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História A confusão do meu coração - Meu remédio para essa dor


Escrita por: BiadeAsa

Notas do Autor


Caramba, gente! É só isso que eu tenho a dizer inicialmente, demais considerações coloco nas notas finais.

Capítulo 30 - Meu remédio para essa dor


POV Elisa

         De nada me adiantava ter TV a cabo. Eu passava os canais centenas de vezes e nada me interessava. Abria vários livros e não lia uma página. Saía de casa, pegava o carro e dava várias voltas pela cidade, mas a garota dos meus eternos pensamentos sempre voltava. Raquel Oliveira é o nome dela. Caso você ainda não a tenha conhecido, é uma adolescente de dezessete anos, de beleza inquestionável, inteligência e personalidade única e com o poder sobrenatural de me fazer ficar desorientada.

         Eu não conseguia mais trabalhar direito, não conseguia mais me concentrar nas tarefas diárias. Tudo me levava a pensar nela, a sentir saudade e arrependimento por tê-la abandonado. Talvez eu tivesse sido muito infantil, muito precipitada ao julgar suas palavras como falta de consideração. O que eu estava pensando quando afirmei que ela não me amava?

         Claro que não posso garantir os sentimentos alheios, mas eu tinha os meus! E eu sabia muito bem o que eu sentia. Se no começo de tudo foi apenas uma atração pela garota frágil que encontrei no corredor da escola no meu primeiro dia, hoje isso era algo muito maior. Eu passei a amar a Raquel e, por mais que eu buscasse explicações de por que isso foi acontecer, eu nunca encontrava alguma racional.

         Aconteceu. Só isso. E eu senti várias vezes que era recíproco. Eu notava sinceridade nas suas falas de ‘eu te amo’ então por que continuava questionando? Talvez porque eu ainda julgava Raquel como uma garotinha, uma criança entrando na puberdade sem controle dos hormônios? Eu seria muito imbecil se pensasse assim. Estávamos muito ligadas desde que nos conhecemos. Eu a vi passar por muitas coisas, inclusive pela quase morte. Eu tive conhecimento do abuso que ela sofreu por parte do pai. Isso me machucava muito.

         Eu conhecia seu sofrimento e já não podia fazer nada. Eu não tinha mais meu amor por perto para ser seu consolo, seu bálsamo. Eu não era mais nada para Raquel.

         Ou era?

         Será que algum dia eu fui?

         Ela tinha a Maria Luísa. Cara... eu deveria seguir o exemplo dessa garota e ser determinada como ela. Há dois dias eu fiquei sabendo que ela estava saindo da escola. Eu não sabia muito bem os motivos, mas de uma coisa eu tinha certeza: ela iria para mais perto da Raquel. Se havia alguém capaz de amar essa menina como eu, esse alguém era a Maria.

         Só que Luísa era quase da mesma idade que a Raquel, sua melhor amiga, tinham uma história juntas, mesmo que breve. Maria Luísa poderia se dar ao luxo de mudar de cidade para ficar perto da garota que amava. Já eu não. Eu não tinha mais idade para essas aventuras românticas.

         Não era velha, tinha ainda vinte e sete anos, mas ainda eram dez a mais que a Raquel.  Eu não era mais uma juvenil disposta a dar a volta no mundo para viver um grande amor. Eu queria um amor verdadeiro sim, mas em casa, na paz e tranquilidade de nossas vidas. Queria alguém para dizer bom dia ao acordar, para dar e amor e carinho diariamente. Eu queria sentimentos puros e trocas de carícia. Eu não queria me arriscar.

         Não mais.

         Não gostava de ficar pensando nessas coisas porque sempre me levava a pensar em outras e em outras, em outras, em outras...

         Entretanto eu estava assim nesses últimos dias desde quando a Raquel retornou para a sua atual cidade. Eu pensava nela a cada instante. Eu sentia saudade a cada instante. Eu queria ter lhe desejado um feliz aniversário no último domingo, mas não pude por orgulho. Eu não era a mulher ideal para ela, pisava muito na bola.

         E, mais uma vez, com essas coisas na cabeça, mergulhei no passado. Em lembranças que eu gostaria muito de esquecer.

 

♀♀

Era como se estivesse me assistindo em terceira pessoa. Eu, na varanda de casa tomando um chocolate quente numa noite fria de inverno esperando a primeira pessoa que despertou em mim o sentimento mais terno que um ser humano pode sentir.

Olhava periodicamente para baixo a fim de ver a pessoa que eu tanto queria chegar. Quando ela tocou a campainha abandonei minha xícara na mesinha e desci com um cobertor quentinho grudado ao corpo para atendê-la.

— Renata. — Recepcionei-a com um enorme sorriso. Sua presença me aquecia naquele frio.

— Olá, Elisa. — Entrou e me beijou com carinho.

Eu tinha vinte e três anos na época, recém-formada, estudando para a pós e trabalhando no meu primeiro emprego. Parecia que eu tinha tudo o que queria. Minha família sempre morou longe de mim desde que iniciei os estudos, eu me sentia muito sozinha, mas depois que comecei a namorar a Renata eu me senti mais completa.

Estava muito apaixonada, muito envolvida naquela relação. Renata era a mulher dos sonhos, me sentia uma sortuda por tê-la nos meus braços. Eu a amava mais do que ela podia imaginar.

— Qual o programa dessa noite? — ela perguntou com a animação de sempre.

— Um filme bem meloso com direito a um achocolatado quentinho e minha adorável companhia para evitar o frio.

— Hum... Você sabe que eu não curto muito essas coisas muito paradas, mas não posso resistir a sua companhia nessa noite.

         Sorri com felicidade e fomos para a sala. Coloquei um filme para assistirmos enquanto abraçava minha namorada. Depois de uns quinze minutos, senti seus lábios quentes e delicados traçarem caminho no meu pescoço. Eu me arrepiava todinha com seu toque. O final daquela noite eu já podia imaginar; desliguei a televisão e a beijei com toda a paixão que sentia.

         Passamos mais aquela noite juntas e eu acordei com a mulher que mais amava ao meu lado. Eu só sabia sorrir perto dela. Me arrumei para ir trabalhar e deixei Renata dormindo com um bilhete meu ao lado explicando que tive que sair cedo.

         Na escola eu tinha a Julie como minha amiga. Sabia que ela gostava de mim, mas nunca lhe dei esperanças. Ela sabia que eu tinha namorada. Entretanto um dia ela fez o que eu nunca imaginei que ela faria: se declarou para mim.

         Fui gentil e disse que nada poderia acontecer entre nós. Eu era comprometida e muito mais nova que a bibliotecária. Bem, a Julie compreendeu, mas meses depois saiu da escola. Talvez para me esquecer, talvez para trabalhar num lugar melhor ou os dois.

         Ela era minha amiga, senti sua falta, mas ainda tinha Renata ao meu lado. Eu nada tinha que reclamar dela, a não ser que minha namorada tinha um espírito de adolescente inexplicável. Era três anos mais velha que eu, contudo parecia ser uma jovem do ensino médio. Seus sonhos envolviam as aventuras mais loucas e impossíveis do mundo. Seu plano era que, depois que nos casássemos, viajássemos o mundo inteiro e vivêssemos experiências inesquecíveis.

         Parecia que ela não entendia que já era bem marcante para mim as vezes que a via dormir no meu colo, seus beijos apaixonados... Para mim, isso sim era uma verdadeira aventura.

         Comecei a ter problemas com relação a isso quando Renata se tornou professora de judô numa academia. Ela amava esportes que envolviam ação e nada de calmaria. A apoiei bastante no início, ela estava feliz e eu também.

         Nunca fui ciumenta demais, mas depois de dois meses percebi que Renata estava diferente comigo, mais distante. Quando ficávamos juntas parecia que tudo era superficial. Como se eu já não fosse mais tão importante assim. Ela sempre falava do seu dia, de como era legal treinar as pessoas na academia e como gostaria muito de algum dia competir fora do Brasil. E me incomodava muito o tanto que ela falava de uma outra mulher do seu local de trabalho, uma aluna.

         Eu escutava pacientemente e sempre falava também do meu dia. Mas nada na minha rotina era tão movimentado como a rotina da Renata. Minha vida era muito pacata perto da dela. E, já não bastando as críticas dela sobre a minha profissão “paradona”, tinha que ficar escutando nos nossos encontros ela falar de outra. Até o dia em que eu me senti irritada e disse:

         — Você parece muito interessada nessa sua aluna do judô. Por que não para de reclamar do que eu faço e deixo de fazer e vai lá se aventurar com ela?

         Como resposta tive:

         — Quer saber, Elisa, você tem razão. A angélica sempre topa tudo o que eu proponho. Nunca que ela aceitaria viver como você, na comodidade; seus programas só envolvem coisas chatas e sem emoção. Cansei de ir ao cinema! Eu quero viajar, eu quero viver a vida! Qual é? A gente ainda é bem jovem, se movimenta mais, Elisa!

         Disse isso e foi embora.

         Fiquei muito triste e chorei por duas noites seguidas. Depois pensei em ligar e liguei. Ela não me atendeu. Dei um tempo, ela poderia estar magoada ainda. Só que se passaram meses e eu não tinha mais notícias suas. Quando finalmente descobri seu paradeiro, ela já estava noiva da tal Angélica, vivendo todas as aventuras românticas que tanto queria.

         Ela simplesmente me largou sem explicações. Não chegamos nem a terminar o relacionamento. Eu pensava que aquela era só mais uma briga de casal, mas não, naquele dia eu vi nosso fim e nem me toquei. Não teve consideração para comigo e foi embora.

         Me culpei por muito tempo por esse término, mas aprendi a superá-lo.

         Quando me apaixonei novamente eu pensei que as coisas poderiam ser diferentes mesmo sendo mais velha que a Raquel. Entretanto eu ainda era a mulher de vida pacata e sem emoção. Eu não tinha o espírito juvenil da minha ex. eu nunca encontraria alguém disposto a ficar comigo vivendo minha amada rotina de pedagoga.

         Isso me deixava muito infeliz. Estava vendo a história se repetir outra vez. Renata encontrou em Angélica a mulher aventureira que queria, assim como a Raquel encontrou na Maria Luísa uma garota sempre disposta a tudo por ela.

         E onde eu ficava nessa história toda? O meu amor contava para alguma coisa? Eu pensava que a Julie poderia ter chances comigo depois de tudo isso, mas não a amava. Eu havia tentado ficar com ela pra esquecer a Raquel, mas terminou tudo errado quando fomos vistas. Raquel ficou muito chateada e quase se matou por isso.

         Era extremamente frustrante viver assim, encontrando amores e os perdendo logo em seguida.

         Mas eu não podia mais passar tantos dias sofrendo por essa garota. Precisava superar essa dor outra vez e sabia muito bem como: me dedicando ao trabalho.

         Eu sabia bem o que fazer. Tinha uma boa formação, mestrado e estava terminando o doutorado. Eu não estava limitada a uma escola de bairro mesmo amando trabalhar com crianças e adolescentes diretamente. Poderia visar algo maior. E era isso que faria. Iria atrás de outro emprego, de outros ares. Estudaria mais. Tinha capacidade.

         O processo seria longo e doloroso, mas eu precisava deixar Raquel no passado. Ela encontraria felicidade com a Luísa. Elas até que eram fofas juntas. Maria Luísa nunca a machucaria, eu cria. Raquel a amaria como um dia disse que me amou.

         Sim, eu tinha que acreditar nisso.

         Tinha também que preencher minha mente com outros pensamentos. Tinha que ser mais feliz. Só não sabia como.

         Ainda na minha cama, como o controle remoto ao lado, desliguei a televisão e abracei as pernas sentindo as lágrimas molharem meu rosto. Queria muito que aquela fosse a última vez que eu chorasse pela Raquel, por sentir sua falta, mas sabia que não seria.

         Sabia que teria mais uma noite mal dormida por estar pensando a todo segundo naquela garota. O que eu mais queria era poder tê-la ao meu lado, bem abraçadinha a mim enquanto eu sussurro o quanto a amo e a quero bem. Era só um desejo impossível de se tornar realidade.

         Me levantei da cama, já de pijama, foi até a cozinha beber um copo de água e em seguida lavei meu rosto no banheiro, o que não adiantou muito já que logo voltei a chorar. Essas crises de choro faziam eu me questionar se isso poderia ser considerado coisa de adolescente.

         Tinha vinte e sete anos, já era bem grandinha e de certa forma experiente, por que então estava chorando tanto por alguém? Ok, não podemos controlar o coração, mas eu era racional, certo? Eu deveria ser mais forte que meus sentimentos?

         Errado.

         E, naquela noite, eu tive mais uma vez a certeza que tinha todos os dias: eu amava muito, sem dimensão, sem explicação e com enorme fervor Raquel Oliveira.


Notas Finais


Eu simplesmente não sei o que dizer.
Pedi pra me enviarem mensagens com uma frase aleatória e pensei que quase ninguém faria isso e depois eu teria que atualizar somente por senso de responsabilidade. Mas aí em poucos dias eu recebo-as. E tenho que destacar que gostei muito da interação que tive (só não ao descobrir que a maioria prefere Toddy  ).
Ainda não entra na minha cabeça que uma parcela de pessoas espera a minha boa vontade de escrever, revisar e postar. Eu nem acredito que realmente tô colocando coisas que eu escrevo aqui, nesse site. Parece muito surreal. Conheci gente muito legal, li muita coisa boa, escrevi muitas vezes mesmo sem muita vontade, somente para atualizar — e ainda atrasava.
Eu fico muito contente por saber que minhas palavras ganham forma na mente de cada um de vocês. Isso é a melhor coisa do mundo para mim.
De verdade, obrigada por serem pacientes comigo, perdoarem minhas maluquices e não se estressarem comigo mesmo eu merecendo muita punição.
Sei que muitas estavam esperando explicações sobre a suposta gravidez da Raquel e sim, foi bem de propósito esse capítulo ser narrado somente pela Elisa, eu queria causar aflição mesmo. Mas não me taquem pedras ainda, tô trabalhando no próximo.

Essas notas finais já acabaram, vocês não precisam ler a continuação, é só eu mais uma vez divagando e escrevendo coisas aleatórias.
Eu lembro bem da última madrugada de sábado. Eu não estava a fim de escrever. Eu não estava a fim de nada. Eu temia a noite porque sabia que não conseguiria fechar os olhos e dormir. Eu ficaria mais uma vez bebendo água até minha bexiga se queixar e eu sofrer no banheiro por minha urina encontrar dificuldades para sair.
Acabou que eu coloquei os fones, uma música e fiquei desenhando no paint para as horas passarem. Em alguns minutos eu simplesmente abri o arquivo nomeado ACMC (A confusão do meu coração) e fiquei encarando as páginas vendo que eu tinha mais de setenta mil palavras escritas.
Mudei a música mais uma vez e me dispus a escrever. Quando me dei conta as luzes da casa já estavam apagadas, eu já havia bebido uns dois litros de água e estava super apertada para fazer xixi.
Fui ao banheiro com o cérebro muito quente — literalmente — e fiz o que tinha que fazer. Eu sentia meu coração bater tão rápido que temia ter um ataque. A ponta dos meus dedos formigava por eu tanto usá-los para teclar. Meu pulso doía porque a altura da mesa em que coloco o notebook é muito além da adequada. Mas eu não podia parar, não naquela hora. Só tinha quatro mil e seiscentas palavras.
Eu queria mais.
Olhei a hora: dois minutos para a meia-noite. Para quem temia a noite, agora tinha a desculpa perfeita para dormir bem tarde.
Eu sabia que meu modo hiperfoco estava ativado. sabia porque eu não perdia o foco mesmo trocando de música de vez em quando, mesmo minha irmã perambulando pela cozinha me dando distração. Eu me sentia ligada na tomada, como se o mundo pudesse desabar e eu ainda estaria ali, naquela mesa com o notebook ligado e meu arquivo aberto e o contador de palavras correndo como atleta profissional.
Parecia que apenas dez minutos haviam se passado. Minhas mãos cansaram e eu decidi que estava na hora de parar, afinal, o capítulo estava terminado. Olhei para o relógio esperando encontrar os ponteiros ainda se arrastando para a meia-noite e quinze. Mas já era uma da manhã.
Nem doeu. Nem vi o tempo passar. Como assim? Sorri triunfante e, como sabia que não dormiria bem, escrevi o capítulo seguinte, esse que foi acabado de postar.
Pronto, missão cumprida.
Fui me deitar e demorei um pouco para dormir, mas meu cansaço mental só me fez ficar flutuando entre planetas antes de pegar no sono.
Domingo de manhã eu revisei o capítulo 29 para postar, liguei o computador e não tinha internet. Beleza, eu tinha o dia todo, certo?
No final da tarde, quando a internet voltou, eu não pude fazer o que tanto queria que era atualizar a fanfic. Fui acometida por uma tremenda dor de cólica, um enjoo do cacete e um mal-estar de sugar as forças.
Eu não sabia o que estava acontecendo comigo, se não estivesse menstruada poderia jurar que estava com sintomas de gravidez. Foi aí que lembrei da Raquel e que não era a primeira vez que fazia um personagem sofrer e passava pelo mesmo sofrimento no dia seguinte, como se fosse uma vingança.
Talvez seja, não é? Tô com medo agora de matar algum personagem e morrer em seguida. Tudo é possível na minha vida.
Enfim, a semana só começa de verdade para mim na segunda, quando eu vejo as pessoas aqui em casa se agitando, quando eu assisto novela e fico vendo os carrinhos de lanche passarem pela janela. Segunda, terça... Nem lembro mais o que aconteceu nesses dias. Não estava feliz nem triste, só na rotina de sempre.
Até que quarta chegou — hoje. Retornei ás aulas na universidade. Revi meus colegas e fiz um trabalho de computação sobre Galinha Pintadinha (o tema era livre, posso fazer nada se minha mentalidade é de seis anos). Eu estava até bem para uma garota que demorou para dormir, que brigou com a melhor amiga imaginária e sentia a bexiga doer.
Pela tarde almocei na universidade e fiquei escutando meu colegar falar sobre o planejamento dele para realizar um curta-metragem. Eu teria que pensar numa história bem legal para o roteiro — ele deixou bem claro que queria um drama lésbico.
Eu poderia pegar um ônibus só, descer numa única rua próxima a minha casa e ir andando. Só que mesmo essa rua próxima era bem longe e eu já estava cansada de ir andando no sol quente para casa. Eu tinha dinheiro então pegaria dois ônibus. Primeiro desceria no shopping e depois iria direto para casa com um ônibus que passava bem em frente.
Eu estava bem. Eu tinha muito o que escrever, havia planejado de encontrar umas amigas nas semanas seguintes e passaria o final de semana na casa dos meus primos. Desci na frente do shopping e esperei o ônibus. Ele chegou logo, quase vazio, fiz sinal, mas ele não parou. Maldito.
Esperei o próximo que não demorou. Entrei, paguei a passagem e me sentei em um dos assentos. Como de costume, abri a mochila para pegar meu caderno e ler/escrever poesias. Só que, para meu maior desespero, não encontrei meu celular. Nem meu dinheiro do lanche que estava juntando para sair em outro dia.
Inicialmente eu não acreditei que tamanha desgraça estava acontecendo comigo. Procurei de novo e de novo. Nada. Teria perdido? Poderia ser que sim, estava tendo uns pressentimentos ao sair da UFPA e odeio tê-los. Só que, se eu tivesse perdido, por que meu dinheiro se perdeu também e não minha carteira de meia-passagem e papéis aleatórios.
Furto.
Foi a segunda coisa que me veio a cabeça. Meu coração quase parou, meus olhos percorreram o ônibus todo buscando explicações. Minha garganta fechou e eu sabia que no meu próximo suspiro eu começaria a chorar e isso seria o fim para mim. Se eu me permitisse cair no choro naquele momento, teria uma crise e eu odeio passar mal em público, o desastre é ampliando milhões de vezes.
A coisa mais sensata que eu pensei foi: vou descer na próxima parada, mesmo sem dinheiro para nenhum ônibus mais, esperar a noite chegar e com certeza atravessar a rua de olhos fechados para ser atropelada e morrer.
Eu não encontrei mais sentido na merda de vida em que eu me incluía lutando todos os dias para sobreviver, para manter a calma e não desistir, mas aí um filha da puta do cacete furta meu aparelho? Caramba, é pra estragar o dia de qualquer um.
Como vocês podem notar — se é que alguém está ainda lendo isso —, eu não me matei como gostaria muito. O pouco que ainda restava de bom senso em mim me fez lembrar das técnicas simples, porém muito eficazes, para evitar uma crise de ansiedade.
Procurei relaxar, não pensar muito no problema, focar na solução. Tudo ficaria bem, certo? Foi quando lembrei que havia algo muito mais valioso no meu bolso da mochila: meu pen drive, o dispositivo onde eu guardo meus livros que escrevo, as fanfics — incluindo essa — e muitas outras coisas mais — só não nudes.
O desespero voltou. Não podia perder meu pen drive! E felizmente ele ainda estava lá, graças a Deus que ainda olha por mim mesmo eu não merecendo nada.
Isso serviu para eu não ter um colapso. Chorei um pouco de cabeça baixa, mas não pelo celular, ele era um bem simples de cem reais, nem internet pegava. O que me machucava e ainda está me machucando é que eu sei que, quando meus pais descobrirem, eu vou passar por mais outra fase difícil dessa vida.
Foda-se o aparelho, cara, é o de menos! Mas eu sei muito bem as frases que eu vou escutar, o sermão de quase todos os dias sobre eu não ter atenção pra merda nenhuma, de eu não fazer nada que preste, de eu andar com a cabeça voando. Resumindo: eles vão me jogar na cara todas as minhas dificuldades e limitações e não tem nada que eu mais odeie é que não compreendam que nada disso é proposital.
Eu não sei o que fazer. Não quero mentir, não suporto enganar as pessoas, de verdade, mesmo quando a verdade vai me fazer afundar outra vez na desgraça da depressão e me fazer ressaltar todo dia que a linha que me conecta a esse mundo é isso que eu estou fazendo agora: escrever.
Se não fosse ACMC, se não fosse meus leitores, as mensagens que eu recebo de vez em quando do tipo “Bia, ahhhhhh como tu podes ser uma escritora tão má! Não faz isso não!”. Não há nada que me motive mais do que saber que eu ainda causo sensações nas pessoas, sejam essas boas ou ruins.
Eu não sei o que faço, eu não sei porque tô desabafando isso aqui. Na verdade eu sei, é que ninguém próximo a mim quer saber de verdade, ninguém vai querer conversar sobre isso. Meus poucos amigos foram afastados.
Odeio esse tipo de discurso. Odeio ser a depressiva do grupinho de amigos. Odeio ter que fazer alguma piada depois pra encobrir meus mil e um gritos de socorro que manifesto diariamente, mas ninguém liga.
Vocês também não precisam ligar, nem me conhecem! A nossa ligação é estritamente relacionada ao que eu escrevo e vocês leem. Isso já basta. Eu também não conheço vocês, os conflitos, as felicidades...
Eu só não queria parar, só não queria jogar água na chama que tem em mim, a que me faz entrar a madrugada escrevendo, que me faz sentir animação e vontade de viver.
Desculpa, gente, eu não deveria estar falando disso.
Até o próximo capítulo e me sigam no Instagram porque eu tô pedindo: @biadeasa


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