Se o marquês a tivesse levado para a cama, Sakura não teria resistido. Mas um segundo de sanidade a fez sacudir a cabeça.
Sasuke suspirou e baixou os braços. Segurou a mão dela e conduziu-a ao quarto dela. Sakura, com o coração aos saltos, não podia negar que desejava ser persuadida.
— Chame sua camareira. Falaremos com meus pais e sairemos em seguida. Não se demore.
Sasuke dirigiu-se a seus aposentos, e Sakura largou-se em uma cadeira, sem saber se ficara contente ou frustrada pelo comedimento do marido.
Uma hora mais tarde, vestida com um traje de crepe verde-pálido, reuniu-se a Sasuke, como se nada houvesse acontecido. Juntos, foram ao encontro do duque e da duquesa.
Mikoto beijou Sakura no rosto.
— Está muito elegante, minha querida. Entendo a pressa de Sasuke em levá-la para o País do Vento. O duque e eu passamos lá parte de nossa lua-de-mel.
Sakura percebeu o sorriso do duque e sentiu-se envergonhada, como se houvesse presenciado alguma intimidade.
Bem-vinda à família Uchiha.
Fugaku beijou a filha, com a certeza de que seu estratagema funcionara a contento. Sakura adorou a ideia de que ele teria de esperar bem mais que nove meses por seus netos de sangue.
Admirou-se do próprio azedume. Afinal, o pior já passara, o marquês mostrara-se disposto a aguardar o momento adequado para consumar a união. Iriam descansar em uma pequena casa de campo. Não havia necessidade de tanta amargura, portanto.
Na carruagem, ao lado do marido, o bom humor de Sakura voltou. A primavera estava no fim, e o clima, ótimo.
— Conte-me algo sobre o País do vento.
— É uma área muito bonita faz muito calor, com um chalé e jardins rústicos. Na realidade, tratava-se de uma simplicidade relativa. É preciso muito dinheiro e trabalho para preservar o charme bucólico. Há um regato nos fundos do jardim, um pomar e um pombal.
— Eu deveria ter trazido meus trajes de renda e seda? — Sakura fez graça.
— De maneira alguma. O encanto do País do vento é podermos vestir o que tivermos vontade. — O marquês tirou a gravata e colocou-a sobre o assento fronteiriço. — Olá liberdade!
Sakura desatou os laços do chapéu de palha e deixou-o pender sobre o lenço de pescoço.
Sasuke, com os olhos brilhantes, desabotoou a camisa.
— Milorde, não pretendo entrar nesse tipo de competição.
— Sasuke. Ou tirarei toda a roupa neste minuto. — Que tal "Sasuke, meu querido"?
— Apenas Sasuke. Não adianta querer blefar. Sei que não faria isso.
— Milady, é preciso lembrar-se de que também não gosto de ser provocado. Mas não se preocupe, não farei nada. Ainda mais que não aprecio carinhos forçados.
Sakura abaixou os cílios.
— Gostaria de agradecer-lhe. Tem sido muito bondoso.
— Não exagere. Não sou nenhum candidato a santo. Amor, sexo e deveres maritais são sagrados e acabarão se tornando agradáveis para ambas as partes. E não deixarei por menos. Temos o resto de nossas vidas para isso.
— Que nada! Ficarei muito ocupada em cuidar do herdeiro Uchiha.
— Se continuar com tantos pedantismos, o resto de sua vida será bem curto.
— Milorde insiste em suas ameaças constantes.
— Não é bem assim. Deve ter havido alguns momentos em que não fui tão sedento de sangue.
— E quem está sendo pretensioso agora?
— O que serve para um...
— Isso está me parecendo outro desafio. Sasuke não negou.
— As mulheres são aviltadas ao receber as atenções triviais com que os homens pensam em retribuir o sexo. — Sakura empinou o queixo. — Na verdade, eles impõem sua superioridade de maneira insultuosa.
— Na certa, são palavras da divina Shizune. Em todo caso, entre amigos não se admite a pressuposição de superioridade.
— Essa bela afirmativa seria endossada por Shizune Yatzu .
— Acredito que devo tê-la ouvido de Naruto. Sakura, será que não poderíamos manter nosso compromisso de intimiade?
— Nós não paramos de discutir. Amizade estranha essa, não é mesmo?
— É o único jeito — Sasuke ironizou. — Não tenho nenhum amigo cujo olho eu não tenha deixado roxo.
— Sempre a violência!
O marquês não conseguiu mais conter a gargalhada.
— Prometo nunca fazer isso com minha esposa.
— Nem mesmo quando eu levar a melhor nas altercações?
— Nem assim.
— Está bem. — Sakura sorriu. — "Amizade é um negócio desinteressado entre iguais. O amor, uma relação abjeta entre tiranos e escravos." Oliver Goldsmith.
Sasuke anuiu, dando-lhe a vitória. Pensativo, circulou-lhe as costas da mão com o polegar.
— Teria feito diferença saber quem era o tirano, quem o escravo?
— Para mim, nenhuma. Não tenho tendência para ser nenhum dos dois.
O marquês beijou-lhe os dedos.
— Sendo assim, devemos lutar pela amizade. Não acredito que será fácil.
— Por quê? Por acaso acha nossos gostos assim tão diferentes? Afinal, reconhecemos as citações um do outro? E eu também aprecio seus amigos.
— Se minha esposa tem predileção por patifes, então ainda resta uma esperança.
Chegaram ao País do Vento muito bem-humorados.
A casa era pequena, tinha dois andares e quatro dormitórios simples. Os jardins eram bem-cuidados, e de um lado corria um regato. Grande parte da propriedade era dedicada à agricultura. Havia apenas cinco criados, o que agradou a Sakura sobremaneira.
E ficou ainda mais aliviada ao descobrir que ela e o marquês ocupariam quartos separados, embora sem fechadura na porta intermediária.
A confusão mental dela quanto às intimidades do casamento aumentavam, o que era desconcertante, pois sempre se considerara uma mulher prática. Apesar da harmonia conquistada, ,qualquer pensamento em relação ao marquês e ao leito conjugal remetia a um atoleiro de fascinação e medo.
Sakura odiou aquilo tudo. Seria mesmo preferível adiar a solução até que pudesse pensar em tudo com calma e racionalidade.
Sasuke teria paciência de esperar? Ou seria melhor terminar logo com o assunto?
Com atitudes gentis, quase fraternas, ele a levou para conhecer o imóvel, os jardins e os anexos. Na estrebaria, falaram sobre aulas de equitação. Sakura comoveu-se ao constatar que o marido mandara trazer um cavalo especialmente para ela. O capão malhado que atendia pelo nome de Stello parecia manso e afável.
Às seis horas, saborearam na pequena sala de jantar uma refeição simples e saborosa. A criada trouxe tudo nas travessas, inclusive as sobremesas frias, e eles mesmos se serviram.
Falaram sobre poesia, e Sakura surpreendeu-se com o conhecimento do marido.
Na realidade, ela se alarmou. Antecipara ter de encarar uma pessoa frívola no campo de batalha matrimonial.
Jogaram cartas e Sakura tocou piano com competência.
Embora a noite transcorresse dentro da maior normalidade, ela continuava tensa. Sem conseguir suportar mais aquela situação, anunciou que iria dormir e, alarmada, viu o marido levantar-se. Mas ele apenas beijou-lhe a mão e desejou-lhe bons sonhos.
Chiyo preparou-a e saiu. Sem imaginar o que aconteceria se o marido batesse na porta, a marquesa acabou por adormecer.
Acordou na manhã seguinte tão virgem como nascera.
Sakura disse a si mesma que estava satisfeita e que seria uma maneira excelente de frustrar os planos do duque.
Os dez dias passados no País do Vento transcorreram da mesma maneira. Os dois cavalgavam pela manhã, e Sasuke mostrou-se um professor compreensivo e paciente.
Os progressos de Sakura foram acompanhados por dores e equimoses. Sasuke ensinou-lhe diversos jogos de cartas e conversavam por horas a fio, entre goles de um vinho excelente. Em outras ocasiões, entretinham-se lendo na biblioteca, e depois discutiam sobre o que liam. Muitas vezes compartilhavam opiniões, mas também não deixavam de impor idéias próprias, mesmo que contraditórias.
Durante as caminhadas, debatiam a situação internacional e o perigo de Hanzõ derrotar os aliados e recomeçar a tentativa de governar as cinco nações. Sasuke tinha certeza de que o corso seria derrotado, e deixava evidente sua vontade de estar ao lado dos que se preparavam para a luta.
Sakura chegou a pensar em deitar-se com o marido, para acabar de vez com a expectativa. Assim, deixaria-o livre para acompanhar os amigos na batalha. Mas não havia garantias de que um ato apenas atingiria os propósitos, e muito menos que gerariam um filho do sexo masculino. Nem mesmo que a criança sobreviveria.
O ônus do privilégio exigia que Sasuke Uchiha ficasse em segurança até conseguir implantar a linha sucessória.
Tudo era uma barbárie, como dissera Narguto Uzumaki .
Evitavam discussões sobre tópicos controversos ou pessoais. Compartilhavam de várias opiniões sobre liberdade individual e teorias de governo.
Sakura surpreendeu-se com as ideias liberais do marquês, embora ficasse tentada a repreendê-lo por sua visão acanhada e arrogante.
O marquês comportava-se como um cavalheiro. Amável. Gentil. Impessoal. Contudo, às vezes, Sakura surpreendia um olhar arguto que a fazia estremecer.
Em quinze de junho, último dia no País do Vento, eles liam na margem herbosa do regato. Era uma tarde quente, e ambos vestiam trajes leves e simples, nos dias passados Sakura sempre vestia vestidos que deixavam a pele mais a mostra, o que deixava o marquês na vontade de persuadi-la. Os passarinhos cantavam, e os insetos formavam uma orquestra de zumbidos. Pancadas na água anunciavam a presença de peixes.
—Talvez fosse interessante pescar, Sasuke. Poderia garantir nosso jantar.
— Os peixes daqui são poucos e muito pequenos. Não valeriam o esforço da pescaria.
— Não se pode fazer criação?
— Meu pai já tentou. O regato seca muitas vezes e... Foram interrompidos pelo grasnar de uma família de patos,
A mãe na frente e os patinhos. enfileirados atrás. Exceto um que, no fim da fila, parecia distraído e a todo instante apressava-se em acompanhar os outros.
Sakura riu e abriu o saco de aveia que trouxera para alimentá-los.
— Veja, Sasuke, nosso preguiçoso está com tendências poéticas. Parece tão encantado com a beleza do cenário que se esquece de nadar.
— Nesse caso, poderíamos chamá-lo de Haikai. Apesar do chapéu que usava para proteger-se do sol, Sakura adquirira algumas sardas, o que o marido achava cativante. No campo, mais descontraída, a esposa mostrara humor, inteligência e vivacidade.
Sasuke encantava-se cada vez mais com ela. E relutava em retornar para o círculo social.
O marquês concluiu que Sakura era envolvida por uma dose de magia. No começo parecera-lhe uma pessoa comum. Mas o inclinar da cabeça quando estava curiosa, a contração dos lábios quando se divertia e a luminosidade do olhar quando dava risada transformavam-na em uma feiticeira.
Contudo, o encanto era frágil e logo quebrado quando se entristecia. Sasuke temia destruir para sempre aquela aura mágica. Observou-a ralhar com a mamãe pata por tirar alimento do bico dos filhotes e dizer palavras carinhosas para o pequeno Haikai.
Sasuke teve de conter-se para não fazer amor com ela ali mesmo, no gramado.
Sakura fitou-o.
— Eu estava apenas vigiando, para o caso de milady entusiasmar-se demais e cair na água, — Sasuke ajoelhou-se ao lado de Sakura, que sentiu a respiração quente no rosto. — Talvez eu devesse ensiná-la a nadar. Perto de Konoha há um lugar de águas profundas e seguras.
Sakura sentiu o coração disparado e o rosto em fogo.
Não podia imaginar entrar na água com o marido. Ele nadaria despido?
— Não sei se eu gostaria de fazer isso, Sasuke.
— Ora, vejam só! — Sasuke afastou-lhe uma mecha rosa da testa. — Shakespeare já dizia que a nobreza é isenta de medo. Uma marquesa não deve temer nada.
— Ele também afirmava que a doce misericórdia é a insígnia da verdadeira nobreza. Há mais perigo em teus olhos do que em vinte espadas.— Sakura pôs-se de pé. — Eu lhe peço lorde Sasuke, poupe-me da idéia de enfrentar a água.
O marquês também se ergueu e tocou-lhe a ponta do nariz.
— Não sei como consegue sempre uma citação para retrucar a minha. Acho que passou muito tempo enterrada nos livros, milady.
— E não deixou de ser o treinamento perfeito para um matrimônio.
— Só para mim, acho. — O marquês tornou a sentar-se na grama. — Venha cá, Sakura.
Ela se acomodou ao lado do marido. Ele tirou o chapéu e deitou a cabeça no colo da esposa.
— Leia para mim. — E Sasuke cerrou as pálpebras. Sakura apanhou o livro de poemas, e os versos que antes lhe pareciam inocentes assumiram novo significado, com a cabeça do marido de encontro a seu ventre.
Depois de alguns minutos, Sasuke tomou-lhe a mão.
— Uma mulher ideal e nobre. Para prevenir, confortar e comandar.
Parecia mais a descrição de uma mãe ou uma governanta.
— Não sei se eu gostaria de ser desse tipo.
— Não? Achei que fosse o ideal de Yatzu . Está na hora de voltarmos para casa, meu anjo.
E puséram-se a caminhar de mãos dadas.
Sakura admitiu que se encontrava frustrada por ter pensamentos fixos em coisas terrenas. Por quanto tempo poderiam continuar com aquela vida de irmãos?
A despeito das estranhas conexões familiares, não era possível prosseguir assim. Sasuke esperaria que desse o primeiro passo? Ela nem mesmo tinha ideia do que fazer.
Na última noite no País do Vento, Sakura sugeriu um passeio ao luar. A lua cheia deixou prateados seus cabelos longos róseos era uma divina imagem.
— Está com frio, Sakura?
— Não.
— Lamenta ter de voltar para mansão ?
— Um pouco. A vida simples daqui é mais de meu agrado, mas sei que temos deveres.
— Se quiser, poderemos vir aqui de novo, ao término da temporada.
— O que costumava fazer nessa ocasião? Sasuke deu de ombros.
— Ia para Aldeia do Som. Passava algum tempo em Uchiha Park. Visitava amigos.
— Sente saudade deles?
— Agora tenho uma nova amiga.
— E não se importa?
— Do quê?
— De ter apenas uma amiga.
— Pareço estar frustrado? — Sasuke virou-a com gentileza. — Sou capaz de aproveitar a companhia de uma mulher sem pedir mais nada.
— Será?
O marquês ergueu-lhe o queixo.
— Não quero atormentá-la, Sakura. Se me quiser, é só dizer. — Ele a beijou de leve. — Quando estiver pronta, basta me avisar, doçura.
Chegaram à porta de entrada, e ela considerou um disparate cada um ir para seu quarto.
— Beije-me, Sasuke.
Ele a olhou, com um sorriso cálido.
— Como um criado com a amada? E por que não? Sasuke segurou-a pelos ombros, deslizou a mão quente e aveludada no pescoço de Sakura e prendeu-lhe a cabeça.
Sakura cerrou as pálpebras e sentiu os polegares acariciarem-lhe o queixo. Sasuke aproximou-se e roçou o corpo no dela.
— Abrace-me, querida.
Ela o abraçou, e ele retribuiu, apertando-a como se fossem fundir-se.
De repente, as portas foram abertas de encontro a eles.
Ambos se afastaram e depararam com o rosto horrorizado do mordomo.
— Milorde. Milady. Perdão! . Muito vermelho, ele saiu correndo.
Sakura e Sasuke entreolharam-se e romperam em risadas.
— Ele deve ter pensado que se tratava do lacaio com a criada, vindos do matagal — Sasuke considerou, rindo. — Bem, isso favorecerá nossa reputação como casal romântico,
Sakura notou a paixão no olhar do marido e, ainda assim, elee se controlava. Ainda bem. -Alguém teria de manter o barco a tona, ou então eles haveriam de naufragar.
Apesar disso, Sakura ansiava por estar de novo nos braços de Sasuke.
O marquês segurou a porta aberta e esperou a esposa entrar. Passaram pelo hall e pela sala de estar. Ele apanhou o lampião e carregou-o escada acima. Formou-se um círculo de luz que os envolveu, como se estivem sozinhos dentro dele.
Sakura imaginou que Sasuke a acompanharia para terminarem a loucura que haviam iniciado. E, ao mesmo tempo que se apavorara, era atraída pelo desconhecido.
Uma coisa era certa: tudo teria de ser resolvido logo. Impossível continuar vivendo por mais tempo com a lâmina do machado apontada para sua testa.
Sasuke entrou nos aposentos dela, deixou a lamparina sobre uma mesa lateral e a encarou.
— Minha querida, está apavorada de novo. — Sasuke meneou a cabeça. — Pode ser uma tolice de minha parte, mas quando eu a amar, quero toda aquela fúria de quem me chamou de babuíno.
Ele caminhou até a porta e voltou-se.
— Se quiser tentar, poderei ser seduzido de outra forma.
Se soubesse como agir!, Sakura lamentou. Teve de limitar-se a vê-lo sair, depois de fitá-la com ardor.
Ela largou-se na cama e admitiu que o marido estava certo. Na noite do casamento, Sasuke a chamara de pássaro ferido e, embora os dias passados no País do Vento tivessem sido de recuperação, ainda sentia chagas no espírito.
Já não mais temia o marido, mas não conseguiria tornar a chama-lo de babuíno. Se fosse aquela Sakura que ele desejava, teria de esperar mais um pouco.
Não poderia desapontá-lo.
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