História A confusão do meu coração - Mudança?

— Eu conheço essa cara. É cara de quem acabou de perder a virgindade.

Ainda com um mega sorriso estampado no rosto, me sentei na cama e joguei um travesseiro em Giovanna. Quanto mais eu relembrava dos momentos de mais cedo, menos conseguia acreditar que eles eram reais.

— Eu não perdi a virgindade, garota — falei ainda rindo.

— Então me diz o que a Elisa foi capaz de fazer pra te deixar toda feliz desse jeito. No mínimo rolou beijo, disso eu tenho certeza.

Assenti.

— Sim, nos beijamos. Várias vezes. — Suspirei.

— Ai... Agora você precisa me contar tudo o que aconteceu, todos os detalhes, afinal, eu que te levei pra casa da sua orientadora e contribuí pra esse sorriso bobo estar insistindo no seu rosto.

— É, você tem razão.

— Vai me contar ou não como perdeu a virgindade?

— Gio, eu não perdi a virgindade!

Gio se aproximou de mim e disse com os lábios na minha orelha:

— Quer ajuda para isso?

Soltei uma gargalhada e afastei minha prima.

— Fica quieta ai, eu vou te contar tudo.

♀♀

Amanheceu. Nunca um raio de sol brilhou tão intensamente no meu rosto e me deixou tão radiante de felicidade. Felicidade com nome: Elisa. Acordei suspirando.

Meu sorriso quase falhou quando lembrei que iria para escola e Elisa não estaria lá, mas lembrei de Maria Luísa, minha nova amiga e defensora. Seria o início de coisas boas na minha vida? Não custava nada acreditar nisso.

Vesti meu uniforme, comi uma maçã no caminho para escola.

— Buenos dias, mi amor. Como estás? — Luísa se colocou na minha frente enquanto eu caminhava. Respondi com um sorriso espontâneo. 

— Ah, é você — disse.

— Que te passas? Estás con un sonriso muy belo en tua face.

— Por que está com fala e sotaque de espanhol? — perguntei.

— Gostou? Eu sou apaixonada por espanhol. Algum dia vou ser fluente.

— Bem, então torço por você.

Maria Luísa abandonou a expressão de sapeca e sorriu fraco. Pareceu que algo a entristeceu de imediato.

Comecei a andar ao seu lado, a escola já se aproximava.

— O fato de eu torcer por você não te anima? — questionei.

— Não é isso — a menina começou dizendo. — Fico feliz por encontrar alguém que torça por mim, geralmente é o contrário. Minha mãe diz que espanhol não é uma língua digna de ser aprendida, ela acha fácil demais, diz que é aprendizado pra gente preguiçosa.

— Eu não acho, gosto mais de espanhol mais do que de inglês.

— Bem, então parece que encontramos um ponto comum entre nós, niña.

Ri um pouco.

— Sem necessidade de me chamar de niña.

Maria Luísa riu também, mas seguimos o restante do caminho até a escola em silêncio.

♀♀

Eu estava me sentindo em outro colégio. Quase um dia inteiro sem nenhuma perturbação, sem momentos ruins, meu coração ainda preenchido por felicidade. Maria Luísa parecia ter muita influência mesmo sobre os demais alunos. Com apenas um dia na minha turma já conseguiu falar com quase todos.

Ela era bonita, simpática e divertida. Tudo o que eu não era. Ainda não conseguia entender como essa menina fazia tanta questão de ser minha amiga e me manter segura.

Um horário depois do intervalo as turmas foram direcionadas para o auditório. Receberíamos um anúncio importante, segundo a diretora.

Sentei na frente, com Luísa ao meu lado. A diretora subiu no palco e fez uma breve saudação aos alunos antes de chegar ao ponto importante.

— Queridos, é de conhecimento de todos vocês que a orientadora Elisa Albuquerque foi embora da escola por motivos restritos — a diretora tocou no assunto que fez meu sorriso murchar. O auditório inteiro murmurou, acho que nesse momento os responsáveis pela calúnia espalhada pelas conversas virtuais estavam muito arrependidos por terem nos feito perder a melhor orientadora de todos os tempos. — Shhh...! Eu ainda tenho o que falar. — A maioria se calou. — A partir de hoje vocês terão um novo e melhor orientador, o Rodrigo.

O suposto novo orientador se apresentou. Pude escutar algumas garotas soltarem alguns assobios e suspiros. Eu poderia até considerar esse tal de Rodrigo bonitinho se minha cabeça não estivesse pensando na Elisa o tempo todo.

Vi que Maria Luísa fechou a cara.

— Na boa, ele nunca será tão bom quando a professora Elisa — ela se manifestou. Nunca concordei tanto com alguém na vida.

— Bom dia, crianças. Me chamo Rodrigo e espero me dar bem com todos vocês e ajudá-los no que precisarem.

Todos aplaudiram, mas Maria Luísa e eu ficamos quietas. Nesse instante me perguntei se Luísa conhecia Elisa tanto quanto eu para termos pensamentos tão parecidos sobre a mesma pessoa.

Fomos dispensados do auditório.

Eu já não estava com cabeça para mais uma aula. Depois de pensar um pouco no caminho para a sala de aula, julguei melhor não assistir os dois últimos horários.

Peguei minha mochila da sala e saí. Senti alguém tocar meu ombro. Parei de andar.

— Para onde você pensa que vai? — Era Luísa.

— Estou sem disposição para mais aulas — falei como se isso justificasse tudo.

— Tudo bem, eu vou com você.

— Não — falei um pouco alto. — Não vou direto pra casa, tenho um assunto para resolver antes. Fique, é melhor.

Dei as costas sem ver a reação de Luísa. Só pude escutá-la dizer "Não faça besteira!". Mas eu não achava que iria fazer besteira. Eu queria ver Elisa novamente, iria até sua casa.

Eu lembrava maios ou menos do caminho, apesar de ser um pouco longe indo a pé. Fugi pelo muro como fiz da última vez, estava sendo boa nesses meus planos de fuga. O céu não estava chuvoso dessa vez, caminhei por alguns minutos até avistar a casa que fez meu coração bater mais forte só de imaginar uma certa pessoa abrindo a porta para mim.

Me aproximei do portão e toquei na porta. Bati três vezes e esperei um pouco. Nada. Bati mais três vezes. Nada de novo. Comecei a bater de forma desesperada.

Nada.

Bati mais uma vez.

— Ei, menina, quer quebrar a porta? — Uma vizinha gritou da janela da casa ao lado. Me recompus.

— Desculpe. Sabe me dizer se a Elisa está? — perguntei.

— Elisa? — A vizinha fez uma cara confusa. — Ah, acho que você não soube, foi bem de imediato. Um caminhão de mudança estava bem na frente da casa dela hoje mais cedo. Sinto muito, acho que essa não é mais a cada dela.

Minha mão foi escorregando pela porta lentamente tentado assimilar aquelas palavras. Se Elisa ia se mudar, por que não me disse nada ontem? Ou sua mudança era justamente por minha causa, para eu não a procurar mais?

Não podia acreditar que ela seria capaz de fazer isso. Mas não tinha nenhuma outra resposta.