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História A canção de Jercy - A convocação


Escrita por: MaxPosey

Notas do Autor


Olá semideuses!
Mais um capítulo fresquinho para vocês.
Então sem enrolação...
Boa leitura...

Capítulo 11 - A convocação


Fanfic / Fanfiction A canção de Jercy - A convocação

Os último raios de sol reluziam no poente quando passamos pelo marco de pedra que indicava os terrenos do palácio. Ouvíamos os brados cada vez mais altos dos guardas e o som de uma trombeta. Subimos a colina e o palácio surgiu diante de nós, tendo ao fundo o espelho do mar.

De pé na soleira, inesperada como um raio, apareceu Tétis. Seus cabelos brilhavam negros contra o mármore branco do palácio. O vestido era escuro, da cor do oceano tormentoso, tons de púrpura mesclados com laivos espessos de cinza.

Guardas se postavam nas imediações e também Grace, mas não olhei para eles. Só via a deusa e a linha de sua mandíbula, que parecia uma lâmina recurva.

— Sua mãe — sussurrei para Jason. Podia jurar que os olhos dela relampejaram em minha direção como se tivesse me ouvido. Engoli em seco e obriguei-me a avançar. Ela não vai me ferir. Quíron garantiu que isso não irá acontecer.

Era estranho vê-la ali, entre mortais; fazia todos, guardas e Grace, parecerem pálidos e doentios, embora a pele dela é que fosse branca como marfim. Estava bem afastada de todos, perfurando o céu com sua estatura sobrenatural.

Os soldados baixavam os olhos, de medo e por deferência.

Jason saltou do cavalo e eu fiz o mesmo. Tétis abraçou-o e percebi que os guardas recuavam um passo. Perguntavam-se sem dúvida qual a sensação que a pele dela transmitia; e estavam felizes por não saber.

— Filho de minhas entranhas, carne de minha carne, Jason — saudou-o ela.

Essas palavras não foram ditas em voz alta, mas ainda assim ecoaram pelo pátio. — Bem-vindo ao lar.

— Obrigado, mãe — disse Jason. Percebia que ela o reivindicava. Como todos nós. Cabia ao filho cumprimentar primeiro o pai; as mães vinham em segundo lugar, se tanto. Ela, porém, era uma deusa. Grace comprimiu os lábios, mas não disse nada.

Quando ela o soltou, Jason foi cumprimentar o pai.

— Seja bem-vindo, meu filho — disse Grace. Sua voz parecia frágil em comparação com a da esposa divina. Estava também mais velho. Ficáramos fora três anos.

— Seja bem-vindo também, Percy.

Todos se voltaram para mim e ensaiei uma reverência. Estava ciente do olhar de Tétis, que me devorava e fazia minha pele arder, como se eu tivesse mergulhado no oceano após atravessar um espinheiro. Fiquei aliviado quando Jason falou:

— Quais são as notícias, pai?

Grace relanceou o olhar para os guardas. Boatos e especulações deviam estar pululando pelos corredores.

— Não as divulguei ainda e só o farei quando todos estiverem reunidos. Esperávamos por você. Venha, vamos começar.

Nós o seguimos ao interior do palácio. Eu queria conversar com Jason, mas não me atrevi; Tétis caminhava logo atrás de nós. Os servos se desviavam dela, tomados de espanto. A deusa. Seus pés não faziam nenhum ruído ao pisar o chão de pedra.

A grande sala de jantar estava atulhada de mesas e bancos. Servos corriam de um lado para o outro com travessas de comida e taças para misturar o vinho, cheias até as bordas. Na frente da sala, via-se um tablado elevado. Era ali que Grace se sentaria, ao lado da esposa e do filho. Três lugares. Enrubesci. Mas o que poderia esperar?

Mesmo em meio ao barulho dos preparativos, a voz de Jason se fez ouvir bem alto.

— Pai, eu não estou vendo um lugar para o Percy. — Minhas faces ficaram ainda mais vermelhas.

— Jason... — comecei num murmúrio. Não importa, queria dizer. Vou me sentar com os homens; está tudo bem. Mas ele me ignorou.

— Percy é meu companheiro, ao qual me liguei por juramento. Seu lugar é ao meu lado.

Os olhos de Tétis faiscaram. Eu podia sentir-lhes o calor. Vi a recusa estampada em seus lábios.

— Muito bem — disse Grace. Acenou para um servo e um lugar foi preparado para mim, felizmente no extremo oposto do lugar onde Tétis se sentara.

Procurando me fazer o menor possível, segui Jason até nossas cadeiras.

— Ela agora vai me odiar — eu disse.

— Ela já o odeia — ponderou Jason com um leve sorriso.

Isso não me tranquilizou.

— Por que ela veio? — sussurrei. Somente algo verdadeiramente importante a teria tirado de suas cavernas no fundo do mar. A antipatia de Tétis por mim não era nada perto do que eu percebia em seu rosto quando olhava Grace.

Jason balançou a cabeça.

— Não sei. É estranho. Não os vejo juntos desde que eu era criança.

Lembrei-me das últimas palavras de Quíron a Jason: reflita sobre sua resposta.

— Quíron acha que serão notícias de guerra.

Jason estremeceu.

— Mas há sempre guerra terra dos Stoll. Não vejo por que deveriam nos convocar.

Grace se sentou e um arauto emitiu três sons curtos em sua trombeta. O sinal para que a refeição começasse. Normalmente, levava tempo para que os homens se reunissem; demoravam-se na arena, só se apresentavam depois de terminar de vez o que estavam fazendo. Porém, agora irrompiam como uma enchente após o rompimento dos gelos do inverno. Sem demora, encheram a sala, procurando seus

lugares e tagarelando sem parar.

Percebi, em suas vozes, uma certa urgência, uma excitação crescente. Ninguém acenava para os criados ou repelia a pontapés um cão faminto. Só falavam do homem dos Stoll e das notícias que havia trazido.

Tétis tomou assento. Não lhe ofereceram nem prato nem faca: os deuses só se alimentam de néctar e ambrosia, do aroma de nossas oferendas queimadas e do vinho que derramamos em seus altares. Coisa estranha, naquele lugar ela não ficava muito em evidência, quando lá fora simplesmente resplandecia. Os móveis pesados e toscos de algum modo a deixavam menor.

Grace se levantou. Todos fizeram silêncio, mesmo nos bancos aos fundos. Ele ergueu sua taça.

— Recebi um comunicado dos Stoll, Connor e Travis. — Os últimos ruídos e murmúrios cessaram por completo. Até os servos pararam. Eu nem respirava. Por baixo da mesa, Jason pressionava sua perna
contra a minha.

— Houve um crime. — Grace fez outra pausa, como se medisse as palavras. — A esposa de Travis, a rainha Piper, foi raptada de seu palácio em Esparta.

Piper! Os homens cochichavam nervosamente uns com os outros. Desde o casamento, a fama de sua beleza crescera ainda mais. Travis construíra, em torno do palácio, grossas muralhas com dupla camada de pedras; durante dez anos treinara soldados para defendê-las. Contudo, apesar de tantos cuidados, ela fora raptada. Quem teria sido o responsável?

— Travis hospedou embaixadores enviados pelo rei de Troia. O chefe era seu filho, o príncipe Polux, e foi ele quem cometeu o crime. Tirou a rainha de Esparta de seu quarto enquanto o rei dormia.

Um rugido de indignação irrompeu. Somente um oriental desonraria assim a  gentileza de seu anfitrião. Todos sabiam como essa gente se inundava de perfumes e se corrompia na ociosidade. Um verdadeiro herói a arrebataria às claras, pela força de sua espada.

— Connor e Travis apelam para os homens de Mclean a fim de que naveguem até o reino de Troia e a resgatem. Troia é próspera e pode ser facilmente tomada, afirmam eles. Quem lutar voltará para casa rico e famoso.

Aquilo fora dito com propriedade. Reputação e riqueza eram os motivos pelos quais nosso povo sempre matara.

— Pediram que eu enviasse um grupo de homens de Fítia e concordei. — Esperou que o murmúrio arrefecesse e acrescentou: — Mas não forçarei nenhum homem que não queira ir. E não comandarei, eu mesmo, o exército.

— Quem o comandará, então? — gritou alguém.

— Isso ainda não foi decidido — informou Grace. Entretanto eu vi que ele relanceava os olhos para seu filho.

Não, pensei. Minha mão agarrava com força a borda da cadeira. Ainda não. Do outro lado da mesa, o rosto de Tétis estava frio e imóvel, os olhos distantes. Ela sabia que isso iria acontecer, compreendi. E quer que o filho parta. Agora, Quíron e a caverna rósea pareciam irremediavelmente longínquos — um idílio de infância.

Calculei, de súbito, o peso das palavras do centauro: o mundo iria dizer que a guerra era o destino para o qual nascera Jason. Que suas mãos e seus pés velozes tinham sido feitos para isto apenas: a ruína das poderosas muralhas de Troia.

Jason seria lançado no meio de milhares de lanças troianas e todos aplaudiriam triunfantes suas mãos manchadas de sangue.

Grace acenou para Leo, seu amigo mais antigo, que estava em uma das primeiras mesas.

— O chefe Leo anotará os nomes dos que quiserem combater.

Ouviu-se um arrastar de bancos enquanto os homens começavam a se erguer.

Porém Grace levantou o braço.

— Há mais uma coisa. — Mostrou um pedaço de pano coberto de marcas escuras.

— Antes de Piper se casar com o rei Travis, teve inúmeros pretendentes.

Parece que eles juraram protegê-la, não importando quem lhe conseguisse a mão.

Connor e Travis agora exigem que esses homens cumpram seu juramento e devolvam-na ao marido legítimo. — E passou o pano ao arauto.

Arregalei os olhos. Um juramento. Em minha mente, formou-se a imagem de um braseiro e de um esguicho de sangue da garganta cortada de um cordeiro branco.

Um salão majestoso, repleto de homens distintos.

O arauto ergueu o pano. A sala pareceu tremer e meus olhos não conseguiam se focalizar em nada. Começou a leitura.

Reconheci muitos dos nomes. Todos nós reconhecemos. Eram os heróis e reis de nossa época. Porém significavam mais que isso para mim. Eu os vira numa sala de pedra cheia de fumaça.

Connor. O vislumbre de uma barba espessa; um homem soturno, de olhos apertados, vigilantes.

Luke. A cicatriz rosada como uma gengiva.

Charles. Duas vezes maior que qualquer homem na sala, com o imenso escudo às costas.

Chris, o arqueiro.

Jackson. O arauto se interrompeu por um instante e ouvi o murmúrio: quem? Meu pai não se destacara nos anos que se seguiram ao meu exílio. Sua fama diminuíra; seu nome fora esquecido. E quem o conhecia nunca ouvira falar que tivesse um filho.

Continuei sentado, imóvel, receando cair se me mexesse. Estou condenado a essa guerra.

O arauto limpou a garganta.

Groover.

— É você? Esteve lá? — Jason se voltara para me encarar. Sua voz era baixa, quase inaudível, mas mesmo assim temi que alguém a tivesse ouvido.

Assenti com um movimento de cabeça. Minha garganta estava seca demais para palavras. Só pensara no perigo que Jason corria, numa maneira de mantê-lo a salvo, se possível. Não considerara sequer minha própria situação.

— Escute, de qualquer forma, aquele não é mais seu nome. Não diga nada.

Pensaremos numa solução. Vamos consultar Quíron. — Jason nunca tinha falado daquele jeito, uma palavra atropelando a seguinte. Sua pressa me trouxe de volta à realidade, pelo menos em parte, e percebi seus olhos fixos nos meus. Sacudi novamente a cabeça.

A lista de nomes prosseguia, despertando lembranças. Três mulheres no tablado — uma delas, Piper. Uma pilha de presentes, a expressão carrancuda de meu pai.

A pedra sob meus joelhos. Pensara ter sonhado aquela cena. No entanto, não fora um sonho.

Quando o arauto terminou, Grace se despediu dos homens. Eles formavam um só corpo, arrastando os bancos no afã de chegar até Leo para se alistar. Grace se virou para nós.

— Venham. Quero conversar com vocês dois.

Olhei para Tétis, temendo que ela viesse também. Porém, ela já havia partido.

Sentamo-nos diante da lareira de Jason. Ele nos ofereceu vinho levemente diluído em água.

Jason recusou. Eu peguei o copo, mas não bebi. O rei estava em sua velha cadeira de espaldar alto, a mais próxima do fogo, coberta de almofadas. Não tirava os olhos de Jason.

— Chamei-o na esperança de que quisesse comandar este exército.

Estava dito. O fogo crepitava na lenha verde.

Jason encarou o pai.

— Ainda não terminei meu aprendizado com Quíron.

— Ficou no Pélion mais tempo que eu, que qualquer outro herói antes.

— Isso não significa que devo correr em auxílio dos filhos de Stoll toda vez que perdem suas esposas.

Pensei que Grace fosse sorrir, mas me enganei.

— Não duvido de que Travis esteja desorientado com a perda da mulher, mas quem mandou o mensageiro foi Connor. Ele tem visto Troia prosperar e se fortalecer há anos; agora, quer saqueá-la. A tomada dessa cidade é uma façanha digna de nossos maiores heróis. Muita glória será conquistada por quem velejar com ele.

Jason apertou os lábios.

— Haverá outras guerras.

Grace não chegou a concordar, mas percebi que acatava a veracidade dessas palavras.

— E quanto a Percy? Ele foi chamado a servir.

— Já não é o filho de Jackson. Não está ligado pelo juramento.

O religioso Grace arqueou as sobrancelhas.

— Isso me parece um subterfúgio.

— Não acho. — Jason levantou o queixo. — O juramento foi desfeito quando o pai dele o deserdou.

— Não quero ir — balbuciei.

Grace nos observou por um momento e depois disse:

— Não me cabe decidir esta questão. Deixo-a a seu critério.

Senti certo alívio da tensão. Ele não iria me expor.

— Jason, pessoas estão vindo aqui para falar-lhe, reis enviados por Connor.

Pela janela, ouvi o murmúrio lento do mar contra a praia. Podia sentir o cheiro do sal.

— Vão pedir que eu lute — disse Jason. Não era uma pergunta.

— Vão, sim.

— Quer que eu os receba?

— Quero.

Fez-se de novo silêncio. E então Jason continuou: — Não vou desonrá-los, nem a você. Ouvirei seus motivos. Mas garanto-lhe que não me convencerão.

Vi que Grace ficou um tanto surpreso com a segurança com que o filho falara, mas não decepcionado.

— Também isso não me cabe decidir — disse em tom afável.

A lenha crepitou de novo, expelindo sua seiva.

Jason se pôs de joelhos e Grace pousou a mão em sua cabeça. Eu me acostumara a ver Quíron fazer isso, e a mão do rei parecia mirrada em comparação com a dele, cheia de veias ressequidas. Às vezes, era difícil lembrar que ele fora um guerreiro, que vivera em companhia de deuses.

O quarto de Jason estava como o havíamos deixado, exceto por meu catre, que fora removido em nossa ausência. Eu fiquei feliz; era uma desculpa aceitável, caso alguém perguntasse por que dividíamos a cama. Abraçamo-nos e calculei quantas noites eu permanecera acordado naquele quarto, amando-o em silêncio.

Depois, Jason se aproximou mais de mim para um último sussurro sonolento: — Se você tiver de ir, saiba que irei com você. — Adormecemos.


Notas Finais


Como se não bastasse uma deusa no pé dos heróis, agora o Percy foi convocado para uma guerra que não é dele.
O que acontecerá aos nossos heróis agora?
Até a próxima...


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