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História A herdeira do inferno - Epílogo - Paz


Escrita por: RenaTriz

Notas do Autor


Permita-se viver.

Capítulo 49 - Epílogo - Paz


Fanfic / Fanfiction A herdeira do inferno - Epílogo - Paz

 

Oito anos depois...

Olhando pela janela do carro, começo a pensar em tudo que aconteceu desde que Tristan foi morto. Antes, eu não conseguia imaginar uma vida onde eu pudesse respirar e não sentir que algo ruim pudesse acontecer comigo. Frequentemente me pegava esperando pelo pior, rezando para que eu pudesse trazer a minha vida de volta. Sentia falta da minha vida normal em uma cidade pequena e não podia fazer nada a não ser lutar.  Saí do caos repleto de morte depois de meses enfrentando a dor, para vivenciar os anos mais incríveis da minha vida. E assim que conclui um ciclo de momentos terríveis, coisas boas aconteceram. Somente o fato de não precisar segurar o cabo de uma espada, era uma vitória. Eu me acostumei rápido demais a essa vida tranquila e comum, que atualmente é tudo que eu tenho, e não pretendia mudar.

É exatamente como eu sonhei, ou até mais do que eu esperava. Como se eu jamais tivesse passado por todas aquelas merdas, sofrido incontáveis vezes e quase sido morta mais de uma vez. Apesar de ainda ter pensamentos dolorosos devido as lembranças de toda a minha história trágica, hoje eu sei que é apenas passado. Um passado muito distante. São meras lembranças. Contudo, estou feliz. Digo, verdadeiramente feliz. Completa. Não existe nada que diminua essa felicidade, nada me abala ou me desconforta. Eu aprecio a vida que eu construí.

Pessoas normais, sofrem por pagar contas, cuidar dos filhos mal educados e ter que trabalhar demais, mas eu? Agradeço por cada problema mundano que tenho que lidar. O que são vizinhos chatos, perto de um tio psicopata que tentou destruir o mundo? O que é reunião de trabalho, perto de meses tendo que me esconder de demônios e ceifeiros? Cada detalhe simples que não colocava a minha vida em risco, era algo para ser comemorado. Coisas que antes eu não dava importância, são mais do que valorizadas agora. A gente começa a ter novas perspectivas. Quando sua vida era colocada à prova todo o instante, você agradece a Deus simplesmente por acordar viva. E no momento, só há o que agradecer.

A tortura, a dor, a perda, tudo ainda está em mim, nada sumiu, mas hoje em dia, não choro mais, não tenho mais medo. Apenas são coisas ruins que passaram, voaram para longe como uma folha seca que caiu distante da arvore. Só cuido para que nunca mais aconteça. Me jogo mais e mais na vida simples e cotidiana para ter certeza disso.

- Amor, acho que o GPS não está certo. – Lorenzo me olhou de canto sem tirar a atenção da pista. – Tenho quase certeza que já passamos por essa casa. – Ele apontou com o queixo para uma casa branca com porta e janelas de madeira. – Ou todas aqui são exatamente iguais? – Ele franziu o cenho e eu senti vontade de rir.

- Deixa eu checar. – Olhei a tela do GPS do carro e cliquei no mapa para me situar. – Vira a esquerda ali. – Apontei para uma das ruas da vizinhança. Lorenzo fez o que eu indiquei e logo o GPS atualizou dando um novo rumo para nós.

- Não confio nessas coisas. – Lorenzo resmungou. - Só confunde a gente. - Tantos anos de existência, e não sabe nem como mexer em um GPS. Segurei o riso.

- Mas não temos outro jeito de chegar até lá. – Soltei uma risada – Você não sabe onde é e nem eu.

Ele sorriu e eu notei seus olhos pretos revirarem. Ele era tão bonito, sempre foi. Seus cabelos longos até a metade das costas penteados para trás e a barba ligeiramente por fazer, sempre foram seu perfil. Eu nunca deixei de ser apaixonada por eleMeu coração ainda batia forte com o seu sorriso. Lorenzo ainda parecia jovem, não mudou nada desde que nos conhecemos, e quando ele queria parecer mais velho, deixava a barba crescer. Tudo graças a vida eterna que Katherine propôs. Eu o amava tanto que não cabia dentro de mim. Ele me preenchia, me deixava inteira.

O vento entrava pela janela e fazia meu cabelo voar assim como o de Lorenzo. Eu podia sentir o cheiro do mar perfeitamente.

- Acho que já estamos chegando. – Falei para o meu marido. – Já sinto vestígios do mar.

- Nem acredito. – Lorenzo comemorou batendo com a mão no volante. – Pensei que nunca mais iriamos chegar.

Tinha sido uma viagem realmente cansativa. Tivemos que sair de Manhattan, onde estamos morando, para vir de carro para Malibu. Apesar de ter sofrido muito em NY, eu havia me apegado a beleza do lugar. Fiz questão de comprar um apartamento na Broadway para iniciar a minha vida independente. Foram 42 horas dentro do carro. Fizemos uma parada em um hotel beira de estrada, mas bem cedo, já estávamos no caminho de novo. A vida cômoda, me fez desacostumar a viagens de longa duração. Antigamente, fugir em carros roubados e dormir em qualquer hotel, era rotina, mas ultimamente, eu pegava muitos aviões e viajar de carro estava fora de cogitação. Entretanto, estamos economizando dinheiro para reformar a casa. Vida comum e suas vaidades. E viajar de carro era mais barato que pagar passagens de avião e levar toda essa bagagem para passar alguns dias em Malibu.

- Mamãe? – Kassy me chamava ao abrir os olhos depois de seu cochilo. Olhei para trás e sorri tocando em suas coxas gordas. Ela coçava os olhinhos verdes e tentava despertar.

- Oi, filha. – Disse para ela e ajeitei a saia de seu vestido a arrumando no booster.

Kassy estava cansada, pois tivemos que acorda-la antes do Sol nascer para chegarmos logo pela manhã no nosso destino. Crianças não são acostumadas a dormir pouco e passar por uma viagem tão, relativamente, longa. Principalmente ás de cinco anos. Ela bocejou me mostrando a falta de um dos seus dentes e passou a mão nos cabelos ruivos que voavam em seu rosto, devido ao vento que entrava no carro.

- Já chegamos? – Ela perguntou um pouco mais acordada.

- Ainda não, princesa. – Lorenzo respondeu. – Espere mais um pouquinho. – Ele olhou pelo espelho retrovisor e sorriu para a filha de um jeito gentil.

Adotar Kassy foi um passo enorme na minha vida e na de Lorenzo, e, apesar das diversas complicações e papeladas que tivemos que resolver, valeu cada esforço. Ela veio recém-nascida para nós, pois foi abandonada pela mãe em um beco numa rua qualquer em NY. Ela foi deixada para morrer, mas resistiu por horas antes de ser encontrada. Achamos que por ela ser forte e ter sobrevivido a tudo isso ainda bebê, deveria receber o nome de uma mulher tão forte quanto ela, então unimos o nome de Katrina com o nome da minha avó – Missy - e deu em “Kassy”.

- Mãe, será que você pode me dizer quando vamos chegar? Eu quero ir ao banheiro. – Simon estava com as mãos entre as pernas e fazia careta. – Tipo, urgente!

- Segure por 5 minutos, filho. - Eu ri e neguei com a cabeça. – O GPS ta dizendo que falta pouco.

- Ele quer fazer xixi? – Kassy perguntou. – Ou o número dois? – Ela riu e colocou a mão sobre a boca como se estivesse falando um palavrão.

- Definitivamente é xixi. – Simon respondeu a irmã. – Mãe...- Disse em um tom de lamentação e suplicação.

Adotamos Simon quando ele tinha quatro anos de idade. Ele já tinha um nome, então não pudemos escolher como fizemos com Kassy. Minha relação com o meu filho, sempre foi especial, pois no momento em que colocamos os pés no orfanato, Simon correu até mim e me abraçou me chamando de “mamãe”. A partir dessa situação, eu não consegui mais olhar para as outras crianças, fiquei completamente apaixonada pelo Simon e Lorenzo fez de tudo para conseguirmos apresentar todos os documentos necessários para a adoção dele. E a adoção do nosso primeiro filho foi mais simples do que a de Kassy, até porque ele não era recém-nascido.

Na época, eu e Lorenzo tínhamos acabado de comprar a nossa casa própria depois de morarmos algum tempo com a minha mãe e Jonas. Foi uma época terrivelmente engraçada e irritante. Eu tive um treinamento prévio de como cuidar de crianças assim que presenciei de perto a vivencia entre Jonas e Lorenzo. Eles discutiam até qual o tipo de pão deveríamos comer no café da manhã. Ir ao banheiro, frequentemente, era impossível, pois só tinha um e Jonas passava horas fazendo a barba e Lorenzo demorava o dobro com o cabelo. E para comprar nossa primeira casa, tivemos que arrumar um emprego qualquer que pagava muito mal para ambos. A casa não era grande, mas era confortável e acolhia perfeitamente Lorenzo, Simon e eu. Kassy veio depois de alguns anos, pois fui trocando de emprego em emprego, para conseguir mais dinheiro para aumentar nossa família.

E foi só quando consegui uma ótima oportunidade em uma empresa farmacêutica, que tudo começou a andar. Comecei a fazer faculdade na área, pois a indústria me conquistou. Quem diria? Quando conclui o ensino superior, fui promovida a chefe executiva. Tudo bem que a vaga de chefe surgiu apenas depois que o dono da empresa havia descoberto que eu era a filha de Catriel e a grande guerreira que matou Tristan. Ele havia lutado conosco na grande guerra e isso o fez praticamente exigir que a herdeira ajudasse-o com o controle da sua empresa. Com o dinheiro que eu ganhava, ajudei Lorenzo com o negócio que ele estava começando. Com o tempo, ele conseguiu abrir a sua academia de proteção pessoal e logo nos víamos em uma casa maior, em um bairro melhor e com dinheiro suficiente para criarmos mimadamente a nossa nova filha.

- Chegamos. – Lorenzo disse e logo vimos a casa pintada de azul.

Estacionamos o carro em frente a casa de praia. Assim que saímos do carro, Simon correu até a porta e pressionou o dedo na campainha. Estava calor e o céu azul não demonstrava sinais de nuvens para que o Sol fosse tampado. Podíamos ver o mar daqui e ouvi-lo perfeitamente quebrando suas ondas.

- Vó! Pelo amor de Deus. Abre a porta. – Ele pulava de um lado para o outro e segurava no zíper da bermuda. Ele só tinha nove anos, mas as vezes eu o via como aquele garotinho que conheci no orfanato. Apesar de ser excepcionalmente esperto para a sua idade.

Lorenzo retirou Kassy do booster e a pegou no colo antes de fechar todas as portas do carro. Abri a mala e retirei nossas coisas as levando para a varanda da casa, uma a uma. Depois tirei as bicicletas do suporte no teto e as deixei paradas no jardim.

Minha mãe abriu a porta e Simon passou correndo por ela. Provavelmente indo diretamente para o banheiro.

- Ora... – Ela olhou seu neto passar e depois me olhou confusa.

- Ele estava apertado. – Dei de ombros enquanto respondia. - Espero que encontre o banheiro a tempo.

Minha mãe parecia bem, seu cabelo longo estava começando a ficar um pouco mais grisalho, mas ela estava linda como sempre. Sua pele não enrugou e sua elegância lhe dava menos alguns anos de vida. Ela vestia um vestido esvoaçante e curto, com uma estampa florida típica da Califórnia. Estava com a pele bronzeada e seu cheiro exalava protetor solar.

- Vovó! – Kassy gritou e então Lorenzo a colocou no chão. Minha filha correu e abraçou as pernas da minha mãe.

- Meu amor! – Minha mãe a pegou no colo e a apertou contra si dando beijinhos em suas bochechas. – Como foi a viagem?

- Foi um pouco cansativa, mas economizamos nas passagens de avião e trouxemos todas essas coisas. – Apontei para as malas com roupas, as boias para a piscina e o mar, a bicicleta vermelha de Simon e a bicicleta rosa de Kassy, junto com seus ursinhos inseparáveis.

- Você é uma ótima mãe. – Ela riu reparando que a maioria das coisas eram para os meus filhos e não para mim ou Lorenzo.

- Não melhor que você, mãe. – Eu me aproximei e lhe dei um abraço, apertando-a junto com Kassy. – Estava com saudade.

- Eu também. – Ela disse e beijou o meu rosto.

Nos afastamos e ela cumprimentou Lorenzo com um beijo no rosto.

- Você também é um ótimo pai. – Minha mãe completou. – Consegue cuidar das pessoas mais importantes da minha vida.

- Temos as pessoas importantes em comum. – Ele sorriu de lado e tocou delicadamente o braço da minha mãe.

Entramos na casa da minha mãe e reparei que a decoração era diferente da antiga casa que moramos por um tempo juntas.

- Vou mostrar a casa para vocês e aproveitem para guardar as coisas. – Minha mãe dizia ainda com Kassy no colo.

A casa antiga tinha móveis de madeira com aspecto antiquado, mas essa, tinha móveis que eram modernos, a maioria de vidro e ferro. A sala tinha uma porta dupla que dava para o quintal com a piscina. A cozinha era no cômodo ao lado, era toda equipada e bem organizada. Seguindo o corredor na nossa frente, podíamos ver a porta do quarto da minha mãe e a do banheiro. A escada espelhada incrivelmente detalhada com madeira e vidro, dava para os quartos de hospedes e um segundo banheiro. A casa era bem espaçosa no geral.

Guardamos nossas coisas e voltamos para a sala.

- Jonas está lá fora. – Ela colocou Kassy no chão e a mesma correu para fora indo de encontro ao “tio super heroi”. O fato de Jonas ser alto e extremamente forte, fazia Kassy acreditar que ele era um dos super herois dos filmes animados do irmão. – Ele está preparando alguma coisa estranha com nome francês, eu acho. Ele aprendeu a cozinhar alguns pratos estrangeiros assistindo Realitys shows. Se acha o próprio mister chefe. – Ela revirou os olhos. – Não reclamem da comida antes de provar, algumas coisas são realmente boas.

- Isso eu gostaria muito de ver. – Lorenzo saiu de perto de nós indo reencontrar o velho amigo.

- Teria sido útil quando estavamos morando juntos. - Comentei.

- Oi, vó. – Simon apareceu mais aliviado. - Você está linda. 

- Oi, querido. – Ela bagunçou seu cabelo loiro e depois apertou suas bochechas as deixando vermelhas. - Você continua sendo o mais bonito da família. Shh...não conte para ninguém. - Ela piscou com um olho só para ele.

Simon sorriu e pareceu convencido de si.

- Vá falar com seu tio, tenho que conversar com a sua avó sobre uma coisa. – Eu dei um tapinha nas costas de Simon o incentivando a ir.

Simon saiu de perto de nós e não demorou muito para ouvirmos o som de algo caindo na água da piscina. Esse garoto não media esforços para brincar.

- Então, mãe. – Eu me sentei no sofá branco com um acolchoado perfeito e a puxei pela mão para que ela me acompanhasse. – Como foi a lua de mel? – Minha mãe havia tirado férias da escola em que trabalhava como coordenadora, para comemorar os cinco anos de casada com Jonas. E com isso, acabou fazendo uma segunda lua de mel.

- Mágica. – Ela pegou o celular em cima da mesinha de centro e começou a me mostrar as fotos. – Ele é o amor da minha vida. Olha esse vídeo. – Ela colocou na galeria do celular e deu play no vídeo. – Ele sempre arruma um jeito de me surpreender.

Na cena, Jonas estava de joelhos segurando um buque de flores vermelhas e minha mãe ria envergonhadamente. Haviam muitas pessoas em volta filmando e os dois pareciam sem graça.

- Amor. – Jonas começou a falar no vídeo. – Eu sei que quando nos conhecemos, as coisas não estavam muito boas para nós dois. Tivemos problemas em nossas vidas que somente as pessoas que passaram pela mesma situação que nós, podem entender. – Ele se referia a perseguição, matança e etc. – Foi muito difícil começar um romance no meio de um turbilhão de coisas terríveis acontecendo. Mas aqui estamos nós. – Ele sorriu e eu não segurei o meu sorriso ao ver a cena. – Minha vida só teve sentido depois que você me beijou. Eu me vi destinado a tê-la comigo. – Minha mãe pegou o buque no vídeo e depois Jonas se levantou e segurou em uma das mãos dela. – Eu te amo, Ramira. Mais do que qualquer pessoa nesse mundo. Mais do que qualquer coisa. Eu te amo, mais do que a minha vida. – Ele disse sincero. – Eu quero passar mais cinco anos com você. Não... Mais 10, ou 20... – Ele sacudiu a cabeça como se estivesse confuso. – Quero ter você até o meu último suspiro. Quero ser o único que irá acordar ao seu lado toda manhã e ver o quanto você é linda com o rosto amassado do travesseiro. – Ele riu e ela também. – Ramira, eu sou seu para todo o sempre. – Minha mãe se jogou nos braços dele e depois o beijou apaixonadamente, como dois jovens que estavam no primeiro mês de namoro. As pessoas ao redor gritavam e batiam palmas e então o vídeo acabou.

Olhei para minha mãe e seus olhos cheios d’agua me fizeram sorrir. Ela era muito emocionada e verdadeiramente apaixonada por ele. Eu toquei seu rosto e depois a abracei.

- Você merece toda a felicidade do mundo, mãe. – Eu disse sem solta-la.

Depois de conversarmos um pouco mais, saímos da sala e fomos para o quintal. Lorenzo bebia uma cerveja e ria de algo que Jonas havia dito. Kassy corria atrás de uma borboleta azul e Simon nadava de uma ponta a outra na piscina. Ainda bem que não era tão funda, se não, eu não conseguiria relaxar durante toda essa natação. Com crianças pequenas em casa, a atenção tem que ser dobrada. Minha mãe olhou a grelha e viu uma carne sendo assada.

- Não ia fazer um broatu-não-sei-o-que, para o almoço? – Ela perguntou para Jonas.

Ele coçou a barba ainda grande, depois abriu um sorriso como se estivesse sendo flagrado fazendo algo ilegal e não se importasse com isso.

- Não tinha os ingredientes necessários. – Meu marido riu e Jonas olhou para Lorenzo furioso. – Algum problema? Seria inveja do meu dom? – Lorenzo riu mais alto e então Jonas o ignorou. – Tudo bem, eu não sabia fazer o Bouillabaisse, então resolvi fazer um churrasco. – Deu de ombros. – Que se foda.

- O que seria um Boui...- Eu tentei falar o nome do prato mas desisti.

- Oh! – Jonas veio até mim e me deu um abraço apertado demais para que eu respirasse. Acho que percebeu a minha presença somente agora. – Você está mais alta ou é impressão minha? – Ele me olhou de cima a baixo.

- Impressão sua. – Lorenzo disse e deu mais uma golada em sua garrafa. – Sempre foi desse tamanho.

Eu olhei para o meu marido de um modo recriminador. Sempre ele...

- Bouillabaisse, é um ensopado de peixe. – Jonas disse e depois voltou para perto da grelha.

- Mamãe. – Kassy veio correndo até mim. – Posso entrar na “pixina”? – Ela me perguntou sem saber pronunciar “piscina” perfeitamente.

- Claro, vamos colocar a boia e a roupa de banho. – Simon tinha a vantagem de poder pular na piscina sem proteção e não afundar por causa da sua altura, mas a mais nova iria ter que substituir o vestido rosa por um maiô amarelo e as boias.

POV LORENZO

Depois do almoço, as crianças pareciam cansadas de tanto nadar na piscina e correr feito loucas pelo gramado do quintal. Não sei como elas tem tanta disposição. Não lembro da minha infância ter sido tão agitada. Talvez seja coisa de humano e não de demônio. Ajudei Kassy e Simon a tomar um banho e vesti os dois usando as minhas habilidades paternais recém descobertas. Era mais complicado arrumar a Kassy, ela sempre queria colocar laços no cabelo, que eram um saco de prender em suas mechas, e vestidos complexos demais para mim. Simon apenas se contentava com a camisa do Capitão América e uma bermuda qualquer. Muito mais prático.

Assim que as crianças estavam prontas para a noite, as deixei brincarem novamente pelo quintal. O que me surpreendeu, pois achei que estavam cansadas. Eu abri o que me parecia ser a sétima garrafa de cerveja. Sim, fiz meu dever como pai, mas estava alcoolizado. Isso é algo que tive que aprender a fazer. Eu não era o único bêbado, todos os adultos da casa estavam. O que era normal em nossos reencontros. Geralmente era Ramira e Jonas que nos visitavam em NY, mas depois da mudança do casal, tivemos que vir conhecer a casa.

Celeste estava com uma taça de vinho nas mãos e conversava sentada na beira da piscina com a mãe. Seus cabelos ainda eram curtos, mas ela havia clareado para um tom próximo de castanho claro. Ela estava mais vaidosa que antes. Sempre usava cordões, relógios e nunca tirava nossa aliança. Assim como eu jamais retirarei a minha.

Kassy e Simon pegaram suas bicicletas e começaram a andar em círculos no enorme quintal. A menor tentava apostar corrida com o mais velho, mas suas pernas curtas mal alcançavam os pedais e mesmo as rodinhas de apoio lhe dando uma vantagem, ela não o alcançava. Jonas estava me contando sobre como havia sido o dia em que seu patrão o demitiu.

- ...E ai eu soquei a cara dele e mandei ele se foder. – Jonas completou. – Ele não podia chamar a polícia nem nada, porque se não, eu iria delatar os inúmeros casos de fraude e corrupção que aquele filho da puta está envolvido lá dentro daquele prédio. Político tem tudo que tomar no cu.

- Não sei como você foi parar nesse meio. – Comentei me referindo ao antigo trabalho dele como chefe da segurança do prefeito da cidade.

- Dinheiro. – Ele deu de ombros. – Não tenho mais Katherine para me bancar. – Ele riu e eu concordei.

Tudo era simples quando Kath pagava as coisas para nós, desde as roupas até mesmo o nosso conforto. Agora, temos que trabalhar para conseguir dinheiro e nos manter. Não era algo ruim, eu gostava do meu emprego. Eu era dono do meu próprio negócio, então não tenho chefes para socar o rosto.

Celeste riu alto de algo que Ramira havia dito e eu desfoquei de tudo que Jonas começou a dizer. Ela era linda assim distraída, seu jeito descontraído era admirável. Seu macacão jeans marcava seu corpo e o decote me atiçava. Ela era muito gostosa e excepcionalmente maravilhosa. Como posso ter conseguido alguém como ela para passar o resto da minha vida? Eu tenho sorte de ter Celeste como esposa. Eu nunca imaginei tamanha felicidade. Jamais passou pela minha cabeça que eu seria pai, quanto mais ter alguém especial ao meu lado para casar. Eu amo a minha nova vida. Não sinto falta das batalhas, nem da ação e da adrenalina. Tudo está onde deveria estar. E me sinto bem com isso. Se eu morresse hoje, morreria feliz. Tenho muita sorte por ter uma família tão perfeita.

- Papai. – Kassy estava parada me olhando em cima de sua bicicleta e eu me agachei para falar com ela. – Posso brincar na praia?

- Pode? – Simon parou sua bike ao lado de Kassy e os dois me olharam com uma face dócil. - Também quero ir.

Pela hora, eles não poderiam entrar no mar. Estava escuro e seria algo perigosos e arriscado. E como um pai responsável, não deixaria.

- Não. – Me levantei e respondi sério.

- Ah papaizinho, deixa... – Kassy me devorava com seus enormes olhos e fazia beicinho. Porra, como posso resistir a isso?

- Prometo olhar a Kassy, pai. – Simon me encarou sorrindo com os olhos azuis. Ele era tão protetor quanto eu, isso me tranquilizava.

- O que acha? – Perguntei para Jonas. – Quer ir conosco? – Me rendi aos meus filhos. Eu tenho o coração mais mole do que eu pensava.

- Você é bem firme. – Ele revirou os olhos. - Vou chamar as mulheres. – Jonas negou com a cabeça e sorriu. Ele não sabia como era ter filhos, é mais difícil ser durão quando eles ficam fazendo essas caras fofas para mim.

Não haviam muitas pessoas na praia e perto de nós estava quase vazio, só alguns adolescentes em barracas. Provavelmente fodendo. Minha sogra abriu uma toalha de piquenique na areia e colocou alguns petiscos juntamente com um balde de bebida. Já estávamos bêbados, mas em nossas reuniões sempre parecíamos jovens loucos para perder o juízo. Celeste estava sentada na minha frente e Jonas na frente de Ramira, jogávamos conversa fora enquanto as crianças faziam castelos de areia. Estava um pouco frio, então eu coloquei agasalhos em cada uma das crianças para nenhum dos meus filhos ficarem doentes. Vesti apenas um casaco e minha esposa também. Não que estivesse absurdamente frio, mas o vento gelado que vinha do mar, era nítido.

Kassy começou a se aproximar da água e quando eu estava prestes a me levantar para traze-la pra perto, Simon correu até ela e segurou em sua mão trazendo-a de volta para nós. Esse é o meu garoto. As crianças cresciam rápido demais.

- Eles são lindos, não são? – Celeste deitou a cabeça no meu ombro e ficamos olhando nossos pequenos brincarem de “pega-pega” a luz do luar.

- Temos sorte. – Respondi. – São filhos incríveis. Nossos filhos. – Beijei sua bochecha levemente gelada e a confortei em meus braços.

Depois de comermos e bebemos mais um pouco, voltamos para a casa. Ainda bem que era do outro lado da rua. Eu e Celeste subimos para os quartos e colocamos Kassy e Simon em suas respectivas camas.

POV CELESTE

Minha mãe fez questão de comprar uma casa onde haveriam quartos para receber sua família completa, e, cada cômodo tinha o necessário. Camas, armários, cortinas e tapetes, abajures e etc. O quarto das crianças era grande e a parede do lado da Kassy era pintado de rosa e tinha posters das princesas da Disney e a do Simon era verde e tinha figurinhas de todos os Vingadores. Eles amaram. Havia uma janela grande de vidro entre as camas, meu marido a fechou e ajeitou as cortinas para que de manhã a claridade não os acordassem. Lorenzo deu um beijo na testa de Simon e depois na de Kassy. Ele ficou encostado na parede próxima a porta esperando que eu me despedisse de meus filhos e fosse, juntamente com ele, para o nosso quarto dormir. Coloquei os ursinhos ao lado de Kassy e ela agarrou o mais próximo contra o peito.

- Conta uma história, mamãe? – Kassy sempre me pedia e mesmo Simon tentando ser o “mais velho e grande demais para histórias de ninar” ele adorava ouvi-las.

- Bom, vocês querem que eu conte qual história? - Me sentei na cama de Kassy e olhei-os um por um.

- A da herdeira. – Simon disse sorrindo e Kassy concordou animada.

- Tudo bem. – Eu assenti com a cabeça. – Era uma vez, uma princesa que não sabia que era uma princesa. – Comecei de forma calma. – O nome dela era...

- Celeste. – Kassy disse sorrindo. – Igual ao seu, mamãe.

- Isso. – Sorri e alisei suas perninhas por cima do cobertor. – Um dia, um homem mal descobriu que a princesa era a herdeira do seu reino e que ele poderia ser substituído por ela. O rei malvado, se chamava Tristan. Ele tinha tanto medo de ser destronado, que mandou seus amigos malvados atrás dela. A princesa Celeste começou a fugir dos amigos do Rei Tristan sem saber o motivo de tanta raiva. “Por que eles estão atrás de mim?” Ela se perguntava. – Eles me olhavam atentos como se estivesse imaginando cada cena. – Ela se escondia com a família porque tinha medo de deixá-los desprotegidos e os amigos malvados de Tristan acabarem machucando-os. Mas então, uma fada madrinha apareceu para ajudar a princesa. O nome dela era...

- Katherine. – Kassy completou com a felicidade típica de uma criança cheia de imaginação.

Eu sentia falta de Katherine. Sua vida como rainha não permitia que ela tivesse tempo para nos visitar. Não a vejo há exatos, 8 anos. Nem mesmo meus filhos a conheceram.

- Kath. – Disse olhando para a minha filha. Kassy e Simon já estavam tão aptos a história, que já sabiam o enredo. – E, a fada madrinha contou para a princesa que ela era dona de um castelo e que o Rei malvado queria matá-la para ficar com o castelo só para ele. Tristan tinha receio de deixar a verdadeira herdeira livre para tornar-se rainha. No entanto, a princesa não entendeu como poderia ser a dona do castelo, se ela morava em um pequeno vilarejo com a família. Mas, a fada madrinha explicou que antigamente, havia um Rei bonzinho que era o antigo dono do castelo, esse rei se chamava... – Olhei para Simon que parecia estar segurando as palavras.

- Catriel. – Ele respondeu e Lorenzo riu atrás de mim.

- Um rei de respeito. – Meu marido disse.

Ele era o pai da princesa. – Continuei contando. -  Só que Tristan matou Catriel com inveja de seu reinado e por fim, virou o rei, mas não legitimo. A princesa demorou para acreditar, mas, entendeu que corria perigo por ser a verdadeira rainha. Ela saiu do vilarejo e começou a morar em vários outros lugares tentando despistar os amigos do Rei malvado. No entanto, os malvados sempre encontravam Celeste e sua familia. Contudo, para a sorte da princesa, um príncipe apareceu, seu nome era Lorenzo. E com ele, seus cavaleiros Jonas e Katrina. – Simon se sentou na cama, pois sabia o que viria a seguir e não continha a emoção. – E ai, a princesa aprendeu a lutar e se defender de todos os amigos malvados do Rei. Ela aprendeu a usar armas de fogo, espada, machado, faca, tudo quanto era tipo de arma. Depois de muito treino, ela foi atrás do Rei malvado e o confrontou em uma batalha. A fada madrinha, o príncipe e seus amigos bonzinhos, lutaram ao lado dela. Haviam muita ação, flechas voando para todo o lado, socos e chutes, mas finalmente Tristan acabou sendo derrotado. – Falei. -  No final, a princesa não quis morar no castelo e deu de presente para a fada madrinha.

- E então, o príncipe pediu a princesa em casamento. E eles tiveram lindos filhinhos e viveram felizes para sempre. – Lorenzo concluiu a história.

- Isso! - Minha filha exclamou feliz.

Os dois sorriam com o final da história e eu me senti satisfeita.

Eu cobri Kassy até o pescoço e fiz o mesmo com Simon, me despedi com um beijo demorado em suas bochechas, antes de fechar a porta do quarto. Kassy e Simon são a minha vida, eu não ligo de ter que reviver minha história, somente para agrada-los e entretê-los. Sempre faço tudo para arrancar um sorriso inocente dos meus bebês. Eu os amo tanto, não sei como administrar tanto amor. Daria a minha vida por eles e não pensaria duas vezes. São meus bens mais preciosos. Irei protege-los até o meu último dia de vida. Meus filhos são a minha razão de viver. Minha família é tudo que eu tenho.

Lorenzo e eu caminhamos até o nosso quarto e tomamos banho juntos no chuveiro antes de deitarmos na cama. Poderíamos transar se não estivéssemos tão cansados. Me deitei de frente para ele e fiquei alisando a pele de seu braço roboticamente enquanto ele fazia carinho no topo da minha cabeça.

-Eu te amo. – Ele sussurrou.                                                          

Me casar com ele foi a primeira decisão concreta que eu tive. Foi um casamento simples, pois na época não queríamos algo exagerado. E nem tínhamos dinheiro para isso. Apenas contratamos um padre, vestimos algo legal e dizemos “sim”. Foi unicamente incrível, com certeza o primeiro momento mais feliz da minha vida. Foi um casamento comum e aos olhos de algumas pessoas foi “sem graça”, mas para nós, aquela pequena capela no topo de uma colina, no final da tarde, com apenas minha mãe e Jonas como testemunhas, correspondeu a todas as nossas expectativas.

Jamais pensei que teria o privilégio de ter uma família tão única. Lembro-me da época onde tínhamos que lutar pelas nossas vidas e matar qualquer um que tentasse nos ferir. Agora, o maior problema que temos que enfrentar, é como nos tornarmos ótimos pais. Depois de toda a merda que rolou comigo, eu só queria uma vida normal e construir a minha própria família. E esse sonho se realizou. Graças a toda a luta, toda a força de vontade e às pessoas que lutaram comigo por liberdade.

Respirei fundo e tentei focar no carinho que eu recebia.  

- Eu te amo muito mais. – Entrelacei nossos dedos e me deitei ainda mais perto dele.

Que o final seja um começo feliz dos novos anos maravilhosos que virão.



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