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História A neve e os dragões - A festa


Escrita por: Cronist

Capítulo 3 - A festa


Capítulo 3 – A Festa

Meu pai chegou exausto do trabalho, suspirando quando me viu em casa já ao forno, preparando o jantar.

-boa noite, filho, - ele diz, se jogando na cadeira. – escuta, eu sei que é seu aniversário...

-não precisa se preocupar, pai. Eu não me importo. Comemorei sozinho, comprei um bolo na padaria e um novo jogo na Steam. Não espere me ver fora de casa pelos próximos nove dias. – digo, sorrindo enquanto mexo um molho na panela.

-na verdade, eu chamei a Astrid e alguns amigos dela pra te levar em Beacon Falls. – Beacon Falls era a cidade vizinha, a segunda maior.

Quase derrubo a colher na panela.

-você fez o quê?!

-você precisa sair de casa um pouco, e com toda essa confusão de assassinato, eu quero te ver fora da cidade por um tempo, pelos menos até eu ter certeza de que você não se traumatizou. – ele diz, se ajeitando na cadeira, uma expressão de culpa no rosto. – por favor, Hector. Você precisa sair um pouco, e Astrid prometeu cuidar de você.

-ela não é o problema. – na verdade era, dado o fato de que eu era afim dela desde que cheguei no colégio.

-filho. Por favor. – meu pai diz, seus olhos suplicantes.

Suspiro por um momento, um gesto de desistência que ambos conhecíamos bem.

-ok. – digo. – mas você vai ter que terminar o jantar. E não me espere acordado.

-combinado. – ele diz. – confio em você, e em Astrid. Pegue algum dinheiro no cofrinho. Eles chegam em meia hora.

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“se eu fugir pela janela pra floresta talvez eles achem que eu fui assassinado...” contemplo meus pensamentos enquanto amarro os cadarços da minha bota.

Eu realmente não queria ir para o que quer que Astrid e Cia. Quisessem para a noite, mas eu me comprometera a me divertir, pelo meu pai. Por que eu não podia ser como noventa por cento dos outros adolescentes mundiais, que pensa que o mundo gira em torno do meu umbigo, que nada nunca vai acontecer comigo e que eu sou o rei da cocada preta? Ugh.

A campainha toca, e eu nem preciso ver no olho mágico pra saber quem era. Abro a porta sem muito cuidado pra ver a menina mais obviamente-linda-perfeita-badass do mundo com uma carranca na porta da minha casa, toda vestida com couro preto e o cabelo loiro preso em uma trança.

-nossa, que belo sorriso de boas vindas. – digo, tentando controlar o rubor no meu rosto. – e que perfume bom. O que é, o “Ódio Inerente Dos Deuses Nórdicos”?

-oi pra você também, Hiccup.

-que diabos de apelido é esse? – indago, saindo de casa e trancando a porta. Meu pai está ocupado demais tentando não por fogo na casa pra falar comigo. – oi, a propósito. Pra todo mundo, porque sim eu notei que vocês existem.

-ei, você deveria estar feliz por ter recebido um apelido. Todo mundo do grupinho tem um. – Heather, uma dos gêmeos, diz. – eu sou Cabeçaquente.

-Cabeçadura. – seu irmão diz, cuspindo na calçada.

-Perna-de-peixe. – diz Louis, o único nerd do grupo, provavelmente de estimação.

-vem cá, todo mundo tem um apelido relacionado a alguma a ver com partes do corpo? – indago, indo na direção do carro do gêmeo mais velho, que também era o mais velho do grupo.

-nope. Eu sou Melequento. – diz Garfield, o cara que todo mundo acha que é namorado de Astrid porque não desgruda do pé dela o tempo todo.

-nojento. – é meu único comentário.

-eu sou Dragon Queen. – Astrid diz, me acompanhando sem expressão no rosto.

-apropriado. – murmuro. – que tortura vocês prepararam pra mim hoje, exatamente? – indago, sentando no banco de trás, no cantinho.

-nada demais. – Louis, “perna-de-peixe”, senta do meu lado e põe o cinto de segurança. – só uma caminhada tranquila pela cidade...

-e talvez uma ou duas pichações aqui e ali. – “Cabeçaquente” diz, sorridente.

-não me incluam nessa. – digo, suspirando. – sou bom em sumir, vou logo avisando. Ao menor sinal de perigo à minha integridade física e mental eu sou o primeiro a cair fora.

-nada de pichações. – Astrid diz, sentando logo na minha frente. – prometi ao senhor Stoico que manteria Hector a salvo e fora de problemas.

-ah, fala sé... – “Melequento” tenta, falhando miseravelmente.

-alguma objeção? – ela o corta, a voz baixa e ameaçadora.

-n-não, Rainha. Astrid. Você. Nenhuma. – ele se encolhe no banco ao lado dela.

Se eles namorassem aquela era uma relação bem abusiva. Cabeçadura deu partida no carro, e fomos em direção à cidade vizinha. Para eles, foi uma viagem relativamente tranquila: não batemos em nada, eles riram e conversaram o tempo todo. Pra mim, foi o inferno. Em momento algum a merda do velocímetro ficou abaixo dos 110 Km/h, e como eu não tinha nada pra me distrair, foi por pouco que eu não vomitei de novo.

Já na cidade, o carro diminuiu a velocidade, o que me permitiu respirar. Isso não significa que eu estava a salvo: Cabeçaquente ficou cortando os carros, fazendo ultrapassagens perigosas, passando o sinal vermelho, etc, etc. demorou bastante até que chegássemos na parte baixa da cidade, onde ele finalmente encostou e eu fugi do carro o mais rápido possível.

Como aquele tipo de coisa podia ser saudável pra um adolescente em fase de crescimento?

Estávamos em um beco escuro, com algumas lanternas meio queimadas iluminando parcamente o trecho visível do caminho até uma porta de ferro pichada e selada. De dentro, uma música relativamente alta tocava, nada que chamasse muita atenção por entre os barulhos naturais de uma cidade grande. Todos ficaram olhando pra mim com certo desprezo enquanto eu tentava sentir as minhas pernas e não vomitar.

-oh merda, eu vou morrer...

-você pensa isso em uma dose diária, né? – perna-de-peixe diz.

-deixa de frescura. – Melequento retruca.

-deixe você de ser mala sem alça. – Astrid diz, me ajudando a ficar em pé. – tudo bem?

-foi mal, não sou a melhor pessoa pra lidar com velocidade... – digo, tentando não depender muito de seu apoio.

-consegue andar?

-affe, deixa de frescura! – dessa vez é Cabeçadura quem fala.

-ok, eu consigo andar. – digo, soltando os braços de Astrid do meu. – onde exatamente estamos?

-no Underworld. – perna-de-peixe diz, um pouco assustado. – um dos poucos clubes dessa cidade que não é entupido de drogas e prostituição.

-bem sem graça, na minha opinião. – diz Cabeçaquente. – afinal, qual a diversão sem uma boa viagem?

Astrid lhe lança um olhar assassino que até me fez ficar quieto.

-como eu já disse, prometi ao seu pai que você iria se divertir e não chegar em casa com um membro a menos, ou, sei lá, uma orelha.

-eu não tenho complexo de Van Gogh. – digo, meio magoado, agora já andando normalmente.

-todos temos complexo de Van Gogó lá no fundo, baixote. – Cabeçadura diz, pondo o braço no meu ombro como se fôssemos velhos amigos. – as coloridinhas só nos ajudam a descobrir isso.

-Van Gogh, tenha mais respeito com o nome de um dos maiores pintores que já existiram na história da humanidade, sim? – digo. – e obrigado por não tentar me matar. – digo para Astrid, nem me importando em tentar tirar o braço de Cabeçadura do meu ombro.

-não fiz mais do que a minha obrigação. – ela diz, abrindo a porta.

Lá dentro, após pagar as entradas e conseguir passar pelos seguranças, não era o meu ambiente favorito: cheio de pessoas, quente demais, luzes negras e em neon no teto que me deixavam com ânsia de vômito só de tentar encarar, bebida rolando pra lá e pra cá, e por aí vai. Apesar disso, eu juro que tentei me divertir: tocaram algumas músicas que eu conhecia e não abominava por completo, eu consegui (depois de muito procurar) achar uma bebida não alcoólica pra matar a sede, e encontrar um lugar onde a música não ensurdecia pra sentar e me aquietar. Terminei com uma latinha de Coca-Cola na mão, sentado na última cadeira do bar do clube, grudado na parede, com os olhos grudados no meu celular e tentando não chamar muita atenção.

Depois de uma meia hora nisso, observando Astrid dançar as músicas eletrônicas com certo desinteresse, eu começo a sentir o mesmo enjoo que senti pela manhã. Minha cabeça começa a girar, eu perco completamente o senso de equilíbrio e se eu já não estivesse sentado eu juro que teria caído.

Nesse meio tempo, um cara sentou na cadeira ao lado da minha, de frente pra mim de acordo com a minha perspectiva.

Já era a segunda vez no dia que um tipo estranho vinha me abordar em um lugar isolado. O universo estava conspirando contra mim.

Mas o meu aniversário mal estava começando.

Ele era realmente estranho: devia ter uns vinte e cinco ou vinte e seis anos, estava vestindo uma camisa cinza com jeans e uma jaqueta de couro preta, era alto, muito alto, mais magro que modelo feminina, cabelo preto, usava óculos escuros (sim, num clube, de noite) e – eu não sabia se era natural ou eram as luzes – a pele era cinza, cinza como se ele tivesse pintado ou algo do tipo.

Ótimo, mais um estranho me abordando novamente enquanto eu passo mal. Rezei pra que ele tivesse simplesmente sentado pra pedir uma bebida, mas como aparentemente o universo estava conspirando contra mim no meu aniversário, após dar uma rápida olhadela para cima do meu celular, ele estava me encarando sem pudor nenhum.

“oh, merda...”

-oi. – ele diz, a voz tão baixa que quase se perdeu na música.

-quinze anos. – digo, me encolhendo (agora sim eu me sentia como tantas meninas indefesas mundo afora) e tentando conter a ânsia de vômito que me acometeu.

Ele arqueia uma sobrancelha, e um sorrisinho surge no canto de sua boca.

-calma. – ele diz. – só ia perguntar se você tá jogando Pokémon Go.

-é. – digo, me encolhendo. – mas não sou muito bom. – essa dor de cabeça é da música ou do enjoo?

-hm. Seu nível de treinador me diz o contrário. – ele diz, dando uma olhadinha na tela do meu celular.

Fecho o aplicativo e me encolho ainda mais.

“Astridpeloamordedeusvemmesalvar...”

-uh...

-Peter, Peter Black. – ele diz, estendendo a mão.

Só olho pra mão dele agora visivelmente encolhido, por cima do celular que eu espremia na minha cara. Ele recolhe a mão ao ver meu medo enquanto e tento fingir que não estou prestes a derramar meu jantar em cima de sua jaqueta de couro.

-acho que uma garantia verbal de que eu não vou te sequestrar não vai adiantar de muita coisa, certo? – ele diz, o sorrisinho voltando pro canto da boca.

-nope. – consigo soltar, prestes a sair correndo para o banheiro.

Ele ri, um barulho curto e sinceramente perturbador que (isso pode ter sido medo ou coincidência) laçou uma onda de ar frio para a minha espinha e uma ova onde enjoo pro meu estômago. Quando ele tira os óculos escuros pra olhar melhor pra mim, seus olhos eram amarelos, e eu devo ter feito uma cara de pânico, porque logo em seguida ele se explicou.

-são lentes. – diz, arqueando uma sobrancelha. – você não me disse seu nome.

-Hiccup. – digo, soltando sem pensar o apelido tosco que Melequento me dera.

Agora foi a vez dele de se surpreender.

-eu quero saber?

-não, não quer. – digo, desviando olhar, tentando não parecer tão assustado ou enjoado quanto eu realmente estava.

Ele sorri, agora abertamente, e eu juro que vi presas afiadas no lugar dos dentes normais por um segundo na boca dele. Talvez tivesse sido só impressão, porque eles eram muito brancos, igual a comercial de pasta de dente.

-ok, Hector, chega de joguinhos. – ele diz, se inclinando pra mim.

Meu coração para e dá um jeito de ir pra minha garganta, eu parei de sentir as minhas pernas (eu paro tanto de sentir as minhas pernas, eu deveria ver isso), meu estômago dá um duplo twist carpado na minha barriga e eu sinto como se estivesse engolindo sapos. A adrenalina começou a correr pelo meu sangue, e por um segundo eu considerei jogar meu celular e a latinha de refrigerante na cara dele e ir agarrar as pernas de Astrid pelo resto da noite. Ele chegou mais perto, os olhos amarelos quedefinitivamente não eram lentes brilhando no escuro.

-aquela foi só a primeira cabeça, baixinho. Avisa pro teu pai que muitos mais vão morrer se ele não deixar de ser um pé no saco tão grande. Avisa pra ele que a ilusão de que Fallen Hills é um lugar seguro vai cair. Nenhum lugar está a salvo de nós. Esse mundo era nosso muito antes de ser de vocês.

É claro que assim que ele se afastou um pouquinho o surto de adrenalina atingiu seu potencial máximo e eu finalmente senti as minhas pernas, esquecendo do enjoo momentaneamente e correndo tão rápido pra fora do lugar que eu me perguntei como eu não derrubei alguém nem tropecei nas escadas pra cima. Depois de correr igual a um louco, eu parei ofegando do lado de fora, a alguns metros do carro, e ao olhar pra lá, meu coração parou de novo e o surto de adrenalina caiu tão rápido que eu fiquei gelado.

Depois do que me pareceu uma eternidade observando aquilo, eu comecei a gritar.

Tinha um corpo mutilado em cima do carro, os membros todos costurados nos lugares errados. O próprio carro estava coberto de sangue, do capô às rodas. E nas janelas, escrito com o sangue do pobre rapaz, as seguintes palavras:

NÓS ESTAMOS VOLTANDO

E eu desmaiei alguns segundos antes de Astrid e os outros em encontrarem inconsciente no estacionamento.

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