História A eternidade num instante - Capítulo único

Ela só quer alguém que saiba algo sobre ela, alguém que saiba os detalhes. Alguém que saiba quando ela está bem e quando não está. Alguém que não explique a mesma coisa toda vez, como se ela não fosse competente, isso a sufoca. Ela só quer que a abrassem, mas ela não gosta de contato. Ela prefere estar sozinha mas ela não quer estar só. Ela não quer que a vejam chorando, mas ela quer que enxuguem suas lágrimas. Quer que saibam como amansar a fera que há dentro dela, mas não quer ferir ninguém, por isso afasta à todos mesmo os querendo perto. Ela perdoa quem a magoou mas ela não esquece como foi magoada, até por que a culpa foi dela por confiar. Ela sabia que estava no alto do monte e os puxou para perto, por não saber que iam empurrá-la... Agora ela não quer afundar ninguém consigo. Ela sabe que está com pessoas que a amam mas ela não se sente amada. Ela se acha quase sempre no vazio, sozinha. Ela se sente como a lua rodeada pela escuridão, enquanto vê as estrelas se unindo em constelações. Mas ela sabe que alguém olha para ela. Por que ela chama a atenção. Mas não é algo que ela quer, por que sabe que seus cacos podem cortar esse alguém. Ela sabe que um dia isso vai acabar, mas ela já não aguenta, ela já desistiu. Agora enquanto esta sentada à porta do banheiro, ela se arrepende de ter escorregado a lâmina fundo demais no pulso.  Ela se arrepende de não ter ido ajudar sua mãe na cozinha ou seu pai na garagem. Ela os perdoa por não estarem procurando por ela, ela sabe que, como sempre, a culpa é sua. Ela não se sente em condições de ficar em pé, para alcançar sequer os pés da escada, está fraca e com a visão turva, talvez não devesse desejar um de seus vários vícios agora, mas o que ela pode fazer? É a única coisa que lhe tranquiliza e que a faz aguentar um dia a mais sem desmoronar atrás das cortinas. Então ela está olhando para o chão do banheiro enquanto se pergunta:

  "como cheguei a esse ponto?"

  A ponto de estar no chão sujo de um banheiro, em meio ao líquido viscoso que deveria estar circulando nas suas veias.

   "eu deveria estar lá, no meio das pessoas fingindo estar bem... onde errei? Em qual esquina virei errado?".

   E a última pergunta ela escreve com sangue no chão, enquanto, após 12 minutos de sua última agonia, a vista escurece:

           "Eu os perdoei.

      Vocês me perdoam?"