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História 3 - A Floresta do Medo - Criações


Escrita por: Samuel_Super_

Notas do Autor


Desculpem não ter postado esse tempo todo. Estava mudando algumas coisas.

Capítulo 4 - Criações


Fanfic / Fanfiction 3 - A Floresta do Medo - Criações

Ela bebia um copo de água dado por mim quando troquei olhares desconfiados com Francis. Ela sentara-se na poltrona e nós dois, eu e Francis, no sofá ao seu lado. A lareira recebera um pouco de lenha a mais para aquecer de melhor forma a convidada. Ou melhor: aterrissada.

            - Bom... Qual é seu nome? – perguntei após ela entregar o copo.

Ele suspirou penosamente.

            - Jane... Jane Rowfrac... – ela estava cansada.

Francis me olhou apreensivo. Vá buscar algo pra ela, balbuciei. 

- Bem e de onde você veio?

Ela olhou para a janela.

            - Ilha Marphob. Caribe. – ela disse, então sua cabeça caiu de repente na poltrona e ela dormiu.

Levantei e puxei um cobertor para ela. Francis concertou a porta que apenas tinha rachado e pregou tecidos brancos nas janelas. Arrumei toda a papelada e varri a cabana silenciosamente. Acostumei-me com o silencio nada natural da floresta.

Terminamos nossas tarefas nada comuns à noite e entramos no quarto. Deitamos-nos e dormimos como bebês com a porta aberta.

 

Alguém andou pela casa. Ouvi os passos quando a luz do Sol cortou meus olhos. Levantei percebendo que ainda estava com a mesma roupa de um dia atrás, assim o cheiro horrível invadiu minhas narinas. Senti o odor das minhas roupas. Quando olhei para trás, Francis estava enrolado por um cobertor e um corte minúsculo tinha fincado ao lado de seu olho. Nada demais.

Caminhei sonolenta até a cozinha, onde encontrei a menina intrusa da noite passada procurando algo para comer em alguns potes. Assim que me viu, ela largou o pote de uva passa e me olhou assustada.

            - Desculpa... – ela disse.

Jane. O nome dela era Jane, lembrei-me.

            - Nada não! – fiz um gesto de deixa para lá com as mãos. – Também estou faminta. Vamos comer no sofá. 

Peguei dois potes de frutas e um pão grande. Ela puxou a cafeteira e levamos para o sofá. As chamas da lareira tinham se apagado e uma fumaça subia pela chaminé. Olhei para a floresta lá fora, vendo o cenário silencioso e sinistro, como sempre. Acomodei-me no sofá e Jane na poltrona.

Comíamos tranquilamente quando ela me perguntou. Antes disso, ela parara abruptamente e me encarara assustada. Como se tivesse visto um fantasma.

            - Em que ano estamos? – perguntou ela.

Parei um pouco para pensar.

            - Abril de 1941. – respondi. – Por quê?

Seu rosto perdeu a cor. Jane pousou sua caneca na mesa de centro.

            - Jane, - comecei- pode me explicar como veio para aqui? Tipo, você veio do Caribe, certo? Acho que fica na América.

Ela ficou muda por um momento. Depois falou.

            - Bem. As cartas que mandei deveriam ter chegado aqui, provavelmente em 2017 ou 2018. – Jane falou.

Engasguei. Lancei um olhar arregalado para a garota.

            - Sou de 2016. Após uma injustiça, fui confinada no Outro Lado da Ilha, um lugar deserto onde vivi por alguns dias, acho que um mês, numa cabana e me adaptei normalmente. – Jane informou. – Mandei cartas para alguém me salvar, contanto toda minha história.

“Acho realmente que elas deviam chegar à Europa, em si. Mas não acredito que cheguem à Polônia, certo? Acho que devo estar em Sopot.”

            - Mas como você chegou aqui? Devemos estar a milhões de quilômetros, separadas por zilhões de metros cúbicos de água e numa distância terrestre do litoral grande.

Ela pareceu forçar as lembranças.

            - Um tabuleiro... Um tabuleiro enorme, cheio de inscrições. Achei um desses num farol dias depois da queda. – ela contou. – Tinha sangue derramado dele, e então havia um livro. Li ele por dias, até que descobri que era um livro de magia. 

“Voltei pra casa com o tabuleiro. Algo aconteceu... Não me lembro... Apenas sei que conjurei algum feitiço do livro e um portal abriu-se da madeira. Caí nele. Vim parar aqui ontem”.

Como assim? Isso não devia ser possível. Entretanto eu vivo num mundo onde pessoas são mortas por fantasmas e florestas têm vidas próprias. Não devia me perguntar muito: o sobrenatural existe, e temos de tomar cuidado para ele não nos afetar.

            - Pera... – disse fazendo um gesto com a mão.

Ontem estava arrumando a casa antes de Jane chegar e tinha achado uma coisa. Deixei na parede ao lado do quarto. Andei até o cômodo iluminado precariamente, assim podia ver apenas Francis deitado de bruços na cama e o som inaudível de sua respiração lenta e pesada. Arrastei silenciosamente uma placa de madeira silvestre e pura da parede e a posicionei de frente para Jane.

A menina abriu a boca. Sua expressão era distante e contemplativa. Jane levantou-se e tocou de forma perfeita e cuidadosa na madeira, passando os dedos entre os padrões de palavras e figuras cravejadas. Um enorme círculo tinha sido manchado por algo vermelho.

            - É ele... – ela afirmou. – Pelo menos uma réplica, no caso.

Jane Rowfrac estava pálida. Ouvi Fran levantar-se preguiçosamente da cama. Ele andou até a sala onde estávamos com o cabelo desregrado e volumoso que tinha.

            - O que é isso? – ele perguntou se apoiando na placa de madeira.

Deitei o tablado num extremo da casa, perto da mesa de estudos do Fran e me afastei. Nós três olhávamos desconfiados para os padrões desenhados.

            - Bem, foi isso que me trouxe para cá. Lembro vagamente das coisas, afinal a viagem foi longa, mas começo a recordar quando tenho um relance. – Jane olhou para o mundo lá fora e se perdeu em seus pensamentos. – Isso já aconteceu uma vez...

Olhei de soslaio para Francis que estava sem nenhuma expressão.

            - Certo. – quebrei o silêncio. – Que tal fazermos um piquenique e estudar os padrões lá fora?

Eles me olharam e, surpreendentemente, lamberam os beiços.

 

Eu e Jane colocávamos o tablado na relva bem aparada de Francis. Um tronco de árvore cortado ao meio revelava as listras de sua história. A floresta ficara silenciosa, e isso ajudava no clima de mistério. Fran estava fazendo o almoço lá na cozinha, por isso não tínhamos nada pra fazer. Assim, sentei ao lado de Jane nos banquinhos.

            - Conte-me sobre você. – ela disse. – Gosto de ouvir histórias.

Pigarreei. Falar sobre mim não era um ponto forte que tinha.

            - Sabe, vivi mais a guerra de que antes dela. – comecei. - Eu morava com meus pais e minha irmã em Varsóvia. Tínhamos uma casa na cidade onde tudo era movimentado, já que meu pai era dono de uma loja de roupa na capital, então sempre íamos para o meio da multidão. Eu e minha irmã éramos cuidadas pela minha mãe que não trabalhava. Sabe, meu pai era um bom homem.

Enxuguei as lágrimas. Lembrar-se de sua família após algo ruim é muito chato. Lembrar de alguém importante para você depois de uma tragédia é muito chato.

            - Bom, a Alemanha Nazista nos invadiu em maio de 1939. – Jane me estendeu um guardanapo da mesa. – Eles mataram todos. Fugimos depois do entardecer, quando nos escondemos no armário e eles tinha ido embora.

“Caminhamos por dias, fugindo, roubando e sobrevivendo até que chegamos a uma cidadezinha e nos deparamos com London. Ele era um padeiro e tinha uma casa nos arredores de Sopot. Assim como nós, ele era um rebelde. Então nos juntamos: eu, Marjorie e London. Até que ficamos aqui por meses na casa de London. No fim houve muitas coisas até que parei aqui com Francis.”

Jane me olhava tristemente.

            - Desculpa te fazer lembrar tudo novamente...

Funguei. Balancei a cabeça num gesto de negação.

            - Foi bom isso ter acontecido. – olhei firme para a garota morena. – Amadureci depois de todos os danos. Agora sou capaz de me erguer novamente.

Jane estava enfática.

            - Não sei. Há muito tempo eu tinha feito alguma coisa para tudo melhorar. – ela disse. – Mas algo ficou para trás. Antigamente eu sabia exatamente o que devia fazer.

Ela assumiu um semblante pesado. Como uma granada ela lançou os fatos de sua vida: contou-me sobre a Ilha Marphob, sobre uma série de assassinados registrados por sua própria mãe que assinava com um “F”; contou-me de seu pai policial, e do Outro Lado da Ilha onde tinha ficado após sua “morte” forjada.

Então percebi que nós éramos conectadas. Havia algo comum entre nós duas: um elo de tristeza que favorecia nosso crescimento. Às vezes o que precisamos é apenas de uma dor para podermos ver o verdadeiro sentido de tudo.

            - Sente saudade dele? – perguntei. – Ainda sente algo por Chase?

Ela negou. Depois pensou.

            - Faz muito tempo... Nesse momento ela ainda nem nasceu, né! Mas se estivéssemos em 2015, talvez ele tivesse se recuperado das lesões e cursado a faculdade que queria. Lou devia ter saído da Ilha. Ele disse que tinha um romance com uma menina do continente e queria viver com ela. Faria de tudo para achá-la. Se eu conheço meu pai, ele saíra da ilha com minha irmã. Deve estar nas praias da Flórida.

Ouvia um sentimento na voz de Jane. Não era apenas dor, mas arrependimento. Mesmo assassinando todas aquelas pessoas, Jane tinha um bom coração. Ela fora traída pela mãe que queria vingança; tinha vivido uma vida de mentiras, com bases no que não era real.

            - Agora que você voltou para 1941, deve esquecer-se dos problemas. – aconselhei. – Viva o momento.

Ela de repente me encarou.

            - Será que vou voltar Emillie?

Calei-me. No exato momento que o silencio ficou desconfortável, Francis surgi na porta da casa com um sorriso imenso. Em suas mãos uma enorme forma de vidro com queijo derretendo para fora aos poucos.

            - Tá lindo gente. – disse Jane maravilhada.

Então o vento tomou conta do lugar. O vapor que emanava da comida começou a voar em uma formação estranha até desaparecer na floresta. Então ao longe algo se mexeu.

            - Francis... – o olhei com os arregalados.

Ele encarou a floresta e deu um passo à frente. Então ele arregalou os olhos ao tempo que olhava para onde o homem ficava abismado. Jane deu um grito.

            - Para dentro! – gritei puxando Jane e empurrando Francis.

Um ser de três metros de altura surgiu no campo de visão. Seus olhos eram horríveis: completamente vermelhos. Pessoas que andavam como o exorcista, surgiram das árvores. O terror percorreu por todo o campo, quando senti um pulso envolto ao meu tornozelo. Caí de cara no chão.

Levantei buscando toda a força que tinha enquanto Francis gritava meu nome. A dor da flecha que me atingira dias atrás, agora voltava de forma pior enquanto um punho me prendia tentando me puxar. Escorreguei e bati o queixo numa pedra. Rapidamente o gosto do sangue espalhou-se por minha boca. Um gemido foi solto atrás de mim.  Olhei para quem me prendia.

Uma mulher com roupa de escoteira e olhos revirados me encarava. Não havia expressão nenhuma na sua face e seu pescoço espirrava sangue todo momento, me sujando. Debati-me tentando me soltar, entretanto a fantasma me segurava e sangrava emitindo grunhidos estranhos.

            - Francis! – gritei pedindo socorro.

Eu me afastava dos meus amigos. Jane estava de joelho perante a porta chorando enquanto Francis corria na minha direção. Um ser estranho e pequeno o segurou pelas pernas e o derrubou. Eu chorava e me esperneava para soltar-me, contudo fiquei ali até ser levada para trás de um arbusto e não ver nada a não ser floresta.

 

            - Por favor, me solte! – eu gritava para a mulher. – Não tenho nada a ver com isso! – olhei para os arredores – Socorro!

A escoteira me levava pela floresta. Ela tinha prendido uma raiz aos meus pés, como cordas, e me puxava lentamente. Ela não era rápida, pensei, se tivesse que lutar eu venceria. Pensei no que Francis me dissera: as pessoas que morreram aqui ficaram presas na floresta.

Ouvia gritos distantes dos meus amigos.

            - Você tem tudo a ver com isso... – a fantasma disse num momento. Ela na verdade sussurrou.

            - O que? – perguntei.

Ela parou de me arrastar e apertou mais as raízes. Aquela era a hora. Peguei uma pedra que estava na minha mão e me ergui. Bati na cabeça da escoteira que caiu no chão. Desvencilhei-me das raízes e corri até Francis.

 

Entrei na área da casa. Avistei os seres ao redor da casa, como se estivessem guardando algo de valor. Eles mantinham-se imóveis olhando para a casa: bichos com garras, gigantes de terra, ventos de adubo natural rodopiantes e os seres que pareciam exorcistas. Mas os fantasmas não estavam lá.

Esgueirei-me atrás de uma moita e analisei o que podia fazer. Podia ver Francis e Jane através dos vidros das janelas andando nervosos. Ambos com as mãos na cabeça, entretanto achava que Jane estava chorando. Enquanto analisava a situação, perguntava-me o motivo dos seres não os terem atacado? Porque os fantasmas haviam desaparecido? Cheguei a conclusão que eles estavam interessados em apenas uma coisa: em mim.

Então fiz o que devia fazer.

            - Ei! – gritei levantando a mão. - É a mim que vocês querem?

Todos os seres estranhos viraram o rosto na minha direção. Um arrepio percorreu minha nuca.

            - Estávamos esperando você. – disse uma voz atrás da casa.

De repente três mulheres caminharam até a porta da frente e abriram os braços em minha direção.

            - Você está linda... – disseram em uníssono. – Lembra-se de nós? Ou melhor, lembra-se de nós filha?

Dei um passo para trás.

            - Quem são vocês?

As três sorriram ao mesmo tempo, assim como as respostas.

            - Ora, parece que não lembra. Nós somos sua mãe, Emillie. Sua mãe. 



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