todos os pertences em um armário, perto de uma pequena sorveteria, onde as pessoas podiam guardar suas coisas por no máximo uma hora, e então pegaram a fila para o momento mais esperado: montanha russa.

Surpreendentemente, Seokjin era o melhor ali em jogos de tiro ao alvo. Com certeza teriam saído de lá de mãos atadas se não fosse por ele. Então Hoseok se lembrou de que ele costumava treinar paintball, embora não soubesse se ainda o fazia. 

Segurou firmemente na barra protetora. Seokjin teve que ir em outro assento, com uma mulher de mais ou menos uns trinta anos, provavelmente solteira, porque dava as desculpas mais sem noção do mundo para tentar se colar aos seus braços.

— Ok! O carrinho vai começar a andar em quinze segundos. Estão todos com o cinto ou barra? — O funcionário que conduzia a montanha russa gritou, para que todos pudessem ouvir, e apertou a alavanca logo depois de verificar que a situação estava sobre controle.

— Está com medo? — Taehyung olhou para o parceiro com um sorriso calmo, porém ligeiramente preocupado. Este segurava firme a barra, e, só por precaução, tinha colocado o cinto também. Hoseok estava em um conflito interno, porque achava que se algo acontecesse, o cinto provavelmente impediria que ele saísse antes de perder as pernas ou sabe-se lá o que poderia acontecer, mas não tinha dúvidas de que caíria caso apenas segurasse a barra. 

O de cabelos negros virou lentamente a cabeça em direção ao outro, assentindo. Não, não estava seguro. Estava morrendo de medo. Hoseok não tinha medo da morte. Ele era completamente indiferente à ela. Morrer ou viver, para ele, já tinham se tornado uma palavra só. Porque Hoseok estava morto por dentro. Completamente vazio, e não via nenhuma esperança para si. Não existia uma "luz no fim do túnel", ou qualquer coisa do tipo.

Mas então por que estava com tanto medo? Por que estava tão assustado? Não queria sentir dor. Não queria ver outras pessoas sofrendo, de novo. Não queria morrer daquele jeito, e sua mente estava em pânico.

O carrinho começou a subir, pelos trilhos, lentos. Hoseok respirou fundo e tentou se acalmar.

— Hyung, quer segurar minha mão?

— O que?

— Quer segurar a minha mão? — O mais novo gritou, aos risos, ansiosamente esperando pelo momento em que o carrinho descesse em alta velocidade, depois de pegar o tranco. Estendeu a mão para o outro, que a segurou firmemente, e começou a gritar no momento em que o carrinho "caiu".

Sentia como se borboletas voassem pelo seu estômago, batendo as asas da forma mais desesperada possível. Gritou e levantou a mão junto a de Hoseok, com a outra presa à barra de ferro, na segunda descida. Hoseok fechava os olhos com força e gritava como se clamasse para que aquilo parasse, mas era quase impossível não aproveitar um pouco do trajeto com Taehyung tão animado, com sua risada verdadeira e inocente em meio aos gritos dos outros passageiros.

A melhor sensação, para Taehyung, era de quando o ar vinha em direção contrária ao seu rosto, deixando-o quase sem ar. Quando o carrinho subia e logo descia em disparada, e podia sentir a corrente de ar fria nas bochechas, doloridas por causa do sorriso nos lábios que se estendia de ponta a ponta, era como se pudesse estar livre. Como se estivesse completamente livre, como se fosse um pássaro e pudesse voar, e sentir o vento e a adrenalina correr por suas veias. 

Aquele embrulho no estômago, apesar de um pouco estranho no início, era com certeza uma das melhores coisas que sentira em sua vida toda.

Hoseok quase se jogou no chão quando o passeio chegou ao fim, fraco. Sentia como se sua alma não o pertencesse mais, e queria estar muito brincando sobre isso. Mas seu coração parou tantas vezes durante o percurso, mais precisamente a cada vez que o carrinho pegava mais força e descia em uma velocidade inimaginável pelos trilhos, que nem sabia como ainda continuava a bater.

— Cara! Essa foi definitivamente a melhor coisa que eu já fiz em toda a minha vida! — Disse Tae, ajudando Hoseok a caminhar até um banco próximo. Seokjin os seguia, alguns passos atrás, em silêncio, depois de pegar as fotos tiradas na montanha russa e quase rolar de tanto rir das caretas de Hoseok e dele mesmo.

Hoseok sentou-se, e sabia que sua pressão estava baixa porque naquele momento mal conseguia manter-se consciente. Estava suando, sua cabeça girava e ficar no meio de tantas pessoas em um mesmo lugar fazia a temperatura de seu corpo aumentar a ponto de passar mal.

Seokjin logou percebeu e colocou uma mão sobre o ombro do dongsaeng. Estava tão sério que sua preocupação quase passava despercebida. Mas, apesar de terem se divertido tanto, ainda não tinha certeza se podia confiar no Hoseok. Se as coisas estavam bem, ou quais eram as suas intenções estando ali.

— Ei, vamos para um lugar menos movimentado. — Segurou nos braços de Hoseok para ajudá-lo a se levantar, temendo que ele ficasse muito tonto e caísse no chão. É claro que, no momento, aquele era o menor dos problemas. Hoseok podia ter uma recaída, ou, pior, desmaiar ali mesmo. 

Assim que chegaram na mesma cafeteria de antes, ajudaram Hoseok a sentar-se em uma cadeira, e ali estavam, todos os três, olhando um para o outro fixamente. Taehyung não fazia ideia do que fazer. Brincava com o suporte de canudos em cima da mesa, meio cabisbaixo. Sentia que tinha deixado o hyung mal, já que havia insistindo tanto para que ele o acompanhasse na montanha russa. Deveria apenas tê-lo respeitado.

Já estavam ali há dez minutos, e, àquela altura, Hoseok já estava menos pálido e menos tonto. Jin pegou o celular para ver as horas, lembrando-se de que tinham de buscar as coisas no armário, e riu baixo, com deboche e talvez um pouco de raiva ao ver as ligações perdidas de Namjoon. 

— Tae...você pode buscar nossas coisas naquele armário? O tempo está acabando. Acho que já acabamos a nossa visita por aqui, não? — Pediu, sereno, e Taehyung apenas assentiu, já se levantando. — Ah, pode buscar algo para o Hoseok também? Acho que ele ficaria melhor se bebesse algo gelado. 

Naquele momento, quando Taehyung deu as costas aos dois e saiu andando, os olhos do Jung imediatamente encontraram os do outro Kim. Por um instante, pensou que ele fosse dizer alguma coisa, gritar, acusá-lo, questioná-lo, qualquer coisa. Mas não o fez. Apenas levantou-se da mesa, devagar, e caminhou até a beirada do grande deque onde ficava a cafeteria. Apoiou os braços na grade e passou a observar as árvores que se estendiam pelos morros de baixo, pensativo.

Hoseok se sentiu mal novamente, mas agora, era algo que vinha de dentro. Sentiu um nó na garganta, mas, mesmo assim, levantou-se e foi de encontro ao outro. 

— Jin... — Chamou, e este virou para ele com uma expressão quase indecifrável, mas, que com certeza, não significava nada de bom.

— Que bom que você conheceu o Taehyung. Ele parece fazer bem pra você. — Tornando a olhar a paisagem novamente, comentou, quase deixando escapar um sorriso. — É um bom garoto. Você faz bem pra ele também. — Suspirou, olhando agora para os próprios pés. Hoseok escutava tudo atentamente, um pouco chocado. Você faz bem para ele também, será que podia realmente acreditar nisso? Era impossível pensar que fosse algo além de um estorvo para aqueles que o conheciam. Hoseok abandonou os estudos e decepcionou a família. Hoseok provocou aquele acidente. Hoseok o matou. Hoseok se matou. — Talvez ele precise mais de você do que você dele.

— Hyung...

— Não o desaponte.

— Jin...desculpe. Por tudo. Por não ter retornado suas ligações, por ter parado de falar com você. Por ter te excluído da minha vida de repente. 

Seokjin olhou para cima, piscando várias vezes como sua mãe lhe ensinara a fazer quando estava prestes a chorar, para que assim pudesse segurar as lágrimas e voltar à expressão normal.

— Não importa, Hoseok. — Então aquela vontade de chorar voltou, e Hoseok se desfez em lágrimas. De repente, estava cheio de novo. Cheio de toda aquela dor e amargura. Hoseok se sentia vazio, estava vazio. Mas pela primeira vez foi capaz de sentir a dor que aquelas lágrimas carregavam, depois de tanto tempo. O choro se intensificou de tal forma que o Jung quase soluçava, e aquela tristeza só cessou quando sentiu os ombros largos de Seokjin embrulhá-lo de forma carinhosa, e de repente o rosto deste estava escondido em seu pescoço, sentia as lágrimas pingarem em sua pele devagar. — Está tudo bem. 

— E-Eu não quero que você me odeie, Jin. Mesmo. Eu nunca te odiei, eu não devia ter feito aquilo com você. E-Eu só n-não podia controlar... — Sussurrou, aos prantos, caminhando as mãos pelas costas de Seokjin e segurando em sua camisa de malha cinza como se não fosse soltá-lo nunca mais. O Kim retribuiu o gesto, passando as mãos pelas costas do outro para acalmá-lo. — Eu não sabia o que fazer... — Sua voz saiu falha, e involuntariamente, Seokjin deixou escapar um soluço. Sentiu o rosto queimar por mostrar que estava chorando, mas apenas apertou o mais novo mais forte contra si e sussurrou várias vezes que estava tudo bem. Hoseok nunca chorara daquele jeito em sua frente antes, com tanto desespero, como se estivesse morrendo de dentro por fora.

Não...como se já estivesse morto por dentro há muito tempo. Como se estivesse gritando por ajuda.

Seokjin decidiu não dizer mais nada. Não precisava, porque tinha certeza de que o Jung sabia que não estava com raiva, ou qualquer coisa. Por muito tempo, Seokjin ficou sem entender o que tinha feito de tão errado. Ficou bravo com Hoseok, e até mesmo se incomodava quando tocavam em seu nome. Mas depois que voltou a se aproximar de Yoongi, foi capaz de lidar melhor com tudo e deixar para lá.

Taehyung caminhava com uma sacola de tecido em mãos, todos os bichinhos e outras coisinhas que haviam ganhado, além de alguns de seus próprios pertences, como carregador e etc, estavam ali. Não tinha entendido muito bem o por que de Jin ter pedido para que ele buscasse alguma bebida se estavam bem em frente à uma cafeteria, mas nada do que Jin hyung dizia fazia muito sentido mesmo. Chegando perto do deque, tirou algumas moedinhas do bolso e as colocou na máquina de refrigerante, tirando dali uma lata de coca-cola e uma garrafa de água, ambas geladas.

O que Taehyung não esperava, de fato, era ver os seus dois hyungs se abraçando quando voltou. Por um momento, pensou em ir até eles, descobrir o que tinha acontecido, porque podia ver de longe o rosto vermelho de Hoseok, e ficou preocupado que algo pudesse ter acontecido. Mas então hesitou, e passou a observar os dois, por apenas um instante. Então algo doeu dentro de si. Queria fazer parte daquilo.

Porque, não importa o quanto tentasse, continuava invisível.