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História A Eleição (em betagem) - A eleição.


Escrita por: Gabbehh

Notas do Autor


Quanto tempo, pessoal!
Desculpe pela demora, bloqueio criativo é meio chato.

As músicas desse capítulo são, respectivamente:
- Toothbrush - DNCE
- West Coast - Hey Marseilles
- Painting (Masterpiece) - Lewis del Mar

Outra coisa sobre as músicas é que eu adoro imaginá-las como trilha sonora, mas as vezes elas não fazem muito sentido.

Capítulo 7 - A eleição.


O primeiro dia de trabalho costuma ser terrivelmente tenso para quem nunca pisou em uma empresa antes, mas não foi assim com Alessio.

Após muito procurar, ele havia finalmente encontrado o trabalho quase perfeito, ao menos momentaneamente. Assim que viu o anúncio de uma loja de eletrônicos no jornal que dizia “Precisa-se de vendedor. Aceitamos pessoas sem experiência” Alessio logo soube que conseguiria aquela vaga com facilidade. Ele falava dois idiomas, aparentava ter ao menos 20 anos e possuía determinação suficiente para aprender coisas novas. Um típico adolescente ingênuo em busca de emprego na pacata cidade de Gracetown. Como a população local era de 1120 pessoas (crescendo raramente) e a maioria ou não possuía idade suficiente para ingressar no mercado de trabalho, ou não possuíam escolaridade suficiente, ou eram apenas preguiçosos demais para arranjar um emprego. Dessa maneira, não foi necessário uma entrevista muito rígida para que eles logo contratassem Alessio.

Obviamente, nem tudo é perfeito. Nesse emprego, Alessio trabalharia em turnos, sem tirar folgas em feriados, com uma pausa de dez minutos para comer sua refeição. Mas apesar disso, nada era tão ruim assim, e o garoto estava bem otimista ao acordar às três da manhã para ir até aquela loja de eletrônicos. Muito otimista.

No entanto, as pessoas não pareciam se interessar muito por aquela loja. Os funcionários também não, já que na maior parte do tempo algum colega de trabalho estava dormindo ou se embebedando de café nos fundos. Aparentemente eles estavam ali fazia tanto tempo que ninguém mais estava se importando se faziam seu trabalho direito.

Recostado na parede da frente enquanto esperava os clientes entrarem, Alessio estava literalmente sem fazer nada, e mal conseguia acreditar que o pagariam por não fazer nada. Era um tanto decepcionante, sim. Mas ele até que estava aproveitando os minutos livres para jogar em seu celular.

O garoto estava tão concentrado em seu celular que nem percebeu que havia alguém encostado próximo a ele na mesma parede. Uma garota, sendo mais específico.

Usando a típica camisa de botão azul clara com uma saia lápis da cor preta e um scarpin da mesma cor, aquela era provavelmente a garota mais elegante que Alessio já havia visto. Ela era jovem, aparentando ter a mesma idade que o garoto. Seu cabelo era longo e castanho, uma parte estava presa para trás com um laço verde água enquanto sua franja lateral sequer encostava em seus olhos, deixando parte de sua testa à mostra. Mas de todas as coisas bonitas, o que mais chamava atenção eram certamente seus olhos verdes.

Alessio ficou a encarando por um momento, sem saber o que dizer. E para a garota estava muito claro que era ela quem deveria iniciar a conversa.

— Você está jogando Angry Birds durante seu turno? — A garota diz, encarando o celular de Alessio, o que o deixa um pouco constrangido.

— É o que parece — Alessio diz enquanto movia o celular para os lados nervosamente  — Estou com problemas?

A jovem moça não disse nada, apenas puxou seu celular da lateral de sua saia e desbloqueou o aparelho, entrando no jogo Angry Birds e mostrando seu nível para Alessio.

— Uau. Nível 68. Estou surpreso — O garoto diz soltando um sorriso, aliviado por não levar uma advertência logo no primeiro dia.

— Dá pra fazer muita coisa no tempo em que não temos clientes. Muita coisa mesmo. — A garota diz — Não preciso nem mencionar quantas vezes o banheiro foi usado para coito durante o expediente.

Alessio riu novamente e a garota fez o mesmo. Era ótimo ver que ele já havia feito uma amizade logo em seu primeiro dia.

— Alessio Attenezi. — Ele diz estendendo a mão para um cumprimento.

— Tree Young. — A garota diz enquanto ambos apertam as mãos. Alessio quase explode em uma risada ao ouvir o nome da moça, e ela solta um sorriso — Eu sei, eu sei. Que tipo de pais dão o nome de “Árvore” para a filha?

— Hippies?

— Exatamente, hippies. — Tree diz e ambos riem mais ainda — Espera. Você não pode falar nada! Alessio Attenezi? Quem te deu esse nome? Stan Lee?

— Infelizmente não. — Alessio responde, guardando seu celular no bolso da calça — É italiano.

— Oui, oui.

— Isso é francês.

— É a mesma coisa! — Tree diz de forma irônica, erguendo os braços para o alto.

— Que insulto! — Alessio diz levando a mão até o pescoço como se a ofensa fosse mortal.

Era até reconfortante para Alessio ver que ele havia conseguido fazer uma nova amizade no trabalho. Agora as coisas finalmente começaram a dar certo. Era disso que ele precisava. De um novo começo. E foi o que ele conseguiu.

---

— Tem certeza de que está bem para ir? — Paul perguntou enquanto ajeitava as golas da camisa da filha com muito carinho.

Preocupado, assustado e apático, Paul estava cuidando de sua filha mais do que havia cuidado em todos os últimos dezesseis anos. E Sam estava sucumbindo por dentro, se sentindo cada vez mais culpada. As consequências de quase tentar se matar foram simplesmente um braço deslocado e um pai que veio o mais rápido possível de Vancouver até Gracetown, chegando na metade do tempo esperado e partindo direto para o hospital. Sem dúvida nenhuma que haveria alguma consequência para Paul por ter saído tão repentinamente da videoconferência. E Sam estava arrependida por tentar se matar, e mais arrependida por não contar a verdade. Mas seria melhor poupá-lo de tudo.

— Só está deslocado. — A garota diz enquanto desviava o olhar. Ela nunca mais seria capaz de olhar seu pai nos olhos após aquilo.

Sam então pega sua mochila com o braço saudável e coloca sobre um de seus ombros. Felizmente ela não havia deslocado seu braço direito, então seria possível completar as tarefas diárias com apenas um pouco mais de esforço.

— Me ligue se precisar de algo — Paul diz assim que Sam encosta na maçaneta. Sua preocupação era perfeitamente perceptível, mesmo com ela estando de costas. — Eu te amo, Sam.

Aquilo foi suficiente para que a garota sentisse as lágrimas brotando em seus olhos. Ela nunca tinha visto seu pai ser assim tão cuidadoso com ela. A última vez que ele havia dito um “eu te amo” foi dias antes de se casar com Ellen, logo após Sam e a madrasta brigarem como cão e gato. Era tão estranho ouvi-lo dizendo aquilo, “Eu te amo, Sam, mas também tenho o direito de recomeçar”. Parece que todos têm.

— Eu também te amo, pai. — Sam diz se virando rapidamente para trás, segundos antes de sair pela porta em direção a escola.

Não era uma grande caminhada até a escola, visto que Sam morava a apenas alguns passos da mesma. Ela literalmente só virar a esquina e atravessar a rua. Ainda sendo um curto caminho, Sam tentou levar o máximo de tempo possível para chegar lá, querendo ficar um pouco sozinha com seus pensamentos. Ainda assim ela chegou tão rápido quanto em qualquer dia comum.

Era estranho andar pelos corredores quando todos a encaravam. Sam não estava nem um pouco confortável com aqueles olhares e ela não sabia se era por causa do incidente no refeitório ou por causa da tala em seu braço. Além disso, aquela era a primeira vez que Sam não estava com seu fiel casaco amarelo, então não sabia se estavam a julgando ou apenas a estranhando.

Sam apenas tentou ignorar toda aquela baboseira e foi diretamente até seu armário, abrindo-o e sofrendo terrivelmente para conseguir abrir a mochila com uma só mão. Ela tentou puxar o zíper com tanta força que ele acabou saindo, tornando a tarefa de abrir o fecho mais difícil ainda. Dominada pela raiva, Sam soltou um curto grito de impaciência e  jogou a mochila com toda sua força para dentro do armário, empurrando-a para o fundo e pegando seu livro de química avançada e o caderno de artes em seguida. Era uma cena um tanto cômica para quem via de longe.

A garota estava quase fechando o armário quando, ao virar o rosto para o lado direito, viu Ícaro empurrando a cadeira de rodas de Lara. Ambos estavam rindo como se algo hilário houvesse ocorrido. Porém aquilo subitamente parou assim que ambos a enxergaram. Ícaro acenou e Lara deu um sorriso, e Sam apenas retribuiu os dois gestos de forma rápida, fechando o armário e indo na direção oposta.

Ao contrário do outro dia, dessa vez Sam havia chegado mais cedo do que metade dos alunos da aula de química avançada. A garota rapidamente se sentou em seu devido lugar assim que percebeu que quase todos a encaravam. Não era possível ter uma folga?

Imersa em seus pensamentos, Sam deu um pulo da cadeira ao sentir a mão de alguém tocando seu ombro.

— Ei. — Era Luna, parada a sua frente com sua pose prepotente. Sam não estava inteiramente segura se ela já sabia sobre o incidente do refeitório, mas por via das dúvidas decidiu não falar nada. — O que aconteceu com o braço?

Sam estava realmente assustada, e a ideia de ter que mentir para mais uma pessoa não a agradava nem um pouco. Ela olhou Luna dos pés a cabeça com seus olhos inquietos, observando cada passo que a garota fez ao se sentar.

—… Me masturbei demais. — Sam respondeu tentando soar engraçada, sem sucesso.

— Assustador. — Luna disse enquanto tirava seu caderno e livro de dentro da mochila.

— Muito. — Sam disse, ainda encarando a amiga, só então percebendo que a olhar daquela maneira era loucura. — Me empresta um lápis? — Ela falou, saindo de seu transe.

— Devia parar de escalar muros. — Luna disse de maneira que deixava a entender que Paul já havia dito toda a “verdade” para a garota. Luna então tirou um lápis laranja de dentro do estojo e o entregou nas mãos de Sam — Sabe que foi assim que o Bran virou um aleijado.

Sam encarou o lápis e o girou em sua mão direita por alguns minutos até que finalmente entendeu o que Luna quis dizer com aquilo. A garota soltou uma risada curta ao captar a referência e logo em seguida se virou para a frente, querendo parar com o assunto constrangedor sobre seu braço deslocado, visto que estava tendo que aumentar aquela mentira mais do que o desejado.

A aula inteira não foi tão tediosa quanto aparentava ser. Pela primeira vez em muito tempo Sam realmente havia prestado atenção durante todos os cinquenta minutos de aula, e não havia sido tão difícil assim, mesmo com os celulares de seus colegas vibrando a todo momento. Para Sam, prestar atenção na aula era a maneira mais eficiente de fugir de mais perguntas sobre seu braço deslocado, ou sobre o incidente do refeitório, que agora já devia ser do conhecimento de todos. No entanto, se Luna sabia de algo sobre o incidente do refeitório, ela não demonstrou. Estava tão normal e indiferente quanto em qualquer outro dia.

O sinal tocou, fazendo com que Sam se assustasse… Novamente. Ela estava se assustando de maneiras muito fáceis naquele dia, provavelmente por não querer abaixar a guarda em momento algum, como se houvesse algum perigo eminente a rodeando o tempo todo.

Logo, Luna e Sam saíram da sala de aula 12, indo em direção a seus armários enquanto conversavam sobre coisas aleatórias. Sam estava conseguindo ficar menos tensa do que antes, se sentindo mais leve e esquecendo sobre suas mentiras. Mas isso não duraria muito tempo, pois mais um acontecimento desastroso estava prestes a acontecer.

— Só tô falando que se você não tem um par, não devia vir para o baile. — Luna diz, destrancando seu armário e revirando algo dentro dele

— Baile é coisa de idiota. — Sam disse com convicção enquanto puxava outro livro do armário. Sua mochila ainda estava jogada ao fundo, sem ser aberta.

A garota olhou ao redor assim que todos os celulares lançaram um barulho irritante de notificação no ar. Sem exceções, literalmente todas as pessoas desbloquearam seus aparelhos eletrônicos no mesmo segundo e então viram algo tão surpreendente que foi impossível não expressar isso em seus rostos. Algumas riram, outras ficaram com a face surpresa e outras até mesmo fizeram olhares de reprovação, mas todos, com poucas exceções, olharam diretamente para Samantha Travis, que ficou sem entender absolutamente nada.

Aquilo era novamente, muito desconfortante. E tudo só piorava por ela não saber o motivo para todos aqueles olhares.

— Ei. — Luna disse após um tempo. Sua voz soava um pouco diferente, mas Sam não conseguia ver sua expressão por conta da porta do armário entre ambas. — Você não tem nada para me contar?

Ela certamente tinha, mas isso dependia do interesse de cada um. Luna estava falando sobre o real motivo por seu braço estar deslocado, sobre Ícaro ter beijado ela, sobre Alessio ter terminado com ela, sobre o incidente do refeitório ou sobre a vez em que Ícaro beijou Stephanie Foster e Sam nunca a contou?

— Não tenho. — A garota mentiu, engolindo em seco e levantando a cabeça.

Luna conseguia perceber perfeitamente que sua amiga estava mentindo por mais de uma razão. A garota fechou a porta de seu armário com uma força espantosa, se virando para Sam e mostrando todo seu semblante de ódio, o que a assustou exageradamente. Luna não havia ficado brava daquela maneira desde que um veterano do time de basquete tentou beijá-la a força, anos atrás (a propósito, Luna fez questão de dar um soco no garoto antes que ele pudesse tentar qualquer outra coisa).

— Pode me explicar isso? — Luna disse enquanto levantava o visor do celular aos olhos da amiga.

Na tela do celular estava aberto uma página de um aplicativo autointitulado Eavesdropper, Sam não entendia muito o que aquele aplicativo fazia, mas assim que o carregamento foi completado, milhões de informações começaram a pipocar na página inicial, informações sobre outras pessoas, mais especificamente, segredos e detalhes vergonhosos da vida de alunos e professores. E é claro que aquilo também continha informações sobre Sam.

O incidente no refeitório agora era de conhecimento geral, visto que a escola inteira parecia ter aquele aplicativo. Eles não só haviam descrito perfeitamente o que aconteceu no dia anterior no refeitório como também o que supostamente havia acontecido antes de toda aquela bagunça, exagerando nos detalhes.

— Que porra…? — Sam murmurou assim que leu o artigo, dando passos para trás.

— Pois é Sam, que porra é essa?! — Luna exclamou enquanto se aproximava de Sam, que ia calmamente se deslocando para trás a cada palavra que a amiga dizia — Nós tínhamos um acordo Sam, e nesse acordo VOCÊ NÃO FODIA COM MEUS HOMENS, LEMBRA? — A garota então deu um forte empurrão em Sam, que bateu as costas na porta de entrada e arfou de dor.

— CAI FORA! — Sam gritou no exato momento em que afastou Luna de perto com seu braço bom de forma um tanto violenta.

Ambas pareciam surpresas com o que estava acontecendo, porém Luna estava mais do que preparada para dar uma bela surra em Sam, que estava encolhida como um cãozinho amedrontado. O clima entre as duas estava mais do que desconfortável, e as coisas só pioraram assim que uma notificação fez com que Luna olhasse o visor de seu celular novamente. E pelo olhar que ela fez assim que levantou seus olhos, a garota teve total certeza de que Luna agora estava ciente sobre o segredo que Sam prometeu nunca contar.

— Ah cara, eu vou te matar. — Luna disse com uma feição tão séria que indicava que ela não estava mentindo.

Sam percebeu isso, e saiu correndo daquele local o mais rápido que pôde.

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— Você deu essas informações sobre mim? SUA CADELA!! — Uma caloura gritou, empurrando a amiga na mesa do refeitório e começando a socar a mesma no rosto.

O refeitório… Não, a escola inteira estava uma bagunça só. Após os alunos terem percebido que as publicações do Eavesdropper só podiam ser feitas por seus amigos, colegas e professores, todos surtaram e uma onda de violência se instalou naquela tarde de sexta-feira. E tudo só piorou por ainda não descobrirem quem era o desenvolvedor daquele maldito site. Você podia ver todo tipo de conflito acontecendo por ali: Alguns alunos discutiam verbalmente com seus colegas, gritando e dando voltas de forma impaciente, já outros, a maioria, estavam se socando violentamente, tentando resolver seus problemas a base de agressões e insultos. Não era nada incomum ver alunos jogados no chão se batendo, professores discutindo verbalmente uns com os outros, alunos jogando latas de suco de pêssego da máquina de vendas uns nos outros, ou sendo jogados em lixeiras e trancados em armários por valentões. A escola toda havia enlouquecido, e aparentemente todos se esqueceram da eleição do grêmio estudantil, e quero dizer TODOS mesmo. Alessio estava sentado em um dos bancos do lado de fora enquanto jogava Angry Birds sem dar muita atenção para o que acontecia à sua volta, Ícaro nem sabia do que estava acontecendo, Luna havia alcançado Sam e a jogado no chão ao lado das lixeiras enquanto a enchia de pancadas, Piper estava pedindo socorro do lado de fora enquanto acenava com uma bandeira branca e Brad James estava tentando se livrar dos valentões que o forçavam a entrar dentro de seu armário minúsculo.

Lara parecia ser a única que não havia esquecido completamente da eleição. Ela estava super ansiosa para isso havia meses! E as coisas não poderiam ser arruinadas por um bando de adolescentes selvagens. A garota estava em sua sala quando ouviu o barulho do que parecia ser alguém sendo jogado contra a parede e decidiu sair para ver o que estava acontecendo, só para ver Trevor esmagando um outro membro do time de basquete. Ela não deu muita atenção para aquilo porque o barulho maior estava vindo do primeiro andar. Então Lara estava se direcionando ao refeitório, passando aos empurrões no corredor pelos alunos bagunceiros, procurando sua companheira de chapa, Piper, para ajudá-la a conter aquela bagunça toda. Mas seria difícil chegar até onde Piper estava, já que Lara teria que passar por todos aqueles baderneiros até a entrada. E sua deficiência não ajudava em nada. Após descer até o primeiro andar, ela cruzou o corredor e levou um tremendo susto ao ver o caos que acontecia, com todas aquelas pessoas se agredindo de todas as maneiras.

— Mas que merda… — Lara disse, boquiaberta. Ela se sentia na selva.

Poucos segundos após dizer isso, Lara foi atingida com tudo por uma lata de suco de pêssego na testa e então caiu com força no chão. Com o impacto, ela bateu a cabeça mais uma vez no piso frio de cerâmica e seus olhos então se fecharam. Por um segundo, Lara pensou em ceder ao cansaço e desmaiar ali mesmo, mas assim que se deu conta da situação, percebeu que não poderia ficar ali. Ela seria pisoteada.

Lara então focou toda sua força em seus braços e se arrastou para poucos centímetros longe de seu antigo local. Ela continuou fazendo força para rastejar para fora dali, mas não obteve sucesso. Estava quase perdendo as esperanças quando Matt parou a sua frente. Lara levantou a cabeça e o olhou. Após abandonar seu irmão em casa com os pais problemáticos na última noite, ela mal conseguia olhar para Matt nos olhos por causa da vergonha. De certa forma, Lara não estava nem um pouco surpresa com o fato de ser Matt que a foi procurar na escola, e não seus pais. Já estava acostumada com o fato de Ann e Jared não ligarem muito para ela.

— O que está fazendo aqui, Matt? — Lara quase gritou enquanto seu irmão a ajudava a se sentar no banco acolchoado de sua cadeira de rodas

— Procurando você, obviamente! — Matt exclamou enquanto guiava Lara até uma sala de aula onde não havia alunos se matando — Ok, eu não sabia que essa escola estava pior do que as escolas públicas. Que porra está acontecendo?

— Eu não sei! — Lara disse enquanto gesticulava loucamente com as mãos

— Nós temos que sair daqui.

— Nem pensar, Matt! — Lara exclamou, segurando a manga do casaco do irmão. — A eleição é hoje!

E esse era o momento no qual Mattew começara a se perguntar sobre o que estaria errado na cabeça da irmã. Era meio óbvio que a eleição não aconteceria naquele dia, visto que todas as pessoas da escola estavam agindo como selvagens.

— Lara, eu não vou deixar você correr perigo no meio de todos esses adolescentes descontrolados! — Matt retrucou enquanto ia até a parte de trás da cadeira de Lara, pronto para começar a guiá-la — Você vai pra casa, Lara. Comigo.

Mas Lara não queria ir para a casa. Não depois de todas aquelas coisas horríveis que ela havia presenciado. Aquele lugar não podia mais ser chamado de “casa”, e talvez pelo pânico de ter que voltar pra lá era o motivo de Lara ter segurado no braço do irmão mais velho antes que ele conseguisse empurrá-la para algum lugar, encarando dentro de seus olhos.

— Matt, por favor. — Lara disse com firmeza — Você viu o que aconteceu. Aquela não é mais nossa casa.

— Lara…

— Não, Matt. — A garota o interrompeu — Eu nunca fiz nada mais do que o necessário. Sempre, a pequena princesa da família Wachowski apenas fazia o que diziam para ela fazer. “Faça aulas de balé”, “Você deve tirar notas altas”, “Faça a fisioterapia de modo correto”. Sempre, Matt. Eu nunca havia encontrado algo pelo qual eu gostasse de me dedicar mais do que o necessário. Mas eu encontrei agora, e é essa eleição. Eu não quero que isso se torne mais uma coisa pela qual eu simplesmente passei sem fazer tudo que estava ao meu alcance para salvá-la, mesmo que isso signifique perder para o Alessio. Você me entende, não entende? Eu tenho certeza que entende. Porque você é a única pessoa que realmente me ama, Matt. Porque nós só temos um ao outro.

Aquelas palavras deixaram Matt sem reação. É claro que ele entendia como tudo isso era, porque também havia sido submetido às ordens de seus pais quando tinha a idade de Lara. Era tudo tão estúpido, como sua própria família conseguia exigir coisas das quais Mattew sequer queria fazer. Coisas como o treino de golfe, as sessões de estudo que duravam mais de uma tarde inteira, o isolamento social por nunca poder sair com garotos menos afortunados que ele (ordens de seu querido pai), toda essa vida regrada e todas essas coisas sem sentido que o faziam ficar confuso sobre qual realmente era seu lugar na sociedade.Ele claramente entendia o que Lara queria dizer com “fazer tudo que está ao meu alcance”, e ele desejava ter feito o mesmo em seus dias de escola.

Matt bufou enquanto entrelaçava seus dedos e apertava seus polegares de maneira sutil. Se rendendo as palavras da irmã. Com um súbito levantar de sua cabeça, o garoto a encara mais uma vez.

— Sua habilidade de discursar está bem melhor, Wachowski. — Ele diz, bagunçando os cabelos da irmã antes de tirá-la de dentro da sala de aula, correndo. — O que posso fazer para te ajudar?

— Me leve até uma pessoa! — Disse Lara, sorrindo. — Ela pode nos ajudar.

---

— Por que EU? — Ícaro protestou a medida que dava voltas impacientes entre as mesas bagunçadas da sala de número 15.

Matt olhou para Lara de forma desconfiada. Aquela pessoa não parecia ser muito útil.

— Vocês são melhores amigos! — A garota exclamou enquanto suplicava com as mãos.

— MUITO PELO CONTRÁRIO! — Ícaro gritou enquanto jogava sua pasta com papéis para trás de forma violenta. — Olha, no momento, Alessio quer a minha cabeça em uma lança nos muros do colégio, então, se eu tentar me comunicar, é bem provável que me deixe aleijado de tanto me socar, NO MÍNIMO! — O garoto diz entrando em pânico ao mesmo tempo em que seus documentos impressos caíam suavente no chão, fazendo um som cativante.

Lara levou a mão a testa e massageou suas têmporas. Ícaro estava exagerando de forma considerável. Alessio não era esse monstro que estava sendo descrito, e na verdade, parecia estar muito tranquilo no momento. Tranquilo até demais.

— Ele não vai te bater, Ícaro. — Lara disse, olhando o garoto através de seus dedos. — E você está entrando em pânico, meu Deus!

— VOCÊ TAMBÉM ESTAVA QUANDO EU TE LEVEI PRA CASA! — Ícaro gritou e cobriu sua boca com as mãos logo em seguida, percebendo o que tinha dito e para quem havia dito.

Matt o encarou com um olhar feroz que já disse tudo o que não havia sido mencionado. Já Lara olhou para o irmão com uma expressão que diz “eu posso explicar”.

— … Desculpe. — Ícaro disse se acalmando e puxando uma das cadeiras azuis para que pudesse se sentar. O garoto abaixou a cabeça por alguns instantes e respirou fundo, com os olhos marejados. — Alessio não vai me escutar, Lara. Ele vai me ignorar e fingir que não existo, como sempre fez quando brigamos antigamente.

— É melhor do que apanhar até a morte. — Lara disse com um tom irônico o suficiente para fazer Ícaro levantar a cabeça e sorrir um pouco. A garota decide se aproximar um pouco mais, o suficiente para conseguir encostar no ombro do jovem. — Qual é, Ícaro. É só uma garota entre você e seu melhor amigo.

Ícaro a olhou. Os cabelos loiros estavam mais bagunçados do que o normal, as roupas amarrotadas eram as mesmas que ela havia usado no jantar da noite passada e seu hálito tinha cheiro de balas de gengibre. No entanto, Ícaro ainda se lembrava do momento em que acordou deitado no chão frio ao lado da cama macia de seu pai, onde estava a garota loira mais bonita e indefesa que ele já havia visto.

O garoto soltou um sorriso triste e criou coragem para encará-la nos olhos.

— Você é tão manipuladora, Lara Wachowski.

— E você é deprimente, Ícaro Wilcox.

Matt apenas observou os dois rindo, de braços cruzados e sem entender nada do que estava acontecendo. Uma parte em seu interior estava inquieta pelo fato de Lara estar se dando tão bem com um garoto tão esquisito. Mas era apenas seu espírito de irmão mais velho e protetor soando novamente.

— Onde ele está? — Ícaro disse ao se levantar.

— Lá fora, em um dos bancos do jardim. Jogando Angry Birds. — Matt respondeu assim que percebeu que Lara não fazia a menor ideia de nada. A irmã o olhou com certa desconfiança. Naquele momento ele estava parecendo um stalker. — O que? É impossível não saber quem é o garoto depois de você falar tanto dele. Até porque eu o ouvi gritar algo em italiano enquanto a música tema do Angry Birds tocava ao fundo.

— Com certeza é ele. — Disse Ícaro. Ele se lembrava muito bem de todos os jogos que jogou com Alessio. E a maioria deles acabava com um controle quebrado e xingamentos em uma língua estrangeira.

Lara sorriu enquanto olhava para os dois garotos à sua frente.

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Ícaro, Matt e Lara decidiram que a forma mais segura de se ir até a frente da escola era dando a volta por fora da escola. E eles estavam corretos. Não havia muitas pessoas descontroladas aos arredores. De vez em quando você conseguia ver alguns delinquentes dando uma surra em um aluno com um pé-de-cabra, mas isso era normal. Desde que você não interferisse, tudo estaria bem.

Conforme passavam pelas janelas as coisas começavam a se tornar um pouco mais perigosas, mas o trio conseguiu percorrer o caminho todo sem problemas, tirando a hora em que Matt encontrou um gatinho perdido e ficou fazendo carinho nele por mais de trinta minutos.

— Ok, ele tá ali. — Disse Lara, espreitando ao lado da parede

— Estou vendo. — Ícaro disse, fazendo o mesmo que Lara. Ele estava morrendo de medo, mas decidiu não demonstrar.

— Podemos acabar com isso logo? — Diz Matt com uma expressão impaciente, dando leves empurrões nas costas de Ícaro — Vai lá, capitão coragem.

Lara soltou uma risadinha. Aquele não era o melhor apelido para Ícaro no momento. Mas ainda assim era engraçado. E Ícaro, no entanto, estava super desconfortável com aquela situação. Ele não estava preparado o suficiente para falar com seu amigo… Ou ex-amigo. Eu não sei. Como as pessoas classificam amigos?

— Se ele me matar…— Ícaro começou a falar antes de seguir seu caminho — Por favor, façam com que ele seja preso.

Matt e Lara acharam aquela reação um tanto dramática e decidiram não levar a sério. Aliás, se Ícaro conseguisse fazer Alessio prestar atenção em alguma coisa além de seu estúpido jogo, já seria uma vitória. Os irmãos observaram enquanto o garoto andava em direção a Alessio de maneira incômoda, com as mãos em seus bolsos e os ombros erguidos.

Ícaro estava completamente desconfortável com toda a situação, apesar de ouvir todas as palavras motivacionais de Lara. Enquanto encarava seu ex-melhor amigo, Ícaro começava a questionar todas as escolhas que ele havia feito para que tudo chegasse a esse ponto, e com isso concluiu que: Ele era muito retardado.

O garoto parou a poucos centímetros de Alessio. Mesmo fazendo uma sombra em frente a ele, Alessio sequer levantou sua cabeça.

— Huh… Ei. — Ícaro disse e logo se calou. Ele estava suando frio e sua expressão facial estava muito esquisita.

— Está ouvindo isso, Matilda? — Alessio disse, levando o celular até a orelha e encarando a tela novamente — Ah sim, esse é o som de um traidor. — O garoto disse, se levantando logo em seguida de uma maneira um tanto intimidadora. — O que diabos você quer aqui, Wilcox?

Ícaro engoliu o nó que se formou em sua garganta com muita dificuldade.

— Eu... Hã… Preciso de um favor. — Ícaro se pronunciou

Alessio o olhou com desdém e andou para frente, fazendo o amigo recuar.

— Estou me segurando muito pra não te dar um soco.

— Eu sei, me escuta. — Ícaro falou, parando de recuar — A escola toda está enlouquecida e todos nós sabemos que a única pessoa capaz de controlar isso é você.

Dessa vez foi Alessio quem recuou, confuso.

— Está tentando me bajular? — O garoto disse enquanto ajeitava os óculos — Porque se está, não conseguiu. Eu não vou fazer merda nenhuma pra essa escola.

— Pelo amor de Deus, Alessio. Todos sabem que você é o único capaz de ganhar a eleição. A escola inteira te ama.

— E o que você quer que eu faça? Não posso simplesmente jogar pássaros neles e esperar que tudo se resolva.

Ícaro se irritou com aquilo. Alessio estava tratando aquele assunto de forma tão estúpida e sem importância que chegava a ser insuportável. Ele mal conseguia acreditar que estava com medo de uma piada como aquela.

— Que tal parar de ser um idiota só por um segundo? — Ícaro indagou, dando um passo à frente de maneira destemida. O segundo maior erro de sua vida.

Era possível ver a fúria nos olhos de Alessio após essas palavras serem ditas. Ele não se deixou intimidar pelo insulto de Ícaro, muito pelo contrário, deu um passo à frente e o agarrou pela gola de seu suéter marrom.

— Que merda você disse? — Alessio perguntou. Sua indignação era perceptível por seu tom de voz alterado.

Ícaro o encarou. Estava cansado de ter medo.

— Eu disse que você é um idiota. — Ele falou sem tirar os olhos do amigo — Mas olhando agora, você é patético. Pior do que eu, seu…

Ele mal teve chance de terminar sua frase e Alessio acertou um soco bem em seu rosto, o derrubando no gramado e começando a agredi-lo mais ainda.

Lara saiu de seu esconderijo o mais rápido que pôde assim que viu aquela cena. Matt a seguiu, obviamente, apenas para vê-la implorar para Alessio parar de socar Ícaro.

— VOCÊ BEIJOU A MINHA NAMORADA, SEU FILHO DA PUTA! — Alessio gritou dando mais um soco no rosto de Ícaro. O garoto mal estava conseguindo se defender.

— SIM, EU A BEIJEI, SEU DESGRAÇADO. — Ícaro disse, puxando a cabeça de Alessio para baixo pelos cabelos — E FOI A MELHOR COISA QUE JÁ ME ACONTECEU, PEDAÇO DE MERDA!

Sem aviso prévio, Ícaro simplesmente chutou Alessio entre as pernas, fazendo com que ele cambaleasse para o lado, dando espaço suficiente para que o garoto ruivo conseguisse escapar. Ícaro até conseguiu correr alguns centímetros, mas Alessio logo agarrou sua perna, o derrubando novamente.

— PARE COM ISSO! MATT! FAÇA ELE PARAR! — Lara gritou enquanto agarrava a manga do suéter azul do irmão, o olhando com os olhos marejados. Matt apenas fez “não” com a cabeça e afagou os cabelos da irmã.

— O que diabos está acontecendo aqui? — Uma voz semelhante se pronunciou.

A pior pessoa para aparecer no momento, Sam, estava lá. Seus cabelos estavam uma bagunça, ela tinha arranhões por todo o rosto e alguma coisa nela não cheirava bem.

Ao vê-la, Alessio só ficou mais agressivo; Ele ficou em cima de Ícaro, o imobilizando e então agarrou seu pescoço, tentando sufocá-lo.

— DESGRAÇADO! — Alessio grunhiu, esquivando de todos os socos e tapas de Ícaro. — ELA ERA MINHA! VOCÊ NÃO TINHA ESSE DIREITO!

— TUDO TEM QUE SER SOBRE VOCÊ, NÃO É MESMO? — Ícaro berrou enquanto dava um tapa na cara de Alessio da forma mais fraca possível.

Alessio o olhou com uma cara confusa. Aquele tapa não havia feito efeito nenhum, ele não soltaria o pescoço do garoto tão cedo. Alessio ainda estava com muita raiva, mas no meio de toda aquela fisionomia raivosa, existia um pingo de dúvida. Enquanto lutava para conseguir apertar o pescoço de Ícaro até que ele ficasse sem ar, começou a perceber que o amigo estava começando a encher os olhos d’água.

— EU AMO ELA — Ícaro berrou, abrindo os olhos e encarando Alessio, ainda se contorcendo loucamente para se livrar do peso do amigo italiano — EU A AMO. MAS ELA NUNCA SE IMPORTARIA COM ISSO. PORQUE ELA AMA VOCÊ, SEU IMBECIL! É VOCÊ QUE ELA AMA!

Alessio ficou atônito. Em um piscar de olhos ele retomou sua calma e percebeu a atrocidade que estava prestes a cometer. Ele certamente não ganharia o prêmio de melhor amigo do ano graças a essa tentativa de estrangular Ícaro. Mais do que imediatamente, Alessio recuou, soltando a garganta de Ícaro, que começou a engatinhar para trás enquanto tossia como um portador de tuberculose. Ofegantes e cansados, tudo o que ambos puderam fazer foi olhar diretamente para Samantha Travis como quem pergunta “É verdade?”.

A garota ficou completamente acanhada, visto que todos estavam olhando-a de forma esquisita. Mais olhares. Eram muitas expressões estranhas para um dia só.

— Você me ama? — Alessio perguntou virando apenas sua cabeça. Seus óculos estavam desajeitados, seu cabelo estava totalmente desalinhado, suas roupas completamente sujas e seu celular havia parado em algum lugar longe dali. Mas Sam ainda o considerava o cara mais bonito que ela já havia visto.

— Eu te amo — Disse Sam, os olhos marejados. Ela também não estava com a melhor das aparências, mas aquilo não era novidade.

As pessoas geralmente se cansam de tentar demais, e era provavelmente isso o que havia acontecido entre ambos. Tanto Alessio quando Sam estavam completamente exaustos de suportar aquela relação. Durante todos aqueles seis meses, durante todas aquelas semanas e dias, ambos sempre pareciam estar vivendo em um tipo de competição para ver qual era o menos interessado naquele relacionamento inteiro. Sam nunca foi carinhosa, aquilo era um fato. Mas Alessio era diferente. Ele gostava de carinhos. Gostava de se sentir amado, de abraçar alguém e ser correspondido, gostava de demonstrar todo seu afeto em público e de ser tratado da mesma maneira. Aquilo estava consumindo os dois por dentro, e às vezes apenas o amor não é o suficiente para manter uma relação.

— Eu não estou completamente certo se quero continuar com isso, Sam. — Alessio disse, se levantando lentamente do chão e ficando em frente de Sam.

Ela não iria recuar dessa vez.

— … Também não tenho certeza. — Sam disse desviando seu olhar e abaixando a cabeça. Ela olhou para seus tênis vermelhos. Estavam sujos — Quer dizer, mas qual a novidade nisso? Eu nunca tenho certeza de nada.

Alessio riu com a cabeça baixa. Ele sabia disso muito bem. Demorou um certo tempo até que ele criasse coragem para olhar para Sam novamente.

—  Promete que não vai me odiar? — Disse Alessio com um sorriso estranho no rosto.

— Eu nunca poderia te odiar. — Sam disse erguendo a cabeça e ajeitando a tala em seu braço.

Ambos ficaram se olhando por um bom tempo. Seus sentimentos ainda fluíam como antes, mas todos aqueles acontecimentos serviram para mostrar que os dois não deviam ser um casal. Antes de Sam e Alessio tomarem seus caminhos e voltarem a viver suas vidas normais, a garota o surpreendeu com um caloroso abraço, que foi correspondido com a mesma grandeza de emoção. Lara, Matt e Ícaro olharam para os dois, sorrindo como idiotas, percebendo que aquela batalha havia finalmente chegado ao fim. No entanto, ainda haviam algumas lágrimas escorrendo pelo rosto da garota.

— Pensei que não gostava de abraços. — Alessio se pronunciou assim que a garota o soltou.

— É algo que eu faria por você. — Sam disse, segundos antes de se virar para ir embora.

Alessio sorriu, constrangido. Mas logo percebeu que não estava sozinho. O garoto se virou então, e olhou para Ícaro. Sentado na grama, a mão na garganta, hiperventilando enquanto seus cabelos voavam com o vento. Lhe faltava coragem para mostrar que estava errado, mas foi só deixar seu orgulho de lado que Alessio conseguiu encontrar as palavras certas para mostrar todo seu arrependimento:

— Desculpe por tentar te matar.

Ícaro ficou absorvendo aquela informação por um momento antes de começar a rir descontroladamente. Aquela situação inteira era inacreditável. Ele riu, riu e riu até que seus olhos lacrimejaram, o que o fez diminuir o ritmo.

— Tranquilo, cara. — Ícaro respondeu, fazendo um gesto como quem diz para deixar o assunto para lá. — Agora vai. Você tem uma eleição para ganhar.

Alessio sorriu, fazendo que sim com a cabeça. Ele chegou mais perto do amigo e estendeu sua mão para ajudá-lo a se levantar. Lara soltou um gritinho de triunfo, vendo que seu plano havia funcionado. Alessio a olhou, seus ombros estavam envolvidos pelos braços do irmão, Matt. Os dois pareciam contentes com a situação, como se as pazes de Alessio e Ícaro fossem tão importantes assim. Mas de certa forma, era até tranquilizante o fato de não ter mais uma guerra acontecendo entre os dois.

---

— Faz a sua magia, Attenazi. — Lara disse enquanto estendia um megafone para Alessio, que estava de pé sobre uma das máquinas de venda.

De volta ao caos do interior da escola, as pessoas ainda estavam lutando, porém de maneira menos animada. No entanto algumas pessoas ainda eram atingidas por um espaguete voador que “acidentalmente” escapuliu das mãos de outro aluno ou por uma cadeira que era atirada violentamente no meio da multidão.

Não seria nada fácil para Alessio controlar essas indivíduos que agiam da maneira mais primitiva possível, mas ele ainda devia tentar. Estava um pouco nervoso, é claro, mas se ele era a única pessoa capaz de parar toda essa loucura, então que seja. Quase todos da escola estavam guerreando, até mesmo os professores. Alessio se perguntava onde a diretora poderia estar. Logicamente, escondida em algum canto, encolhida como uma pequena tartaruga.

— Você acabou de me chamar de Nazi?? — Alessio indagou, enfatizando a palavra “Nazi”. Era a primeira vez que ele ouvia alguém errar seu nome daquele jeito.

— Ah, nossa — Lara disse, arregalando os olhos e mordendo a língua, deixando uma pontinha para fora da boca. Ela estava com uma expressão hilária. — Foi mal.

Alessio sacudiu a cabeça enquanto tentava esquecer aquele terrível insulto. Ele agarrou o megafone e tentou se equilibrar sem cair na máquina de doces. Ao menos ele não tinha medo de altura.

Alessio tentou ligar o megafone, e só então ficou imaginando de onde Lara poderia ter tirado aquele aparelho. Ignorando seus pensamentos, Alessio soltou um grito diretamente no microfone esperando que algo acontecesse. Infelizmente, seu rangido não foi reproduzido pelo equipamento que deveria o ajudar. O garoto se sentiu frustrado enquanto Lara, Matt e Ícaro o encaravam de maneira confusa. Ele deu um, dois, três tapas no botão power, pensando que a violência seria capaz de fazer com que aquilo funcionasse. Estava quase dando o quarto tapa quando a tampa de trás se abriu e as quatro pilhas AA caíram. Alessio tentou agarrá-las no ar, mas sem sucesso, se desequilibrou da máquina de doces e caiu diretamente em uma das mesas do refeitório, quebrando-a com o impacto.

— JESUS CRISTO! — Alguém gritou na multidão, apontando para Alessio, jogado no piso frio, em meio aos restos amadeirados da mesa, gemendo de dor.

Aparentemente ter caído e quebrado uma mesa foi o melhor jeito de chamar toda a atenção para si. Naquele momento, todos do refeitório pararam o que estavam fazendo, levantaram seus celulares e começaram a gravar e tirar fotos de Alessio naquela situação vergonhosa. Agora ele seria imortalizado para sempre na internet.

Alessio xingou um palavrão e então começou a tatear o piso em busca das pilhas perdidas. Para as pessoas que estavam gravando, aquilo estava ficando cada vez mais hilário. Após localizar as pilhas e as colocar em seus devidos lugares, Alessio se apoiou no chão, tentando ao máximo ficar em pé sem que sua tontura o fizesse cair novamente. Lara, Matt e Ícaro apenas observavam tudo com olhares apreensivos.

— O QUE CARALHOS VOCÊS ESTÃO FAZENDO? — Alessio gritou após finalmente conseguir fazer o megafone funcionar. Sua voz estava falhando um pouco, mas ele logo recobrou a dicção. Aquilo certamente assustou as pessoas, até porque qualquer um conseguiria ouvir aquilo em um raio de dois quilômetros. — Pelo amor de Deus, vocês não conseguem agir como pessoas civilizadas nem por um dia?

A multidão toda se entreolhou, eles estavam estranhando demais tudo aquilo.

— E desde quando você tem moral pra dar sermão?! — Chuck Swanson gritou enquanto dava pulinhos. A multidão toda deu espaço para ele passar. Não demorou muito até os dois ficarem cara a cara — Você é o cara que perdeu a namorada para o melhor amigo, imbecil.

— E NO QUE ISSO AFETA A SUA VIDA? — Gritou Alessio, colocando o megafone extremamente perto do rosto de Chuck.

Apesar de levar um insulto do cara mais monstro da escola, Alessio não estava dando muita importância para aquilo. Se ele ficasse com raiva e desse um soco na cara de Chuck, isso só provaria que ele está sendo hipócrita. No entanto, Chuck parecia estar mais do que com vontade de irritá-lo.

Alessio voltou a levantar o megafone, encarando Chuck Swanson com uma expressão de desdém.

— Vocês sempre tem que agir como um bando de idiotas, não é mesmo?!  — Alessio falou. Ele estava cansado de todas aquelas pessoas. — Sempre assim. Qual o problema de vocês?! Alunos e professores, vocês todos agem como completos imbecis! Contando segredos alheios, traindo seus amigos e falando mal de todos pelas costas, através desse aplicativo estúpido!!

A multidão toda estava estranhando aquela situação. E de fato, era algo que não se vê todos os dias. O garoto mais gentil estava dando a maior bronca em todo mundo. Era um tanto estúpido, agora que paravam para pensar. A escola havia enlouquecido por causa de um aplicativo.

— É SEMPRE ASSIM POR AQUI, NÃO É? — O garoto berrou — Gracetown sempre foi assim! As pessoas nunca cuidam das próprias vidas, nunca sabem guardar segredo e muito menos se comportar como seres humanos! — Alessio parou por um segundo para recobrar o fôlego — POIS EU DIGO UMA COISA PRA TODOS VOCÊS! Que se foda tudo isso.

Alguém no fundo da multidão gritou um “É!”

— Que se fodam esses amigos mentirosos. Que se fodam os professores fazendo boatos estúpidos sobre vocês. Que se foda os idiotas falando coisas ruins pelas costas! — O garoto exclamou. Gradualmente, mais e mais pessoas começavam a balançar suas cabeças, concordando com o discurso. — E principalmente, que se foda essa droga de eleição!

A multidão toda estava gritando ou batendo palmas. Alessio olhou para seus amigos que o encaravam de maneira esperançosa. Ele olhou novamente para todas aquelas pessoas, batendo palmas, gritando seu nome e pulando como loucos, e naquele momento, ele estava em paz.

A eleição havia sido ganha.

— E principalmente, que se foda essa merda de desenvolvedor. Seja lá que você for, O EAVESDROPPER É UM LIXO! — Alessio exclamou, segundos antes de sentir as mãos finas e pálidas da garota mais detestável da escola.

— Quem deixou você usar meu megafone? — Cho Adams indagou, mantendo sua voz calma como sempre.

Alessio revirou os olhos. Não queria ter que lidar com aquela chinesa aquela altura do campeonato.

— Nós pegamos emprestado! — Lara exclamou. A chinesa apenas a encarou de forma enojada.

— Não falei com você, querida. — Cho disse, enfatizando a última palavra. — Me devolva isso logo, Attenezi. Eu tenho algo pra falar.

Alessio estranhou aquela posição de Cho, já que ela não era de se pronunciar publicamente, ao menos não daquela maneira. Ela geralmente se escondia atrás de um computador, onde digitava suas maldades para em seguida imprimir em papéis e distribuir para a escola inteira, fazendo com que todos acreditassem em seus absurdos. Alessio até conseguia imaginar o que ela falaria dessa vez: Mais mentiras.

— Alunos e alunas, professores e professoras. Aproveitando que estamos nesse assunto sobre o desenvolvedor do Eavesdropper, eu gostaria que vocês pegassem seus celulares e abrissem as configurações do aplicativo. — Cho falou enquanto tirava um papel de seu bolso. Ela o desdobrou e voltou a falar — Agora, entrando em “serviços” se vocês digitarem o konami code, no final da página aparecerá “Criado por Arietty Watterson”. Eu agora pergunto, qual é mesmo o nome da diretora desse colégio?

O refeitório ficou em silêncio, completamente em choque. A verdade estava tão perto e tão longe ao mesmo tempo. Tudo o que todos foram capazes de fazer foi encarar a diretora, que novamente se encolheu como uma tartaruga.


 



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