CINCO ANOS DEPOIS
Pov. Kol
Nos dois primeiros anos estava tudo bem, havia sentimento e cumplicidade. Mas depois disso, desandou totalmente.
Nossos caminhos se separaram, os olhares não se encontraram mais e nenhuma palavra de afeto havia sido proferida desde então, a não ser para nosso pequeno Andrew de três anos.
Havia me casado por aliança com a princesa Davina da Itália, foi uma questão de vida ou morte segundo meu irmão mais velho, se eu não me casasse, ela se casaria com Krum, o príncipe Russo, e os Estados Unidos perderia um grande aliado. Eu me apaixonei por Davina antes mesmo de nos casarmos, ela era divertida, animada e inteligentemente sarcástica, parecia um Kol com um belo par de seios.
Mas certa noite ela não voltou para o quarto, e depois disso nunca mais dormimos juntos, devido ao tratado eu não poderia lhe trair e muito menos ela, por isso, eu não entendia o que havia acontecido para ela ter mudado tão abruptamente. Tentei conversar, tentei lhe tocar, mas ela se desviava com louvor até que eu desistisse.
- É só uma fase. – disse a governanta semana passada.
- Que dura há anos? – perguntei incrédulo.
Davina foi quem me ajudou a superar perdas familiares, e agora me sentia mal em não conseguir superar a dela.
- Seu irmão solicita nossa presença em sua pátria, já tomei a liberdade de arrumar nossas malas, partimos em uma hora. – ela entrou no gabinete dando as informações com seu sotaque carregado enquanto eu a fitava boquiaberto acima do copo de wisky.
- A guerra novamente? – questionei me levantando e abandonando o wisky sobre a escrivaninha.
- Sim, ele tem medo de que a Inglaterra não os apóie, os motivos são bem óbvios. – ela encostou a porta atrás de si.
- Irão precisar das tropas?
- Não, acreditam que se assustarmos eles com as presenças dos chefes aliados, tudo ficará em extrema paz. – como disse, irresistivelmente inteligente.
- Andrew deverá ficar, não podemos o levar para o centro da guerra. – ela concordou – Eu mesmo cuido da babá e de sua guarda, nosso filho nunca ficara nas mãos de qualquer um, principalmente quando estivermos longe.
- Na verdade – ela se aproximou da mesa e falou em tom baixo – Seu irmão acredita que há infiltrados aqui, que querem nos matar durante a viagem, por isso acha melhor que mentimos sobre nossa ida de avião, mas na verdade iremos de carro até o porto e pegar o navio, realmente irá ser mais demorado para chegar, porém é inegavelmente mais seguro.
- Então teremos de levar Andrew! – falei me exaltando, só em pensar na possibilidade de alguém machucar meu primogênito.
- Eu já cuidei disso, fique tranquilo – ela tocou meu braço e eu senti meu corpo se eletrizar – Ficara com Anabela por alguns dias, na casa de campo.
- Sua prima? – perguntei não reconhecendo.
- Sim, ela mesma. – me garantiu e ao perceber que me tocava se afastou – Bem, estarei conferindo as malas se precisar, esteja pronto as dez.
- Estarei. – afirmei.
Nos despedimos brevemente de Andrew e os outros empregados, Davina derramou algumas lágrimas ao olhar o pequeno moreno que corria feito doido pelo quarto, porém não aceitou meu abraço e muito menos aceitou ser conduzida até o carro.
Algumas horas depois e estávamos há um dia do porto que ficava do outro lado da cidade que era realmente muito grande.
- Teremos de parar para dormir, tem algum hotel que prefira? – questionei enquanto tomava um gole de café.
- Não. – respondeu secamente se virando pela vigésima vez para a janela, procurando fugir da conversa.
Parei em um hotel que realmente ficava no meio do nada, achei mais seguro, talvez ninguém nos conhecesse, principalmente porque trocamos de carro e roupas após sair do castelo, parecíamos camponeses que arranjaram um jeito de lucrar. Subimos para o quarto e ela se trancou no banheiro.
- Está com fome? – perguntei em tom alto.
- Não. – respondeu ela no mesmo tom.
Minutos depois quando eu já havia tirado os sapatos e a camisa, Davina apareceu na porta usando um roupão de cetim, parou boquiaberta no vão da porta e me olhou, piscou e fechou a boca.
- Algum problema? – falei em tom provocativo.
- Nenhum. – ela disse se recompondo e passando por mim, indo para a janela fingir que olhava algo lá fora.
- Posso dormir no chão hoje, mas você irá dormir sem cobertores. – avisei já puxando os cobertores.
- Não precisa. – ela falou se virando – Por hoje, não é necessário.
- Quer que eu durma com você? – perguntei já ascendendo minha última esperança.
- Quero que durma na cama. – ela revirou os olhos.
Instantes depois e já estávamos deitados lado a lado, ela parecia querer me martirizar também, pois depois de tirar o roupão, eu me vi deitado com uma mulher irresistível numa camisola curta mais irresistível ainda.
- Onde foi que nos perdemos? – olhei de soslaio para ela, ambos de barriga pra cima.
- O que?
- Onde foi que você deixou de me amar? – mudei a pergunta.
- Você não se lembra não é? – ela virou a cabeça me olhando abismada. – Realmente não se lembra?
- Lembrar do que Davina? – me sentei na cama e ela fez o mesmo, parecia alterada pois seu peito subia e descia com veracidade.
- Uma noite de bebedeira com amigos e você proferiu em alto e bom som que ainda preferia as meretrizes a mim, porque amar não era para você, que você não me amava, que eu era apenas um meio de você conseguir filhos. – ela suspirou – Já estávamos casados há dois anos! E você ainda teve coragem de dizer aquilo, naquela noite algo morreu em mim e você nunca conseguirá recuperar!
- O que? – perguntei me empertigando – Você não pode levar a sério as palavras de um bêbado orgulhoso? Eu estava furioso naquele dia porque meus amigos me chatearam! Davina pelo amor de Deus – fiquei sobre meus joelhos na cama – Não me diga que passamos todo esse tempo separado porque eu disse bobagens, não me diga que eu passei noites em claro me perguntando o que fiz porque eu bebi e disse bobagens?
- As únicas três pessoas que dizem a verdade são as criadas, as com raiva e os bêbados. – ela deitou novamente e virou-se de costas para mim – Kol, acredito que deva dormir no chão, me viro sem cobertores.
- Davina, por favor...
- Kol! – ela se sentou e virou-se para mim, os olhos marejados, aquilo ainda doía nela, percebi que não era só uma bobagem, ela realmente acreditou nas idiotices que havia dito naquela noite e as minhas palavras embriagadas e orgulhosas haviam nos separados de um casamento feliz e de tantos momentos que poderíamos ter compartilhado juntos – Vá para o chão!
- Eu não vou! – ela me lançou um olhar furioso e começou a me estapear, até que ela desistisse e começasse a chorar. – Eu te amo!
- Pare de contar mentiras! – ela falou entre soluços enquanto meus braços circundavam seu corpo.
- Eu juro, nunca acredite em alguém orgulhoso na frente dos amigos, mas se você quiser, eu digo pra quem for: Eu amo você, mesmo depois desses anos separados, eu ainda guardei na memória a garota na qual eu me apaixonei, volte pra mim Davina!
- O que eu mais odeio nisso tudo – ela ergueu a cabeça – É que nem mesmo esse tempo, essa raiva e essa mágoa, me fizeram parar de te amar.
Fiquei em silêncio por muito tempo, tentando digerir, ela ainda me amava! Minha Davina me amava!
Abaixei minha cabeça para ela e toquei seus lábios uma primeira vez, ela fechou os olhos pelo toque, beijei novamente, e de novo, até que as chamas dela também ascendessem como as minhas.
Ficamos ajoelhados sobre a cama, ela tocando meu peitoral de maneira delicada, alisando e passando de leve as unhas que me causavam arrepios enquanto nossas bocas não se desgrudavam. Eu desci as alças de sua camisola e me deparei com apenas uma peça da lingerie, a debaixo. A contemplei por longos segundos antes de sentir seu sabor novamente, ela gemeu meu nome e puxou meus cabelos enquanto eu puxava ainda mais seu corpo para perto de mim, querendo que nossos corpos se fundissem.
E se fundiram entre gemidos, palavras devassas e declarações que eu ansiei por aqueles cansativos três anos.
- Essa noite foi um grande erro! – ela terminou de se vestir e antes de sair do quarto se virou para mim – E eu não te perdoei se quer saber. – bateu a porta com força.
Não havíamos sequer dormido, após alguns segundos onde eu estava a contemplando em meus braços, ela se levantou num sobressalto e começou a praguejar dizendo que éramos para ir agora, ela não ficaria nem mais um minuto no mesmo quarto que eu.
Quando descia as escadas, ela já estava na porta, e pelo jeito havia pagado a conta.
- Eu te amo Davina! – gritei do alto da escada e todos me olharam.
- Cale a boca! – ela disse envergonhada.
- Te amo, mil vezes te amo! Se quiser eu bebo para você saber que eu te amo de verdade! – ela me deu as costas e saiu correndo para o carro – Um lindo dia não acha? – disse rindo para a recepcionista.
- É. – ela confirmou franzindo a testa enquanto me entregava a chave do carro.
Quando entrei no carro, parecia que nevava e ela não me olhou por pelo menos uma hora.
- Linda, porque está assim depois da... daquilo maravilhoso que fizemos?
- Não me chame assim nunca mais. – ela me fulminou com o olhar.
- Você gostou ontem à noite. – disse provocador.
- A noite passada foi um erro, um grande erro, um catastrófico erro.
- Sabe que pode ter um irmãozinho de Andrew ai dentro não é? – coloquei a mão em sua barriga e ele me estapeou, estava começando a recuperar minha antiga Davina.
- Cale a boca e dirija Kol, não quero que isso dure mais que o necessário. – ela passou a mão pela testa fazendo círculos com os dedos, provavelmente não havia pensado na possibilidade de ter mais um filho.
- Davina...
- Maldita hora que eu me casei com você. – ela suspirou.
- Maldita hora que eu te amei. – rebati e olhei sua expressão, ela ruborizou, sorriu e censurou seu sorriso, depois olhou para a janela.
Alguns minutos depois a chuva reiniciou e já era madrugada.
- Está falando sério? – perguntou enquanto eu prestava atenção nas vacas quase cobertas pela escuridão no pasto onde passávamos.
- Que eu te amo? – ela se surpreendeu por eu saber do que ela se referia – Nunca deixei de amar, quando é de verdade, nada apaga.
- Como pode explicar alguém que te ama e odeia ao mesmo tempo? – ela se recostou no banco e suspirou.
- Porque você me ama, e é por isso que me odeia. Faz sentido? – perguntei.
- Talvez. – ela ficou em silêncio e começou a rir.
- O que foi? – perguntei sorrindo.
- A gente brigou mesmo por palavras de um bêbado orgulhoso, não pode ser mais piegas e ridículo. – ela se virou para mim – Tenho de admitir que não me arrependo de hoje, foi muito... esclarecedor.
- Estava com saudade de você. – falei lhe fitando.
- Também estava. – trocamos um olhar de intensidade que só foi interrompido por um grito de Davina. – Kol cuidado!
Me virei para frente e havia alguém na pista, puxei o volante rapidamente e ele deu dois giros na pista antes de cair na ribanceira.
Gritos, choro, vidros estilhaçados e o carro sendo esmagado por pedras.
E logo depois parou na grama que ficava lá embaixo, vi Davina inconsciente e a tirei do carro o mais rápido que pude, o cheiro de gasolina e a fumaça indicavam que haveria uma explosão, eu sentia meu corpo inteiro dolorido e sequer sentia que poderia realmente move-lo, mas eu o fiz por ela.
Quando a tirei longe o suficiente do carro, eu me joguei no chão e senti sangue escorrendo por minha boca, nariz, ouvido e testa, como se não obtivesse mais lugares onde não estivesse saindo sangue. Fechei meus olhos na tentativa de ignorar a dor, e só me senti pior.
- Kol! – alguém se levantou ao meu lado – Meu amor você está bem? Kol você está sangrando muito! Ai meu Deus! Como vou pedir ajuda estamos no meio do nada!
- Fique quieta Davina – falei baixo – Você estava desmaiada...
- E você me tirou de lá – ela deitou a cabeça em meu peito – Meu herói... – falou com meiguice, mas eu sabia que estava vendo meus batimentos – Você tem de resistir!
- Você me chamou de meu amor... – observei contemplando as estrelas no céu.
- Meu amor. – repetiu me olhando e tentando secar meu rosto com a roupa que rasgou, tentava sem sucesso estancar o sangue.
- Eu não consigo mais Davina, sinto muito. – porque o céu parecia querer me sugar? – Eu amo você e Andrew, nunca deixe isso cair no esquecimento.
- Eu vou achar ajuda, você não vai morrer! – ela falou determinada apesar de estar se debulhando em lágrimas.
- Um dia a gente se encontra. – sorri sentindo meu corpo levitar.
- Não Kol! Kol! Não! Não! Meu amor! Volta! Volta pra mim! – ela me chacoalhou e me abraçou, chorou tanto que eu sequer pude olhar muito, meu corpo estava lá, mas eu olhava de cima. - Eu te perdoo meu amor, mas volta pra mim!
No mesmo instante que eu estava ali, ouvi o carro explodindo e Davina soltar um soluço, ela não largou meu corpo até que o sol amanhecesse, e não parava de dizer que me amava.
Eu queria dizer que a amava também.
Que eu sempre amei.
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