História A Certain Romance - Aquele do corte na testa

- Eu ouvi muito bem o que você apagou - Claire falou rindo.
- Foi sem querer - menti.
- Eu acho que não… Jacqueline querida, por acaso você tem uma quedinha pelo Turner?
- Quem é Turner?
- O Alex jumenta.
- Ah… Não tenho.
- Uhum sei…
- Eu não tenho uma queda por ele, eu juro - falei sem acreditar em mim mesma.
- Ok, pode negar, eu acredito em você… Mas saiba de uma coisa, estou de olho em vocês dois.
Sorri de forma falsa e saí de perto dela. Eu admito que minha atitude havia sido um tanto infantil e errada, mas naquele momento eu não havia pensado como eu mesma. Lembrei da pergunta que Claire tinha feito para mim,  "por acaso você tem uma quedinha pelo Turner?", e a fiz para mim mesma. Eu tinha dúvida quanto a minha resposta. Se eu não soube responder, era porque eu via algo a mais nele, e isso obviamente não era um bom sinal.

Quarta-Feira

Eu estava correndo desesperada para casa. Havia me atrasado para sair da universidade e meu celular (que era horrível, só para constar) estava sem bateria, então Claire pensaria que alguém teria me sequestrado e vendido meus órgãos no mercado negro, já que qualquer atraso alheio era motivo de desespero para ela.
Finalmente cheguei em casa e quando a vi já sabia que ela estava furiosa. Expliquei o que aconteceu e levei minhas coisas para meu quarto. Tomei um banho rápido para tirar o suor do meu corpo e vesti uma roupa confortável. Desci para a sala afim de conversar com Claire, quando para meu desespero não estávamos sozinhas. Os garotos (que mais pareciam moradores da casa) estavam aqui novamente e antes que pudesse me esconder, todos eles me cumprimentaram. Acenei e sorri para todos, morrendo de vergonha. Estava prestes a ir trocar minha roupa quando o almoço chegou. Estava faminta, então me sentei com todos na sala e tentei não me importar com minha aparência ridícula. A pizza foi devorada tão rapidamente que achei que não conseguiria um segundo pedaço. Mas enfim estava satisfeita e todos pareciam estar iguais.

                                          ***

Estava em meu quarto, revisando minhas tarefas quando escutei duas batidas na porta. Abri para ver quem era e quase caí para trás de susto.
- Hey Alex - falei tentando aparentar tranquilidade.
- Jacqueline… É, ahn… A Claire pediu pra eu te trazer isso, são umas coisas que sua mãe te mandou eu acho.
- Ah sim, pode colocar ali na minha cama se não se importar.
- Ok - ele carregou a caixa até a cama e após largar a mesma, ele ficou parado em silêncio. Parecia estar pensando no que falar, e notei que ele estava nervoso, ou eu que estava ficando louca.
- Mais alguma coisa? 
- Se importa se eu olhar os seus vinis?
- Claro que não, fique à vontade.
- Obrigado - ele andou até minha estante e começou a mexer na minha enorme coleção de discos. Seus olhos brilhavam, parecia que ele havia encontrado o pote de ouro no fim do arco-íris. Fiquei admirando seu rosto por alguns segundos, mas logo voltei as minhas tarefas.
Alex continuava a mexer na minha coleção, e a cada minuto eu desviava minha atenção para ele. Vê-lo tão fascinado me deixava com uma sensação que eu não sabia descrever. Me sentia tão estranha perto dele, mas não era estanha do jeito apaixonada, até porque eu seria louca em estar assim em tão pouco tempo conhecendo ele. Mas sua presença era algo que eu gostava, e que eu queria sempre ter por perto.
- É incrível o que você tem aqui. Que inveja disso - ele falou sorrindo.
- Fico feliz que tenha gostado, eu nunca conheci alguém com um gosto musical tão parecido com o meu.
- Você tem uma cara de cult.
- Cult?
- Eu não sei como te explicar isso, mas você curte umas coisas tão fodas, mas que muita gente sequer sabe que existe. Um exemplo bem óbvio são os Zombies. Quase ninguém sabe quem são, mas provavelmente conhecem Time Of The Season.
- Eu sempre pensei a mesma coisa sobre os Zombies - ri sem saber o que mais responder.
- Você vai hoje à noite no Duet's?
- Não estou muito afim mas eu vou, por insistência da Claire.
- Sei bem como é, ela também me enchia o saco no começo já que eu nunca queria ir. Ela me incomodou tanto que eu já nem tento não ir para lá. Com o tempo você se acostuma.
- Sabe de uma coisa - falei juntando coragem para dizer o que estava pensando - a gente podia ir e voltar mais cedo como semana passada, eu tenho sorvete e filmes aqui. O que acha?
- Você roubou minha ideia, sério. Eu estava pensando a mesma coisa mas não sabia como perguntar isso - ele riu e eu também.


Por volta de cinco da tarde eu resolvi me arrumar para ir ao Duet's. O local só abria às sete, mas eu gostava de sempre estar pronta antes. Vesti um vestido não muito longo e nem muito curto. De maquiagem passei apenas rímel e batom, e nos pés coloquei um salto baixo.
Quando todos estavam prontos, saímos de casa para ir ao pub. Dessa vez fomos todos juntos já que estavam todos no mesmo lugar durante a tarde, então fomos a pé, já que o Duet's não era tão longe para precisarmos de um carro.
O local ainda não estava tão cheio como era sempre, mas a pista já estava bastante ocupada. Sentamos todos na mesa de sempre e pedimos bebidas para entrarmos no clima. Jamie, Claire, Chandler e Matt foram dançar, não os acompanhei, já que a única coisa que eu pensava no momento era em ir embora. Também estava com medo de que Chandler tentasse outra aproximação, igual a última vez, mas me aliviei quando o avistei dançando com outra garota, uma loira alta e com uma bunda bastante saliente. Alex estava sentado de frente para mim, e toda vez que botava meus olhos nele, ele fazia alguma careta, me provocando risadas. Comecei a cutuca-lo com o pé, fazendo ele se contorcer e rir. Andy ficou nos observando com uma feição confusa até Alex atirar uma bolinha de guardanapo nele.
- Viado - Andy xingou rindo. De repente seus olhos se fixaram em um ponto e ele mudou totalmente sua postura. Olhei rapidamente para onde ele olhava, imaginando que Claire e Jamie estivessem na maior pegação, mas não vi nada.
- Tudo bem com você cara? - Alex perguntou confuso.
- Ahn sim… Eu tenho que ir para lá - Andy apontou para uma garota que estava na porta. Alex e eu nos olhamos e pensamos a mesma coisa. Alguém tinha um encontro.
- Até ele arruma um encontro e eu não - Alex riu.
- Você não é o único, toca aqui - Alex bateu em minha mão e nós rimos da nossa situação.
Nós pedimos uma porção de fritas para comer e logo que nosso pedido chegou, atacamos o mesmo, morrendo de fome. Chandler voltou para a mesa com sua nova conquista. Tive a impressão de que ele estava querendo me deixar com ciúmes, mas ele falhou miseravelmente.
- Espero que eles não comas nossas fritas - Alex falou rindo e percebi que seu queixo estava sujo de ketchup.
- É melhor a gente acabar com isso rápido - falei pegando um guardanapo e limpando onde ele estava sujo - tinha ketchup no seu queixo.
Ele riu e novamente fiquei olhando para ele, hipnotizada. Desviei rapidamente e sugeri que fôssemos embora para assistir algum filme.
- Finalmente, não aguentava mais ouvir aqueles dois se beijando.

Destranquei a porta e entramos na casa. Alex largou seu casaco na mesa da sala e se sentou na poltrona. Avisei a ele que eu ia rapidamente trocar minha roupa, já que não aguentava mais o vestido que usava. Peguei uma calça de moletom, uma regata branca e fui para o banheiro fazer a troca. Quando voltei ao meu quarto para largar meu vestido na cama, Alex estava lá.
- Precisa de alguma coisa? - perguntei confusa.
- Eu vim olhar seus discos de novo, foi mal - ele falou envergonhado.
- Ah sem problemas, fique à vontade.
- O que é isso aqui? - ele falou pegando um caderninho na minha estante.
- Larga isso, sério - falei correndo até ele. Ao ver meu desespero, ele resolveu fugir de mim - Aleeex devolve meu caderno.
- Eu só quero ver o que tem nele, por favor - ele falou enquanto gargalhava e corria. Em um segundo ele já estava no chão, e sangrando.
- Ai meu Deus.
- Minha testa, Deus que dor - ele falou com suas mão onde sangrava.
- Deixa eu te ajudar, eu tenho um remédio pra fazer seu corte sarar.
- Não precisa, tô bem.
- Nem começa… Se você deixar eu te ajudar, eu deixo você ler uma página do meu caderno, mas só uma!
- Ok, você me convenceu.
Descemos até a sala e eu ordenei que ele sentasse na poltrona. Ele me obedeceu e ficou aguardando minha volta. Eu fui até o armário de tralhas e procurei pelo kit de remédios, e depois de muito procurar consegui encontrar. Voltei para onde Alex estava e comecei a ajuda-lo.
- Me explica como que isso aconteceu, já que eu estava correndo atrás de você e de uma hora para outra você parecia que tinha desmaiado. Parecia um ovo quebrado no chão.
- Eu bati na sua prateleira, a que tá presa mais perto da porta. Mas nem liga, eu sou assim desastrado mesmo.
- Isso vai arder um pouco - falei tentando limpar o corte dele. Perdi o equilíbrio e quando ia cambalear para o lado, Alex me segurou. Sentei em sua perna afim de conseguir terminar seu curativo - pronto! Daqui a alguns dias a marca vai sumir da sua testa.
- Ok, agora é a hora de me mostrar seu caderno misterioso - ele falou sem nem se incomodar por eu estar sentada em sua perna. Me mantive ali para poder ver se ele realmente leria só uma página.
- Não ria de mim… Isso são coisas que eu escrevo quando a idéia vem na minha cabeça. É um pouco estúpido. Deixe eu escolher uma página.
- Não, não. O trato era eu ler uma página, mas não quer dizer que você escolheria.
- Aff, vai logo então.
Alex abriu o pequeno caderno e escolheu uma página perto do fim, uma das últimas coisas que escrevi. Eu diria que ele foi bem inteligente se fez o que pensei. As últimas páginas obviamente são minhas emoções mais recentes, ele saberia exatamente a confusão que se passava na minha cabeça. Senti minhas pernas tremeram, eu mal lembrava o que havia escrito.
- Você escreve muito bem, mas dei o azar de ler uma coisa interminada - ele falou decepcionado.
- Eu deixo você ler mais alguma coisa então - logo ele abriu um sorriso - aqui ó, pode ler isso.
Entreguei o caderno para ele e ele logo começou a leitura em voz alta.
-"Descartou todas as noitadas por gentilezas
Caiu em uma crise muito comum
Tudo está em ordem dentro de um buraco negro
Nada parece tão bonito como o passado
Aquela loira está precisando de um Tabasco
Lembra quando você costumava ser um canalha?" - ele olhou para mim com uma feição que eu não consegui interpretar.
- Por favor não ria, eu disse que eu escrevia muita besteira.
- Você está brincando, não está? - ele percebeu que me mantive quieta então prosseguiu - isso é genial!
- Jura?
- Juro juradinho - ele ficou pensativo por um momento - eu acho que você é a pessoa que eu precisava para me ajudar em uma coisa.
- O que?
- Eu também escrevo, mas eu escrevo músicas, e você tem esse… "Estilo" de escrita que se encaixa com minhas composições. Será que consegue me ajudar?
- Talvez, deixe-me ver o que você tem.
Ele me entregou uma folha que tinha guardado em seu bolso. Apenas dois versão estavam escritos por enquanto. 
- "Você costumava consegui-los com sua meia arrastão
Agora você só os consegue usando sua camisola" - pensei por um momento em como continuar - tive uma idéia. Você inicia a música com isso que já tem escrito, adiciona também o que eu escrevi e a gente tenta continuar.
- Deixa eu ver - ele começou a cantar da forma que expliquei. Sua voz era tão boa de ouvir, ele definitivamente daria um bom vocalista de banda, isso se já não estivesse em uma - isso ficou incrível! A gente só precisa continuar… Vamos sentar no sofá? Deve estar desconfortável para você ficar sentada na minha perna.
Eu concordei e fui buscar sorvete para nós dois. Eu estava impressionada com Alex. Ele se mostrou mais inteligente do que eu imaginei que ele fosse, e a cada vez que conversa com ele, mais eu me encantava com seu jeito de ser. Voltei para sala onde ele estava.
- Aqui tem o melhor sorvete de chocolate e creme que você vai comer na sua vida, e confetes também - entreguei a ele uma colher e sentei do seu lado - consegui alguma coisa?
- Bem pouco, o que escrevi até agora foi isso "Oh, aquele garoto é um cafajeste
O melhor que você já teve
O melhor que você já teve"
- Está muito bom… Da para continuar assim "É apenas uma lembrança e aqueles sonhos
Não eram tão estúpidos quanto pareciam
Não tão estúpidos quanto pareciam
Meu amor, quando você os sonhou"
Alex concordou e alguns minutos depois conseguimos terminar a letra. Fomos bastante rápidos nisso, fiquei impressionada com a habilidade que ele tinha para essas coisas. A parte mais difícil foi escolher o nome para a música, e depois de muito pensar decidimos que seria "Fluorescent Adolescent" que fazia sentido se prestasse atenção na letra.
Começamos a assistir Casablanca, um dos meus filmes favoritos, mas que Alex nunca havia olhado. Alguns minutos depois, sem perceber, eu já havia deitado minha cabeça no ombro dele, e acabei adormecendo.