A fumaça sobe na campina, sufocante e ardendo entrando pelo nariz. Ouço um choro baixo de uma criança e corro. Corro. Corro. E vejo Pérola no meio da campina, chorando, sozinha e ao redor dela, gente morta, mutilada, com os olhos abertos cheios de pavor. O pânico toma conta de mim e corro mais, pegando ela no colo tentando acalmá-la e ao mesmo tempo tentando sair daquele circulo de morte.
– Está tudo bem meu anjinho. - digo mais para mim do que para ela. - Quem te deixou aqui? Peeta? - grito. Nenhuma resposta. - Não, por favor, por favor... - minha voz se transforma num lamento choroso.
E sinto um medo crescente em mim. ”Algo ruim vai acontecer."
– Peeta ?! - olho para todos os lados. - Por favor, não me deixe aqui...não me deixe sozinha... murmuro baixinho como uma oração.
O céu escurece. As pessoas lá embaixo começam a correr ao som de alarmes. Prim e minha mãe estão assustadas e não sabem para onde correr. Agora reconheço tudo, estou no 12. Olho para cima e vejo a forma gigantesca e assustadora. O bombardeiro. Pérola começa a chorar, tenho que sair dali, tenho que protegê-la. Onde está Peeta? Então Snow aparece num holograma. O cheiro adocicado de sua rosa branca se mistura com a fumaça e meu estômago revira.
– Que bela criança.
– Fique longe dela. Cadê o Peeta? - grito.
– Ele não vai voltar, Peeta servi a Capital agora, servi a mim.
–Não. - grito desesperada. - Peeta volte pra gente.
Seus olhos azuis me olham como se fossem de gelo, ele não me reconhece nem a nossa filha.
– Peeta, por favor. - choro.
Ele continha como uma estátua e Snow solta uma risada cruel. Nesse momento, uma bomba é lançada. Perto demais de mim. Não há tempo de correr. O mar de fogo vem em minha direção, e fico apenas olhando. Ironicamente vejo como é belo. Fecho os olhos e abraço Pérola. É o fim. O Tordo foi abatido...
Acordo suada, ofegante e trêmula, sentada na cama. Peeta está do meu lado.
– Foi só um pesadelo. Está tudo bem. –diz ele tentando me acalmar.
– Eu gritei?
– Não.
Olho nossa filha dormindo tranquilamente e abraço ele chorando baixinho. Peeta não diz nada, apenas beija o topo da minha cabeça e espera o tempo que preciso. Ele está sem camisa e seu peito molha com minhas lágrimas.
– Quer falar sobre o pesadelo? - pergunta.
Engulo em seco. As imagens bem nítidas, ainda sinto o calor do fogo e o cheiro de fumaça ardida.
– Eu estava no 12, Pérola estava sozinha na campina quando a encontrei. Você tinha sumido e Snow disse que você servia a ele e nunca mais voltaria. Um bombardeiro destruiu tudo. Eu morri, não consegui salvar nossa filha. - mais lágrimas.
Peeta me abraça.
– Eu nunca vou deixá-la. Nunca. Vou estar sempre aqui. Você sabe disso não sabe?
Eu balanço a cabeça em afirmativa. Ele segura meu rosto entre as mãos.
– Deixar você na arena foi um erro que eu nunca vou repetir. Nunca mais. Você confia em mim Katniss?
– Sempre confiarei em você. - digo e o abraço, sentindo seu corpo quente.
As mãos dele deslizam pelas minhas costas numa massagem calmante. Não consigo dormir o resto da noite e a todo instante viro a cabeça olhando Pérola no berço, mas a tranquilidade de estar nos braços dele compensa a falta de sono. Por que Peeta é assim. E saber que ele é meu e estará sempre comigo me faz ter esperanças. Ainda que ameaçadas por pesadelos e o demônio chamado Snow. Mas eu tenho e sei que ele também.
– Eu te amo Peeta. Obrigada por sempre me ajudar quando eu mais preciso.
Poucas vezes eu disso isso então ele sorri e me beija.
– Eu também te amo Katniss e vou estar sempre aqui quando você precisar.
São cinco horas da manhã quando todos são acordados com a voz monótona do comunicador que está em cada quarto. Sei que é manha por causa do relógio. Na Colmeia não da pra saber se é dia ou noite se não acompanharmos o horário, por isso todos nós usamos relógios de pulso. Me sinto exausta por não ter dormido, mas mesmo assim me arrasto para fora da cama.
Após eu amamentar nossa filha e fazermos a higiene pessoal. Peeta, Pérola e eu entramos no refeitório e a cena se repete. Todos olham para a família que sobreviveu a arena e o Torturador da Capital. Depois voltam para a rotina de comer o escasso café da manhã que é apenas um pão com manteiga e meio copo de café com leite. Sinto falta de ovos e bacon, parece até que sinto o cheiro e me dou conta que não me lembro da ultima vez que comi bacon.
Pérola chupa uma migalha de pão molhado e sorri. Peeta e eu sorrimos por que assim como ele, é fácil rir com ela. Levanto a cabeça e vejo as crianças ainda famintas e me pergunto como aqueles soldados vão conseguir continuar lutando tão mal alimentados.
Após o café, somos convocados para uma reunião do Conselho no salão oval. Todos murmuram especulando, outros dizem que ainda estão com fome. Vejo Gale e sua mãe, ele apenas acena de cabeça e eu retribuo. A presidente Coin se apresenta.
– Bom dia.
Murmúrios novamente. O rosto dela está sério.
– Hoje recebemos novas informações. - ela continua. - O ataque que sofremos foi uma retaliação da Capital pelo resgate dos prisioneiros que estavam sendo mantidos lá.
Vejo olhares para Peeta e Anie. Finnik toma a frente dela como se precisasse protegê-la. Peeta encara a presidenta. Ela desvia os olhos para a multidão. A sensação que sinto e no mínimo desagradável.
– O presidente Snow declarou que qualquer distrito que tiver contato com o Tordo será declarado inimigo da Capital e para mostrar seu poder o distrito 8 foi bombardeado esta madrugada. - Ela faz uma pausa e respira fundo. - Não sobrou ninguém. – suas palavras trás uma mistura de sentimentos que não consigo definir.
Protestos, exclamações de horror, comentários baixos, olhares, e medo. Ela continua.
– Ainda não é seguro voltar para o 13, portanto, vamos continuar aqui. Mas nosso exército não se renderá e nem vamos ficar aqui até morrermos de fome pois é isso que a Capital quer. - a voz dela agora é motivada, cheia de incitações.
Todos aplaudem a presidenta, gritam palavras de ordem e concordam com ela.
Estou pálida e bamba, me lembrando do sonho que tive. Entrego Pérola para Peeta por que tenho medo de deixa-la cair. Parece que eu mesma vou cair.
– E agora eu pergunto... - Coin continua. - O Tordo lutará conosco?
Sinto cada milímetro do meu corpo sendo alvejado por muitos pares de olhos interrogadores e esperançosos. E por um segundo tenho medo. Tenho medo de não corresponder a expectativa que está sendo depositada em mim. De mais sangue inocente ser derramado por minha causa. Posso sentir o peso naqueles olhos.
Peeta me olha me fazendo entender que está do meu lado para o que der e vier. Começo a andar em direção a presidente. Todos abrem caminho para eu passar e o silêncio é tão grande que ouço meu coração batendo em meus ouvidos e o som dos meus passos, me levando para a decisão que deve ser tomada. E quando subo no patamar, a parede atrás de nos se transforma num grande telão e imagens do distrito 8 sendo atacado é mostrado. Escombros, fumaça negra, gritos, choro, morte... E então mais imagens aparecem. É Gale, Peeta e eu, no momento em que abatemos os planadores durante o ataque no 13.
Olho pra mim mesma na tela gigante. Sinto o cheiro da fumaça negra, de corpos queimados e o choro apavorado das crianças e suas mães tentando em vão protegê-las. Penso em Pérola, ela poderia ser uma das muitas crianças que viraram cinzas lá em cima, em Peeta, que sofreu todo tipo de tortura. Olho para a presidente e me viro para a multidão silenciosa.
– Estão vendo o que a Capital faz? Mata mulheres e crianças indefesas. Por que simplesmente não importa o que ela tem que destruir para vencer. Mas estão vendo isso? - aponto com o braço para trás a imagem dos planadores explodindo. - Está vendo presidente Snow? Tá pegando fogo. Você pode tentar nos reduzir a cinzas, mas se nos queimar, queimará conosco.
A multidão explode num grito de guerra, fazendo o sinal do distrito12. Eu tomei a decisão. O Tordo lutará, só não sei se viverá para ver o fim.
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