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História A Missão - Conflito


Escrita por: jaimencanto

Notas do Autor


Primeiramente, mil desculpas pelo atraso. Como algumas devem saber, estive viajando e fui tonta o suficiente para esquecer de enviar os tópicos dessa fic por email (sim, eu escrevo me baseando nos tópicos que faço, para facilitar), e como eu já havia começado a escrever o capítulo, não quis arriscar escrever um novo e deixar de colocar os detalhes necessários. Espero que gostem.

Capítulo 6 - Conflito


               Lety saiu da delegacia e respirou profundamente. Tinha passado quase uma hora inteira com um suspeito de assalto à joalherias. O homem havia negado o tempo inteiro que ele era o ladrão, até Letícia conseguir fazer com que ele confessasse em uma conversa “amigável”, apenas os dois. Todos admiravam o poder que ela tinha de arrancar qualquer coisa das pessoas, e por isso era considerada uma das melhores policiais para negociações e confissões.

- Oi! – Fernando se aproximou dela com dois cafés em suas mãos, entregando um deles à Lety. – Como foi?

- Cansativo. – Ela respondeu pegando o café, tomando um gole dele. – Obrigada, estava precisando.

- Ele é realmente o assaltante que estávamos procurando?

- Sim.

- Por que eu não estou surpreso por você ter conseguido mais isso? – Ele sorriu orgulhoso.

- Acredite, eu não queria ter essa facilidade. Isso é realmente cansativo. – Ela riu.

- Mas eu estou muito orgulhoso de você. – Fernando deu um passo à frente. – Se não estivéssemos em trabalho, eu te beijaria agora mesmo.

- Talvez não tenha ninguém olhando. – Ela disse divertida.

- Jantar hoje à noite? Por minha conta. – Ele sorriu.

- Eu adoraria. Sua esposa merece.

- E muito.

- Não vai me obrigar a bater continência mais, não é? Agora eu não preciso mais disso porque estamos na mesma altura. – Ela brincou e Fernando riu.

- Isso é uma calúnia, Letícia Mendiola. Eu nunca obriguei você a bater continência para mim.

- É verdade. Mas se quiser... Posso usar isso em outra ocasião. – Disse provocativa.

- Não me provoque, Lety. Sabe que ainda temos muito trabalho até a hora do jantar...

- Me desculpe, é que não posso evitar. Por falar nisso... O que teremos para o cardápio?

- Isso será uma surpresa.

- É injusto.

               Fernando sorriu.

- Bom... Tudo bem. – Ela tocou no ombro dele. – Podemos voltar ao trabalho, já que não posso agarrar o meu marido no meio da rua por que senão seríamos demitidos por justa causa?

- Podemos.

- Vou tentar me concentrar pensando na lasanha que você fará mais tarde.

- Não é uma lasanha, é uma macarronada.

               Letícia sorriu divertida e Fernando bateu na própria testa.

- Me esqueci que sou casado com uma manipuladora. Acabei de estragar a surpresa.

- Não sou manipuladora, sou uma profissional.

               Ela sorriu vitoriosa e caminhou até a viatura, deixando Fernando completamente desnorteado e ansioso para que pudesse ficar à sós com sua esposa.

 

 

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LETY

 

               Entrei na delegacia e todos os policiais me olharam curiosos. Talvez me conhecessem por estarmos trabalhando juntos no caso, mas obviamente não sabiam o que eu estava fazendo ali.

- Boa noite. – Me aproximei da mesa em que um deles estava.

- Posso ajudar? – Ele perguntou me olhando com desdém.

               Peguei o meu distintivo e mostrei à ele, que imediatamente se levantou e levou uma das mãos à testa, batendo continência.

- Ouvi dizer que estão com dois caras do caso sigiloso...

               Pareceu uma besteira dizer daquela maneira, já que o caso era sigiloso e eu não deveria saber de absolutamente nada.

- Sim, mas... Ninguém tem permissão de falar com eles ainda. Ordens do chefe.

- Entendo. Acontece que houve uma mudança de planos de ultima hora, e eu fiquei encarregada de interrogar um deles.

- Qual deles?

Droga. Eu não sei qual deles.

- O de cabelo... Curto. – Tentei a sorte.

- O pior deles. – O policial bufou. – Deu trabalho, e custou sossegar. Só ficava gritando que pagaríamos por isso e que ele não ficaria muito tempo preso, que seus parceiros o tirariam da cadeia.

- Posso imaginar. Bom... Se não se importar, eu preciso interrogá-lo e...

- Desculpe, mas vou precisar falar com o chefe primeiro. – Ele tirou o seu rádio da cintura e estava prestes a usá-lo, quando eu rapidamente bati a mão à mesa, impedindo-o de fazer isso.

               Ele e seu parceiro que estava próximo à ele me olharam assustados, e eu tive que pensar rapidamente antes que fosse descoberta e Rodriguez ficasse furioso.

- Ele disse para não incomodá-lo. – Falei tentando parecer preocupada. – Sabem como ele fica quando está nervoso? Louco! Ele desconta em todos que vêem pela frente. E o ultimo policial que se comunicou com ele nessas circunstâncias, foi demitido, rebaixado, e agora está trabalhando em uma loja de rosquinhas.

               Os dois se olharam.

- Ele realmente fica uma fera, e precisavam ver como ele repetiu mil vezes: “Padilha, vá até a delegacia e interrogue um dos homens! Não me faça repetir, e não quero que ninguém me incomode enquanto não terminar essa tarefa!”. – Tentei imitar sua voz grave de uma maneira frustrante, mas que fez os dois policiais rirem. - Mas, se quiser falar com ele, tente a sorte... Ele só vai dizer a mesma coisa que disse à vocês.

               Novamente eles se olharam, e o policial tirou a mão do seu rádio.

- Tudo bem. Eu vou te levar até a cela em que ele está.

- Obrigada. – Sorri satisfeita.

               Adentramos a delegacia e as celas estavam curiosamente vazias, menos duas delas, com uma distancia grande entre as duas.

- É esse aqui. – O policial parou em frente à uma das celas, onde o homem estava sentado mais ao fundo de cabeça baixa. - Quer que eu faça companhia ou...?

- Não, eu consigo me virar. – Sorri. – Obrigada.

- Se precisar de algo...

               O policial se afastou e eu me aproximei da cela, encarando o homem.

- Seja o que for que tenha vindo fazer aqui, perdeu o seu tempo. – Ele disse de cabeça ainda baixa.

- Só quero fazer algumas perguntas.

- E quem te iludiu dizendo que eu iria respondê-las?

- Eu sei que você vai respondê-las.

               Ele ergueu a cabeça e me olhou, sorrindo logo depois.

- Eu sei quem é você. Estou devendo um tiro na perna do seu namoradinho. Mas do que isso importa, não é? Logo vocês todos vão morrer.

- Ele não é meu namorado. – Falei rapidamente.

- Sei. – Ele riu debochado. – Eu vi vocês dois abraçados quando eu estava na viatura.

- Então também viu o momento que eu roubei a arma dele. – Falei decidida e ele me encarou por alguns minutos.

- O que é que você quer?

- Quero um acordo.

- Acordo? – Ele se levantou, aproximando-se da grade. Continuei firme, sem dar um passo sequer. – E quem disse que faço acordo com policiais, principalmente que estão do lado do governo?

- Porque eu estou do seu lado.

               O homem gargalhou na minha cara, debochadamente.

- Você é engraçada, moça. Poderia ser comediante, já que não parece ser uma boa policial.

- Joseph e eu já combinamos tudo.

               Ele parou de rir, me olhando.

- Eu aceitei ajudá-lo e continuar infiltrada entre os policiais.

- Você acha que eu sou idiota para acreditar nisso?

- Eles me humilharam. – Falei tentando parecer extremamente irritada. – Me humilharam dizendo que não sou boa o suficiente para ser uma policial. Eles sempre me disseram que não sou capaz de conquistar nada.

- Bom... Pelo visto não estavam tão errados. Você não vai conseguir me fazer falar nada com esse teatrinho.

- Pense como quiser. Eu vim para te tirar daqui.

               Ele ficou em silencio.

- Vim à mando das pessoas que estão do seu lado, porque confiaram em mim para que eu me arriscasse e conseguisse tirá-lo daqui.

- Você está mentindo.

               Mostrei as chaves que estavam em minha mão, e ele tentou pegá-las por entre as grades, mas fui mais rápida e dei um passo atrás.

- Eu não posso fazer isso se não tiver certeza de que você não os traiu.

- É claro que não os traí! Eu estou nessa porcaria há três dias e tudo o que eu fiz foi morder a minha própria língua!

- Isso não é o suficiente. Eles querem que você prove que não os traiu.

- Diga à eles que teremos o tempo que quisermos, porque esses idiotas não vão conseguir achar a arma antes usarmos ela.

 - Tem razão, mas isso ainda não é suficiente. Precisa me dizer o local.

- Está de brincadeira? – Ele riu. – Eu não confio em você!

- Então não posso te ajudar.

- Você realmente está me achando com cara de palhaço, não é? Acha que pode vim aqui, depois que eu vi que você é uma policial, e pensar que vou simplesmente entregar tudo à você? Acha que eu sou tão idiota assim? Você se acha forte e esperta só porque está aí do outro lado, e eu estou preso aqui. Mas quando eu sair daqui e quando o governo for o culpado por todas as mortes, farei questão de rir da sua cara! Isso se voce não estiver entre os mortos. Você e o seu namoradinho.

               Continuei em silencio.

- O que foi? Ficou sem palavras? – Ele riu. – Pensou que poderia vir aqui e eu te entregaria tudo de bandeja, não é? Seus amigos têm razão. Você não merece ser uma policial, porque não é esperta o suficiente para isso. E eu não sou idiota como você pensa.

               Respirei fundo e guardei as chaves em meu bolso.

- Você quem sabe. Perdeu a oportunidade de assistir a queda do governo de camarote. – Falei dando alguns passos para trás. – E só para você saber, eu não estou mentindo. Já sei que a arma será usada no topo da igreja, de onde dá para ver a cidade inteira.

               Ele gargalhou ainda mais.

- Está vendo como é idiota? A arma não será usada na igreja, e sim durante a festa da cidade, no terraço da biblioteca.

               Depois que percebeu que havia revelado o local para mim, seu sorriso diminuiu e ele me olhou tenso.

- Obrigada pela sua ajuda. – Sorri vitoriosa. – E só para você saber, aquele policial não é o meu namoradinho, é o meu marido. E eu tenho sim muito orgulho da minha profissão, e não sou apenas esperta. Eu sou melhor do que isso. – Me afastei. – Ah... E você realmente não é idiota como eu pensei. É ainda mais. – Acenei para ele. – Espero que comece a pedir desculpas, porque se eu estiver no seu julgamento, farei questão de acenar quando derem sua sentença.

               Ele continuou me encarando, sem acreditar que tinha sido tão idiota. Caminhei pelo corredor e quando passei em uma das celas, um homem estava escorado à parede, de braços cruzados. Eu não ia parar para olhá-lo, principalmente porque sabia que ele estava do lado deles e que provavelmente tinha escutado toda a conversa. Mas, foi impossível não ouvir sua voz ecoar por todo o corredor quando eu estava me afastando:

- Comemore a vitória agora, porque em breve não poderá mais fazer isso.

               Não costumo me sentir abatida ou ofendida com as coisas que os prisioneiros me dizem. Em todos os anos de profissão, tive que ouvir muitas ofensas e revoltas, e aprendi a ignorá-las. Mas, aquela realmente mexeu comigo, não porque ele estava me ameaçando, mas porque pela primeira vez pensei “e se não formos capaz de acabar com isso?”.

- E então? – O policial me olhou, interrompendo meus pensamentos.

- Ah... Está feito. Consegui o que eu queria. – Falei um pouco perdida.

- Que bom! Tomara que isso acabe logo. Senhor Joseph com certeza não gostaria de ver a cidade em que ele nasceu sendo destruída com sua própria arma.

               Parei de andar e o olhei.

- O que?

- O cara que construiu a arma, ele...

- Eu sei quem ele é. – Falei um pouco eufórica. – Mas o que você disse sobre a cidade?

- Ah... Ele nasceu e cresceu aqui. Dizem que ele sempre foi muito inteligente, mas as pessoas não davam nada por ele. Não acreditavam que ele fosse capaz de fazer tantas coisas. E quando ele se mudou para fazer faculdade e crescer no mundo lá fora, ficou bem famoso por aqui. Teve muitos comentários quando ele voltou, foi difícil abafarmos os boatos. Por sorte ninguém sabe do que está acontecendo.

               Eu não sabia o que dizer. Tinha sido pega de surpresa por aquela notícia, e com certeza Fernando e Marcela também ficariam de queixo caído quando eu dissesse à eles.

- Não gosto de admitir isso, mas estou com medo do que pode acontecer. – Ele olhou para o seu colega, que balançou a cabeça concordando. – Nunca tivemos que participar de nada assim. É assustador. Principalmente quando tudo está prestes a acontecer em uma cidade tão calma.

- Eu... Preciso ir. – Falei colocando as chaves em cima da mesa.

- Espera. Quando foi que eu te dei...?

               Não esperei ele terminar sua pergunta, e saí às pressas da delegacia. Precisava falar com Fernando o mais rápido possível.

 

 

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FERNANDO

 

 

- Está vendo ela? – Perguntei um pouco mais alto para que Marcela conseguisse me ouvir.

               Não esperávamos que a “festa” que Lety mencionou fosse um evento tão importante, já que parecia que toda a cidade estava reunida e concentrada na praça. A banda tocava na rua e as pessoas comemoravam. Estava difícil conseguir encontrar Lety no meio de toda aquela gente, e principalmente, estava difícil mantermos o nosso disfarce. Algo poderia acontecer à qualquer momento, e tínhamos que estar preparados para isso.

- Droga. Não estou vendo! – Marcela murmurou impaciente.

               Olhávamos em nossa volta, mas nem sinal de Letícia. Além de procurá-la, eu tinha que me preocupar se ela estava bem, se não tinham descoberto o seu plano maluco, e principalmente se não estávamos sendo vigiados. Crianças corriam em volta da praça soltando “bombinhas” e à todo momento Marcela e eu nos assustávamos. Eu já estava ficando ainda mais tenso no meio de tantas pessoas, até que senti alguém puxar minha camisa. Me virei assustado, e por pouco não saquei minha arma, acabando com todo o disfarce. Quando vi Letícia em minha frente, parecendo tão tensa quanto Marcela e eu, não pensei em mais nada a não ser puxá-la para um abraço. Eu estava aliviado por seu plano maluco ter dado certo e por ela estar bem.

- Eu estava preocupado. – Falei enquanto a abraçava.

- Eu estou bem. – Ela retribuiu o abraço.

- Letícia, como é que você...?

- Depois. – Ela separou do abraço e Marcela nos olhou. – Não temos tempo. Precisamos ir até a biblioteca. – Ela olhou em volta, certificando-se de que ninguém estava ouvindo.

- Biblioteca? – Perguntei.

- Sim. Ela está lá. Mas precisamos ser cautelosos. Ela deve estar muito bem protegida.

- Mas como você...?

- Eu explicarei tudo depois. Agora precisamos ir. Mas... Temos um problema.

- Qual? – Marcela perguntou.

- Vi Rodriguez e alguns policiais por aqui. Devem estar procurando por algo suspeito.

- Se algum deles nos ver, estaremos perdidos!

- Tudo bem, então faremos o seguinte. Nós...

- Iremos nos separar. – Letícia me interrompeu.

- O que? Não. Não era o que eu ia dizer.

- Não podemos nos arriscar e irmos os três para lá.

- Mas também não sabemos a periculosidade da situação. Se nos separarmos ficaremos mais fracos diante deles.

               Lety ficou pensativa, assim como Marcela e eu.

- Eu tive uma idéia. – Marcela disse. – Mas vocês não irão gostar muito.

- Qual? – Perguntamos em uníssono.

- Já que sabemos o local da arma... Eu levarei os policiais até lá. Chamarei reforço.

- Mas e se Rodriguez ficar furioso e te tirar do caso também? Aí sim estaremos perdidos.

- Só saberemos disso se tentarmos. Além do mais, Fernando tem razão. Não sabemos se apenas nós três vamos conseguir lidar com isso.

               Letícia e eu nos olhamos.

- Tudo bem. – Ela concordou por fim. – Fernando e eu vamos para a biblioteca, e você chama o reforço.

- Certo.

- Aqui... – Lety entregou o rádio à ela. – Vamos nos comunicando.

- Tudo bem. Vejo vocês em alguns minutos.

               Marcela virou-se, mas antes de sumir no meio da multidão, voltou a olhar para nós dois.

- Tomem cuidado.

               Olhei para Lety e ela sorriu. Um momento propício para que as duas enfim fizessem as pazes, mesmo que eu tenha tentado fazer isso durante vários meses que trabalhamos juntos.

- É melhor irmos. – Lety me olhou.

- Espera. – Segurei em seu braço e ela me olhou. – Por favor, tome cuidado.

- Eu estarei com você.

- Não sou um super herói, Lety.

- É claro que é.

               Ela sorriu, e só Deus sabe o quanto eu quis abraçá-la naquele momento e fechar os olhos por um instante, imaginando que estávamos em nosso apartamento, sentados no sofá, discutindo qual filme assistiríamos naquele fim de tarde. Eu daria tudo para que Lety e eu estivéssemos a sós, e principalmente que ela estivesse em proteção. Eu não me preocupava comigo, mas por conhecê-la tão bem e saber que ela não tinha medo de nada, minha preocupação era inteiramente com ela.

- Vamos? – Lety continuou a me olhar.

               Balancei a cabeça assentindo e juntos passamos por toda a multidão, caminhando em direção à biblioteca. Eu costumava ficar empolgado com esse tipo de trabalho. Costumava gostar de imaginar o que estaria me esperando. Gostava de cobrar de mim mais do que eu precisaria fazer. Mas, naquelas circunstâncias, eu seria um tolo se dissesse que não estava com medo. Não estava lidando com apenas um ou dois bandidos. Não estava lidando com um assalto à uma joalheria e nem mesmo com um delinqüente que fugiu da prisão. Aquilo era muito mais delicado do que isso, e qualquer passo que déssemos em falso, poderia ser o nosso fim.

- Acha que ela vai conseguir o reforço? – Perguntei à Lety quando paramos à calçada próxima à biblioteca.

- Vai. – Lety suspirou sem me olhar. – Rodriguez vai acreditar nela. E mesmo se não acreditasse, viria até nós dois para nos impedir.

- Tem razão.

- Então... Como vamos fazer? Entraremos juntos ou...?

- Juntos. – Falei rapidamente.

- Certo. – Ela me olhou. – Tome cuidado, está bem?

               Concordei com um maneio de cabeça e entrelacei minha mão à dela.

 

 

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LETY

 

               Não queria demonstrar à Fernando o quanto eu estava com medo por estarmos ali. Assim que entramos à biblioteca, para nossa surpresa, estava tudo calmo. Pela primeira vez pensei que minha atuação na delegacia tinha sido em vão, e que aquele idiota havia me passado a informação errada. Estava tudo calmo demais, e também ainda mais assustador. Era estranho não sabermos o que nos esperava, e ainda pior por sabermos que corríamos risco à cada segundo, e a cada passo que dávamos. Estávamos com as armas em mãos e caminhávamos em silencio pela entrada da biblioteca. Olhamos atentos para cada estante, chequei à mesa da recepção, mas não havia absolutamente ninguém ali além de nós dois.

- Impossível... – Sussurrei para Fernando. – Não deveriam estar esperando que um de nós entrasse aqui? Ou são burros o suficiente para pensarem que jamais descobriríamos?

- Eu ainda não estou confiante. – Ele disse olhando ao redor. – Está tudo calmo demais.

- Deveríamos sair e esperar o reforço?

- Não. – Ele sussurrou ainda mais baixo. – Você sai e espera o reforço.

- Mas e você?

- Eu vou lá pra cima.

- Ficou louco? É lá que provavelmente está a arma. O que vai fazer se...?

- E o que vamos fazer se formos os dois e formos pegos?

- Fernando, eu não vou...

- Lety, você irá me ajudar muito mais se ficar e esperar o reforço. Se Rodriguez ainda estiver furioso achando que é mentira, você diz que eu estou lá em cima e sobe com os policiais.

- Mas e se eles... – Dessa vez eu não fui interrompida, mas não terminei a frase. – Não quero deixar você ir sozinho.

- Eu vou ficar bem.

- Promete?

- Prometo.

               Infelizmente aquela promessa não deveria ter sido feita por ele. Fernando o melhor policial que eu conheci, e tinha certeza que ele conseguiria se virar muito bem. Mas, não estávamos falando de simples missões que estávamos acostumados à fazer, e era isso que me preocupava. Mas, como ele disse, eu seria mais útil se esperasse o reforço, e por fim concordei com aquela idéia. Observei Fernando se afastar em direção à escada e fechei os olhos, rezando para que ele ficasse bem. Se algo acontecesse com Fernando, eu não agüentaria.

 

 

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FERNANDO

 

 

               Minhas mãos estavam suando e por mais que eu não quisesse admitir, estavam tremulas. Estar sozinho deixava tudo ainda mais assustador, e o silencio apenas piorava a situação. Não haviam vozes, não haviam ruídos, não havia absolutamente nada. As únicas coisas que eu conseguia ouvir era a banda da cidade ao longe, comemorando a festa, e o barulho da multidão comemorando. Quando estava quase no fim da escada, de frente à uma porta que dizia “terraço”, me assustei com um barulho estridente. Por pouco pensei que tinha vindo da arma, e que tudo estava perdido, mas fiquei aliviado quando percebi que eram apenas os barulhos dos fogos. Respirei fundo e pensei em arrombar a porta, mas fui mais sensato e toquei à maçaneta, e para a minha surpresa, a porta estava destrancada. A abri com cuidado, apontando a minha arma para frente, mas outra vez não havia nenhum movimento suspeito.

               Pensei por um momento que Lety teria se equivocado, ou que mais uma vez tivéssemos sido vítimas de uma emboscada. Mas, enquanto caminhei pelo terraço, percebi dois homens conversando próximos à sacada. Pensei que fossem apenas os comparsas de Joseph, até perceber que era o próprio, e que não estavam conversando. Ele estava sendo ameaçado.

- Por favor... Não faça isso... – Ele implorava enquanto uma arma estava apontada para ele.

- Me dê bons motivos para não fazer isso. – O homem disse irritado.

- Porque eu não tenho culpa de nada disso.

- Nós já fomos informados que você tem sim culpa nisso. Você tem sorte por eu não poder matá-lo agora mesmo.

               Por um segundo pensei que o homem que ameaçava Joseph poderia ser membro de uma gangue rival, mas que também queria a arma por algum motivo. Continuei afastado, mas observado tudo atentamente, com a minha arma na mão.

- Fernando... – Joseph olhou para mim, e então o homem virou-se imediatamente, apontando a arma para mim.

- Quem é você?

               Abri a boca para respondê-lo, mas tudo aconteceu rápido demais. Joseph tirou uma arma do bolso e atirou nas costas do homem, fazendo-o cair desacordado no chão. Sem saber o que fazer, Joseph pegou a arma dele e tirou as balas, jogando-as no chão. Mesmo assustado e confuso com o que havia acabado de acontecer, continuei apontando minha arma para ele, que sarcasticamente começou a rir.

- Eu sabia que você seria útil, Fernando. – Ele caminhou em minha direção, despreocupado que eu estava apontando uma arma para ele. – Eu tinha certeza de que você seria a pessoa ideal para me ajudar com tudo.

               Eu não fazia idéia do que ele estava me dizendo, mas estava começando a ficar com raiva de sua gargalhada sarcástica.

- Esse idiota estava infiltrado entre os meus homens há muito tempo, e achou que ninguém desconfiaria de nada. Pobrezinho... Era um policial iniciante. De certa forma o designaram para uma missão suicida. Eu só estava esperando o momento certo para conseguir matá-lo, mas você me ajudou com isso, não é?

               Olhei para o homem caído no chão e me senti culpado por isso, embora Joseph por um lado tivesse razão. Se infiltrar entre um grupo tão perigoso como aquele sem a mínima experiência era uma missão suicida.

- Mas confesso que por um instante pensei que as coisas ficariam mais difíceis. – Ele olhou para a arma em sua mão. – Sua esposa é muito esperta, Fernando. E se me permite dizer, muito bonita também. E corajosa. Sabe o quanto é difícil encontrar essas qualidades em uma mulher hoje em dia? – Ele sorriu e me olhou, e eu tive vontade de disparar a arma naquele momento. – Mas no fim tudo deu certo. Você era a pessoa que eu esperava que chegasse até aqui, e meu plano saiu perfeitamente bem. Você foi afastado do caso... Seu amigo foi baleado e você se sentiu extremamente culpado por isso... Sua mente está abalada com tudo isso, não está?

               Fiquei em silencio, apertando a arma em minha mão e me segurando para não dispará-la.

- Eu sei que sim. Você se sente incapaz, não é? Incapaz de para a sua profissão, e para proteger a sua amada.

               A cada vez que ele tocava no nome de Lety, eu sentia a raiva subir em meu corpo. Agüente mais um pouco, Fernando... Agüente mais um pouco.

- E por falar em não conseguir protegê-la... Foi ótima a sua idéia de deixá-la sozinha lá em baixo.

               Eu não entendi sua frase, até ouvir a porta do terraço se abrindo. Imediatamente um homem alto passou por ela, e prendi meu fôlego ao ver que ele puxava Lety pelo braço, com uma faca em seu pescoço. Me senti o pior dos homens naquele momento. Senti meu sangue ferver ainda mais, e por pouco não fiz uma besteira. Mas, quando apontei minha arma novamente para Joseph, ele ergueu as mãos com sua arma em uma delas, em sinal de rendição.

- Você quer me matar? – Ele sorriu. – Pode fazer isso. Mas você não é bom o suficiente para fazer dois disparos ao mesmo tempo, não é? Porque no momento em que você apertar esse gatilho, sua esposa também irá morrer comigo.

               Olhei para Lety e ela prendia o choro. A pior cena que eu já havia visto em toda a minha vida, e a pior sensação que já senti: Ser incapaz.

- Tenho certeza que você não vai querer fazer isso, então... Jogue sua arma no chão, na minha direção. A não ser que queira ver sua esposa morrendo mais rápido.

               Olhei para Joseph e para a arma em minha mão. Eu jamais arriscaria a vida de Lety.

- Eu só largo a arma se você deixar ela ir. – Falei tentando manter a voz firme.

- Imaginei que diria isso. Mas, não. Não temos um trato. Coloque sua arma no chão e chute ela na minha direção, se não quiser que sua esposa tenha um lindo corte no pescoço.

               Suspirei impaciente, sem saber o que fazer. De qualquer maneira, se eu não soltasse a arma as conseqüências poderiam ser muito piores, e eu não tinha forças nem mesmo para pensar nisso. Imediatamente soltei minha arma no chão e a chutei em direção à Joseph. Ele sorriu satisfeito, e acenou para seu comparsa. Por um segundo pensei que ele faria algo com Lety, mas ele a soltou e ela logo correu em minha direção. Foi inexplicável o que senti no momento em que a segurei em meus braços e ela afundou o rosto em meu peito. Ela ainda não estava totalmente a salvo, mas ao menos não tinha uma faca em seu pescoço. Por um segundo pensei que a perderia, e foi o pior segundo da minha vida. Eu não queria soltá-la, e ela também não queria se separar de mim. Continuei abraçado à ela, e Joseph caminhou em nossa direção, brincando com a arma em sua mão.

- Linda cena. – Ele disse olhando para a arma. – Sabe... Por um momento realmente gostei de vocês dois. Sempre tão cúmplices, um ajudando o outro quando preciso. Se querem saber, foram o casal mais apaixonado que já conheci na minha vida. Nem mesmo meus pais eram assim. Não era para menos... Eles se odiavam.

 Ele riu e eu o encarei com raiva.

- Vou sentir muito quando vocês morrerem junto com os outros.

               Joseph seguiu para o outro lado da sacada e só então notei um objeto estranho, de porte médio em cima de uma mesa.

- É linda, não é? – Joseph a olhou. – Essa é a minha maior criação. Modéstia à parte, já tive várias, mas essa é sem sombra de dúvidas a melhor. Quer saber por quê?

               Não o respondi. Estava mais preocupado em arrumar uma maneira de sair dali com Letícia, que ainda estava abraçada à mim, trêmula. Mas, o seu comparsa estava tampando a passagem da porta, e eu notei uma arma em seu bolso. A minha estava longe o suficiente para que eu desistisse da idéia de tentar passar por eles sem que corrêssemos o risco de sermos baleados.

- Tive a idéia de construir um reator há muitos anos atrás. – Joseph continuou seu discurso desnecessário. – Quando esses ratos do governo me tiraram da minha mãe. E sabe por que? Por acharem que ela não era capaz de cuidar de uma criança sozinha. Por culpa do meu pai que a abandonou logo quando eu nasci, ela teve que se sacrificar para me dar uma boa vida. A única coisa que ela conseguiu me dar e que me foi muito útil foram os estudos. – Era notável a raiva em seu tom de voz. – Mas antes que eu pudesse terminar os estudos, eles me tiraram dela. Me levaram para um orfanato, e se quer saber... Eu preferia ter passado fome com minha mãe do que continuar morando naquele lugar. Quando tive idade suficiente para sair do orfanato, voltei à essa cidade de pessoas inúteis, acomodadas... Mas descobri que minha mãe havia falecido tempos depois que me levaram. Faleceu de tristeza.

               Continuei abraçado à Lety, ouvindo sua história em silencio. Isso daria tempo para que Rodriguez chegasse com o reforço, mas eu começava a duvidar se eles realmente chegariam.

- Eu tive ainda mais ódio das leis desse governo. Eu tive ainda mais vontade de fazer com que o governo caísse. Soube de vários grupos que se opunham à ele, e fiz partes de muitos. Já fui preso diversas vezes, até perceber que eu precisaria estar entre eles para conseguir derrubá-lo. E foi então que mudei o meu nome e fiz uma faculdade renomada. Fui eleito o melhor aluno de toda a faculdade diversas vezes, publiquei diversos livros sobre ciência, até finalmente ter sido convidado à fazer parte do governo. Não era como eu imaginei, mas foi ainda melhor do que isso. Foi durante um grande conflito. Ficaram preocupados que houvesse uma guerra, e pediram para que eu construísse uma arma para eles. Obviamente fiz diversos estudos e pesquisas, até conseguir inventar essa arma. – Ele suspirou satisfeito. – Uma arma que é capaz de fazer um estrago enorme se usada em mãos erradas, que por ironia, são as próprias mãos do criador. – Ele riu e virou-se para nós dois. – Em poucos segundos essa arma será ativada, e em exatos trinta minutos toda essa cidade vai para os ares.

               Senti o meu corpo se arrepiar e Lety se agarrou ainda mais à mim.

- Quem diria que juntando energia eu conseguiria produzir uma arma tão potente, não é? – Ele continuou a rir. – Devem estar se perguntando por que estou perdendo o meu tempo dizendo tudo isso à vocês ao invés de matá-los de uma vez, não é? – Ele se aproximou. – É que gosto de dizer aos outros o quanto eu sou inteligente.

               No mesmo instante, vários homens começaram a passar pela porta, postando-se um ao lado do outro. Não tive tempo de contar quantos eram, mas poderia chutar que ao menos quinze deles estavam ali. Letícia ergueu a cabeça para olhá-los e me olhou preocupada.

- Uma pena vocês estarem sozinhos nessa. – Joseph disse pegando minha arma do chão. – Se querem saber, fiquei até com um pouco de dó. Esperava que os outros policiais viessem atrás de vocês. Preparamos um show maravilhoso para vocês.

               Olhei para Lety e ela balançou a cabeça desapontada. Rodriguez provavelmente não havia acreditado em Marcela e não havia enviado o reforço. Estávamos mesmo sozinhos, e desarmados.

- Para você ver que não sou um cara muito ruim... – Joseph esticou a mão para mim, com a minha arma.

               Fiquei parado, sem saber o que fazer. Só poderia ser uma brincadeira de mau gosto.

- Pegue. – Ele insistiu, e ainda desconfiado peguei a minha arma. – Agora... Boa sorte para enfrentar todos eles. Ao menos não terei que matá-los... Como eu disse... Realmente gostei de vocês. – Ele deu alguns passos para trás e no mesmo instante todos os homens tiraram as armas do bolso.

               Me preparei para empurrar Letícia em direção à mesa para que ela pudesse se esconder, mas fui surpreendido quando vários policiais entraram disparando contra os comparsas de Joseph, inclusive Marcela e Rodriguez. De repente uma enorme correria começou, e rapidamente puxei Lety para nos escondermos, atrás de uma pilastra.

- Toma. Fique com ela. – Falei colocando minha arma em sua mão.

- O que? Não! E você?

- Eu dou um jeito!

- Fernando!

               Não tive tempo de dizer mais nada. Deixei Lety atrás da pilastra e corri até um dos capangas que estava desacordado no chão, pegando sua arma, em tempo de retribuir um disparo que por pouco não pegou em meu braço.

 

 

 

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LETY

 

               Tudo estava acontecendo rápido demais. O terraço que antes estava praticamente vazio, agora estava repleto de policiais e comparsas, atirando um contra o outro. Procurei por Fernando entre eles e percebi que havia acabado de atirar contra um deles, e sorri satisfeita. Marcela estava próxima à mim, mas estava ocupada demais para me notar ali. Me preparei para ajudar os outros, mas percebi que Joseph estava assustado, afastado de todos. Ninguém notou que ele ainda estava armado, e sozinho. Respirei fundo e criei coragem para sair correndo entre eles, correndo o risco de ser atingida. Consegui atravessar até o outro lado do terraço e me aproximar de Joseph, que estava assustado demais para fazer qualquer coisa.

- Largue a sua arma! – Gritei apontando a minha arma para ele.

               Assustado, ele me olhou e ergueu as mãos, mas não soltou a arma.

- LARGUE A ARMA! – Repeti.

               Joseph colocou sua arma sobre a mesa, mas me olhou sorrindo. Não entendi por que ele estava sorrindo, e me preparei para ir até ele, até que ele apertou algo no objeto sobre a mesa fazendo-o produzir uma luz ofuscante, que chamou a atenção de muitos que estavam próximos a nós dois. Meus olhos lacrimejaram com a luz forte, e por alguns segundos fechei meus olhos, sem soltar a arma. Assim que me acostumei com aquela claridade, abri os olhos e vi que Joseph estava com sua arma em mãos novamente, ainda sorrindo.

- Agora em apenas trinta minutos essa cidade pacata irá para os ares! E a culpa será toda do governo!

               Continuei com a arma apontada para ele, e aquela sua falsa aparência de um idoso bondoso e indefeso desapareceu de minha mente. Tive raiva daquele homem, e por pouco não apertei o gatilho e atirei contra ele.

- Lety! Não faça isso!

               Era a voz de Rodriguez. Voltei minha atenção para ele, e só então percebi que eu não poderia deixar a raiva me dominar. Mas então, tudo aconteceu rápido demais. Quando voltei minha atenção para Joseph ele continuava sorrindo satisfeito, e vi quando Rodriguez começou a correr em nossa direção. Olhei para Marcela e ela tinha acabado de se livrar de um dos comparsas, e olhou em minha direção, com uma feição assustada.

- LETY!

               Ouvi ela gritar e então tudo pareceu confuso demais. Me preparei para procurar por Fernando quando ouvi a voz de Joseph sair em câmera lenta:

- Uma pena eu ter que fazer isso, eu realmente admirava você.

               O tempo em que Joseph apertou o gatilho e eu percebi que estava em sua mira foi como um flash. Eu já podia sentir a dor da bala atravessando em meu corpo, mas senti um impacto forte contra meu corpo. Bati as costas no chão e percebi que tinha sido empurrada por alguém. Só então tudo voltou à velocidade normal, e pude ouvir claramente o  grito de Marcela logo depois do disparo da arma. Quando enfim voltei à realidade, vi Fernando caído em minha frente, com a mão no peito ensangüentado. 


Notas Finais


E então, o que acharam? Pode estar um pouco confuso, mas se quiserem, podem perguntar à vontade. Esse é provavelmente o penúltimo ou antepenúltimo capítulo, porque como eu disse, será uma fic de temporadas, e não pretendo colocar vários capítulos nela. De qualquer maneira, essa terá um "fim" e um epílogo, não se preocupem.


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