Tantos sonhos se espalhando pelos céus, cobrindo o mundo de felicidade, esperança, fé…
Breu revirou os olhos de desgosto. O céu iluminado de areia dourada enchia ainda mais seu peito de ódio. E quanto mais raiva sentia, mais os cavalos que o seguiam pela neve pareciam se agitar. Continuava andando sem jeito pelo chão fofo que prendia seus pés e sua roupa.
Cada vez que parava, os cavalos se afastavam para manter distância segura, temerosos de que Breu os ferisse novamente com a espada de lâmina vermelha que segurava como se fizesse parte de seu braço.
-Animais estúpidos, vão perturbar outro. –disse, mostrando-lhes os dentes pontudos e carcomidos.
Mas eram os seus pesadelos e, por mais medo que agora sentissem dele, precisavam acompanhá-lo. Por isso continuavam a segui-lo a distância, bufando ar quente em suas costas e fazendo ruídos de ameaça. Mas breu sabia que eles não atacariam novamente.
Quanto tempo passara dentro daquele poço, remoendo sua derrota, aprimorando sua raiva entre aqueles malditos pesadelos sórdidos?
“Lembre-se de todo o ódio, Breu. Lembre-se do quanto você odeia. “ a voz esganiçada que parecia patinar na lama ecoava em seus ouvidos.
-Mas que ódio? –sentia como se estivesse caindo há séculos.
“Dos guardiões, é claro.”
-Não foi o suficiente. –e ao redor, os cavalos pesadelos sapateavam em seus medos.
“Dos humanos que não acreditam em você, então.”
-Eles sequer podem me ver... do que ia adiantar?
“Então lembre-se, Breu, do medo.”
Aquela palavra. Medo. E de repente Breu via mil olhos de mil crianças. Caretas contorcidas pelo medo. Uma menininha chorando e pedindo para ser solta. Camas molhadas e gritos de terror noturno. Lágrimas que corriam pelos rostos juvenis.
E os pais… aah, os pais. E Breu começou a sorrir. “O bicho papão não existe.” Ah, atrevidos. Mentindo para suas criancinhas ingênuas, no meio da noite, tentando convencê-las de que não era real… “Você já está muito grandinho pra acreditar nisso”. E alguns irmãos e irmãs mais velhos caçoavam dos mais novos.
E de repente, Breu começou a gargalhar. Os cavalos negros sentiram-se confusos com a falta do sofrimento com o qual haviam se acostumado. E a areia negra ia pulsando ao redor de suas mãos, assumindo um formato laminado, lâmina que cortou-lhe a palma e assumiu o tom do sangue.
Tudo bem então, não tinha problema que dissessem que não existe. Voltaria na noite seguinte. E na próxima. E na próxima. E em todas as noites que fosse preciso. E a descrença dos pais seria seu alicerce de vitória.
-Vocês ACHAM que eu tenho medo de vocês? Vocês PENSAM que eu, de alguma forma temo aos pesadelos? HAHAHA! EU SOU O MEDO!
E Breu interrompeu sua queda enfiando as unhas nas paredes. E um golpe da espada bastou para destruir um cavalo, mantendo os outros em alerta, afastados de si pelo resto de sua escalada.
Parou de caminhar ao chegar à cidade. Havia enfeites de Natal, então deduziu que era Dezembro. Época maldita, tantas luzes por todos os lados, tanta felicidade e harmonia. Fechou os olhos e se lembrou de uma mesa de natal posta. E de uma arvore sem presentes. E de uma cadeira na qual não se sentara em ano algum. Abriu os olhos e proclamou:
-Eu odeio natal!
Dito isso, enfiou sua espada no disjuntor que alimentava as luzes do portal de entrada do lago.
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