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História 60 Dias Para o Amor - Capítulo XVI


Escrita por: Psycho-sama

Capítulo 16 - Capítulo XVI


“Essa afeição discreta que recebo é algo muito incompreensível. Não consigo aceita-la de forma sincera [...]”

———— One OK Rock, The Same As

 

. . .

 

Capítulo XVI

Empurrando e Depois... Puxando de Volta

 

. . .

 

Dia Quatorze

 

.

 

———— Se divertiram hoje cedo? ———— Os três praticamente se arrepiaram com a pergunta, olhando de forma alarmada para o Senhor Feudal.

As conversas ao redor distraíram-lhes por um tempo, esquecendo que estavam de volta à jokamachi, desta vez apenas com Sesshoumaru e Yuki, e durante o dia. Quando saíram da Cova já era manhã outra vez, e dera o infeliz prazer de encontrar-se com Yuki na entrada do castelo. Deram a desculpa de que estavam caminhando pela manhã (bem cedo), para passarem o tempo. O yadoukai pareceu compreender na altura, mas agora ela se perguntava se ele não estivera apenas fingindo.

Ainda bem que Maiko comprou aquelas roupas novas e mandou todos se trocarem e queimarem os vestígios do crime. Eles não costumavam fazer aquilo, pois sempre voltavam ainda à noite, mas como naquele dia perderam a noção do tempo, tiveram que tomar medidas extremas. Sorte InuYasha e Heima terem sido impedidos de participar naquela noite, se não teriam alguns roxos para explicar.

Kagome desviou os olhos para uma tenda próxima, fingindo procurar o que ela fora procurar ali para começar — uma roupa para o bebê de Sango —, enquanto Heima e InuYasha se entreolhavam.

Maiko e Satoru foram bem convincentes ao lhes dizerem que Sesshoumaru, principalmente Kaneki, ou qualquer outro do castelo, não poderiam saber sobre a ida deles à Cova, sob circunstância alguma. Ela era estritamente proibida, por ser algo apenas ligado ao submundo e aos anarquistas. Apenas pessoas ou youkais realmente muito ruins, frequentavam esse tipo de lugar. E caso fosse espalhado por aí que os servos e empregados do Senhor do Oeste o frequentavam, incluindo seu caçula e sua “esposa”, as coisas iriam piorar para a fama de Sesshoumaru.

———— Uh-hum... ———— O hanyou sorriu.

Yuki o olhou, notando como os três pareciam estranhos. Quando InuYasha pareceu desconfortável abaixo de seu olhar, não se impediu de rir de leve, balançando a cabeça e se voltando para Sesshoumaru.

———— Olha, InuYasha! ———— Kagome puxou a manga da Hi-Nezumi do hanyou, apontando para uma tenda e fazendo tanto ele, quanto Heima, pararem. Sorriu. ———— É um manto tão bonitinho!

InuYasha a olhou com uma expressão levemente irritada, enquanto era puxado para próximo da tenda. O vendedor estava ocupado atendendo outra mulher, o que permitiu que a miko puxasse o tecido do varal improvisado para poder olhá-lo melhor entre os dedos.

———— Mas é um manto para garotos.

———— É um manto unissex. ———— Ralhou, estranhando o silêncio e olhando para ele, vendo que o Taisho obviamente não devia saber o que significava, olhando-a com o cenho franzido e olhos irritados. Rolou os olhos. ———— Vale tanto para garotos quanto para garotas. E além do mais, acredito que o bebê da Sango vai ser menino. ———— Riu superior, devolvendo a manta ao varal e voltando a andar, enquanto Sesshoumaru e Yuki já estavam mais à frente. O último, que olhava um quimono feminino, provavelmente para sua esposa, enquanto o Senhor do Oeste era paparicado por um segundo comerciante da mesma tenda, que tentava lhe oferecer algo enquanto o Dai-youkai apenas o fitava quase como se estranhasse um macaco a falar.

Era engraçado o fato de que, por onde eles passavam, as pessoas desejavam “bom dia” ou chamavam pelo nome de Sesshoumaru numa euforia que era quase constrangedora e extremamente contagiante, enquanto ele apenas se limitava a fuzila-los com olhares que diziam obviamente, várias alternâncias entre “morra” e “suma da minha frente”.

———— Vai ser uma garota. ———— Kagome o olhou de forma irritada, enquanto Heima, mais atrás rolava os olhos para os dois.

———— Vai nada! Você prevê o futuro?

———— E você prevê? ———— Ela riu, cruzando os braços.

———— Fui eu que soube que ela estava grávida em primeiro lugar. Meus instintos são mais confiáveis que os seus.

———— Isso não significa nada! ———— Curvou-se sobre ela um pouco, as sobrancelhas unidas em desgosto. ———— Vamos apostar? ———— Ela arqueou uma sobrancelha, parando de andar e quase fazendo o kitsune bater contra ela, já que estava distraído olhando para uma tenda que vendia takoyaki.

Ele era tão bom quanto Sesshoumaru ignorando as pessoas e conversas desparelhas, ás vezes.

———— Não, obrigada! Não quero humilhar você, InuYasha! ———— O hanyou pareceu horrorizado, logo soltando disparates que foram prontamente rebatidos por Heima.

Enquanto discutiam, Kagome passou a correr para perto do Senhor do Oeste e do Senhor Feudal. Sorrindo-lhes.

———— Bem... ———— Kagome no meio dos dois Senhores os observou com diversão, enquanto os outros dois ficavam para trás. ———— Já pensou no que comprar? ———— A miko olhou para Yuki, e depois para a tenda atrás dele.

———— Não sei o que poderia comprar para um bebê menino.

———— Menina! ———— Kagome riu de forma irritada, olhando para o hanyou de forma ameaçadora.

———— Compre um quimono. Ele não precisa usar logo, afinal, bebês humanos crescem rápido. ———— Deu de ombros, olhando em volta. ———— Oh, armaduras! ———— A miko olhou o homem se afastar correndo, logo seguido de InuYasha. Franziu o cenho, inclinando a cabeça e vendo-os praticamente saltarem sobre os balcões, com olhos grandes e sorrisos bobos.

Riu.

———— Ele se dispersa facilmente. ———— Comentou, olhando para frente.

———— Ali tem roupas para crianças, Kagome. ———— Ela olhou para a tenda, e depois sobre o ombro, fitando Heima com diversão. ———— O quê? ———— Perguntou mal humorado, depois de notar que era observado daquela forma.

———— Você fica mais bonitinho quando fala meu nome. ———— Ele pôde jurar que os olhos dela brilharam de forma orgulhosa, deixando-o com um humor desagradável.

———— Eu paro!

Ela riu, agarrando o braço dele.

———— Não! Eu te proíbo! ———— Heima rosnou, fazendo-a rir mais suavemente. ———— Vamos ali dar uma olhada. ———— Apontou, ainda agarrada a ele. Girou o rosto sobre o ombro, ignorando os resmungos que conseguia ouvir do kitsune, e fitou Sesshoumaru, de braços cruzados a olhar em volta, fuzilando qualquer um que ousasse cumprimentá-lo, mesmo que da forma mais respeitável que ela já tenha visto. Riu. ———— Sesshoumaru! ———— Ele a olhou, de olhos estreitos. ———— Espera aqui, sim? Não vou demorar!

Ele não pareceu gostar, provavelmente achando que ela o estava dando ordens. Ela conseguia visualizar alguma ofensa flutuando por sua mente. Virou-se para frente, correndo até a tenda. Pediu a vendedora para mostrar outros quimonos de outras cores, e algumas yukatas. As primeiras eram horrivelmente caras, devido ao tecido ser leve e muito mais demorado para ser importado. Já as yukatas eram baratas, mas nenhuma delas lhe agradou. Havia também a opção de kosodes, mas não julgou que seria um bom primeiro presente, mesmo que achasse lindo em um garotinho pequenininho.

———— Me pergunto... Com que dinheiro você vai pagar? ———— Heima murmurou próximo a seu ouvido para que a vendedora, alegre, não ouvisse. Kagome o olhou feio, soltando-se de seu braço.

———— Eu tenho dinheiro!

‘Não, não tem!’

“Não tenho mesmo...” choramingou internamente, cruzando os braços e quase lamentando sobre os dois quimonos que queria comprar. Um azul, e outro preto. Imaginava uma criança de cabelos castanhos escuros, bagunçados e compridos como os de Miroku, olhos azuis grandes e apaixonantes como os de Sango — não que os da taijiya fossem azuis —, e um sorriso travesso nos lábios, vestido naquelas roupas, correndo por aí com os braços abertos, se jogando no colo da mãe enquanto ria.

Era até depressivo pensar que não poderia se realizar por que, desde que fora “morar” com Sesshoumaru, ela vinha ganhando tudo de mão beijada e sem esforço algum, e devido a isso, só se lembrava de que não tinha dinheiro algum, quando precisava meter a mão na carteira.

Que carteira, aliás?

Era tão bom o tempo que passavam por aí ajudando Senhores Feudais, enganando-os sobre demônios em suas casas, nuvens negras sobre elas, trazendo maus presságios. Pelo menos ganhavam dinheiro com isso. 

———— Você pode pedir dinheiro emprestado ao Sesshoumaru. ———— O kitsune cogitou, olhando o quimono azul que ela escolhera. Ao citar o nome do Senhor do Oeste, a vendedora logo ergueu a cabeça dos embrulhos para presente que ela escolhia.

Nenhum dos dois percebeu sua reação abrupta.

———— Não vou pedir dinheiro a ele. Não teria como devolver depois. ———— Heima a olhou de forma enfezada, vendo um bico infantil nos lábios dela. ———— Não é questão de não ter dinheiro agora. É questão de não ter dinheiro nunca mais.

———— Pretende viver na mordomia do castelo para sempre?

———— Claro que não! ———— Olhou-o. ———— Mas onde vou encontrar um emprego aqui?

———— Você nunca trabalhou na sua vida? ———— Ela abriu a boca, ultrajada diante o tom incrédulo dele.

Como ela trabalharia? Na sua época, só se podia começar a trabalhar com dezesseis anos. E adivinha, ela fora parar ali com quinze, no dia que antecederia o seu aniversário. Agora, com ela viajando entre o passado e presente/futuro, com a escola, e ainda com quinze anos, como ela trabalharia? Sem contar, que ficara presa ali, ou seja, sem mão na massa para a Kagome.

———— É uma longa história! ———— Cruzou os braços sobre o peito, indignada por estar sendo, tecnicamente, chamada de escorada.

———— Não se preocupe, Senhora! ———— Os dois encararam a mulher, que lhes sorria de forma gentil, já com um embrulho de presente nas mãos, a oferecendo. ———— É um presente. Aos dois. ———— Kagome franziu o cenho, prestes a olhar para Heima, quando viu a mulher olhar sobre seu ombro, sorrindo para algo que ela via lá.

Sesshoumaru.

Olhou-o de canto, na esperança de que ele não tivesse ouvido sua conversa, mas enganando-se piamente ao notar que a distância não era assim tanta, e que mesmo com centenas de pessoas falando e ocupando seus ouvidos aguçados, ele poderia muito bem distinguir uma conversa aqui, de outra ali.

Voltou-se para a mulher.

———— Tem certeza? Quero dizer...

———— Por favor, aceite! ———— Fora Heima quem pegara o embrulho, agradecendo numa mesura respeitável, que fez a mulher corar absurdamente, parecendo entrar em modo catatônico, e depois arrastar Kagome dali.

———— Como você é oportunista. ———— Ralhou com ele, já ao lado de Sesshoumaru e agarrando o embrulho quando ele lhe fora, literalmente, atirado.

———— E você também deveria ser. ———— Cruzou os braços, olhando em volta. ———— Ela estava lhe oferecendo.

———— É, mas... ———— Olhou o presente com careta. ———— Não pareceu certo. ———— Murmurou baixo, dando-se por vencida e apertando o embrulho contra o peito. O que importava agora, é que Sango e Miroku iriam gostar do presente.

———— Não custa nada usar as pessoas ás vezes. ———— Ambos se encararam, confusão e seriedade chocaram-se de frente. ———— Ainda mais quando elas deixam.

———— Ótimo conselho, Heima! ———— Resmungou irônica virando o rosto, ouvindo-o rir anasaladamente.

———— Veja ———— Ela o mirou de esguelha, agora, um pouco séria. ————, se não usá-los, eles usarão você. Deveria ter isso em mente. ———— Estreitou os olhos de forma divertida, parecendo quase sádico e sombrio. ———— Francamente... É capaz de matar um Cão do Inferno, mas incapaz de lidar com a ingenuidade própria.

Kagome arregalou os olhos, completamente chocada por ele ter dito aquilo, logo ali, e em voz alta ainda por cima. Aquele arrepio que lhe subiu a coluna foi de pura irritação. Olhou para Sesshoumaru em completo alarde, mas vira que ele os ignorava, como sempre. Ainda sim, ela sabia que ele tinha ouvido, e ao voltar seus olhos para seu familiar, não poupou na expressão furiosa, que o fez arrepiar-se e algo pinicar dolorosamente em sua nuca. Tanto pela mirada irritada, quanto como retaliação por ter irritado sua mestra.

Odiava aquela ligação, ás vezes.

Virou o rosto, levemente emburrado. Sentindo a hostilidade dela, resolveu se afastar e se juntar a Yuki e InuYasha antes que ela o estrangulasse ali. Mesmo que não entendesse o motivo da raiva. Não havia dito nada além da verdade. Ela deveria saber lidar com aquele tipo de sinceridade.

A miko suspirou, levando a mão ao rosto e balançando-o em negação. Esse Heima idiota, por que ele tinha que ser tão... Ele? Não tinha a intenção de contar a ninguém a abordagem de Akashi, pois fora graças a ela que cortou o próprio cabelo. Sem mencionar que ela tinha treinado tanto para ficar mais forte, e quase fora devorada por um Cão do Inferno.

Tudo bem que o tanuki havia usado truques sujos, mas isso só a fazia pensar que ainda não era forte o suficiente. Pois, se ela o fosse, poderia lidar com aquilo.

Se fosse Sesshoumaru, medalhão estúpido algum o pararia.

E isso a deixou de mau humor.

———— Preciso comer... ———— Olhou em volta, quando sentiu o cheiro, afastando aqueles pensamentos da mente com bastante rapidez.

“Comida. Deliciosa comida!” sorriu, enquanto procurava pela barraca de onde vinha aquele cheiro maravilhoso. Nunca pensou que poderia amar tanto assim yakitori, mas era como quando notou que estava atraída por Sesshoumaru, simplesmente aconteceu.

Assim que avistou a tenda, ao lado de outra que vendia takoyaki, ela sorriu abertamente, dando um passo naquela direção. ‘Com que dinheiro vai pagar?’ seu corpo se retesou, e ela fez careta. Seiji, ás vezes podia parar de lembra-la de tudo e ser tão detalhista.

Olhou sobre o ombro, vendo que Sesshoumaru ainda estava ali, olhando para o céu, distraído e perdido no próprio mundo. Mesmo que ele estivesse com aquela expressão calma, ela sabia que ele estava a um passo de pegar todos pelo pescoço e tirá-los dali de volta para o castelo.

Assim que notou que estava sendo observado, ele a encarou, estreitando os olhos. Uma ideia brilhou em sua mente, e um sorriso quase perverso surgiu em seus lábios. Uma pequena parte de sua mente, por isso facilmente ignorável, dizia que era errado fazer aquilo, mas sua fome era tamanha que ela achava que poderia lidar com a culpa depois. Ou dependendo, nem mesmo se culparia.

Aproximou-se do Dai-youkai, e enlaçou seu braço rapidamente.

———— Vamos continuar andando? ———— O olhar que ele a mandou dizia exatamente o que ele pensava: “eu sei o que você está planejando”. Diante daquilo, ela riu, desviando os olhos para a barraca enquanto se aproximavam dela.

Assim que o vendedor os viu, ela nem mesmo precisou pedir por um yakitori, ele quase se jogou sobre o balcão para lhe dar. Sorriu agradecida, e levemente surpresa com o efeito que Sesshoumaru tinha naquelas pessoas, e se voltou para ele.

———— Você quer? ———— Ofereceu, mas ele apenas estreitou o olhar outra vez, de braços cruzados e aquela aura que a dizia para tirar aquela coisa frita de perto dele se ela não quisesse ter galinha frita enfiado goela abaixo. ———— Só perguntei... ———— Resmungou na defensiva.

Com o embrulho em uma mão e o palito na outra, eles voltaram a andar, descendo a rua de chão batido. Em pouco menos de quatro minutos a galinha frita fora completamente devorada. O palito fora colocado em um dos barris que pareciam servir para o lixo — já que aquela jokamachi não era a mais limpa e a mais rica de todos os Reinos à toa.

Não demorara muito para que pessoas começassem a se aproximar, cumprimentando-a e a Sesshoumaru, oferecendo presentes que na maioria das vezes — todas elas — era Kagome quem pegava e agradecia.

Em todas elas, sempre olhava para o Dai-youkai de forma repreensiva, como se o perguntasse se ele tinha alergia à pessoas ou coisa assim.

———— Você não costuma sair muito, certo? ———— Não olhou-o quando perguntou, tentando equilibrar algo nos braços. ———— As pessoas parecem bem surpresas por vê-lo por aqui. ———— Riu de leve, quando o que parecia um manto, embrulhado semelhante ao presente do bebê de Sango, escapou de seus braços e rolou para o chão.

Em um momento, Kagome se repreendia por não ter mais braços, no seguinte, ela xingava Sesshoumaru mentalmente por ser um porco chauvinista, e depois, o manto estava na mão dele. A miko o olhou de forma surpresa, reparando como a mão do youkai era grande ao amparar o embrulho sem esforço no meio do ar.

Olhou-o, vendo que ele não tinha pretensão de lhe dar para segurar novamente. Quase riu com a cena, vendo como ele ficava mais “simpático” com pessoas que demonstravam ter respeito por ele, ou assumiam abertamente que o idolatravam. Kagome começava a achar que, quanto mais devotarem suas vidas a ele, mais fácil será para ter alguma recíproca vinda dele.

Rin era um exemplo bem óbvio.

———— Obrigada...

Ele a lançou um rápido olhar, antes de voltarem a andar. Kagome ficou olhando-o, com aquele riso fácil no rosto, como uma criança sedenta. Pigarreou, voltando a andar.

Não havia desistido de sua pergunta, e isso ele pareceu perceber.

———— Há assuntos mais importantes que requerem a minha presença.

———— Não acho que seja verdade. ———— Virou o rosto, dando um passo para o lado dele para desviar de um homem que trazia algumas verduras em um carrinho de mão, feito de madeira. Sorriu para ele, o cumprimentando quando ele retirou seu chapéu e fez uma mesura respeitosa. ———— Essa é sua cidade. Seu povo. Seu Reino. ———— Continuou falando, em uma voz moderada e controlada, olhando para as pessoas que trabalhavam, compravam, riam, conversavam. Todos perdidos em seus mundinhos, com seus problemas, mas achando um minutinho para olhar seu Senhor, e cumprimenta-lo exageradamente. ———— Se você não liga para eles... Se não mostra que se importa com eles. Mesmo que apenas fingindo... Por que eles deveriam apoiar você? ———— Voltou os azuis para o Dai-youkai, reparando que ele a olhava, agora. Por um segundo se perdeu no fato de que batia no ombro dele, e como ele parecia tão... Normal ali.

Com aquela hakama preta e a yukata sem mangas. Ele parecia qualquer coisa, menos o Senhor do Oeste, menos aquele youkai frio que já matara centenas, ou quem sabe, milhões de pessoas, e outros youkais. Aquele que pensava apenas em si, que queria controlar todo o Japão, e que não mediria esforços para isso. Ali. Ele parecia apenas Sesshoumaru, com sua estola em volta do braço e aquela aura fodônica que os Inu-youkais mais poderosos costumam passar.

De repente, ele era o youkai que ela conhecera há três anos. Inconsequente e impulsivo, atrás de uma maldita espada enferrujada.

Sorriu para ele, diante aquele olhar enviesado, aquelas rugas entre os olhos, que o deixava, agora pela perspectiva torpe dela, mais bonito do que intimidante.

Se percebe que ela esta perdendo o foco de sua mente, quando começa a pensar como Rin e ver Sesshoumaru como “um cara legal”.

———— Você entende? Esse povo, mesmo que não seja importante para você, é importante para o Senhor do Oeste. ———— Girou o rosto, satisfeita por ter a atenção dele apenas para si. ———— Esse é seu ponto fraco. E seu inimigo sabe dele.

Eles ficaram em silêncio por algum tempo. Em algum momento ela parou de andar, para arrumar as coisas de forma que fosse mais fácil de carregar. Estranhamente, ou não, dependendo o ponto de vista, as coisas não lhe eram pesadas, apenas eram incômodas. Quando conseguiu ajeita-las, ergueu o olhar para o Dai-youkai, vendo que ele a encarava. Inclinou a cabeça, ainda encurvada sobre uma sacola, quando ele desviou o rosto.

Suspirou, empertigando-se e se sentindo esgotada. Era difícil entender o que se passava naquela cabeça. Quanto menos ela sabia, mais ela queria. Era estranho, sim, mas fazer o quê?

———— Esse não é meu único ponto fraco. ———— Kagome arregalou os olhos, olhando-o tão rapidamente que ela quase torceu o pescoço.

Ela havia acabado de ouvi-lo admitir... Que tinha, não só um, mas dois pontos fracos? Se bem que, Rin não era um segredo, certo?

———— Não precisa se preocupar com Rin. ———— Disse, começando a andar. ———— Se todos continuarem a pensar que eu sou a garota que andava com você, ela vai ficar segura. ———— Desviou os olhos. ———— Pelo menos eu espero, já que Atsushi sabia que não era eu, e a vil-

Calou-se quando percebeu que ia falar demais. Sesshoumaru a olhou de canto, ela sentiu o peso dos âmbares, pois era facilmente perceptível quando ele simplesmente a olhava, e quando a olhava com indisfarçada tensão.

———— Aliás, nem perguntei como você está. ———— Mordeu o lábio inferior, esperando que ele não notasse que ela estava escondendo algo. Sesshoumaru a olhava firmemente, quase com nojo. E isso a fez rir. ———— O quê? Traição não é algo que relevemos. Independente de como ela venha, ou de quem.

———— Não é a primeira vez que acontece. ———— Pareceu dar de ombros, virando o rosto. Sesshoumaru não é do tipo que dá de ombros, ou do tipo que tropeça, gagueja, erra a fala, ou se engana. Ele era perfeito, por isso tinha que se basear. Aquela fala indiferente, aquele girar de rosto, para Kagome, era o “dar de ombros” dele.

———— Você percebe que tem algo errado quando se acostuma a ser traído? ———— Olhou-o, quase perplexa. ———— Ainda sim. ———— Com certa dificuldade agarrou seu braço, sentindo como a pele abaixo da sua era fria e lisa em contraste com a feminina. Quente e levemente áspera. Olhou o local que tocara, por segundos, sem notar que Sesshoumaru a mirava também. Quando apercebeu-se da cena, retirou a mão, olhando-o nos olhos. ———— Atsushi trabalhou pra você por décadas, ou sei lá quanto tempo... Deve ser difícil lidar. Eu mesma me vi irritada, quando ele não estava realmente traindo a mim.

Desviou os olhos, apertando mais as coisas no peito.

———— Se bem que... A culpa não é totalmente dele. Não que eu esteja lhe dando anistia, mas esse Hisao é um pé no saco. E eu já acho isso sem nem conhecer o cara.

———— Como soube sobre Hisao? ———— Ela o olhou de forma alarmada, notando o barítono levemente irritado dele.

———— Huh... InuYasha?! ———— Ela não soube se estava perguntando ou afirmando.

O estreitar de olhos do Dai-youkai foi um claro sinal de que ela não deveria saber daquilo. Engoliu em seco, sem entender como aquela “agradável” caminhada, tinha virado de pernas para o ar em segundos de tempo a uma frase ser dita. Agora quem estreitava os olhos de forma irritada, era ela.

———— Eu não deveria saber disso? ———— Sesshoumaru quase rolou os olhos, murmurando um “duh” para ela. Sabia que ele nunca faria isso, mas pela expressão, o Dai-youkai estava quase lá. ———— Por que não? Sei que ele não é meu inimigo, pra começo de conversa, mas isso era no início. Depois de ele ter atacado Rin e Kohaku, e mandado Atsushi e Akashi... As coisas mudaram, e também estou nisso. ———— Apressou o passo e parou na frente do outro, olhando-o da mesma forma que ele a olhava. Com irritação. ———— Você não pode me deixar de fora. Querendo ou não, eu vou ajudar. Independente de como.

———— Isso não vai ser tão fácil como lutar contra Naraku. ———— Ela abriu a boca, levemente surpresa. Não fora fácil lutar com Naraku. Levaram quase um ano pra matar o desgraçado, e ela ainda fora jogada num abismo sem fim por causa dele. Todos sofreram por causa de seus atos. E ele dizia que era fácil? Fácil para quem? ———— Não se meta no que não é da sua conta. Volte a brincar de casinha longe de problemas.

Ele simplesmente esbarrou nela de propósito quando passou. Não fora abrupto, mas ele era alto e forte, e Kagome se viu com certa dificuldade em conseguir equilíbrio outra vez.

Sentiu o sangue subir para seu rosto, começando a se arrepender de estar atraída por aquele imbecil. Realmente, o que ele tinha de rude, tinha de beleza. E era muito. Ela simplesmente não conseguia lidar com aquele youkai sem ter pensamentos homicidas em várias formas de tortura. Ele conseguia ofendê-la de diversas maneiras, em vários pontos fracos que ela desconhecia, até ter uma simples conversa com ele.

Respirou fundo, com o maxilar rígido e os dentes trincados. Empertigou-se, girando nos calcanhares e o olhando.

———— Sesshoumaru, seu idiota! ———— Ele parou, olhando-a sobre o ombro. Não se importou com o fato de ele tê-lo feito tão lentamente, que fora quase assustador, ou com o fato de que suas íris âmbares mostravam o claro pensamento que ocupava sua mente. O que ele a mataria ali mesmo, fazendo um show para dezenas de pessoas. Nem ligou para os comerciantes e cidadãos que se viraram para olhá-los, curiosos do porque de os pombinhos estarem a gritar. Bem, pelo menos Kagome. ———— Estou fazendo isso pela Kaede-obaa-chan! Não é mais por você, ou por InuYasha, ou a pedido de Yuki... Você não vai mandar em mim como manda em seus cachorros... ———— Deixou as coisas caírem aos seus pés, tão enfezada com aquela atitude dele que só faltava bufar. ———— Nem fodendo eu vou fazer o que quer só porque acha que tem algum direito sobre mim... Que fique bem claro! ———— Apontou-lhe um dedo.

Girou nos calcanhares e deixou um furioso Dai-youkai para trás, e algumas pessoas curiosas.

Só não sabia se se sentia orgulhosa de si mesma, ou se começava a procurar algum lugar para se esconder da fúria de Sesshoumaru.

“Talvez as colinas?”

‘Elas parecem uma boa ideia, sim!’

.

 

.

 

Noite

 

.

 

———— Não acredito que é você o novo Senhor do Leste! ———— Kagome foi erguida do chão, rindo como uma criança. No fundo, não se importou com o que as outras pessoas diriam, ou se aquilo desagradaria Sesshoumaru, no fundinho, desejando que o desagradasse mesmo. Ele que fosse a puta que o pariu, pois ela não era nenhuma trouxa pra ficar aceitando suas patadas e ofensas de cabeça baixa.

Tudo bem que ela era trouxa, mas não naquele quesito.

———— Eu também, Kagome! Na verdade, nem acredito ainda. ———— O sorriso fácil no rosto do Ookami fez a miko sorrir mais, enquanto se afastava, com aquele brilho orgulhoso nos olhos, como uma mãe que olha para seu filho depois de ouvir diversos elogios das professoras de escola.

———— Dá pra acreditar nisso? ———— Assim que a voz feminina se fez presente, a miko olhou-a com um sorriso rasgando sua face, mas quando viu aquela enorme barriga, a expressão de choque tomou parte. Kouga riu alto, circundando os ombros de uma Ayame corada, que ficara um tanto sem jeito pela surpresa e palidez estampadas no rosto da miko.

———— Eu disse que eles iam reagir assim. Olha o Inukoro! ———— Inuyasha, ao lado da morena piscou, fuzilando o Ookami em seguida.

———— Depois de três anos você ainda lembra esse apelido idiota, Yase Ookami? ———— O moreno não pareceu ofendido, apenas rindo mais.

———— Ayame-chan... ———— Kagome estendeu as mãos para ela, as quais foram prontamente seguradas, enquanto a miko olhava a barriga com uma fascinação assombrosa. ———— Você está linda... De quantos meses? ———— Ergueu os azuis, soltando a Ookami e permitindo que ela alisasse a própria barriga.

———— Treze meses. ———— Os olhos da miko se arregalaram, e ela se afastou, como se um verme começasse a sair da outra. Ayame riu. ———— Você não sabia a duração da gestação de uma youkai? ———— Kagome negou, ainda sem reação. ———— Se é um bebê youkai, ele tem muitas partes para desenvolver, além de uma criança humana normal, por isso demora. Já se fosse um hanyou, levaria onze meses, apenas.

———— “Apenas”? ———— Surtou. ———— Você está grávida a mais de um ano. ———— A Ookami cobriu a boca, querendo evitar uma gargalhada mais constrangedora.

———— Me surpreende vocês dois conhecerem o futuro Senhor do Leste. ———— A voz de Yuki foi o que os lembrou de que não eram os únicos ali. Girou o rosto para o yadoukai, dando passagem para que ele e Heima cumprimentassem Kouga e Ayame com apertos de mão.

Já Sesshoumaru, se limitou a um manear de cabeça. Ele estava com uma aura tão sombria, que o casal se perguntou se haviam feito algo de errado.

‘Você o deixou irritado, Kagome!’ a miko se limitou a rir anasaladamente, dando de ombros.

Ele não teve mais do que mereceu. Tentava convencer a si mesma que não havia sido uma vadia, e nem que estava agindo como uma, quando ele poderia apenas estar tentando protege-la. Claro, era absurdo pensar algo como aquilo, mas aquela sua parte que havia assumido que tinha atração por ele, uma parte maior do que deveria ser, e do que Kagome considerava “seguro”, lhe insistia em dizer que era sim, possível.

———— É uma longa história. ———— Respondeu o futuro Senhor, olhando seriamente para o yadoukai, mesmo que o sorriso ainda estivesse lá.

———— Engraçado ouvir isso de duas pessoas diferentes em dois dias seguidos. ———— Os castanhos voaram para Kagome, que coçou a testa, desviando os olhos.

Ela ia contar a ele tudo nos mínimos detalhes. Um dia. Mas no momento, ele tinha que confiar nela.

Não demorou muito para que os quatro começassem a discutir sobre negócios e sobre as novidades no Reino. Por surpresa, as duas foram permitidas de ficar, mesmo que Kagome mais passasse tempo a conversar com Ayame sobre banalidades do que realmente prestando atenção nos homens, um tanto afastadas, enquanto Heima ficava de guarda-costas, afastando olhares masculinos e fuzilando aqueles que passavam próximos das duas, cobiçando-as com os olhos.

Era estranho ter alguém cobiçando uma mulher grávida, mas ele mesmo se via no delito de se impedir a olhar para Ayame.

Mulheres youkais quando estavam no “cio”, exalavam um cheiro parecido. Uma fragrância tão doce, que deixava youkais homens sedentos para terem-nas, como se fosse tão viciante, que inibia todos seus sentidos e a única coisa que passava por sua cabeça era sentir aquele aroma para sempre. Quanto mais forte o desejo, mais impossível é negar-se a ele. O problema é que mulheres youkais grávidas, exalavam cheiro parecido. Talvez pelo fato de que durante aquele período elas não sangravam.

Não era tão forte, mas ainda era perceptível. E se fosse uma youkai bonita, como Ayame, a tarefa ficava bem mais complicada. O Senhor do Leste devia ter a ideia de que era perigoso deixar sua mulher longe, e por isso, de dez em dez segundos, ele lançava olhares a ela, e vez ou outra, ele podia sentir a presença de dois Ookamis que também ficavam como protetores ao redor dela. Um pouco mais afastados.

Não demorou muito para Kouga puxar a mulher para si, e por consequência, obrigar Kagome a se aproximar. Meio a contra gosto, ela enlaçou o braço de Sesshoumaru, o que fez automaticamente os dois Ookamis olharem-nos com olhos arregalados e expressões de choque no rosto.

Agora quem ria era ela.

Com um movimento de mão, prometeu a Kouga que o contaria depois, enquanto InuYasha roubava a cena, tentando cada vez mais se entrosar na conversa, sentindo-se deixado de lado.

Kouga já era um Senhor, e não era um Senhor por falta de opções, mas sim por que ele merecia estar ali. Havia treinado, e havia conquistado seu lugar. E durante esse tempo, o que ele, InuYasha, esteve fazendo?

O instinto de rivalidade havia disparado outra vez em relação à Kouga, e agora viera com tudo. InuYasha estava decidido. Ele também se tornaria um Senhor. Faria qualquer coisa para isso, mesmo que fosse necessário se ajoelhar para Sesshoumaru para conseguir alguma coisa... Quer dizer... Pensando melhor, não, isso ele nunca faria. Poderia achar outras formas que mantivessem seu orgulho intacto.

Em algum momento, Senhores feudais em demasia se aproximaram, tomando a vez da oratória, e roubando quase todos os homens do círculo. Quase todos, pois Kouga conseguiu escapar com Ayame e Kagome, pedindo que seus rapazes, o tal Hakkaku e Ginta, a ficarem supervisionando a Ookami, enquanto ele tinha uma palavrinha com a miko. E ela sabia exatamente sobre o que (ou melhor, quem) seria essa palavrinha.

Quando o seguiu até o alpendre nos fundos do castelo, se surpreendeu pelo lugar estar praticamente vazio, uma vez que jovens casais gostavam de ir para lugares assim em eventos como aquele, aproveitando a escuridão do local e a privacidade para escapar dos olhos dos pais autoritários. Aproximou-se dos degraus, sentando-se ali calmamente, enquanto o Ookami se mantinha de pé, apoiado na haste de madeira no portal.

Levou uma mecha do cabelo para trás da orelha, insistente em querer ocupar sua visão. Olhou o moreno de esguelha, sentindo que os azuis dele não despregaram de cima de si desde que se apoiara ali. Olhou-o dos pés a cabeça, vendo como aquelas vestes formais e de cor caramelo combinavam com ele e com sua pele bronzeada. A hakama marrom, a yukata sem mangas cor de caramelo, os colares de presas, a armadura nos dois ombros e no peito, e aquela capa curta e felpuda, caída sobre seus ombros e costas lhe davam um ar meio intimidante.

Os cabelos presos pareciam mais volumosos e maiores do que ela se lembrava, o que o deixava com aquela aparência de Senhor que lhe faltava anos antes.

Riu, desviando o olhar para os próprios joelhos unidos.

———— Pergunte. ———— O Ookami suspirou, cruzando os braços, olhando para o jardim bem cuidado do castelo que, dali um ano, se ele se saísse bem, poderia chamar de “casa”.

———— Por que estava enlaçada com o aniki super-sinistro do Inukoro?———— Kagome riu alto, cobrindo a boca com a mão e jogando a cabeça para trás.

———— Ele não é sinistro, Kouga-kun! ———— Olhou-o, já com lágrimas embaçando seus olhos. ———— Ele apenas é um pouco sério demais.

———— E sinistro... Já viu aquele cara te olhando como se você fosse comida? ———— Ela negou, ainda rindo. ———— Eu já. E não gostei. ———— Fingiu um arrepio, ignorando os risos que a miko tentava controlar. Em vão, claro, pois ela se mostrava péssima naquilo. ———— Então... Trocou o Inukoro pelo outro?

———— Não troquei ninguém. ———— Ergueu as pernas, abraçando os joelhos e olhando a grama verde e aparada que crescia alta ao redor dos degraus. ———— Apenas estou ajudando Sesshoumaru. A pedido de Yuki.

———— O Senhor Feudal que estava junto? ———— Ela assentiu, sem olhá-lo. ———— E qual o problema com o seu Senhor? ———— Seu rosto girou para o Ookami de forma lenta, evidenciando sua desgostosa expressão ao notar o tom jocoso na voz dele. ———— ‘Tô brincando. ———— Ergueu as mãos em sinal de rendição, rindo.

———— Você não ouviu nada sobre Sesshoumaru, nos últimos meses? ———— Kouga franziu o cenho, inclinando a cabeça. ———— Coisas ruins. Bem ruins. A ponto de fazer seu próprio povo querer se voltar contra ele?

———— Ouvi alguns boatos... ———— Murmurou com descaso, olhando-a a agora. ———— O que têm eles?

———— Foram espalhados por alguém que traiu Sesshoumaru. Por causa desse traidor, que descobrimos há poucos dias quem fora, os Senhores Feudais e a população do Oeste queriam tirar Sesshoumaru do poder. ———— Os azuis se arregalaram, surpreso por não ter ouvido aquilo. ———— Infelizmente, quando descobrimos, um grande estrago já havia sido feito. Por isso Yuki deu a ideia de que... Se a população visse que Sesshoumaru não estava negligenciando seu Reino por descaso, como os boatos afirmavam, e sim por extrema necessidade; todos, talvez com muita sorte, mudassem de ideia. Ele queria mostrar que Sesshoumaru não odiava os humanos, o que nós sabemos que é mentira, e para isso... ———— Ela deu de ombros, e Kouga assentiu.

———— Ele precisa de você! ———— Sorriu compreensiva, olhando-o.

———— Já havia se espalhado um rumor de que Sesshoumaru andava com uma humana... Eu apenas tomei o lugar dela por um tempo.

———— E como o Inukoro está levando isso? ———— Ela desviou os olhos, mordendo o lábio inferior e rindo de leve, coçou a bochecha.

———— Não sei... Deve estar bem. ———— Se ela tivesse continuado a mirar o Ookami, teria visto o olhar surpreso que ele espelhou, para logo depois transformar-se em um quase compreensivo.

———— Vocês não estão mais juntos, estão? ———— A miko riu, meio envergonhada, meio sem saber o que dizer, assentindo. ———— Uau... Quem dera isso tivesse acontecido no tempo que ainda corria atrás de você.

———— Kouga-kun! ———— Fora a vez dele de rir, vendo-a ficar entre embaraço e raiva. ———— Geez... De qualquer forma, e sob qualquer circunstância... Estou com Sesshoumaru, entendeu? ———— Kouga assentiu solene, como um bom soldado, anuindo com veemência, o que a fez rir. Mais leve dessa vez.

———— E como você está?

———— Como assim? ———— Franziu o cenho, estranhando quando o Ookami se sentou ao seu lado, olhando-a como quem olha para uma criança antes de lhe dar uma notícia ruim.

———— Você está “envolvida” com Sesshoumaru agora... Como você se sente em relação a ele?

———— Está me perguntando... Se eu gosto dele ou algo assim? ———— Kouga deu de ombros, se jogando para o lado e apoiando-se na haste de madeira, com as costas, para mais fácil estender as pernas pelos degraus.

Com surpresa, o Ookami fitou a miko que caia na gargalhada outra vez, batendo a mão freneticamente na perna como se não houvesse amanhã. Franziu o cenho para ela, coçando a testa numa calma absurda, esperando-a se acalmar.

———— Você só pode estar brincando... Kouga-kun... ———— Respirou fundo, jogando a cabeça para trás para tentar se acalmar.

———— Ora... Isso não é impossível, sabe? ———— Ela limpou as lágrimas, tentando parar de rir quando voltou seus olhos para o moreno. A expressão séria na face dele, quase contemplativa ao encarar as próprias mãos sobre as pernas, fez com que o último resquício de graça sumisse de seu rosto. ———— Veja Ayame e eu... No início também não gostava dela. E para mim, mesmo no dia do nosso casamento... Julguei que jamais a amaria. Independente de quanto amor ela me desse... De quão feliz eu fosse. Ela não era meu tipo, eu me assegurava disso.

Kagome baixou o rosto, ficando um pouco encabulada com aquela conversa, sem entender o motivo.

———— Não tem a mínima chance disso acontecer, Kouga-kun. ———— Ele a olhou.

———— Por que você acha, ou por que as circunstâncias a fazem achar?

———— Qual a diferença? ———— O moreno pareceu pensar em como respondê-la.

———— Bem... Quando você acha, é por que apenas pensa que isso é algo impossível, ridículo, que jamais vai acontecer por que não tem nem cabimento. Como eu via minha relação com Ayame. Agora, quando as circunstâncias a fazem achar, é por que há vários fatores no caminho, que impedem você de gostar dele, ou o contrário, e vocês acabam se conformando com isso.

———— Ambos fazem parecer que eu estaria assumindo que gosto dele, mas tenho motivos para esconder ou para ferrar a cara. Não seria a mesma resposta independente do que eu dissesse? ———— Kouga riu, dando de ombros.

———— Acho que isso é você quem decide.

Ela bufou ruidosamente, ignorando aquele lindo sorriso que via no rosto de Kouga, mas que apenas a irritava de uma forma absurda. Qual era a dele falando aquelas coisas e depois dizendo que ficava pela conta dela?

———— Kagome? ———— Ela o olhou, um pouco enfezada. ———— Se um dia isso acontecer... Mesmo que você não queira... ———— Ela estreitou os olhos, estranhando aquela conversa. ————... Não corra, nem se esconda desse sentimento, tudo bem? Por que vai ser pior.

Ela não respondeu, incerta do que falar.

Se apaixonar por Sesshoumaru? Tudo bem que ela já estava atraída por ele, mas uma coisa não remete a outra. Ela só havia percebido quão bonito ele era, e não se importaria de tocar um pouco. Isso não era amor, era atração, desejo. Sesshoumaru não era um youkai por quem se vai querer apaixonar, mesmo sem querer.

Foi apenas quando InuYasha, Ayame e Heima passaram pelo portal, que ela pôde mover o rosto, um pouco tonta ainda com as imagens que passaram por sua cabeça.

———— Espero não estarmos interrompendo. ———— Murmurou a Ookami de forma divertida, aproximando-se do marido e se sentando ao seu lado, entre os dois.

———— Sem problema. Falávamos apenas sobre... ———— Kagome procurou as palavras certas, não querendo falar que o tópico momentâneo era o Dai-youkai mais frio de todos os Reinos. Sorriu, dando de ombros. ———— O tempo.

‘Ótima escolha. Ninguém vai suspeitar!’

“Cala-te!” InuYasha e Heima, que desciam alguns lances de escada para se apoiarem, cada um, em um lado do corrimão de madeira, a olharam com sobrancelhas arqueadas em óbvio sinal de dúvida, enquanto Kouga segurava o riso, olhando para as palmas unidas suas e de sua mulher.

———— Mudando de assunto. ———— Pigarreou, baixando a cabeça para os joelhos e depois encarando Ayame. ———— Já escolheram os nomes ‘pro bebê? Aposto que vai ser uma garota!

A ruiva riu, olhando para Kouga e depois de volta a miko.

———— Já. Se for menina, vai se chamar Kira! ———— O sorriso carinhoso que a mulher esbanjou fez Kagome sorrir também.

———— Eu acho que vai ser um garoto. ———— Os azuis se estreitaram, quase de forma afiada, lançando flechas, lanças e espadas na direção do hanyou quando ela o mirou. O que o deixou confuso primeiramente. ———— O-O quê?

———— Por que sempre tem que discordar de mim? ———— Ergueu as mãos ao alto, enquanto Kouga e Ayame se entreolhavam, antes de rir baixo. ———— Eu disse que o bebê da Sango-chan seria um menino, e você disse que seria uma garota!

———— Mas vai ser uma garota!

———— Vai nada! Deixa de ser teimoso! ———— Apontou-lhe um dedo, o que o fez inclinar-se levemente para frente, como se ameaçasse se aproximar dela.

Heima suspirou, levando a mão á testa e balançando-a de forma negativa.

———— Vocês dois são teimosos! E idiotas!

‘Concordo!’

———— Calado! ———— Bradaram os dois ao mesmo tempo. Kagome para os dois Miyazakis, que pareciam gostar de infernizá-la até não poderem mais. ———— Mas mudando de assunto de novo... ———— De repente a miko estava calma, olhando para Kouga que observava suas reações de olhos arregalados, um pouco surpreso por encontrar outra mulher tão facilmente irritável e de humor tão diversificado quanto Ayame. E olha que a miko nem grávida estava. Será que as mudanças de humor vinham com frequência nas mulheres humanas conforme elas iam envelhecendo? ———— Já escolheram o nome se for menino?

O moreno ainda piscou algumas vezes, um tanto confuso pela pergunta, sem entendê-la, mesmo tendo ouvido-a com clareza. Quando Ayame cutucou seu braço foi que ele acordou, rindo amarelo, coçou a nuca.

———— Sim... Vai ser Koura! ———— As bochechas vermelhas e aquele enorme sorriso de orelha a orelha deixaram a morena com olhos arregalados a principio, mas logo ela sorria também, percebendo como um bebê mudava a vida dos pais de formas diversas, mesmo antes de sequer nascer.

———— É um ótimo nome. ———— Inclinou a cabeça, alisando o braço de Ayame.

———— Melhor que Kira! ———— Agora as duas mulheres fuzilavam o hanyou com a mesma intensidade que um dia Sango o fez se encolher detrás de Kagome, com olhos arregalados.

A cena se repetiu, dessa vez com ele se escondendo atrás de um Heima confuso e um tanto temeroso de que a tempestade caísse sobre sua cabeça também. Empurrou o grisalho com o cotovelo, não querendo correr o risco.

Já Kouga apenas riu alto, pensando que, podiam se passar trinta anos, e InuYasha sempre seria o idiota sem filtro entre o cérebro e a boca de sempre. Tão preocupado em irritar Kagome, nem notou que a fala atingiu até Ayame.

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A volta para o castelo de Sesshoumaru fora feita em um silêncio abismal e tenso. Kagome estava de longe furiosa; ainda brava com Sesshoumaru, enquanto ele, aparentemente não estava nem aí para o caso. Óbvio que ele percebia o mau humor dela, e mais óbvio ainda que ele sabia ser o motivo de tal, mas como ele era, não apenas omisso, mas um cretino, ele não moveria um mínimo fio de cabelo sobre isso.

Enquanto os dois pareciam em uma guerra pessoal, os outros três na carruagem apenas observavam as nuvens pesadas e negras sobre suas cabeças ficarem cada vez maiores, e mais dificilmente respirável ali dentro. Era estranho que, mesmo Sesshoumaru sendo uma estátua inabalável e impassível, ainda podia permitir-se pairar aquele tipo de neblina pesada sobre sua cabeça.

Yuki fora o primeiro a deixa-los, uma vez que sua província ficava bem próxima ao castelo do Senhor do Leste. Mais algumas horas, e eles já se viam nas ruas da silenciosa e escura jokamachi de Sesshoumaru, que naquela manhã, percorreram de cima a baixo, e fora palco, não só de uma bela e exibiciosa cremação em praça pública, como de uma discussão de um “casal” nada convencional. E a lembrança de como Sesshoumaru fora um idiota, dizendo-a que deveria voltar a brincar de casinha e ficar fora de problemas, como se, em primeira instância: ele não fosse o causador do surto de problemas que caíram sobre a cabeça dela nos últimos dias, pouco tempo depois de ela achar que poderia viver em paz após a morte de Naraku; e segundo: como se ela estivesse sendo um fardo para ele, quando era bem o contrário. Ou que, pior, ela fantasiava alguma coisa ao lado dele, ao dizer “brincar de casinha”.

Quem ele achava que era?

Se ele queria procurar alguém para colocar a culpa de toda merda que estava acontecendo com ele, eles iriam procurar alguém então.

Bufando, ela virou o rosto, aquelas vincas entre as sobrancelhas e os olhos fechados com as sobrancelhas arqueadas. Aquela expressão de desgosto, irritação e frustração que InuYasha vira tantas vezes, ainda mais depois de uma de suas discussões de adolescentes. Naquele tempo, se visse a miko com tal irritação, sabia que o culpado era ele. Agora, era estranho pensar que a culpa não fora sua e que estava ileso, e o culpado, na verdade, era o mais improvável dos youkais.

Provavelmente Sesshoumaru tocara na ferida. Não que fosse muito difícil tirá-la do sério, mas ainda sim, parecia diferente agora.

Assim que desceram da carruagem, Kagome quase correu para dentro do castelo, querendo trocar aquele quimono bonito, que Sesshoumaru a dera, desfazer aquele cabelo enfeitado, aquela maquiagem pesada e que a irritava. Heima e InuYasha trocaram um breve olhar, enquanto soltavam um suspiro simultâneo, seguindo Sesshoumaru para dentro, como em uma concordância muda de que não deveriam falar com a miko por um tempo. Por segurança própria.

A morena praticamente invadiu seu próprio quarto, já desfazendo seu obi com tamanha pressa e força que se ela forçasse mais um pouco, rasgaria o tecido. Como no dia anterior, em que mandara queimarem seu quimono, ela foi-o abrindo e deixando cair aos seus pés, enquanto adentrava seu closet e procurava por uma simples yukata. Sua primeira opção fora a branca, que ela usava para dormir, pensando que seria uma boa mesmo se jogar sobre o futon e pegar no sono.

Já devia passar das nove de qualquer forma.

Mas o ronco que sua barriga produziu, meio que a impediu disso.

Puxou um kosode preto, com estampas de Frésias amarelas, brancas e vermelhas, amarrando-a com a obi preta embutida. Adentrou o banheiro, parando diante o espelho e tirando aqueles adornos espalhafatosos, e bagunçando os fios curtos, um pouco encaracolados nas pontas. Estava tão irritada, que simplesmente jogava as coisas sobre a pia de mármore, sem o menor decoro ou preocupação.

Não entendia direito por que estava daquela forma, como se Sesshoumaru tivesse lhe enfiado o dedo na ferida aberta e girado-o lá até que ficasse dez vezes maior. Talvez o fato de que ele tenha insinuado que ela não fazia nada de importante a não ser arranjar confusão, a irritasse.

Caramba, ela estava tentando tanto para ficar mais forte, para conseguir ajuda-lo, ajudar a todos... Por que ele tinha que ser um idiota que pensa só no próprio umbigo? Será que ele não poderia deixar de ser um cachorro ao menos uma vez na vida e ver o esforço que ela estava tendo?

“Não, ele não podia. Já está fantasiando coisas, Kagome. Sesshoumaru jamais vai deixar de olhar para o próprio nariz.”.  Ótima terapia, por sinal. Só não era bom sinal começar a falar consigo na terceira pessoa. Isso dizia que estava começando a ficar como Sesshoumaru. Mesmo que no fundinho sempre achara fofo aquela mania de falar dele mesmo na terceira pessoa.

Bufou, apoiando as mãos na pia e encarando o tampo com extremo desgosto, fulminando-a de forma que parecia esperar que ela se encolhesse e pedisse desculpas.

Riu, levando uma mão à testa e balançando a cabeça em negativa.

Estava, definitivamente, andando demais com Sesshoumaru.

Respirou fundo, girando nos calcanhares e deixando o banheiro. Apanhou as roupas que deixou pelo caminho e as jogou sobre uma mesinha baixa no canto de seu quarto. Que as servas as recolhessem para lavar, não estava com ânimo algum de ser boazinha e levar até a lavanderia como fazia normalmente.

Caminhou pelos corredores extensos com passos pesados, que eram prontamente abafados pela madeira abaixo de seus pés. Cruzou os braços, bufando ruidosamente (e propositalmente) quando passou pela frente do escritório do Dai-youkai, sentindo o cheiro dele ali, e sabendo que ele a ouviria.

Desceu as escadas, e encaminhou-se para a cozinha, onde encontrou ninguém além de Maiko sentada sobre um dos balcões, balançando as pernas com displicência. Quando ela ouviu que alguém chegava, praticamente saltou de onde estava para o outro lado da cozinha, fingindo que olhava as unhas. Assim que Kagome percebeu o que ela fazia, e o que fizera, pois não fora nada sutil, apenas franziu o cenho, olhando-a de forma curiosa.

A Inu-youkai levou trinta segundos para encará-la, e mais dois para soltar um longo suspiro, olhando-a de forma enfezada.

———— Caramba... Você me assustou. Achei que fosse o Senhor Sesshoumaru. ———— Kagome fora bem enfática em sua expressão de desgosto, ao voltar a caminhar e procurar alguma coisa comestível naquela cozinha antes que desmaiasse de fome.

“Ah, como sinto falta do manjar divino; vulgo: sorvete!”

———— Parece irritada.

———— Deve ser por que estou. ———— Olhou em volta, se aproximando do fogão e abrindo as panelas, olhando o conteúdo dentro e sentindo seu estômago revirar de fome ao ver aqueles pedaços de carne e batata... Como sempre, era uma sopa com legumes, vegetais, hortaliças, carnes de bichos estranhos a cada dia, e com cheiro bom, por mais estranho que ela parecesse. O cardápio daquela Era, sem dúvida, devia ser o que mais matava ali. ———— Isso deve bastar. ———— Olhou em volta, procurando por uma tigela onde poderia servir-se.

———— Briga de casal? ———— Kagome a olhou de esguelha, com uma tigela e uma concha a meio centímetro da panela alta. Quando a albina ergueu as mãos em frente ao corpo, de forma defensiva e desviou os olhos, a miko percebeu que a encarava feio. ———— Não que seja da minha conta.

Suspirou, repreendendo-se por não conseguir ser menos expressiva. Quando você demonstra o que sente, as pessoas costumam perguntar demais. Se você não demonstra, como Sesshoumaru, todo mundo vai achar que aquela sua cara azeda é a mesma de sempre, mesmo que você esteja morrendo de raiva por dentro, e por isso não vão perguntar nada.

Muito mais prático.

———— Não foi bem uma briga... Se considerarmos o fato de Sesshoumaru ser um cretino em tempo integral. ———— Maiko riu, cruzando os braços e apoiando-se no balcão, olhando sua Senhora servir-se da sopa que Takao fizera, e experimentá-la da panela mesmo. Riu mais.

———— Você vai levar para o Senhor Sesshoumaru? ———— Kagome a olhou, franzindo o cenho.

———— Levar o quê?

———— A sopa!

———— Por que eu deveria? ———— Bufou ruidosamente, rindo em escárnio. ———— Que aquele cachorro safado morra de fome.

———— Bem ———— A albina coçou a nuca, descorando-se e andando lentamente em direção à saída, para que ainda tivesse tempo de falar e ser ouvida. ————, Senhor Sesshoumaru raramente come. Pensando agora, na verdade... ———— Levou uma mão ao queixo, olhando para o teto e forçando uma expressão pensativa, enquanto Kagome mastigava um pedaço enorme de carne de sua tigela, dessa vez. ————... Acho que nunca... Vi ele comer. ———— Olhou-o com aquela cara de quem não quer nada. A miko franziu o cenho. ———— Deve ser difícil manter uma dieta dessas, não acha? Quero dizer... Tão poucos nutrientes naquele corpo, e correndo o risco de ser atacado por youkais mais fortes... Ele pode muito bem desmaiar, ou passar mal e ser apunhalado... ———— Riu, abanando a mão em seguida como quem acabou de dizer que seu cachorro sabe fazer xixi no sanitário. ———— Deve ser por isso que ele é tão magro. Me pergunto se ele não tinha boas refeições em família na infância, ou se as tinha e depois que seus pais se separaram, ele perdeu a vontade de fazê-los, por que elas o lembram de uma época que nunca mais vai voltar, e é difícil para ele... ———— Suspirou, olhando para o teto como se lamentasse a própria vida. Balançou a cabeça em negativa, desolada. ———— Não é a toa que ele tenha aqueles bracinhos...

“Bracinhos? Ele é magro, mas aquilo é músculo, sua estúpida!” Depois que o pensamento lhe cortou a mente, se repreendeu de novo, bufando.

————... Onde eu quero chegar é que ———— Voltou seus olhos para ela, vendo que havia perdido algo. ————, achei que você fosse cuidar da dieta dele, agora. Talvez a mulher que tenha conseguido conquistar aquele coração de gelo, seja capaz de fazê-lo comer um pouco de sopa, e garantir a sobrevivência dele por mais alguns anos, mostrando que ele não está mais sozinho e que pode voltar a “sentir”. ———— Curvou-se exageradamente. ———— Era só isso mesmo, janeh! ———— Abanou a mão, quase correndo da cozinha em seguida.

Kagome ficou encarando o portal com olhos estreitos e sobrancelhas unidas, como se esperasse que aquele local entrasse em combustão espontânea. Seu maxilar subia e descia lentamente, ainda tentando mastigar aquela carne dura, e não morrer com ela entalada na garganta. Ou com a digestão.

Quando fitou sua tigela, o único pensamento de um Sesshoumaru pequeno, comendo diante uma mesa com um InuTaisho que ela não conhecia, e uma Satori sorridente, passou por sua mente.

Depois a visão dele a comer sozinho lhe cortou o coração. Balançou a cabeça, com os olhos fechados em força.

———— Ah, qual é! ———— Rosnou, largando sua tigela sobre o tampo da mesa e olhando para o lugar onde Maiko estava com uma raiva sólida. ———— Vaca! Eu sei o que você fez aqui!

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Atravessou a sala em três passos, largando a tigela sobre a mesa dele com aquela carranca que dizia “uma palavra e eu te mato!”. Mesmo que não fosse exatamente a ele que se dirigia a ameaça, ele fora o causador daquele seu péssimo humor para com todos, desde que chegara ao castelo aquela manhã. InuYasha que o diga.

Ainda sim, Maiko conseguiu dobra-la e ainda persuadi-la, e Kagome odiava quando faziam isso com ela, pois agora estava ali, como quem está com o rabo entre as pernas, arrependida. Ela foi a primeira a falar, sendo assim, a primeira a pedir desculpas.

Mas ela não estava ali para se desculpar, muito menos arrependida, só queria levar a porra da sopa para ele comer, por que a maldita Inu-youkai a fez ter pensamentos emocionais com aquele Dai-youkai sem sentimentos, que provavelmente nem devia sentir fome. Se ele sentisse, ele comeria, caramba. Sesshoumaru já era bem grandinho para isso.

Agora ele pensaria que era um pedido de desculpas e se acharia o fodão. Ele sempre se acha, mas agora seu ego iria inflar um pouco mais, e isso era o que Kagome NÃO precisava.

———— Coma. ———— Ela não estava pedindo ou perguntando. O tom de voz imponente e sério pareceu chamar a atenção dele, pois logo os âmbares a fitavam. Ele estreitou o olhar. ———— Não se faça de teimoso, Sesshoumaru, isso não combina com você. ———— Sentou-se diante a mesa dele, com sua tigela numa mão, olhando-o com tal fúria que espelharia a dele. ———— Já cansei dessa sua atitude mimada. Coma, ou não saio daqui!

E o maldito não comeu.

Ela sim aproveitou sua sopa, mas comera pouco também, mais irritada do que com fome.

Meia hora depois que já havia comido, apoiara-se na mesa dele, espalmando as mãos com força, para irritá-lo de uma vez. Se já tinha começado, ela iria terminar.

———— Olha aqui... ———— Ele a olhou, mas ela não se deixou intimidar pela frieza e o aviso óbvio de que ele a mataria ali mesmo. ————... Sei que você é uma máquina fria e sem piedade, mas você precisa comer, caramba. Você nunca se senta à mesa conosco para tomar o café da manhã, almoçar ou jantar. Como você consegue se manter de pé? Por acaso é um camelo? ———— Ele estreitou mais o olhar, fazendo-a se perguntar como ele não tinha rugas. Provavelmente fora rude compará-lo com um camelo, mesmo que camelos fossem fofos. ———— Eu estava pensando em um discurso do tipo: se não quer fazer por você, faça por seu povo, eles precisam de você forte e blábláblá, mas me lembrei de que você não liga, pois se ligasse mesmo para isso comeria por conta própria já que é bem grandinho pra saber desse tipo de coisa. E isso ferra com as minhas intenções, sabe? Então pode, por favor, comer? ———— Agora a expressão irritada e enfezada deixara seu rosto, em uma súplica para que ele se alimentasse. Mas nada veio daquela expressão.

Caralho, além de omisso, ele era um comissivo negativo. Ela teria que chutá-lo para que ele expressasse algo? Suspirou ruidosamente, espalmando as mãos de novo na mesa e se erguendo. Pegou sua tigela, mas deixou a dele ali.

A passos pesados, a ponto de acordar todo mundo no castelo, desceu até a cozinha, deixando a peça lá. Procurou pelo lugar onde sabia que Kaneki guardava o sakê e os masus, e subiu de volta, decidida de que não era obrigada a aturar Sesshoumaru estando sóbria. Bebeu um pouco da garrafa ainda no corredor, apenas para conseguir coragem de fazer o que ela queria fazer.

Quando invadiu a sala de novo, já estava se fodendo para o mundo. Ela era fraca para bebida, como se via. Aproximou-se da mesa e puxou o pergaminho que ele lia, olhando-o de cima de uma forma que ela jamais achou que iria. Ele deve ter a incinerado com aquele olhar.

———— Coma... Por favorzinho? ———— Sua voz saiu mais irônica do que ela queria, o que não surtiria efeito nenhum, claro.

Largou o masu que segurava com a mesma mão que equilibrava a garrafa de cerâmica, e as largou ao lado da mesa. Sentou-se de forma pesada, sendo acompanhada pelos olhos dele.

———— Façamos o seguinte então... ———— Ergueu a mão e afastou a dele quando ele tentou tirar o pergaminho dela. ———— Eu fico com isso aqui, enquanto você come. ———— Apontou para o papel em suas mãos, sorrindo.

———— Você acha que é capaz disso? ———— Fechou os olhos.

———— Pode parar de... ———— Respirou o mais fundo que seus pulmões permitiam, massageando os olhos com força. Apertou o papel entre as mãos, fitando-o com irritação. Crispou os lábios. ———— Coma, Sesshoumaru. Eu não vou devolver esse pergaminho até você comer. ———— Não que ela achasse que seria difícil para ele conseguir arrancar o papel de suas mãos. Suspirou, apontando para a tigela. ———— Aproveite que ainda está quente.

E desviou o olhar, cruzando as pernas em lótus, e mantendo o pergaminho entre suas pernas. Serviu-se de sakê no masu, e o bebeu num gole só, lambendo os lábios. Quando sua atenção fora roubada pelo documento em sua pose, sorriu, começando a abri-lo e lendo as coisas que Sesshoumaru havia escrito e arregalando o olhar ao notar como a letra dele era legível, encurvada em certos pontos, com detalhes que apenas uma pessoa muito praticada naquilo e muito, mas muito concentrada, conseguiria fazer.

———— Você pratica shodou? ———— Quando ergueu o rosto, seus olhos se arregalaram mais um pouco.

Ele estava comendo.

Quase sorriu com a cena, erguendo-se na sala e dançando como uma louca, enquanto batia palmas e agradecia aos céus por conseguir que sua teimosia, uma coisa que ela julgava super-irritante nas outras pessoas, e provavelmente a causa de muitos homicídios por ai, ser algo útil à nação.

Pelo menos, a ela fora.

———— Não. ———— Fora a resposta curta, enquanto parecia extremamente emburrado e frustrado ao comer.

Ela riu, voltando os olhos para o papel.

———— Não esperaria menos de você. ———— A fala mansa o fez olhá-la de canto, coisa que ela não percebeu, ocupada em ler o que ele escrevera e tentando entender do que se tratava, mesmo que já tivesse uma ideia, levemente, formulada.

Lendo sobre aquele assunto, sentia-se como uma criança que a recém aprendera a escrever. Bebia do sakê vez ou outra, quando sentia sua garganta seca, ou quando sentia vontade apenas. Mas em questão de pouco tempo, sua visão estava embaçada e seus olhos pesados, sem conseguir se concentrar nas letras bonitas e palavras difíceis.

“Por que o mundo tá girando?” Quando sentiu o pergaminho ser tirado de suas mãos, ela olhou primeiro para o teto, como se algo tivesse sugado-o dali, mas depois se tocou de que tinha mais alguém na sala, e que esse alguém era Sesshoumaru.

Olhou-o de forma acusativa, vendo que ele deixara a tigela vazia de lado, e voltava a fazer o que ela o interrompera. Uma calmaria tão assustadora, que ela apenas deu de ombros, voltando sua total e absoluta atenção para a garrafa de sakê quase cheia.

Quando ela a terminou, pouco tempo depois, estava atirada sobre o chão forrado com tatame, esparramada de forma desleixada, arfando pelo calor que sentia e tentando procurar uma posição mais confortável. Um ato de muita bravura, vendo que ela estava deitada no chão nu.

Quando deu por si, os azuis voaram para Sesshoumaru. E ela percebia que estava irremediavelmente atraída por aquele homem.

Era incapaz de lidar com seus próprios pensamentos quando envolviam Sesshoumaru. Naquele segundo, só pensava em lamber toda a extensão daquelas marcas em sua face, que surgiam desde sua orelha até as maçãs do rosto. Tão charmosas e tão únicas dele, que a deixavam mais quente ainda.

Levou as duas mãos ao rosto, tentando controlar os pensamentos parvos. Ela estava atraída, fodidamente atraída, mas precisava se controlar, tinha que ser racional, tinha que ter prioridades, conceitos, ideias. Respirou fundo, odiando aquele homem extremamente atraente e absurdamente filho safado de uma mãe.

Choramingou, virando-se de lado e estendendo os braços ao longo do corpo. Seu kosode subiu nas coxas, e ela soube que era indecente, mas aquele calor infernal, que ocupava a maior parte dos pensamentos em sua cabeça, permitira que pudesse ignorar a outra parcela menor e mais insignificante que lhe dizia para se endireitar.

Ela disse que ia sair dali apenas depois que ele comesse, e ele já havia comido. Ela deveria ir para o quarto, mas estava entorpecida e tonta pelo álcool. Se tentasse se erguer, um tombo seria inevitável, ela sabia.

Respirou fundo, fechando os olhos e inspirando o cheiro dele impregnado em cada mínimo cantinho daquela sala.

E a sonolência veio com mais força, e ela sorriu, sentindo-se satisfeita. De alguma forma estranha, mas satisfeita.

 


Notas Finais


Oláááá galerinha!!! Sentiram minha falta??

Eu achei que tinha coisas para dizer, mas era só em Youkai mesmo uhauaahuahuahuha

Obrigada a todas que comentaram e me apoiaram aqui, tbm, vcs são demais e tem um cantinho pra vcs no meu core <3 Qualquer dúvida que tiverem, podem me perguntar nos comentários q se der, e não ser considerado - por mim - spoiler, eu respondo ^^

Até a próxima >3<


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