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História A moment like this - Capítulo dois.


Escrita por: Raaven

Notas do Autor


Obrigada a todos que comentaram e favoritaram a estória.
Espero que gostem!

Capítulo 3 - Capítulo dois.


19h12 Hora da Costa Leste - 00h12 Hora de Greenwich

Os alto-falantes anunciam que um passageiro vai perder o voo, e Regina vislumbra a possibilidade de também perder o seu. Como se a garota pudesse ler sua mente, lança um olhar sobre ela só para ter certeza de que ainda está lá. Regina está feliz por ter companhia, mesmo que seja inusitada.

Elas passam por várias janelas que dão vista para o asfalto no qual os aviões estão alinhados como carros em um desfile. Seu coração acelera quando se lembra de que, em breve, vai ter que entrar num deles. De todos os lugares apertados do mundo, de todos os cantos, buracos e quinas, nada a assusta mais que um avião.

Aconteceu pela primeira vez no ano anterior. Era uma preocupação que dava vertigens, fazia o coração bater acelerado e o estômago se revirar de pânico. Num banheiro de hotel em Aspen, enquanto a neve caía rápida e pesada lá fora, e o pai falava ao telefone no cômodo ao lado, Regina teve a sensação de que as paredes estavam cada vez mais próximas, esmagando-a com a certeza inabalável de uma geleira. Ficou onde estava e tentou respirar com calma. Seu coração batia tão alto que nem dava para ouvir a voz abafada do pai do outro lado da parede.

— Isso — disse ele —, e teremos mais 15 centímetros hoje à noite, então amanhã vai estar tudo perfeito.

Estavam em Aspen havia dois dias, esforçando-se ao máximo para fingir que aquelas férias eram iguais às outras. Acordavam cedo e iam para as montanhas antes que ficassem lotadas; sentavam-se lado a lado na cabana com as canecas de chocolate quente; jogavam jogos de tabuleiro à noite na frente da lareira. No entanto, a verdade é que passaram tanto tempo não falando sobre a falta da mãe que era a única coisa na qual conseguiam pensar.

Além disso, Regina não era idiota. As pessoas não vão para Oxford para dar aula de poesia durante um semestre e, de repente, decidem que querem se divorciar sem motivo algum. E mesmo que a mãe de Regina não tivesse falado nada sobre isso — na verdade, ela estava evitando falar sobre o pai —, a filha sabia que a razão devia ser outra mulher.

Havia planejado tirar a limpo a história durante a viagem à estação de esqui.

Queria sair do avião e já apontar para ele, indagando por que não voltou mais para casa. Porém, teve um choque quando saiu da área restrita onde ficam as esteiras com malas; o pai, que a esperava, havia mudado muito. Seus cabelos castanhos haviam crescido consideravelmente e possuia um sorriso tão largo que dava para ver toda a gengiva. Não se viam fazia apenas seis meses, mas ele já se tornara quase um estranho. Ela só o reconheceu de novo quando se abraçaram. O cheiro de cigarro e da loção pós-barba, e a voz grave dizendo que sentira saudades eram muito familiares. Por algum motivo, isso foi ainda pior. No final das contas, não são as mudanças que partem o coração, e sim esse quê de familiaridade.

 Ela não teve coragem e passou os dois primeiros dias tentando ler o rosto do pai como um mapa, procurando por pistas que pudessem explicar por que sua pequena família se despedaçou de repente. Quando ele foi para a Inglaterra no outono anterior, todos estavam super felizes. Até então, ele era um professor sem muito prestígio numa universidade de Connecticut, assim o convite para ir para Oxford — que tinha um dos melhores departamentos de literatura do mundo — foi irresistível. No entanto, Regina ia começar o segundo ano do ensino médio e sua mãe não tinha como abandonar a lojinha de papéis de parede por quatro meses, então decidiram ficar em casa até o Natal e, depois, passar duas semanas passeando pela Inglaterra; a família toda voltaria para casa junta.

Isso obviamente não aconteceu.

Cora, a mãe de Regina, simplesmente anunciou que os planos haviam mudado e que passariam o Natal na casa dos avós no Maine. Regina suspeitou que o pai apareceria de surpresa, mas a noite do Natal chegou e só havia vovó e vovô, e uma quantidade de presentes suficiente para confirmar que estavam tentando compensar a falta de alguma coisa.

Havia dias que Regina escutava conversas tensas ao telefone entre seus pais e ouvia o som do choro da mãe por meio do sistema de ventilação da casa velha. No entanto, a mãe só anunciou a separação e a notícia de que o pai ficaria em Oxford mais um semestre durante a viagem de carro, voltando do Maine.

— Por enquanto vamos só ficar separados — disse a mãe.

Ela desviou o olhar da estrada para Regina, que estava estática no assento, absorvendo a notícia aos poucos — primeiro, seus pais iriam se divorciar; depois, seu pai não iria mais voltar.

 — Já tem um oceano entre vocês — respondeu. — Dá para ficar mais separado que isso?

— Legalmente — disse a mãe com um suspiro. — Vamos nos separar legalmente.

— Vocês não precisam se encontrar antes de decidir uma coisa dessas?

— Filha — disse a mãe tirando uma das mãos do volante para fazer carinho no joelho de Regina. — Acho que a decisão já foi tomada.

Dois meses depois, lá estava Regina no banheiro do quarto de hotel em Aspen, segurando a escova de dente e ouvindo o pai conversar no cômodo ao lado. Achou que fosse sua mãe checando se estava tudo bem, chegou até a ficar feliz, mas aí ouviu o pai dizendo um nome — Belle — antes de baixar o tom de voz de novo.

— Não, tudo bem — disse ele —, ela está no toalete.

Regina sentiu o corpo gelado; ficou se perguntando em que momento o pai havia se tornado uma pessoa que diz “toalete”, que conversa com gente estranha em telefones de hotel, que leva a filha para esquiar como se fosse fazer diferença, como uma promessa, e aí volta para sua nova vida como se nada tivesse acontecido. Respirou fundo, sentindo os pés frios no chão de ladrilhos.

— Eu sei — disse ele com voz suave. — Estou com saudades também, amor.

É claro, pensou Regina fechando os olhos. É claro.

Regina tinha razão, mas isso não fez com que a situação ficasse melhor. Sentiu uma ponta de ressentimento. Era como um caroço de pêssego, uma coisa pequena, dura e má, uma amargura que certamente nunca se dissolveria. Afastou-se da porta, sentindo a garganta apertada e o peito doendo. Viu no espelho que seu rosto estava ficando vermelho, e a visão ficou embaçada por causa do calor. Apertou as bordas da pia até as juntas ficarem brancas e se forçou a esperar o pai sair do telefone.

— O que houve? — perguntou, quando ela finalmente saiu do banheiro, passou por ele sem dizer nada e se jogou em uma das camas. — Está tudo bem?

— Tudo — respondeu Regina.

O mesmo aconteceu no outro dia.

 Na manhã seguinte, estavam descendo de elevador para o saguão — ela já sentia calor por causa das roupas de esqui — e, depois de um solavanco, ficaram presos. Eram as únicas pessoas lá dentro. Trocaram um olhar vazio até que o pai apertou o botão de emergência.

— Droga de elevador.

Regina olhou para ele.

 — Você não quis dizer merda de elevador?

— O quê?

— Nada — murmurou ela e começou a apertar todos os botões, acendendo um por um, enquanto o pânico aumentava.

— Acho que não vai adiantar fazer isso... — disse o pai até perceber que alguma coisa parecia errada. — Você está bem?

 Regina puxou a gola da jaqueta de esqui e abriu o casaco.

— Não — respondeu com o coração batendo forte.— Sim. Não sei. Quero sair daqui.

 — Eles já vão chegar — disse —, não podemos fazer nada até...

— Não, pai, agora — respondeu um tanto fora de controle.

Era a primeira vez que o chamava de pai desde que haviam chegado a Aspen; até então, estava evitando chamá-lo de qualquer coisa.

O pai olhou em volta do pequeno elevador.

— Você está tendo um ataque de pânico? — perguntou preocupado. — Já teve isso? Sua mãe...

Regina balançou a cabeça. Não sabia o que estava acontecendo; só sabia que tinha que sair dali naquele instante.

— Eles vão chegar daqui a pouco, está bem? — disse o pai, segurando-a pelos ombros para que ela o encarasse. — Olhe para mim. Não pense neste lugar.

— Tá bem — murmurou, rangendo os dentes.

— Muito bem — respondeu. — Pense em outro lugar. Um lugar aberto.

Ela tentou se acalmar e pensar em alguma coisa branda, mas o cérebro não cooperava. Estava quente e não dava para se concentrar.

— Finja que está na praia — disse ele —, ou no céu! Pense no céu, está bem? Pense em como é grande, como não dá para ver seu fim.

Regina fechou os olhos e se forçou a pensar nisso, no azul vasto e infinito manchado por algumas nuvens. Com uma profundidade, um tamanho tão exagerado, que era impossível saber onde terminava. Sentiu o coração desacelerar, a respiração ficar mais calma e relaxou as mãos. Quando abriu os olhos de novo, o rosto do pai estava diante do seu, com os olhos arregalados de preocupação. Ficaram se olhando pelo que pareceu uma eternidade, e Regina percebeu que era a primeira vez que se permitia olhar nos olhos do pai desde que se encontraram.

 Depois de alguns instantes, o elevador se moveu. Ela respirou fundo. Ficaram em silêncio, ambos sensibilizados e ansiosos para sair do hotel e admirar o azul infinito do céu.

Agora, no meio do terminal lotado, Regina tem que parar de olhar para a janela e para os aviões enfileirados como se fossem de brinquedo. Sente uma pontada no estômago de novo; o único momento em que imaginar o céu não ajuda é quando você está a trinta mil pés de altura e o único caminho que pode percorrer é para baixo.

A garota ainda está esperando por ela, segurando a mala. Sorri quando Regina finalmente se aproxima. Vira no corredor, que está lotado, e Regina tem que se apressar para acompanhá-la. Está tão concentrada em seguir sua jaqueta vermelha que quase tromba com ela quando param. A garota é um pouco mais alta que ela, e tem que inclinar a cabeça para falar.

— Nem perguntei aonde você está indo.

— Londres — responde, e a garota ri.

— Não, quis dizer agora. Aonde está indo agora?

— Ah — diz Regina, passando a mão sobre a testa. — Na verdade, não sei. Jantar, talvez? Só não queria ficar lá para sempre.

Não é verdade; estava indo ao banheiro, mas não teve coragem de dizer isso. Não queria que a garota ficasse lhe esperando.

— Ok — diz, olhando para ela. Seu cabelo loiro cobria uma parte de seu rosto. Regina nota que ela tem uma covinha na bochecha quando ri, o que produz um efeito estranho de fofura, mas também de alguma coisa torta. — Aonde, então?

Regina fica na ponta dos pés e se vira para dar uma olhada nas opções: uma coleção sem graça de balcões vendendo pizza e hambúrguer. Não tem certeza se a garota também vai comer, e essa possibilidade faz com que a decisão fique difícil; dá para sentir que a garota está esperando. Seu corpo está tenso e ela tenta decidir qual opção vai lhe trazer menos chances de ficar toda suja de comida, caso ela decida ir junto.

Depois de uma eternidade, ela aponta para uma delicatessen ali perto. A garota sai andando na direção da loja com determinação, carregando a mala vermelha. Chegando lá, põe novamente a bolsa no ombro e dá uma olhada no menu.

 — Boa ideia — diz — a comida do avião vai ser bem ruim.

 — Para onde você vai? — pergunta Regina quando entram na fila.

— Para Londres também.

 — É mesmo? Qual assento?

A garota coloca a mão no bolso de trás do jeans e pega a passagem dobrada no meio com as pontas enrugadas.

— 18C.

— Estou no 18A — diz, e ela sorri.

— Quase lá.

Regina faz sinal com a cabeça para o casaco social que a garota ainda carrega nos ombros.

 — Tem um casamento também?

A garota hesita e depois levanta o queixo em concordância.

 — Eu também — diz ela. — Imagine se for o mesmo!

— Não deve ser — responde, olhando para ela com uma expressão estranha. Ela se sente boba.

É claro que não é o mesmo casamento. Regina não queria que ela achasse que sua impressão de Londres é de uma cidadezinha qualquer na qual todo mundo se conhece. A morena nunca havia saído do país, mas sabe que Londres é enorme; com a pouca experiência que tem, a cidade parece ser grande o suficiente para que duas pessoas nunca se encontrem.

Parece que a garota quer falar alguma coisa, mas se vira e aponta para o menu.

— Já sabe o que quer?

Se eu já sei o que quero?

Regina pensa sobre a pergunta.

 Ela quer ir para casa.

Quer que seu lar volte a ser o que era.

Quer ir para qualquer lugar, menos para o casamento do pai.

Quer estar em qualquer lugar que não seja este aeroporto.

Quer saber o nome da garota desconhecida.

 Depois de certo tempo, olha para a loira.

 — Não sei o que quero — responde. — Ainda estou decidindo.


Notas Finais


Então...é isso. Comentários, elogios, e críticas construtivas são vem vindos haha
Até a próxima.


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