Era uma tarde de sexta feira, uma daquelas terrivelmente quentes. Já havia discutido exaustivamente os preços das mercadorias com alguns clientes, agora observava, através das janelas do estabelecimento em que trabalhava o sol faiscar lá fora. E com uma impaciência nervosa, torcia apenas para que o dia terminasse logo.
Foi quando sentiu um par de braços a rodear, sequer precisou levantar o olhar para saber quem era, conhecia como ninguém aquele cheirinho de baunilha e hortelã. Tamanha foi a surpresa que lhe faltaram as pernas, mas ele a manteve de pé, apertando o corpo frágil contra o seu sempre tão quente.
Àquela altura ela sequer lembrava o próprio nome, e se concentrou apenas em fazer com que a respiração normalizasse.
Devia admitir, o romantismo nunca fez parte da natureza grotesca e primitiva que a compunha. Contudo, quando se tratava de Jung Hoseok ela era toda ao avesso.
Estava a um passo do despenhadeiro que a levaria ao abismo de paixão que ele era, mas contrariando todo o seu Manual de Segurança, ela não se importava. Confiava nele, e era toda essa confiança que a desarmava.
Faz sentindo? Alguém sempre tão extremamente cuidadoso com os próprios sentimentos, os entregar de bandeja em troca de meros sorrisos?
Tudo bem, não eram meros sorrisos, eram os sorrisos de Hoseok, que tendiam a lhe fazer sair de órbita e a esquecer de problemas banais quando lhe eram lançados.
Mas a questão é: Isso não faz sentido, faz?
Hoseok era totalmente o seu oposto.
Era uma figura e tanto. Sempre falando em tom vivo e animado. Era inteligente, esforçado, um rapaz de família. E os elogios nunca cansavam, indo por aí além.
Por um tempo, foi conformada com os paredões intransponíveis impostos entre eles desde quando ela era ela, e ele era ele. Porém, sua conformidade não à fez imune à onda avassaladora de sentimentos que veio junto dele.
E ela assistiu os paredões desabarem, caírem aos seus pés e virarem nada além de pó.
Quando souberam do relacionamento houve todo aquele alvoroço de cidade pequena.
Mas ele está namorando com aquela? Logo aquela toda sem graça? Mas não são muito novos para isso? É coisa de jovens, não vai durar!
Durou.
A cada dia sentiam crescer aquele sentimento tímido que logo transbordaria, e os deixaria imersos numa atmosfera de cuidados e carinhos.
Amor? Talvez.
Às vezes ela se via perdida nele e na cortina de fios negros e impecavelmente lisos que contrastavam com sua pele de marfim. Suspirava deslumbrada. E quando era pega no meio das observações, ele lhe dava aquele meio sorriso de surpresa que fazia seu estômago afundar.
A princípio, rejeitou com veemência a ideia de se apaixonar, mas não era como se já não estivesse no abismo. E o coração bobo que guardava no peito sempre reagia a ele: Estrondeava quando seus lábios pairavam nos dela suaves e macios; quando a surpreendia com seus abraços calorosos; e mais ainda quando ele a encarava com a expressão afogueada e soprava baixinho um "eu te amo" depois de uma noite inteira se entregando um ao outro.
Quando estavam juntos o tempo escoava - se numa ligeireza só. Os olhos se fitavam cariciosos, denunciando os desejos inadiáveis que agitavam o peito de ambos.
Não queria isto dizer que não brigavam. Brigavam bastante. E o motivo era sempre o mesmo: Rugiam ciúmes. O timbre ficava ríspido, dos lábios saia um jorro de injúrias que repercutiam muito sonoras. Mas estavam sempre dispostos a esquecer da aspereza das palavras, e a cena toda terminava em ofegos de prazer e juras de amor.
Pelas imediações da cidadezinha tudo que se dizia era o quanto tudo aquilo não podia ser certo. Amar tanto assim não pode ser normal!
Mas como ele poderia deixar de ama - lá quando ela era sempre tão linda e afetada de ternura?
Não tinha jeito, a paixão era indomável.
O abismo dela era todo Jung Hoseok, e tudo que ela queria era ser seu abismo também. Queria que ele se perdesse nela como ela havia se perdido nele.
E talvez isso já tenha acontecido, porque ela sentia o coração dele reagir junto ao seu.
Talvez tenham agora um só coração.
Talvez tenham construído o próprio abismo.
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