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História A Terra do Céu Cinza - As Montanhas de Rick


Escrita por: gabbyxx

Capítulo 11 - As Montanhas de Rick


Fanfic / Fanfiction A Terra do Céu Cinza - As Montanhas de Rick

“E, querido amor, você não desejava ser livre? Eu não posso continuar fingindo que nem te conheço e que em uma noite doce você é só meu. Pegue minha mão (…) Eu sonhei por muito tempo, mas eu não posso mais sonhar”.

Anywhere, EVANESCENCE

 

Não sei bem onde estou. Mas talvez isso não seja tão importante agora, porque o que importava no momento é que eu estava viva. Impressionantemente eu sobrevivi e precisava voltar a ação, eu tinha que cumprir minha missão e trazer esse mundo cinza de volta aos seus eixos.

Estava deitada em um colchonete, no que parecia ser o chão de uma barraca, eu sentia cheiro de flores e de grama, a luz machucava meus olhos. O lugar era realmente muito claro e até onde eu sei parecia ser uma manhã de sol em algum descampado distante. Eu logo soube: eu só podia estar sonhando ainda.

Sentei-me no colchonete e respirei fundo. Eu não sabia o que fazer porque não sabia onde eu estava.

A barraca era simples, comum, não muito grande, mas também eu não chegava a sentir claustrofobia dentro dela, era como barracas de ir acampar que conhecia do meu mundo. Percebi então que eu não estava com dor, olhei meus braços para ver se estavam com alguma sequela do ataque da bruxa, mas não havia nada, estavam apenas um pouco arranhados, mas eu não estava mais tão machucada. Misteriosamente eu havia me curado da noite pro dia, eu sentia como se tivesse dormido por semanas e então tivesse acordado completamente recuperada, pois eram poucos os vestígios em meu corpo da sangrenta batalha no labirinto contra minha bruxa professora de português.

Levei a mão a minha cabeça, ela estava doendo um pouco, noto que ela estava enfaixada e isso faz com que uma careta surja em meu rosto. “Eu não preciso disso, eu estou bem” é o que penso, antes de retirá-la.

Resolvo me levantar depois de alguns minutos de preguiça. A barraca era grande suficiente para que eu ficasse de pé dentro dela. Ao me livrar das cobertas do colchonete notei que não estava mais com minhas roupas rasgadas e ensanguentadas. Eu usava uma blusa branca de botões, parecia ser de garoto, principalmente pelo o fato de que ela ficava enorme em mim, usava uma calça jeans clara, ela ficava muito grande, então resolvi dobrar as barras. Eu estava descalça e não encontrei sinal do meu All Star ou de qualquer uma de minhas roupas por ali.

Resolvi que não ia ficar parada, se estou viva, posso lutar, não posso perder tempo mesmo nessa terra onde o agora é eterno eu não posso desperdiçar nem um segundo apenas descansando. Eu quase morri, a bruxa quase havia me matado, o que tenho a temer agora? A morte sem duvida não era uma dessas coisas.

Ao sair da barraca, me deparei com um campo cheio de flores e árvores com frutas, a grama era alta e quase chegava ao meu joelho, o céu estava azul e limpo, haviam poucas nuvens e sol brilhava no alto.

-C-Como isso é possível? Eu morri? –Como ninguém responde, eu mesma dou a resposta de minha pergunta incrédula: -É, eu devo ter morrido.

Ouço uma risada, alguém estava bem ao meu lado. Levo um pequeno susto com o som, mas logo me virei pra ver quem era e me deparei com Rick rindo de minha cara, e rindo mais ainda pelo meu espanto de vê-lo. Ele estava bem melhor do que da ultima vez que eu vi, estava tão tranquilo e com um sorriso quase completamente verdadeiro que quase fazia eu esquecer que o mundo estava caindo no abismo do inferno.

Quase. Em seus olhos eu via preocupação, e eu sabia muito bem que não poderia ignorar a ruína do mundo por muito tempo.

-Não Alex, você não morreu. –Ele disse quase não contendo o riso depois de avaliar-me.

-Pare de rir! –Disse com raiva dele, pra variar ele estava me irritando.

Mas minha advertência de nada adiantou e ele continuou com seus risinhos, só que agora mais tímidos.

-Pare de rir! Que droga! –Digo. -Eu quase morro, e você ri de mim... –Então o encaro e digo: -Onde estamos, Rick? Você pode me responder? Ou é mais uma das coisas que você não quer me contar?

Ele me olhou sorrindo e balançando a cabeça negativamente.

-Ah, é assim, você não vai dizer isso também? –Solto um grunhido de frustração agora realmente irritada com ele. Frustração essa que me dá coragem o suficiente para começar a bater nele, dou tapas e socos em seus braços, mas ele não sente dor, é como se estivesse batendo em uma parede, pois minhas mãos começam a ficar doloridas, e quando eu falo estou soando como uma criança mimada e histérica: -Fale, eu estou cansada disso! Fale!

Então Rick segurou meus braço, de modo que eu fui obrigada a parar bruscamente e quase cair. Eu sou uma anã perto dele e sou fraquinha assim é obvio que ele levaria vantagem sobre mim e se quisesse, poderia me fazer em pedaços se essa fosse sua vontade. Mas não foi isso o que Rick fez, ele olhou bem em meus olhos, sério, nenhum traço de seu sorriso de menos de 20 segundos atrás restava em seu rosto. Por um estante tive medo dele, mas então vi sua expressão mudar, e novamente ele estava sorrindo, isso o divertia. Idiota.

-Você pode parar? –Ele diz, olhando-me de cima eu me sentia ainda mais pequena e frágil perto dele. -Vai acabar se machucando.

-Eu? Me machucando? Mas eu que estou batendo em você! –Digo em protesto, irritada, dou-lhe um ultimo soco frustrado e cruzo os braços, emburrada.

Deus, eu parecia uma criança.

E pela primeira vez o fato de ele ser um ano mais velho me incomodou. Idade não queria dizer nada, na verdade, o problema mesmo era minha aparência, eu era muito baixinha e isso fazia com que parecesse que eu era bem mais nova do que realmente sou. Algumas pessoas já pensaram que eu tinha 12 anos. Mas que merda, eu sou uma piá perto dele.

-Por isso mesmo. -Ele riu.

Fiz uma careta, e me afastei tirando as mãos dele de meus braços de forma rude. Não queria que ele me tocasse, estava irritada, e que droga, eu estava agindo como uma menininha da quarta serie.

-O que você quer Rick?! –Disse rispidamente, não estava a fim de ser gentil.

Ele riu.

-Bom, muitas coisas, e uma delas, é lhe contar coisas que deveria ter contado há muito tempo.

-Você... –Digo apontando pra ele com raiva, meu dedo indicador encosta seu peito de forma acusatória, e eu tento ignorar o detalhe de tocá-lo quando finalmente processo o que ele tinha dito de verdade. –Espera, o que você disse?

-Eu quis dizer que estou convidando você para dar uma volta por aí comigo. –É o que ele fala, da forma mais natural do mundo. Seu rosto ainda estampa um sorriso maroto, seus dentes são tão brancos que me pergunto se ele fez clareamento ou algo do tipo.

-Você vai o que? –Disse buscando uma confirmação ainda sem acreditar no que ele estava falando, mas sinto uma animação começando a surgir dentro de mim, ao que parece eu finalmente teria todas as minhas perguntas respondidas.

Ele sorriu e me deu a mão um pouco sem jeito, sua mão era enorme perto da minha, mas mesmo ele estando meio inseguro do pequeno ato, ele me passava segurança, como se fosse algo comum entre nós dois.

-Venha Alex, vamos dar uma volta por aí.

Eu sorri, agora havia entendido o que ele queria dizer, uma referência que talvez só eu e ele entendêssemos porque era particular demais para qualquer outro. Eu entendi e pude supor o resto das coisas, eu soube onde estávamos e o que ele iria fazer.

Rick me levaria para dar uma volta na sua mente, não em um simples campo de flores bonito. Ele ia me mostrar tudo aquilo que ele pensava, nós iríamos gastar um pequeno tempo juntos, e mesmo achando que não podia perder tempo, eu me permitir ir com ele, porque eu sabia que valeria a pena.

 

Rick me mostrou muitos lugares nas montanhas. Sim, eram montanhas. Uma pequena região rochosa perto da costa marítima, onde tudo era bonito e ensolarado, onde Rick havia construído seu próprio abrigo, o qual chamou de As Montanhas de Rick. Ele havia criado um refugio só dele, para que pudesse visitá-lo quando quisesse esquecer um pouco a maldade e o egoísmo dos dois mundos que ele conhecia muito bem, um abrigo onde poderia ser ele mesmo e fugir de toda aquela guerra... E agora, ele estava mostrando esse lugar a mim.

Ele disse que trouxe-me para cá porque nessas terras demônios não podem entrar, é solo sagrado, embora nem ele mesmo saiba bem porque.

Depois de caminhar por um longo tempo nos campos, resolvemos nos sentar, então paramos em um lugar onde tinha vista para um grande lago de água cristalina, na outra margem era possível ver montanhas e algumas tinham o pico coberto por neve, mas eu não conseguia vê-las direito, pois eram cobertas por nuvens e estavam muito distantes. O clima nas Montanhas de Rick deveria ser frio, mas na verdade era quente, como no meio da primavera, de modo que era agradável.

Fazia muito tempo que não sentia o sol em minha pele, pois mesmo no meu mundo ele parecia ter se escondido. E o compreendia: talvez de fato fosse difícil ver o egoísmo e a maldade dos homens, dia após dia, desde o inicio dos tempos. Eu particularmente me sentia uma vampira por estar mais branca que o comum mesmo sendo morena, porém, devo admitir que era realmente bom ficar ao sol, a sensação da luz e do calor em minha pele, me lembrava a minha infância na qual em dias quentes sentava-me na calçada ao sol e ficava tendo minhas conversas malucas comigo mesma.

Talvez eu tenha fritado um pouco meu cérebro... Faz sentido. Isso explica em parte porque sou louca e vejo essa maluquice toda.

Virei-me pra Rick interrompendo minhas reflexões e sorrio, porque estava de fato feliz por ele estar ali comigo, mesmo sabendo que isso não fazia sentido nenhum. O que havia de errado comigo? Não havia motivos para sorrir... No entanto eu ficava ali com aquela coisa que eu chamava de sorriso no rosto e com cara de tonta. Estava com uma margarida atrás da orelha que havia colhido em um dos campos ali das Montanhas, as roupas que eu usava eram de Rick e eu as havia dobrado por causa do calor.

-Esse lugar é lindo, Rick. –Digo evitando olhá-lo nos olhos, o êxtase na minha voz já é o suficiente pra que ele saiba que eu estou maravilhada, embora eu ainda não saiba bem o porquê.

Ele dá de ombros, meio indiferente e não dá muita importância para minha observação. Não saberia dizer qual era a expressão, os pensamentos ou os sentimentos dele naquele lugar que parecia deslocado na terra cinza que eu vim a conhecer. Rick sempre era um mistério pra mim, um mistério que talvez eu nunca conseguisse resolver. Uma coisa que nunca conseguiria entender, mesmo que tentasse mil vezes. E mesmo assim eu continuo tentando e tentando, sem nunca conseguir. A razão de continuar com isso eu não sei. Talvez seja como minha tentativa de lutar contra o mundo e meu destino: eu sei que vou perder, mas não posso parar de tentar.

-Eu preciso lhe contar uma coisa. –Ele finalmente diz, sua voz está rouca e soa falha, ele está sendo cuidadoso, como sempre.

Franzo a testa de primeira, mas logo assumo uma expressão despreocupada e apenas digo-lhe:

-Pode me dizer qualquer coisa. –Estou sorrindo, tentando lhe passar segurança.

Ele faz que sim e hesita, como se tentasse encontrar palavras para me dizer-me de uma forma mais fácil.

-Você lembra-se do filho da lua que brigou contra Andrew na noite em que os lobos tentaram invadir os subterrâneos? –Faço que sim, não entendendo onde ele quer chegar. –E lembra-se que ele depois quase atacou você e Sever quando matou aqueles zumbis?

Ele soa distante e entrando em colapso, como se alguma coisa dentro dele estivesse queimando, embora eu não soubesse o que.

-Rick, eu não sei aonde você quer chegar. –É o que eu digo.

-Era eu! –Ele diz alterado em um grito que me faz arregalar os olhos de espanto, nunca o havia visto irritado a esse ponto. –Era eu! Aquele monstro peludo e nojento sedento de sangue era eu, Alex! Eu sou um monstro! –Estou tão em choque que não sei como reagir ou o que lhe dizer, então apenas o ouço continuar falando, ainda aos berros como se algo explodisse dentro dele e transbordasse em seu exterior: -A razão de carregar um espelho de obsidiana comigo é porque todos os dias (todos mesmo!) quando eu acordo preciso lembrar a mim mesmo que eu não sou um monstro. –Ele fecha os olhos e diz em um sussurro abafado, mais pra ele mesmo: -Eu preciso lembrar-me que há alguém por trás de todo aquele ódio. –Ele está diminuindo o tom de voz que antes era agressivo, mas o único que era agredido pelas palavras era ele mesmo. Ele então tira o pedaço do espelho negro que havia me dado de seu bolso e aperta-o com tanta força na sua mão que fico me perguntando como ele não a corta enquanto ele fala: -É curioso, não?

Franzo a testa e digo quase inaudivelmente ainda processando suas ultimas palavras:

-O que?

-O espelho de obsidiana. O mais escuro dos espelhos é aquele que nos mostra a verdade, de modo que mal podemos a ver com clareza. Chega a ser irônico, não? –Diz ele, mais para si mesmo do que para mim. –Mas apenas prova que mesmo quando sabemos a verdade, ainda não vemos tudo que há sobre ela.

Penso em suas palavras tentando compreender o sentido de cada uma delas e é quando encontro os olhos de Rick no reflexo negro do espelho da verdade que tudo começa a fazer um pouco de sentido naquele mundo completamente maluco e caótico. É por isso que eu conheci aquele olhar curioso, é por isso que o lobo parecia conhecer-me e eu não o temia, era por causa disso que todos ficavam fazendo insinuações sobre Rick ter descendências caninas. É claro! Rick era lobisomem! Agora tudo fazia sentido e eu finalmente havia conseguido entender o significado de todas as palavras que ele havia me dito.

-Mas era obvio o tempo todo! –Digo interrompendo suas filosofias momentâneas ocasionadas por sua deprê. –É por isso que você sempre sumia antes do lobo aparecer.

Ele faz que sim, meio indiferente embora eu ainda esteja meio incrédula.

-Nossa, eu sou muito lerda. –Digo mais pra mim mesma. Então me ocorre uma coisa e um meio sorriso surge em meu rosto e quando falo é mais para tentar incomodá-lo e deixá-lo menos sério. –Ei, será que você não gosta de carteiros também?

-O que? –Ele diz em um grito e eu me encolho, pois vejo que ele está irritado, mas não havia sido bem eu que o irritei, mas sim suas próprias reflexões sobre ele mesmo. –Eu lhe digo que eu sou um monstro e você fica zoando minha cara? –Ele quase solta um rosnado, me olha nos olhos procurando algo mais e o que eu encontro em suas palavras é muita dor: -Você não tem ideia das coisas terríveis que eu já fiz, Alex. –Nesse momento é como se a única coisa que cortasse o ar fossem suas palavras, não havia mais som do vento e das árvores dançando, os passarinhos que cantavam ficaram em silencio para ouvir sua trágica história, e quando ele continuou eu senti seus olhos enchendo d’água e o vazio que havia entre uma fala e outro era o mesmo vazio que o preenchia por odiar quem ele era. -Eu matei gente. Gente inocente... Que não tinha nada a ver com essa merda toda.

Rick fecha os olhos e deixa o espelho de obsidiana cair na grama, então fecha seus punhos com tanta força que suas juntas ficam brancas.

Um silencio quase morto nos separa, eu não sei o que dizer, não sei o que pensar, eu apenas junto da grama o espelho de obsidiana e fico ali encarando meu reflexo. Eu estou com um corte no lábio inferior e um hematoma enorme na testa, porém, tirando isso... Estou com uma aparência ótima e completamente recuperada. Era difícil acreditar que algum dia a batalha com a bruxa existiu.

O silencio se arrastava um pouco mais e não sei quanto tempo ele dura, mas sei que quando falo soo assustada, o que era terrivelmente doloroso pra mim e para ele:

-Sever me falou que você trabalhou para Irmandade.

Nesse momento ele volta a me encarar, eu posso ver o ódio queimando dentro de seus olhos, novamente ele está explodindo.

-Sim, eu trabalhei para aqueles demônios! –Ele disse, agora com a cabeça baixa, encarando suas próprias mãos que tremiam muito, era como se pudesse ver novamente a mancha do sangue inocente que ele mesmo derramara. –No inicio... Fora contra a minha vontade... Mas quando eles descobriram que eu era um filho da lua de nascença... Eles quiseram explorar todo o meu “potencial” e me treinaram. Transformaram-me em uma maquina de matar, e o meu ódio por eles ia crescendo a cada dia. –Ele ainda está com os punhos serrados, cada vez mais apertado. –E eu mergulhando em ódio, já que não podia descontar toda minha raiva e frustração neles quem acabava sofrendo com minha ira eram as minhas vitimas... –Rick me encara, eu mal o conheço, porque em seu rosto vejo quem ele era e não quem ele é de fato. -Alex, você faz ideia do que é ter prazer em matar pessoas?

Ele está tremendo de tão nervoso que está, mas em sua voz eu sinto seu arrependimento. Eu não sei o que pensar, não sei o que dizer, pois estou em choque, nunca esperaria isso vindo da parte dele.

–Malditos! Malditos! Todos eles! Eu fui para Ordem procurando um lugar onde eu poderia me redimir, mas eles são tão cruéis quanto a Irmandade e se esqueceram do Deus a quem eles servem! Oh, como eu me arrependo amargamente Alex! –Ele diz e sua dor me parte o coração, mesmo sabendo que ele cometera grandes erros, ele ainda era meu melhor amigo, e eu queria ajudá-lo, mas não fazia ideia do que fazer. –Eu não aguentava mais aquele lugar, e ha um mês quando descobri que há um traidor que trairia o chefe da Irmandade para dentro da Ordem... Isso bastou para eu desistir daquele desprezível lugar, e então comecei a vagar sem rumo por essas terras, me escondendo de ambos os lados, porque ambos querem minha cabeça em uma bandeja... Até que ouvi a noticia de que você, logo você estava aqui... E isso foi o bastante para acreditar que as coisas mudariam e que o vento tomaria outro curso. –Terminou ele olhando-me no fundo dos meus olhos, olhos que apesar de feridos carregavam um punhado tão pequeno de esperança que era difícil dizer se ela realmente existia, mas ela existia e era o suficiente para mantê-lo de pé.

Não tenho muito tempo para pensar nos erros do passado dele e logo decido que eles não importam, pois passado é passado e ele mesmo se arrepende de tudo aquilo que fez e estava tentando concertar isso e ser alguém melhor para ele mesmo, para Deus e para todos. No entanto, não posso ignorar o que ele disse: há um traidor na Ordem do Filho do Homem.

-Espera. –Digo, interrompendo meus próprios pensamentos. –Você disse que há um traidor na Ordem... –Ele faz que sim. -Quem é? –Arrisco perguntar.

-Eu não sei quem é, mas eu sei quem ele colocou pra dentro da Ordem. –Ele diz, os olhos distantes que mais uma vez inesperadamente voltam a encontrar os meus. –Andrew.

Arregalo os olhos e minha boca se abre. Porém, não fico tão surpresa pela conversa que havia ouvido antes entre ele e as três bruxas.

-Mas é claro! Como não percebi antes? –Digo. –Por isso você nunca engoliu a presença dele!

Rick faz que sim e continua:

-Depois que você sumiu... A coisa ficou tensa. Andrew revelou que não estava no fim das contas do nosso lado e murmurou algo sobre um ritual que deveria ser feito no Campo de Punhais e que traria o tempo de volta para a Terra do Céu Cinza. –Ele fez uma pausa, franzindo a testa, tentando colocar ordem na sua cabeça lembrando-se do ocorrido. –Max sabia do que ele estava falando e por isso Andrew levou-o consigo, deixando eu e Sever para sermos mortos pelas três bruxas. –Surgiu então um sorriso em seu rosto. –E foi nessa parte que Paul entrou quebrando tudo com o aerodeslizador. Hayley disse que viu que estávamos com problemas e conseguiu nos localizar, então mandou Paul ir atrás da gente.

Faço que sim compreendendo, eu finalmente estava tendo algumas das respostas que eu desejava, e isso era aliviante.

-Mas como me encontrou? –Perguntei.

Rick cosou sua nuca e disse pensativo:

-Acho que foi puro golpe de sorte Hayley ter conseguido lhe achar... E um golpe de sorte maior ainda ter conseguido me enviar para lá para lhe ajudar... –Ele então me olha nos olhos. –Se bem que você já tinha se virado bem sozinha, só estava um pouco...

-Detonada. –O que era verdade.

-É. –Ele concorda.

Passamos um tempo em silencio apenas nos encarando, olho no olho, cabeças fervendo em mim pensamentos, mas quem fala é novamente ele:

-E então eu te trouxe pra cá. O nome original do lugar é as Montanhas Sagradas, mas eu chamo de as Montanhas de Rick porque sou o único que vem aqui pra fugir do monstro que sou e dos monstros que habitam essa terra. –Ele desvia os olhos, olhando para o céu azul. –É, eu sou um covarde, Alex. É, eu fujo de mim mesmo.

Vê-lo dizer que ele era um covarde me fazia ter vontade de gritar com ele dizendo que não, embora aparentemente fosse verdade que ele estava fugindo daquilo que ele era em seu passado, e era evidente também que ele estava com medo não só de quem ele se tornou, mas também de quem ele se tornaria. E somando tudo isso a maldade dos governantes desse mundo e a ruína em que ele se afunda... Qual é? Qualquer um ia querer apenas jogar tudo pro alto e fugir para um lugar bonito onde não fosse obrigado a lutar por causas falhas.

Eu queria dizer a ele que ele não era um covarde, eu não conseguia ver Rick como um covarde, assim como não conseguia vê-lo como um monstro mesmo com tudo que ele me falou. Rick sempre parecia querer me passar uma ideia sobre ele ser alguém terrível, alguém muito mal que nunca iria mudar. Agora eu começava a entender, ele estava falando assim por causa do demônio que vive dentro dele, um lobo faminto que eventualmente ele se transformava. Mas mesmo assim, depois de tudo isso, depois de até mesmo vê-lo como o lobo, não conseguia ver Rick como uma pessoa má. Rick, apesar de tudo, era uma das pessoa melhor que eu conhecia, ele não era um monstro, eu via através dele, e eu sabia que assim como havia algo muito mal dentro dele, também havia algo realmente bom, e ele era muitas coisas, mas nenhuma delas era covarde.

-Ei, você não é um covarde. –Consegui dizer. –Escute, você salvou minha vida... Voltou para Ordem apenas por minha causa, nisso há muita coragem...

Ele não olha pra mim, fica o tempo todo quieto pensando, como se tentasse escolher se falaria algo a seguir ou se era melhor manter o silencio. Mas então ele volta a me encarar, porém, eu estou olhando para baixo, observando meu reflexo no espelho negro. Ele então coloca sua mão no meu rosto, fazendo com que eu olhe para ele e diz em um sussurro abafado:

-Alex, eu fiz tudo isso porque eu gosto de você.

Suas palavras me acertam em cheio e eu me sinto ainda mais em choque do que quando ele dissera que era lobisomem.

-Como? –Digo, ainda não acreditando.

-Eu gosto de você, sabe? –Ele diz, todo sem jeito, quase escondendo o rosto. –Mais que como amiga, é eu gosto mui... –Ele para de falar porque eu coloquei os dedos em seus lábios, para evitar que ele se enrolasse ainda mais em suas próprias palavras, então surrei um pequeno “cala a boca e me beija” quase inaudível e tirei os dedos que tocavam seus lábios, para encontrar os meus próprios nos dele.

Beijar Rick foi algo estranho, mas foi bom ao mesmo tempo. Ele é quente, apenas digo isso, e seu beijo não foi diferente. Os lábios dele eram tão macios, e nossa, eu gostava tanto dele... Mas sempre achei que ele fosse demais pra mim e que me visse como uma pirralha chata que o ficava incomodando e chamando-o de maninho. Maninho... Era por isso que era estranho, o tempo todo eu apenas pensava “Okay... Eu estou beijando meu melhor amigo”.

O beijo não durou muito tempo, foram exatos sete segundos, mas foram os melhores segundos que eu tive em muito tempo. Eu nunca imaginaria que ele beijava tão bem.

-Também gosto de você. –Digo em um sussurro. Nossos rostos continuam próximos, de forma que novamente nossos lábios se tocam e depois trocamos alguns olhares e sorrisos.

-Não deveria, sabia? –Ele diz.

-Por quê? –Digo com a testa franzida.

-Você deveria ter medo de mim. –É o que ele diz, seu olhar distante, mas em sua boca um sorriso, ele estava feliz por ser correspondido, isso era evidente. –Eu sou um monstro, Alex.

Ele vira seu rosto, para não me olhar nos olhos, no entanto, eu coloco minha mão em sua bochecha esquerda, de modo que ele é forçado a me encarar quando eu falo:

-Você não é um monstro, Rick. –Ele está pronto para discordar, mas eu não deixo que ele continue. –Não é. E eu não tenho medo de você. –E não tinha mesmo, de modo que as palavras soam fortes e convincentes, porém, tudo que ele faz é dar uma pequena risadinha de alivio, era evidente que ele estava feliz por nada ter mudado na maneira como eu o via.

Ele beija minha testa enquanto penso que na verdade de fato mudara, tudo isso apenas serviu para que eu pensasse que ele é ainda mais forte do que eu pensava, para assim como eu lutar contra seus próprios demônios internos.

Me aproximo dele e escoro minha cabeça em seu ombro e solto um grande suspiro frustrado lembrando-me de que o mundo existe e que ele está caindo sem que haja ninguém para segurá-lo e que eu tenho a missão de colocá-lo de volta aos eixos porque havia prometido não só para Deus, mas para mim mesma também.

-O que vamos fazer? –Soo cansada de lutar, mas o que eu estava fazendo era apenas permitindo-me descansar para me preparar para as próximas batalhas que seriam ainda mais difíceis.

Rick também suspira e envolve-me em seus braços fortes e eu estupidamente me sinto protegida como se isso fizesse de fato alguma diferença para os demônios deste maldito mundo cinza.

-Primeiro vamos ir a Casa sem Fim e no espelho da verdade vamos separar você de Nightmare. –É o que ele diz.

-Como assim? –Digo confusa.

Ele então assume uma expressão de pesar e continua:

-Infelizmente durante a batalha no labirinto deixando Nightmare possuí-la você aumentou sua conexão com ela e isso não é nada bom. –Ele então dá um sorriso, tentando me animar. –Mas fique tranquila, vamos conseguir resolver isso... E como eu já lhe disse, você não pode viver em comunhão com um demônio e viver em comunhão com Cristo também. –Franzo a testa, eu não me sinto em comunhão com Cristo, eu não me sinto fazendo nada por ele e não faço ideia de como fazer isso, mas escuto o que ele tem a dizer: -Eu vejo Ele mudando você... É isso é incrível.

Franzo a testa e digo não entendendo bem do que ele estava falando, pois eu não me sentia em nada diferente:

-É, eu acho.

Ele sorri, o que me faz sorrir também, então beija minha testa, meio inseguro. Fecho os olhos quando seus lábios tocam minha pele e ele diz:

-Não se preocupe, vai dar tudo certo.

Levanto uma sobrancelha e digo:

-É piada né? –Então sorrio. –Você o senhor preocupação dizendo para mim não me preocupar... Deus, você deve estar doente.

Rimos juntos e ele balança a cabeça negativamente.

Porém seu sorriso não dura muito e logo ele diz, mais serio do que antes:

-E depois iremos a Casa da Morte.

Fico surpresa de imediato, mas já sei o que vamos fazer lá: vamos descobrir o que diabos Andrew está tramando e o que é esse tal ritual que ele quer realizar. Assinto para Rick e continuo pensativa, não tinha mais muito tempo de descanso e por isso por um momento pensei que seria bom congelar o tempo e então me lembrei que o tempo nessa terra de fato estava congelado.

Suspiro e digo:

-É, daqui não muito tempo temos de voltamos para batalha. –Rick faz que sim. –Mas por enquanto acho que posso lhe dar outro beijo.

Ele sorriu e nos beijamos novamente, dessa vez o beijo dura mais tempo e é mais intenso, e quando ele acaba eu mal acredito no que estava acontecendo. Rick Traverser havia me beijado, o moreno gostoso que eu nunca achei que fosse olhar pra mim com algum interesse além do de querer alguém pra ouvir suas piadas sem graça havia me beijado e isso era tudo que eu sabia no momento.

Então fechei meus olhos e enterrei minha cabeça no peito dele, deixando-me repousar. Eu pensara demais naquele dia, mas pelo menos tive várias das respostas que eu queria e isso era realmente animador, fazia-me pensar que nem sempre a tendência é nos ferrarmos cada vez mais.

Esses pensamentos eram o que mantinham em paz. Eu ainda não havia sido derrotada e eu ainda iria encontrar a razão da minha luta. Mas enquanto isso, o ombro de Rick de fato será um bom lugar para descansar. Ele não havia lutado junto comigo contra a bruxa no labirinto como prometera na noite da fogueira, mas ele curou minhas cicatrizes depois da luta e ajudou a manter-me firme para partir para a próxima na qual ele estaria comigo.

Rick era meu melhor amigo, e agora era evidente que ele se tornaria mais que isso.



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