História A Maldição de Serena - O segundo sol da manhã de Saturno

Estava andando tão entediada quanto nunca pela casa. Eram apenas 5 horas da manhã e eu já estava de pé, ansiosa, preocupada. Eu tinha uma coisa que odeio, chamada eu preciso que tudo seja feito no tempo que estabeleci, mas nunca acontecia. Minha vontade agora era de esganar Mabelle, minhas malas já estavam prontas a dias, e eu tinha certeza que ela nem ao menos começou as dela. Mabelle é minha amiga de infância, sempre fomos grudadas como dois chicletes recém-mascados e sempre odiamos ficar separadas, e agora mais que nunca, eu precisava que ela chegasse logo.

Eu e Bel, que é como eu a chamo, estamos com horário de voo marcado para as 7:30h, para a Barbados, onde vamos começar finalmente a nossa vida adulta. Eu e Mabelle cursamos biologia marinha, e morar na praia foi a melhor decisão que tomamos, tornaria tudo mais fácil, o contato com a vida marinha e todas essas coisas.

Somos muito iguais, tirando pela parte que Mabelle é extremamente fantasiada, e acha que tudo é real. Ela afirma que já viu um gnomo de jardim correndo pela grama, e podia jurar que já ganhou um presente diretamente do Noel, o que é claro que é mentira. Não sei nem de onde ela tira isso. A teoria menos idiota dela, que apesar de não ser real é a que tem mais sentido, é a que sereias existem. Sereias? Sério? Para alguém que estuda biologia, e conhece cada canto do mar sem ao menos ter explorado ele, saberia que sereias não existem. E que isso seria impossível. Mas ela não desiste e diz que um ia ainda irá mergulhar tão fundo que fará contato com uma, e ainda trará uma estrela-do-mar que segundo ela, sereias usam como brincos.

As vezes eu parava pra pensar nisso, e ficava cada vez mais claro pra mim que Mabelle estava ficando louca. Afastei meus pensamentos assim que ouvi a campainha tocar, larguei o copo de suco em cima do balcão correndo até a porta, a abrindo sem pestanejar. A garota loira revelou-se a minha frente, o que me fez respirar aliviada.

 –  Poxa hein, Mabelle, por que demora tanto pra arrumar uma mala? O que você tá levando ai? Sua casa?

 –  Eu parei de ouvir no Mabelle. Odeio quando me chama assim, já sinto que vai brigar ou algo do tipo.

 –  Agora eu realmente queria matar você. É o primeiro dia das nossas vidas, e você demora desse tanto para arrumar a porcaria de uma mala!

 –  Credo, Ren, você não costuma ser tão nervosa assim, talvez, politicamente correta. Mas nunca nervosa. O que você bebeu? Uma dose de Ted?

 –  Como sabe disso?

 –  Ele me ligou hoje cedo. Finalmente, achei que ele nunca fosse te pedir em casamento.

 –  Foi uma péssima hora para isso acontecer, Bel.

Ela arqueou uma sobrancelha adentrando o apartamento, se sentando no sofá sem pressa.

 –  É uma péssima hora pra pedir alguém em casamento? Que?

 –  Estamos indo embora Mabelle. Imagine, não posso me casar com ele agora que a minha vida profissional está dando um rumo, finalmente!

 –  Então você vai desistir do seu conto de fadas assim? Não acha que poderia, sei lá, convidar ele pra ir também?

 –  Mabelle, contos de fadas não existem. E não, eu não quero distrações.

 –  Você tem que parar com essa mania de dizer que as coisas não existem. Você não sabe.

 –  É claro que sei. Se chama ciência, lógica, isso é impossível. São contos da Disney e mais nada.

 –  Você sabe que os contos dos Irmãos Grimm eram verdade, certo?

 –  Não começa Mabelle.

Revirei meus olhos, agarrando o copo de suco sobre o balcão e o bebendo de uma só vez. Quando ela começava a defender isso, não parava mais. Mas eu tinha mais com o que me preocupar. Puxei as malas que estavam no canto da sala para fora do apartamento, até o elevador, puxando também a mão de Mabelle.

Mandei o elevador para o térreo, que logo foi visto. Fechei a porta do elevador assim que saímos, e caminhei segurando as malas até o carro dela. Aliás, porquê eu ainda não tenho um carro?

 –  Hoje é o primeiro sol da manhã de Saturno, é ótimo para começar com o pé direito.

 –  Lá vem você com isso de novo.

 –  Eu acredito no que eu quiser, Ren.

Suspirei, apenas a deixando bater palma três vezes. Ela dizia que era um ritual, que cada planeta representava algo, e hoje, era o primeiro sol da manhã de Saturno. Saturno representava bons ares, mudanças e inovações. Em cada planeta, existiam três '' Sóis das manhãs '' e esse era o primeiro, que significava a primeira definição do planeta, ou seja, bons ares. Que pelo menos isso seja verdade, pois o que eu menos preciso agora, são de problemas.

{...}

O aeroporto estava razoavelmente cheio, ou na verdade quase vazio. E isso, era na verdade, bom. Talvez essa parada de '' Sóis das manhãs '' seja realmente verdade, porquê posso dizer que estava começando a funcionar. Mabelle me puxou pelo pulso, correndo ( não sei pra quê, pois nem fila tinha ) para o embarque. Se eu era ansiosa, Mabelle era desesperada. A recepcionista nos entregou a passagem e carimbou nosso passaporte, antes de nos mandar entrar, e foi o que fizemos.

Posicionei minha pequena mochila por entre os blocos vazios na parte superior do avião, deixando Bel se sentar na janela. Ela me olhou desconfiada, e arqueou uma sobrancelha.

 –  Por que nunca senta na janela? A maioria das pessoas preferem.

 –  Eu não sou a maioria das pessoas. E na verdade, eu tenho medo de altura. Então prefiro não ficar vendo, sabendo que estou no ar.

 –  Pois a janela é o melhor lugar, eu me sinto voando, apesar de eu realmente estar voando... você entendeu.

 –  Você se fantasia tanto, deveria voltar pro mundo real um pouco.

 –  Se o mundo real fosse bom, não existiria fantasia.

Ela piscou pra mim, antes de virar seu rosto para encarar novamente as nuvens, e voltar a ter aquela fantasiada sensação de voar.