História Alasca - .1

POV Alasca

Completamente escura. Pela primeira vez, eu via aquela rua completamente escura. Estranhei, pois durante todos os anos que passei por ela, a mesma se encontrava clara. Mas nesta noite de sexta não. Ela estava escura.

Toda segunda à sexta, desde que eu me entendo por gente, passo por essas ruas após a aula da Dona Fran. Dona Fran foi a minha professora e treinadora de ballet e continua sendo até hoje. Ela já me ajudou a conquistar muitas coisas na minha vida, e também sempre esteve lá por mim quando eu precisava de um ombro amigo, de um carinho de mãe. A minha própria mãe pelo contrário, sempre pareceu uma empresária para mim. Quase não me lembro de conversas nossas que não estejam relacionadas ao meu futuro, faculdade ou carreira.

Mas bem, lá estava eu no meu caminho de volta para casa pela milésima vez na minha vida, mas pela primeira vez com a rua completamente escura.

Continuei caminhando por ela, um pouco receosa, até que uma luz encontrou o meu olhar, para mais a frente da rua. De longe, aparentava ser um bar. Mas havia algo além dos barulhos de conversas, eu conseguia ouvir de fundo um barulho conhecido, como uma melodia. Como se alguém estivesse batendo em algo, lento e devagar, com um ritmo calmo.

A curiosidade transbordando pelo meu corpo, me dominou, me fazendo andar até a esquina daquela rua escura para ver que suposto bar era este, que eu nunca havia percebido antes. Na porta do bar, já reparei que o mesmo estava cheio, como eu imaginava. Afinal, era sexta-feira à noite.

Pelo o que eu conseguia identificar, haviam duas guitarras, um baixo e uma bateria, isso explicava o barulho que eu estava ouvindo no caminho. Porém, antes que eu pudesse reparar no ambiente direito, me deparei com um vermelho que tomou todo o espaço do pequeno bar.

Um vermelho vivo, quente e contagiante. Um vermelho selvagem e desafiador. Um cabelo lindamente vermelho. Um vermelho vivo. Esse momento, se igualou aos de filme. Pareceu como se tudo ao redor passasse em camera lente, e tudo o que eu conseguia ver era o seu cabelo vermelho. Não sei porquê, mas o meu interesse por aquele menino dos cabelos vermelhos se tornou muito grande. Eu estava curiosa para saber sobre ele, para saber quem é ele e para descobrir sobre a sua vida. Eu já estava interessada por ele, só pelo ar de desafio que ele exalava.

Dizem, que azul é a cor mais quente. Bom, pra mim sempre foi vermelho. Mas antes que eu pudesse continuar me perdendo nas profundezas daquela linda explosão de sentimentos, uma voz me tirou do meu transe.

- Com licença, senhorita. Você deseja algo? - um senhor perguntou, supus que este seria um funcionário do bar.

- Ah, não, desculpe. Só entrei para conhecer, mesmo. Passo por essa rua praticamente todos os dias da minha vida, e nunca havia notado este bar. - enquanto respondia, tentava observar de longe o dono dos cabelos de fogo.

- É porque nós abrimos ontem, senhorita. Este é meu bar, seja muito bem vinda. Fique a vontade e se precisar de algo, pode me chamar. - e após isso ele saiu e voltou para atrás do balcão.

Agora, retirada do meu transe, consegui observar que o homem desconhecido tinha compania. Se encontrava com mais três garotos, e eles estavam encostados nos instrumentos e, pelo o que parecia, afinando as guitarras. Observei eles parada e atenta, no canto no bar, até um deles ir ao microfone e anunciar.

- Boa noite a todos. Nós somos o 5 Seconds Of Summer, e iremos mostrar para vocês um pouco da nossa música. Espero que gostem

E então uma melodia começou a tocar, e logo uma voz foi ouvida no ar. Uma voz doce, mas ao mesmo tempo forte e bela. Era ele. Tudo voltou a ficar em camera lenta novamente e eu só conseguia prestar atenção naquele rosto, até então nunca visto antes por mim. Naqueles olhos, profundos e hipinotizadores. Sei que isso parece clichê, mas foi exatamente assim. E aos poucos, a música foi sendo absorvida por mim.

Everybody's got their demons
Even wide awake or dreaming
I'm the one who ends up leaving
Make it okay

See a war I wanna fight it
See a match I wanna strike it
Every fire I've ignited
Fade into grey
But now that I'm broken
Now that you know it
Caught up in a moment
Can you see inside?

Cause I've got a jet black heart
And there's a hurricane underneath it
Trying to keep us apart
I write with a poison pen
But these chemicals moving between us
Are the reasons to start again

Todo mundo tem seus demônios
Mesmo acordado ou sonhando
Eu sou a pessoa que no final acaba saindo
Para tornar isso bem

Vejo uma guerra e quero lutá-la
Vejo um jogo e quero ganhá-lo
Cada fogo que eu já acendi
Descolore para cinza
Mas agora que estou quebrado
Agora que você sabe disso
Me pego em um momento
Você pode ver por dentro?

Porque eu tenho um coração negro
E tem um furacão por baixo disso
Tentando nos manter separados
Eu escrevo com uma caneta de veneno
Mas essas químicas se movendo entre nós
São a razão para começar de novo

(Jet Black Heart - 5 Seconds Of Summer)

No meio da melodia, os olhos dele se encontraram com os meus. Hipnotizada por um instante, só analisei e absorvi a beleza dos mesmos e a profundidade deles, esqueci tudo. Esqueci que teria que ir pra casa, esqueci que não nos conhecíamos e esqueci até mesmo quem eu era. Eu simplesmente não conseguia soltar, até que ele desviou como se nada tivesse acontecido e prestou atenção entre outro par de olhos.

Nesse meio termo, acordei e lembrei que ele não fazia idéia de quem eu era, e eu também não fazia idéia de quem ele era. E também lembrei que provavelmente já estava atrasada para chegar em casa, e que provavelmente minha mãe estava desesperada. Me liguei de tudo, e voltei a triste e confusa realidade.

Sai apressada do bar, sem dar uma última troca de olhares para os lindos olhos verdes e os cabelos furiosos vermelhos. Mas antes que eu pudesse virar a esquina, ouvi uma voz.

- Ei, menina! Sou eu, o dono do bar. Vi que você reparou nos meus meninos! Eles são bons mesmo... Ou eu só sou um pai babão mesmo. Mas de qualquer jeito, eles tocam aqui toda segunda, quarta, sexta e sábado! Será sempre bem vinda, se quiser.

- Ah, muito obrigada. E-eu tenho que ir agora, minha mãe está me esperando..

- Sem problemas, até! - ele disse enquanto ia me afastando.

- Ok, isso foi estranho.. - disse para mim mesma, enquanto andava em direção a minha casa.

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Chegando em casa, abri a porta já com medo da reação de minha mãe. Nunca costumo passar do horário, e como volto andando do ballet, deixo o celular em casa. Antes que pudesse pensar mais sobre sua reação, ela aparece na minha visão.

- Oi mãe. Desculpa pela demora. A rua estava um pouco apagada hoje, então fui mais devagar para não errar o caminho.

Droga, mil vezes droga. Na hora em que falei isso, sabia que deveria ter inventado outra coisa. Como você vai errar um caminho que você faz desde que você era criança, Alasca? Meu deus. Mas eu estava nervosa. Não é como se eu pudesse ter falado a verdade para a minha mãe. Apesar de ser maior, ela ainda se preocupa comigo e me trata como se eu fosse uma criança. Se a tivesse tido que havia parado em um bar no caminho de casa para ouvir uma banda tocar porque havia me atraido pelo guitarrista de cabelos vermelhos da mesma, estaria morta agora.

- Ah é, Alasca? A senhorita estava com medo de errar o caminho? O mesmo caminho que você faz todos os dias há mais de 10 anos?

- É mãe, segurança em primeiro lugar. Só queria garantir que ia chegar em casa segura e na casa certa. Não vejo problema nisso. E também, eu nunca me atraso, foi só hoje, eu prometo. Não vou mais atrasar.

- Acho bom mesmo... Por falar em atraso, quando começam os exames da faculdade? Você precisa recuperar os movimentos. Está atrasada comparada as outras meninas.

- Eles ainda não enviaram as datas, mãe. Mas assim que começar, eu aviso, você vai poder controlar tudo, como sempre faz.

- O que é que você falou, Alasca?

- Nada mãe, deixa para lá. Vou subir pro meu quarto, estou cansada, vou dormir cedo hoje.

E sai correndo escada a cima, sem conseguir ouvir sua resposta. Minha mãe me tira do sério, na maioria das vezes. Entrei no meu quarto e logo procurei meu pijama, entrando no banho logo depois. Durante o banho, fiquei pensando em como eu estou cansada da minha rotina, em como tudo é sempre o mesmo e em como eu não tenho tempo para mim, em como eu não posso ir a um bar em paz, só para relaxar.

Mas isso não conseguiu ocupar minha mente por muito tempo. Uma vez que, fui dormir com uma única coisa na minha mente.

Vermelho.