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História A Rosa Traída - Depression


Escrita por: Isobu

Notas do Autor


Boa leitura!

Capítulo 1 - Depression


Fanfic / Fanfiction A Rosa Traída - Depression

Lucian remexeu-se, a toalha de banho no ombro parecendo mais pesada do que de fato era. Pretendia passar direto pelo corredor, em direção ao banheiro. Entretanto, uma vez mais se viu ali, o coração disparado como se esperasse algo, o fiasco de esperança aos poucos se desvanecendo.

O homem suspirou antes de abrir a porta, a tristeza parecendo tão tangível quanto a maçaneta de metal, da qual girou, entrando no quarto uma vez mais.

Era a quinta vez naquele dia? Perdera as contas havia muito, muito tempo.

O local parecia o mesmo, entretanto, a tristeza de reconhecê-lo aumentava cada dia mais, embora, a lei natural das coisas era que esquecesse gradativamente, seu corpo pensava o contrário. A tristeza, tão profunda e ressonante quanto o abismo negro que pulsava no coração outrora vivo, mas agora, batia unicamente pela maldita biologia. Sentimentalmente falando, seu coração fora estilhaçado a exatos dois meses, treze dias, oito horas e quinze minutos atrás.

Lucian Harris adentrou o local, fechando a porta, o ruído da maneira já um tanto gasta soando em seus ouvidos, voltando os olhos para o vestíbulo, embora parecesse o mesmo, a cada vez que olhava, sentia o coração contrair, aquele fiasco de esperança de que estava apenas vivenciando um pesadelo, do qual, buscava desesperadamente acordar.

O local parecia o mesmo, os móveis de madeiras recicladas eram simples, embora bastante bonitos, a cama de dorcel continuava intacta, o lençol perolado impecável, os travesseiros com fronhas negras de cetim, o cheiro... Aquele cheiro o fez sentir os olhos marejarem, a visão embaçada fazendo com que a efígie se reintegrasse em sua cabeça, como um faixo de luz brilhando na escuridão, os cabelos dourados formando uma auréola brilhante em sua cabeça, o rosto era pequeno e delicado, no formato de coração. Os olhos, um tom reverente de castanho-claro, brilhantes como âmbar, tão perpicazes e felizes, como sempre estavam.

Não importava o que acontecesse, sua Elisabeth jamais ficava triste. Nem mesmo no leito de morte, cansada e fatigada, o corpo embora débil e cansado pela constante luta contra o câncer, já no limiar das forças, aquele sorriso continuava o mesmo. Inabalável, capaz de mover montanhas, e destruí-las também.

Sua morte fora a demolição de qualquer alicerce que Lucian contruíra durante a longa e sucedida vida de psicólogo. Elizabeth Radock começara como uma simples distração na cansativa vida de universitário, a estudante de Artes era gentil e educada, tão turbulenta quanto uma tartaruga poderia ser, era tudo o que precisava entre complicados trabalhos e apresentações da faculdade. A vida do rapaz na época com vinte e três anos era a sala de aula, e horas exaustivas na biblioteca de Cambridge, com copos de café e um mufin blueberry.

Conhecera a mulher entre os vário corredores de Shakespeare ou Dickens, apaixonada por romances clássicos, Beth fora inicialmente uma ótima colega nas horas vagas, muitas vezes ajudando-o com as atividades, e Lucian a guiando nos trabalhos extra-curriculares. E foi então que veio os cafés, cinemas... Quando ele viu, já estava amando aquela voz calma e doce, a risada tímida e discreta. A inteligênica notória, embora ela tentasse inutilmente mascará-la; era uma ativista de carteirinha, vegetariana e supervisora de causas sociais. Não havia como não adorá-la, e mais rápido do que lembrava, já se via apaixonado.

Do namoro para o casamento não passava de um borrão, fora um espaço de tempo curto, não mais do que dois anos. Sabia que havia encontrado a mulher de sua vida.

Só desconhecia o fato de que a perderia de uma forma tão trágica.

Lembrava que o casório fora pouco tempo depois de ambos estarem formados, viviam bem na casa que até hoje ele residia, Lucian ocupado com o trabalho em um renomado hospital inglês, e Beth fazendo o orçamento para montar a própria galeria de arte, estavam felizes, ocupados, mas felizes.

Os treze anos de casados passaram rapidamente. Não havia brigas, Lucian sempre fora por natureza calmo e um bom ouvinte, sua Beth, a mulher mais compreensível e dedicada que conhecera durante toda a vida. Já planejavam uma viagem de descanso, peos mares oceânicos, quando um estranho nódulo abaixo do braço esquerdo da mulher apareceu, Lucian, preocupado, contactara um médico especialista amigo, com o qual a mulher consultou.

O diagnóstico do câncer de mama fora a queda brutal da vida dos sonhos, a tempestade cruel entre a brisa gentil. O choque fora tamanho, que Lucian lembrava até hoje a expressão séria da mulher ao sair da sala, ele se colocara de pé na sala de recepção segundos depois, preocupado com sua mulher, que tinha o rosto pálido, os lábios sem qualquer cor.

Estou com um nódulo bastante agressivo na mama esquerda, querido, dissera ela, a voz tentando soar calma, mas ele conhecia Elisabeth tempo demais para perceber qualquer tênue mudança na personalidade astral da mulher.

Lucian voltou os olhos para o quarto. O local continuava o mesmo, arrumado e cheio, mas essencialmente bagunçado e vazio. Sentou-se na cadeira de balanço ao lado da cama, o ranger suave, o único barulho perante a solidão inquietante. Queria chorar, mas não conseguia, queria gritar, mas só sabia acolher a solidão.

Passou as mãos pelos cabelos escuros, os fios estavam desgrenhados e sujos, coisa que ficara comum nos últimos meses, as unhas roídas pelo constante nervosismo, a barba por fazer, as roupas amarrotadas... Aquilo o definia agora, não conseguia fazer mais nada, fosse falar ou mesmo se arrumar. O mundo gradativamente desbotara, do craquelado arco-íris para um cinza morto e sem fundo.

Do diagnóstico para o leito hospitalar passara rápido demais. O tumor ficava cada vez mais agressivo, e embora tentasse, aos poucos Beth já não conseguia manter aquele sorriso acolhedor, os mesmos foram trocados por tosses ruidosas, inúmeras dores... O câncer de mama da mulher era invasivo, alastrando as células cancerosas por todo o corpo, destruindo como labaredas, mais rápido do que percebera, Beth trocara a galeria pela cama, os amados livros por remédios. Tentara parecer forte, entretanto, mesmo ele ficara arrasado quando veio a perda dos cabelos, parecia tão errado... Errado demais uma mulher que passara a vida toda ajudando qualquer necessitado, sempre com um sorriso no rosto, compadecer daquela forma com uma doença que em porcentagem mundial, não era a de maior risco.

Lucian se sentira impotente. Ver a mulher definhando sem poder fazer nada, ele, sendo um médico, aquilo estava o acabando. Embora sua especialização fosse a mental, ver Elisabeth daquele jeito, fazia com que a inutilidade corroesse o cérebro. Em pouco mais de cinco meses, sua vida parara, só vivia para a mulher, que inutilmente ainda lutava contra o pior, mas na altura do campeonato, os médicos só não davam o diagnóstico final por respeito a ele.

O homem olhou para a cômoda ao lado da cama, a fina camada de poeira denunciando o tempo que passara, e ele a continuar regredindo naquele pequeno espaço, que ao mesmo tempo que o acalmava, era como respirar veneno. Entretanto, foi o pequeno vaso de vidro que o chamou atenção, onde uma flor, que outrora fora bela e rubra como o sangue, jazia murcha e cinzenta.

Era um contraste e tanto, a flor murcha e praticamente morta, no quarto impecável e lustroso. O tempo passava, e todo mundo acabava seguindo a vida, era a lei natural das coisas, mas Lucian, assim como a rosa, estava definhando a cada dia que passava. Como a planta, que ao longo dos dias morria pela falta de água e os cuidados, ele se sentia vazio, vítreo, sem nenhum motivo para continuar respirando.

Lembrava do dia que lhe dera a rosa, no dia de seu óbito, naquela manhã nublada de quinta-feira, mesmo o céu já parecia chorar com a perda. Ele lembrava que ao costumeiro caminho até o hospital, parara em uma banca, onde as rosas da cor de carmesim chamaram sua atenção, comprara apenas uma, para não agitar a mulher. Quando a entregara, em meio à fios e máquinas ligadas, ele vira a mulher sorrir verdadeiramente em meio a dias de pequenos risos forçados.

As mãos delicadas acariciaram as pétalas, os olhos da cor de âmbar tão brilhantes, que ele podia jurar que nenhuma pedra preciosa podia igualar-se a eles.

Miuito obrigada, querido, dissera ela. Será a primeira de uma enorme estufa que farei na galeria. É linda!

Lucian lembrara que sorrira, a primeira vez também depois de perpétuos meses. Três horas depois, a mulher falecera, por insufiência cardíaca. Jazindo descansada sobre a cama, o rosto da cor de papel, os olhos, da cor de vidro fosco.

O mundo, daquele dia em diante, perdera a cor.

Os dias não voavam, pareciam se arrastar. Respirar já não era mais uma dádiva, mas sim um tormento, a felicidade dos outros, sua própria invídia.

Demorara apenas uma semana para se auto diagnosticar com depressão. Parecia uma piada de mal gosto um psicólogo taxado como um dos melhores da vasta Inglaterra sofrer daquilo que era o motivo de viver tão bem. Contudo, parecia fácil resolver o problema dos outros apenas como um ouvinte, mas era como passar para um jogo 3D, onde invertera os papéis: deixara de ser expectador para personagem principal, a nova dimensão não era nada que já havia estudado em suas milhares de aulas em Cambridge, e torcia para que tudo não passasse de um brincadeira, um sonho ruim.

Ser humano algum merecia viver aquilo.

E somente aquela rosa, mesmo de forma hipotética, podia entender o que ele sentia. Não os amigos, nem mesmo os familiares mais próximos sentiam a devastação total que o acometia. Era um vazio gélido, e que não parecia capaz de ser preenchido. Ele podia reconhecer os diagnósticos sem nenhuma dificuldade, todavia, assim como os vários pacientes que já atendera, não sentia vontade alguma de progredir.

Começara com a anedonia, como os leigos falavam, o desprazer total em qualquer atividade. Não sentia fome, nem sede, nem vontade de movimentar-se, tampouco dialogar. Pedira afastamento do serviço, não sentia interesse algum em sequer receber as condolências, fechara o escritório, e somente não fechava a galeria porque sabia que aquele local era especial demais para a falecida mulher, entretanto, mesmo aquilo de forma alguma o animava.

A mente já não trabalhava mais, como peças de carro morto, as alterações cognitivas o deixavam em um estado quase vegetativo. Vivia à base de soníferos, e o máximo que conseguia dormir eram quatro horas seguidas, e nunca naquele quarto. Jamais nele.

Aquele local era como um templo, tudo estava do jeito que ela deixara. O tempo passava, e a única coisa que ali mudava era a flor, que ainda vivia unicamente por força de vontade.

A rosa, assim como ele, se sentia traída.

Da flor, fora tirada a dádiva de viver; dele, fora usurpado o motivo de ainda caminhar sobre a Terra.

Mas não podia viver daquele jeito para sempre.

Afinal das contas, sobreviver era bem diferente de viver.

Levantou-se da cadeira, o olhar pairando sobre a flor. Lucian pegou o jarro, caminhando até o banheiro do quarto, abriu a torneira da pia, onde deixou o recipiente de vidro molhar, a água caindo como chuvisco sobre a flor. Minutos depois voltara ao quarto, colocando o vaso sobre a cômoda, com um suspiro, virou-se em direção à porta, caminhando rapidamente até o painel de madeira.

Precisava fazer algo, não era mesmo?

Fechando a porta novamente, observou o corredor escuro e silencioso, a respiração soando alta no túnel escuro.

Caminhou vagamente, sem saber exatamente o que iria fazer. Antes de entrar no quarto, iria fazer algo...

Banhar. Sim, claro. Ele iria banhar.


Notas Finais


Gente, isso aqui é um projeto de dois blogs de designers, que eu admiro bastante, e to aqui pra participar do projeto, isso aqui é apenas um projeto meu das horas vagas.
Os dois blogs estão aqui em baixo, podem visitar, ambos são ótimos.

Beautiful Design: http://beautifuldesigners.blogspot.com.br/
Relics Designs: http://relicsdesigns.blogspot.com.br/

Beijos.


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