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História A Queda - Retorno


Escrita por: NoobsGodoy

Notas do Autor


AGORA VAI

Capítulo 11 - Retorno


O caminho até o supermercado foi tranquilo. Triste, mas tranquilo. É provável que todos os infectados dos quarteirões mais próximos tenham se dirigido para a praça em que estávamos, indo direto a qualquer possível sobrevivente do terceiro grupo. Direto a William e Angelo.... Mal consigo caminhar, tomado pela tristeza. Só de pensar o terrível destino que se abateu sobre eles.... Funguei, tentando sufocar a tristeza. Marcos virou sua cabeça, sem parar de andar:

            – Não há tempo pra isso, rapaz. Pode chorar depois que voltarmos ao estádio. Em frente. – Disse, apertando o passo.

            – Babaca. – Matheus murmurou, andando a meu lado. Seus olhos também estão avermelhados. Merda, isso não tá legal.

            É tão estranho. Isso mal começou e já perdi dois dos meus melhores amigos. Sem sinal de ninguém da minha família, ou qualquer pessoa que eu conheço, a não ser por Matheus, que está na mesma situação que eu. Que merda essa realidade.

            – Supermercado em frente. Temos uma grande avenida, bem exposta. – Informou um dos soldados.

            – Ciente. Andem em silêncio, escondendo-se atrás dos carros. – Marcos ordenou.

O grupo tornou a andar, invadindo a avenida. Esta está tomada por vários carros, num grande engavetamento perto de um semáforo, num cruzamento à direita. Ali jaz tombada uma carreta, atravessada na rua. Junto, um ônibus fretado e vários carros menores completam o acidente. De longe podemos ver os corpos nas ferragens, dilacerados, alguns carbonizados, outros tentando sair das ferragens, berrando com aquela voz demoníaca das criaturas. Afastei o olhar.

– Pra dentro, anda. – Marcos mandou ao chegarmos à fachada do prédio.

O grupo foi entrando no supermercado, ainda aceso pelas luzes no teto. Ao menos a energia ainda não acabou por aqui. As prateleiras não estão completamente cheias, mas dá pra ter algum proveito do que restou.

– Espalhem-se. Peguem apenas o que for necessário. – Instruiu o tal Gomes.

As pessoas se separaram, andando pelo mercado vazio. Eu e Matheus estamos no corredor de enlatados, pegando todo o tipo de comida não perecível que existe. Ervilhas, milho e principalmente atum não vão faltar para nós. Bom, pelo lado positivo, eu gosto de atum. Engraçado eu poder ver algum lado positivo nesse momento.

Nem sei como estou lidando com isso tudo para falar a real. Sempre tento ver o lado positivo das coisas, mas nunca estive numa situação assim. Nunca vivi nada nem remotamente parecido com isso, e o estresse e a pressão psicológica são esmagadores. E estou apenas no segundo dia. Merda, foco!

Um único disparo do lado de fora nos faz estacar, assustados. Isso não é nada bom. Outro tiro, na mesma rua em que estamos, talvez bem na frente do mercado. Lá vamos nós de novo.

– Ah qual é... – Matheus murmurou, fechando sua mochila cheia de enlatados.

– I... isso não é bom. – Eu disse, andando de costas pelo corredor.

– Contato! – Gritou Gomes numa ala próxima e as armas começaram a disparar.

Uma saraivada de tiros explodiu pelo supermercado, retumbando no bairro silencioso. As balas voam por todos os lados, atravessando as prateleiras, atirando ao ar farpas de madeira e pedaços rasgados de produtos sobre elas. Eu e Matheus corremos para os fundos do prédio, indo até o açougue em busca de proteção. Do nada, um infectado aparece à nossa frente, correndo como louco até nós, berrando daquela forma doentia que eles sempre fazem. Sua cabeça explodiu a dois metros de distância de mim, e atrás dele, segurando uma fumegante Magnum 44, está Marcos, o rosto manchado de sangue.

– Escondam-se! – Ele gritou, e voltou para trás, de volta ao outro corredor.

– Aqui! – Matheus me puxou.

Corremos até a bancada de pedra do açougue, quando três infectados vieram com tudo por um dos corredores.

– Mala! – Gritei, apontando a eles.

– Merda, separa! – Matheus disse, empurrando-me.

Perdi o equilíbrio e caí sobre um mostruário de produtos, rolando por cima dele. A pequena mesa não aguentou meu peso e quebrou em vários pedaços, derrubando-me no chão, junto com pedaços ensacados de bacon. Um dos não-mortos avança sobre mim e com a adrenalina no sangue, peguei um pé de madeira da mesa e rolei sobre o piso liso, desviando por um triz da criatura, que se desequilibrou e caiu.

Levantei-me de um pulo, golpeando o monstro no chão, com força contra sua cabeça. O pé da mesa quebrou de imediato e a criatura ainda está viva (mais ou menos), de modo que o chutei bem no ouvido e tornei a correr até o açougue. Pulei por cima da bancada de pedra, caindo do outro lado. O cheiro de carne crua invadiu minhas narinas, e devido à atual situação de canibalismo presente, senti nojo de tudo aquilo pendurado no cômodo ao lado. Levantei-me no exato momento em que um infectado pulou a bancada, caindo a alguns metros de mim.

Ele gritou ao me ver e se levantou de imediato, correndo em minha direção. Peguei o item mais próximo (uma balança) e segurando-a na altura da cabeça da criatura, empurrei o monstro (que dá dentadas contra o objeto) até que ele caiu no chão. Joguei a balança com força em sua cabeça, amassando-a. Observei a criatura (agora morta-morta mesmo) no piso, enquanto o caos ainda se desenrola no resto do supermercado. Do nada, Matheus se joga por cima da bancada, segurando uma vassoura.

– Ai! – Gritou ao cair pesadamente no chão.

Fui até ele, ajudando-o a se levantar.

– A cozinha de um açougue deve ter facas né? – Eu disse e ele fez uma careta de dor.

Corremos para dentro da cozinha, onde vários porcos estão abertos e pendurados pelas patas traseiras. Alguns já dão sinais de podridão.

– Ah, caralho. – Matheus exclamou, cobrindo o nariz com a camiseta.

– Não dá tempo disso. – Eu disse, ao ver dois infectados pulando a bancada.

Caído no chão, há um cutelo de tamanho considerável, já manchado de sangue animal. Peguei-o, sem saber muito bem o que fazer com ele.

– Tá zoando né? – Matheus disse ao me ver segurando a faca.

– Quer derrubar eles na mão?! – Perguntei, apontando às criaturas que avançam correndo.

– Puta merda! – Ele berrou, pulando por cima de uma mesa onde, imagino eu, os açougueiros cortavam os pedaços de carne.

Matheus também pegou uma faca do chão, ainda maior que o cutelo, mas mais fina.

– Espera eles virem. – Eu disse, tenso. Ele acenou positivamente.

As criaturas avançaram correndo até nós e quando pularam, ambos desviamos para o mesmo lado, dando de cara um com o outro. Ge-ni-al. Os monstros pareceram zombar de nós, cercando-nos. Eles avançaram por trás, e de forma estupidamente coordenada, eu e Matheus golpeamos as cabeças das criaturas que pararam de gritar quase ao mesmo tempo, caindo no chão.

– Você quase me beijou! – Ele disse, limpando a boca.

– Porra, deixa esse comentário pra depois! – Exclamei, saindo da cozinha.

Alguns disparos ainda ecoam pelo supermercado, assim como um ou outro grito de infectados e sobreviventes. A chacina nos corredores não deve ter sido nada bonita. De repente, o mundo começou a tremer. O chão sob meus pés vibra de forma intensa e produtos e até prateleiras inteiras sacodem e caem pelo supermercado. Um altíssimo barulho agudo invade o ambiente, ficando cada vez mais alto.

Um estrondo de metal sendo rasgado veio do teto atraindo meu olhar para cima. A laje cai no chão, conforme alguma coisa abre um talho gigante nela. Os pedaços da estrutura começaram a chover e me joguei no chão, cobrindo a cabeça. A poeira do entulho já domina o ambiente, deixando difícil respirar, e o barulho absurdamente alto ajuda a deixar o cenário completamente caótico. Enfiei minha cabeça sob os braços e fechei os olhos, rezando para não ser atingido por um pedaço de concreto.

O som foi ficando mais baixo após alguns segundos, e quando achei que tinha acabado, uma esmagadora onda de pressão atingiu-me, espalhando a poeira e quebrando todos os vidros próximos, além de derrubar (e quebrar) várias fileiras de prateleiras. O som da explosão não demorou a chegar e a claridade de suas chamas conseguiram penetrar até mesmo na densa fumaça cinza dos escombros.

Não sei exatamente quanto tempo fiquei deitado no chão. O que me despertou foi a tosse seca de Matheus vinda da cozinha. Levantei-me, jogando para o lado uma pequena pilha de pedacinhos de concreto. Inspirei profundamente e de cara me arrependi, tossindo dolorosamente. A asfixia causada pela fumaça dos entulhos é desesperadora. Caminhei como pude pela escuridão causada pela poeira, com os sons da estrutura do mercado estalando me assombrando.

– Mala? – Chamei com a foz fraca.

– Aqui... – Ele disse, tossindo outra vez.

Matheus está apoiado numa mesa sobrevivente da queda do teto, descansando sobre ela.

– Que caralho foi isso? – Perguntou quando me aproximei.

– Não tenho ideia. Vamos sair daqui. Não esquece a faca. – Eu disse, avaliando o cutelo que, milagrosamente não ficou danificado (e nem me matou enquanto as coisas despencavam ao meu redor).

A bancada de pedra do açougue está em ruínas, soterrada por entulho. As janelas estão todas quebradas e o prédio, dominado pela fina (mas abundante) poeira cinza geme, ameaçando cair a qualquer momento. A parede que sustenta a fachada do açougue caiu pouco após sairmos dali, levantando mais fumaça e fazendo mais barulho.

– Caralho. – Matheus murmurou alguns passos atrás de mim.

Ele olha para cima, com uma expressão absorta no rosto. Levantei a cabeça e vi o gigantesco rasgo no teto do supermercado, deixando entrar a fina garoa que cai do lado de fora, mas que nem chega ao chão por causa de toda essa poeira. Uma coisa me chamou a atenção alguns metros à frente e fui investigar.

– O que aconteceu? – Matheus perguntou, enquanto eu chutei alguns pedaços de concreto para revelar o estranho brilho que vi.

– Nada bonito. – Murmurei, tirando as pedras.

Debaixo delas está uma grande chapa de metal cinza, bastante amassada. Após um pouco da poeira sair pelas janelas (e pelo imenso rombo no teto), percebi que não é um pedaço de metal da laje, e sim um estabilizador traseiro de um avião. No momento estou pisando num pedaço do que restou de um Boeing, que caiu em algum lugar por perto.

 

*               *               *

Um maldito avião. Os filhos da puta conseguiram derrubar uma porra de um avião, e a julgar pelo tamanho do aileron em que estou pisando, não é um pequeno. Talvez um 737 da Boeing. Como isso é possível? Corri até a fachada em ruínas do supermercado. A fumaça negra se eleva centenas de metros ao céu. De longe podemos ouvir o crepitar do fogo. Imagino que sem bombeiros, ele só tende a se espalhar com o tempo.

– O que você... Porra! – Matheus disse ao ver a cena.

Uma explosão levantou uma imensa bola de fogo no horizonte e pedaços cadentes de ferro e concreto vieram zunindo em nossa direção.

– Corre! – Berrei, puxando-o de volta aos escombros do supermercado.

Pedaços em chamas do motor caíram pela área, explodindo na queda. Nenhum deles chegou perto o bastante para nos ferir, mas por pouco. Muito pouco.

– Tudo bem? – Perguntei.

– Não caralho! – Matheus exclamou. – Olha essa merda! O que aconteceu? – Gritou, transtornado.

Por um momento temi que sua voz alterada fosse chamar a atenção de infectados, porém imagino que com a queda desse avião, todo e qualquer infectado daqui até Atibaia deve estar se dirigindo até nós. Precisamos correr.

– Merda, nem você tá bem. – Ele disse, apontando à mim.

Uma mancha de sangue suja minha camisa, no flanco esquerdo. Levantei a roupa, assustado. O ferimento é superficial, um corte não muito grande na lateral, mas agora que vi, dói. E bastante.

– Não é nada. – Eu disse, arrumando a camisa.

– É claro que é! Se você pegar um tétano agora, fudeu!

– E vamos fazer o quê? Olha essa merda, a gente tem que sair daqui o quanto antes. Isso vai chamar muita atenção.

– Pra onde vamos, de volta pro estádio?

– É um começo. Mas tem os infectados que atacaram o outro grupo... E se nós chegarmos naquela praça e encontrarmos...

– Não fala – Matheus cortou – Não precisamos pensar nisso. A gente vai por outro lugar.

Concordei com a cabeça, ainda com o terrível pensamento em mente, quando um grito de ajuda ecoou pela rua. Uma mulher de uns 40 anos, que imagino ser de um dos grupos, vem correndo até nós, a expressão em puro desespero. É, talvez a queda de um avião possa causar um pouco de desespero.

Um estouro seco varreu friamente o ambiente. A expressão da mulher se transformou de pânico para dor e confusão. Ela caiu de cara no chão de forma violenta, sem se mexer mais. Atrás dela, está um soldado que também fazia parte dos grupos. Em suas mãos, está uma M4, que imagino estar fumegante. Nada bom.

– Senhor, mais dois! – O homem gritou.

De trás de uma esquina próxima, outra silhueta apareceu, segurando um familiar e gigantesco revólver.

– Não há sobreviventes. – A voz de Marcos ecoou à distância.

– Mas senhor...

– Eu faço se você não quiser. – Marcos cortou o soldado e apontou a arma contra nós.

– Ei, mas o quê... – Mala começou, quando um grito o interrompeu.

Da esquina em frente à Marcos, um infectado apareceu correndo, voando contra outro soldado que estava distraído. A criatura pegou o homem num abraço mortal, levando ambos ao chão numa luta desesperada no chão.

– Tem mais! – Gritou o homem que executara a pobre mulher. – Temos que sair daqui agora!

– De volta pro estádio! – Marcos berrou, retrocedendo.

– Mas e o... – Antes do soldado terminar a frase, o tenente executou com um único tiro o infectado e o soldado no chão. Ele mal virou a cabeça.

Os soldados restantes começaram a correr, levando alguns infectados consigo. Mas nem todos.

– Ok, agora a gente rodou. – Matheus disse, levantando a faca.

– Vamos pensar, calma. – Eu disse, tentando disfarçar o nervosismo.

Outro grito fez meu sangue gelar. Agora eles também estão vindo de trás, numa marcha meio lenta. Talvez saibam que simplesmente não temos por onde fugir. Estamos cercados. Cada vez mais e mais criaturas se aproximam, fechando o cerco. Agora não temos a proteção dos militares, ou do estádio. Estamos em campo aberto completamente vulneráveis. Acabou.

– Dia estranho esse né parça. – Matheus murmurou ao meu lado, nervoso.

Uma única lágrima escapou de seu olho, mas ele se conteve. Dessa vez é real. Vamos morrer e já nos entregamos. A pesada fumaça cinza cobriu a nós dois, impedindo a vista da rua. Mas eu sei que estão lá.

– É... Poderia ser pior. – Eu disse, a voz carregada de emoção.

Nós apertamos as mãos então, prontos para o que quer que viesse a seguir. Venham, seus malditos. Os sons dos infectados ficam mais altos, indicando que se aproximam mais e mais. Levantei o cutelo, ficando de costas para Matheus. A fumaça clareou um pouco, revelando algumas dezenas de infectados rondando pela rua. E para minha surpresa, ao fim da avenida, apareceu derrapando de um cruzamento à toda velocidade, um Ford Fiesta preto.            



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