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História Além da Esperança - XXVIII - Decisões da Meia-Noite


Escrita por: Vexus

Notas do Autor


Voltei e levemente atrasada ~('-'~)

Desculpem, mas minha semana estava extremamente corrida.
Chega de enrolações.

Espero que gostem.
Boa leitura.

P.S.: Caso haja algum erro, por favor, me avisem.

Capítulo 29 - XXVIII - Decisões da Meia-Noite


Os corredores recebiam uma luz bruxuleante oriunda das lamparinas penduradas nas paredes e o vento que soprava deixava o clima ainda mais sombrio. Ryeowook mancava, sendo acompanhado por Sungmin e Lisa – que guiava o caminho até onde Minhyuk se encontrava. Sua perna havia melhorado o suficiente para conseguir andar sem ajuda da muleta, mesmo sentindo um forte incômodo na coxa. Um grito rasgou o silêncio da noite, assustando o trio, sendo seguido por um palavrão.

– Que conveniente. – Lisa resmungou.

Desceram as escadas de incêndio e avançaram pela galeria do térreo até uma loja cuja vitrine fora coberta por tábuas e a porta encontrava-se descascada em alguns pontos. Lisa virou-se e encarou a dupla antes de balançar a cabeça e entrar.

– Se preparem. – ela recomendou. – Moonbyul está furiosa e...

A garota foi empurrada em direção ao chão antes que pudesse terminar de falar, Ryeowook se prontificou em ajuda-la, mas alguém o jogara contra uma parede cheia de prateleiras. O impacto o pegou de surpresa e ele não fez nada além de emitir um gemido de dor, enquanto potes de vidro e utensílios caíam ruidosamente no chão.

– Mas o que... – Ryeowook se calou ao sentir algo cutucar sua garganta, era frio e rígido.

Uma faca.

Engoliu em seco e encarou o responsável pelo ataque. Apesar de a penumbra bloquear parcialmente sua visão, Ryeowook conseguiu reconhecer o rosto de feições marcantes e camiseta branca coberta com o casaco marrom e sem mangas. Era Moonbyul que o estava empurrando contra a parede. O olhar era de raiva e sanguinário, assemelhava-se ao de um assassino pronto a atacar sua vítima – a coloração âmbar de um dos olhos apenas aumentava a tensão. O suor brilhava em sua testa e ela apertou o cabo da faca, empurrando-a contra a pele do jovem.

– Espero que esteja feliz. – grunhiu, enraivecida. – Por sua culpa, meu irmão quase morreu!

Sungmin tentou avançar, mas Moonbyul rugiu em sua direção.

– Se mexer mais um músculo, eu corto o pescoço dele. – gritou a plenos pulmões.

– Moonbyul... Eu não sei do que está falando. – Ryeowook sussurrou, suando frio.

– Que curioso não? Depois de vocês, um grupo de soldados terem surgido no meio da floresta.

– Mas isso não tem...

– Moonbyul. – A voz era grave e parecia cansada.

A garota pareceu hesitar por alguns segundos, abaixou o olhar, mas não recuou com o que estava fazendo. Ryeowook sentiu o toque frio da ponta de aço na sua pele e fechou os olhos, não podia se mexer, sua vida estava nas mãos de Moonbyul.

– Eric... – ela começou, sem desviar o olhar. – Não tente se intrometer.

Com toda aquela tensão, Ryeowook não reparara que Minhyuk estava deitado em um colchonete, completamente seminu, enquanto Eric cuidava dos ferimentos em seu braço e em seu peito.

– Escute o que está dizendo, minha jovem. – Eric mantinha a calma enquanto debruçava-se sobre o ferimento. – É estúpido e completamente leviano acusa-los. Eles não têm culpa.

– Como sabe? – Moonbyul trincou os dentes. – Eles são os únicos que vieram de fora.

– Moonbyul, acalme-se e veja o que está fazendo. Atacou Lisa, que nada tinha a ver com a história, e agora ameaça Ryeowook com uma faca. – O tilintar de uma das balas caindo no recipiente de metal rompeu o breve momento de silêncio. – Você não é um monstro e muito menos uma assassina. Não haja como um.

Moonbyul urrou e então recuou com a faca, cravando-a na parede momentos depois, há alguns centímetros da cabeça de Ryeowook. Ela o libertou e então empurrou Sungmin antes de sair do cômodo, a passos firmes. Eric suspirou com pesar e então balançou a cabeça.

– Esqueça-a. – Minhyuk murmurou trincando os dentes. – Sabe como Moonbyul age quando está sob estresse.

– Alguém... Por favor... Pode me explicar... O que aconteceu? – Ryeowook perguntou sentindo seus joelhos tremerem.

O choramingo despertou a atenção de Sungmin, que se abaixou para ajudar Lisa a levantar. A garota exibia um arranhão no ombro e uma marca roxa na cintura, que certamente originaram-se do empurrão. Ela ergueu-se e enxugou as bochechas molhadas, parecia chateada e assustada ao mesmo tempo.

– Lisa... Está tudo bem, não precisa chorar. – Minhyuk falou enquanto sentava-se.

A jovem assentiu e então se retirou, sentando-se do lado de fora do quarto.

– Ela vai demorar a se recuperar. – Eric comentou suavemente. – Vocês dois, imagino que queiram saber o que realmente aconteceu. Minhyuk, por favor.

O rapaz suspirou e acomodou-se melhor na cama, antes de começar.

– Estávamos na patrulha, como o de sempre, até que o barulho de vozes despertou nosso interesse. Ficamos o anoitecer inteiro espionando-os até que fomos avistados, no meio da confusão e da correria, Moonbyul foi cercada e eu tentei ajuda-la. – Eric entregou-lhe a camisa. – Estava distraído demais e não prestei atenção nos disparos. Quando me dei conta meu braço estava sangrando, e meu peito, ardendo.

– Então porque Moonbyul estava tão furiosa?

Minhyuk vestiu a camisa e sentou na beirada da cama antes de falar.

– Ela se preocupa demais comigo. – justificou. – Me desculpem.

– Não precisa se desculpar. – Eric censurou levantando-se. O homem tateou lentamente até encontrar uma pia que havia no canto, ligou a torneira e começou a limpar os dedos sujos. – Sua irmã é quem deveria, foi ela que agiu sem pensar.

– Você disse que eram soldados caminhando pela floresta. – Ryeowook arriscou de maneira tímida. – A farda deles era amarela ou verde?

– Não. – cabeceou negativamente. – Os detalhes eram em branco.

– O quê? – Eric e Sungmin falaram ao mesmo tempo.

– Qual o problema? – o Kim questionou, olhando de um para o outro. – A quem pertencem esses soldados?

Sungmin abaixou o olhar e encarou o chão. Não queria deixar brechas de suspeita de seu passado para aquelas pessoas que até então pensavam que ele era apenas um cidadão que se perdera durante uma viagem, balançou a cabeça, censurando-se por tal atitude.

– A Zona Habitacional. – Foi Eric quem respondeu.

– Certo, mas... Por que essa surpresa?

– Ryeowook, meu querido, lembra-se do que eu disse sobre essa região? Que era uma terra sem lei, uma terra de ninguém? – O Mun questionou.

– Sim. – assentiu e então encarou Minhyuk.

– Ela não tem esse nome atoa. – o rapaz explicou. – Aqui nenhuma Zona tem poder.

– Nosso acampamento é independente. – Eric completou.

– Mas se os líderes sabem disso, por que os soldados da Zona Habitacional viriam até a floresta? – Sungmin perguntou.

– Era isso que eu e Moonbyul estávamos tentando descobrir, mas fomos avistados. – Minhyuk informou observando Eric desligar a torneira, virar-se e mostrar as mãos molhadas a si. – Estão limpas.

O homem agradeceu e sorriu, passando as palmas na calça. Minhyuk levantou e aproximou-se da pia, fazendo o mesmo processo de limpeza de mãos. Enquanto isso, Eric atravessou o quarto e parou na porta, como se estivesse esperando alguém.

– Tome um banho antes de dormir. – ele instruiu a Minhyuk. – Precisa tirar a sujeira do corpo para prevenir possíveis infecções.

– Sim senhor.

– E quanto a vocês dois, quero que voltem para minha casa. Passarão essa noite sob meus cuidados já que o tratamento ainda não terminou.

Ryeowook aceitou a proposta e então se retirou do cômodo sendo seguido por Sungmin, no trajeto procuraram por Lisa, mas a garota havia desaparecido.

– Quer que eu vá falar com Lisa? – Minhyuk indagou aproximando-se enquanto secava as mãos.

– Deixe isso para amanhã. – Eric recomendou, inclinando a cabeça para o lado. – Ela está chateada e precisa ficar sozinha por um tempo.

– Tudo bem. – O rapaz passou pela porta e, antes de sair para as galerias do acampamento, deu leves tapinhas no ombro de seu mentor. – Boa noite.

– Boa noite Minhyuk.

––XX––

Ryeowook aguardava o retorno de Eric, sentado na beirada da cama. O acampamento estava ainda mais silencioso deixando o cricrilar dos grilos e o farfalhar das folhas, ainda mais perceptíveis. Um sino de vento tocou ao longe, dando a sensação de paz e tranquilidade que aquela dupla não via há dias. Sungmin fechou os olhos, estava apoiado na parede oposta, e deixou-se apreciar daquele momento.

– Uma raridade. – comentou.

– O quê?

– Uma noite tranquila, é uma raridade para mim. – repetiu e então abriu os olhos. – Há anos que não via o mundo tão calmo assim.

– Talvez ele sempre estivesse. – Ryeowook divagou encarando o nada. – Nós que vivemos em um local caótico.

Sungmin meneou a cabeça, concordando com o pensamento do rapaz. Depois de todos os acontecimentos passados, presenciar um momento de calma e tranquilidade era raro, mas ao mesmo tempo estranho. Ele sorriu de canto e balançou a cabeça.

– O que foi? Por que está rindo?

– Não é que... É a primeira vez que você se dirige a mim sem insultos ou desconfiança.

Ryeowook encarou-o por alguns segundos e então abaixou o olhar, envergonhado. Tratara mal o rapaz e sentia-se culpado por isso. Sungmin podia ter sido uma pessoa ruim no passado, mas agora, depois da história com a inteligência artificial, ele estava mostrando ser completamente diferente. Engoliu em seco e suspirou, por mais que detestasse, teria que pedir desculpas.

– Te julguei mal e acabei tirando conclusões precipitadas. – falou por fim. – Sunny dera seu voto de confiança, mas eu ignorei e decidi seguir com desconfiança. Desculpe.

– Tudo bem. – respondeu cruzando os braços. – Faria o mesmo se estivesse no seu lugar.

Ele sorriu de canto, entrelaçou os dedos e começou a brincar com os polegares.

– O que aconteceu depois? – perguntou de súbito.

– Perdão?

– Depois de Bora e eu termos saído de sua mente. – repetiu, encarando-o novamente. – O que aconteceu depois?

Sungmin franziu o cenho e então se aproximou de Ryeowook, sentando ao seu lado – os ombros se tocaram e ele sentiu um leve calafrio. Sungmin parecia inseguro no que ia falar e mordeu os lábios diversas vezes.

– Parece estranho, mas foi como se eu tivesse visto toda a minha vida em questão de minutos. – revelou suavemente. – Quando vocês sumiram, toda aquela cidade desapareceu, e eu fiquei mergulhado na mais completa escuridão. Já não tinha mais forças e, com o passar do tempo, eu percebia que minha situação só piorava, fechei os olhos e esperei que o fim chegasse logo. Foi então que as imagens da minha infância começaram a surgir, uma a uma. Vi meus pais, minha irmã e até a casa que morávamos quando criança, tudo parecia terminar ali. Até...

– Até o quê?

Sungmin cerrou os punhos, os dedos da prótese soltaram um leve ruído metálico.

– Até eu ouvir minha irmã me chamando. – revelou com pesar. – Quando abri os olhos, vi Sunny ajoelhada ao meu lado, segurando minha cabeça no colo. Eu chorei, mas não de tristeza ou desespero e sim de alegria. Eu estava vendo minha irmã uma última vez antes de morrer, a única família que possuo.

– Mas você não morreu.

– Por que ela pediu para que eu voltasse. – ele relaxou visivelmente. – Veio um turbilhão e eu acordei na enfermaria do abrigo.

Uma batida na porta interrompeu a conversa. A dupla virou-se e assistiu enquanto Eric entrava calmamente, guiando-se pela bengala de madeira que colidia com tudo a sua frente. Ele aproximou-se de uma prateleira e começou a separa alguns frascos de vidro transparente com formatos diferentes.

– Espero não ter atrapalhado a conversa. – ele falou, preocupado.

– Não, nós... Já havíamos terminado. – Ryeowook respondeu levantando-se.

– Ótimo. – Eric sorriu. – Poderiam deitar para que eu continue?

Ryeowook obedeceu e, com um pouco de dificuldade, deixou-se cair no colchonete no chão – Sungmin fez o mesmo, segundos depois. Eric então se aproximou da dupla, segurando uma mochila de couro marrom que emanava um leve cheiro de ervas.

– Voltaremos às agulhas? – Sungmin perguntou visivelmente incomodado.

– Hoje não. – Eric explicou, ajoelhando-se entre os dois. – Usarei algo diferente.

Usando uma colher, o homem amassou a planta dentro de uma cuia de barro, e em outro pote preparou-se para acender o fogo. Ao mesmo tempo, dispôs, a sua frente, dez largas tiras de couro – cinco para cada um. Quando o fogo irrompeu, queimou as ervas e pôs as cinzas flamejantes sobre as ataduras. Em seguida, fixou as tiras nos membros afetados pelo veneno, apertando forte as ervas ferventes, que provocaram queimaduras superficiais na pele. A técnica, apesar de dolorosa, empurrava os vapores medicinais da substância para dentro do organismo, que absorvia suas propriedades benéficas. Ryeowook trincou os dentes e deixou um gemido de dor escapar.

– Peço que me desculpem, sei que é extremamente doloroso. – Eric falou.

– O que é essa técnica? – Ryeowook perguntou, desviando-se um pouco a dor.

– Chama-se moxabustão. – explicou enquanto colocava a última tira de couro no braço de Sungmin. – É bastante eficaz no combate a várias enfermidades, até mesmo as simples dores de cabeça.

– Nunca... – Sungmin grunhiu quando as ervas queimaram sua pele. – Ouvi algo do tipo.

– Essa técnica é antiga e muitos dizem que ela é obsoleta. – falou de maneira triste. – Mas para mim, é uma das mais fantásticas.

– Ficaremos com isso por quanto tempo?

– Cerca de uma hora. Enquanto isso tentem dormir, uma boa noite de sono ajuda na recuperação.

Ryeowook respirou fundo e fechou os olhos, a ardência havia abrandado, tornando-se um leve incômodo. Ele procurou relaxar, deixando sua mente ser embalada pelo cheiro que ervas queimadas lançavam, e lentamente caiu no sono.

 

A moça abriu a tampa do bueiro, o vento gélido da noite lançou seus cabelos para trás, ela abaixou-se e empurrou a pesada tampa de concreto e metal de volta para o devido lugar no mesmo instante que o som de passos aumentava. Tiffany colou suas costas à parede úmida e suja do beco enquanto aguardava a passagem de dois guardas que faziam patrulha naquele quarteirão. Um carro passou em baixa velocidade pela avenida fazendo com que o vapor que saía do bueiro se dissipasse rapidamente. Com a chuva de mais cedo, a temperatura caíra rapidamente forçando todos a saírem com seus casacos. O chão ainda estava molhado e qualquer tentativa de ser silenciosa resultaria em um fracasso imediato. Vendo o caminho livre, ela levantou o capuz da blusa e atravessou a avenida correndo, sem olhar para trás. Saíra de manhã cedo para checar a situação das ruas e acabou ficando surpresa com a quantidade de pessoas que saíam de suas casas apesar do clima de tensão na Zona Comercial. Detestava sair sozinha, sentia-se cega sem ajuda de Andrew para vigiar seu trajeto, mas fazer contato com aquela pessoa era extremamente restrito e apenas alguns eram agraciados com isso.

Seguiu caminhando pela calçada de concreto cinza, sentindo vento carregar consigo o aroma característico da noite e da chuva, passou sobre uma poça e virou à direita da esquina mais próxima. A rua que se estendia a sua frente se assemelhava ao interior de uma boate antiga, as fachadas das lojas exibiam letreiros com neon em tons de roxo, azul e rosa. Ela continuou caminhando, desviando das pessoas que seguiam pelo sentido contrário, e entrou em um beco escuro que fedia a lixo e comida estragada. Uma fraca garoa começou a cair e Tiffany apertou o passo para não ficar molhada. Passou em frente de um restaurante de comida chinesa e virou à esquerda para enfim chegar à rua residencial de classe-média daquela região.

Todas as residências daquela rua possuíam o mesmo estilo – tinham no máximo três andares, permitindo que seu proprietário alugasse quartos caso fosse necessário – Tiffany avançou até uma construção que ficava no meio do quarteirão. A fachada era pintada de vermelho e os contornos das janelas eram brancos, havia um pequeno jardim onde a única vegetação que crescia era a grama. Após subir as escadas que levavam a entrada, Tiffany fechou os olhos, exalou ruidosamente e bateu na porta. A garoa cessou, deixando a noite ainda mais gelada. Alguns minutos se passaram até a porta ser aberta, revelando um homem, que aparentava estar na casa dos trinta anos, vestido com um roupão verde amarrado de maneira preguiçosa na cintura. Ele era alto e forte, tinha cabelos negros, olhos estreitos e castanhos, que a encaravam com tédio.

– Sabe que horas são? – a voz grave estava carregada de cansaço.

– Preciso falar com você. – Tiffany adentrou sem dar espaço para uma resposta.

A sala era decorada com móveis de couro branco e marfim, uma televisão de tela plana descansava sobre um armário baixo, semelhante a um altar. O chão entre os sofás possuía um tapete persa vermelho com detalhes dourados e a mesa de centro era decorada com um vaso de flores brancas. As almofadas eram azuis e pareciam ter sido despreocupadamente jogadas sobre os móveis.

– Oi pra você também. – resmungou e então fechou a porta, suspirando de maneira cansada. – O que você ‘tá fazendo aqui Hwang?

– Sabe que eu detesto que me chamem pelo sobrenome. – Ela pôs as mãos na cintura.

– E eu detesto que sujem o meu chão! – exclamou apontando para o piso de porcelanato sujo de lama e então avançou até a cozinha enquanto grunhia enraivecido. – Já não basta bater na minha porta às duas horas da manhã.

Tiffany olhou para um relógio que se encontrava pendurado na parede e franziu a testa.

– São onze e meia.

– Onze e meia! – o homem retrucou da cozinha. – Sabe o que eu poderia estar fazendo agora?!

– Pelo amor de Deus, Seunghyun. – Tiffany abriu os braços. – Você fala como se não estivesse deitado na cama com a televisão ligada.

O homem voltou para sala, arqueou a sobrancelha e cruzou os braços. Era visivelmente mais velho que a visitante e poderia expulsá-la de sua casa quando quisesse, mas isso o obrigaria a vencer o cansaço – coisa que Seunghyun não estava disposto a fazer.

– Eu só não te ofendo, porque estou morrendo de sono. – murmurou e então inclinou a cabeça de lado. – O que foi dessa vez, Tiffany?

– Preciso que coloque uma pessoa fora da Zona Comercial o mais rápido possível.

Seunghyun revirou os olhos e voltou para o cômodo do qual havia saído, não demorou muito e o cheiro de café começou a dominar o ar.

– Vai me ajudar? – Tiffany questionou enquanto o seguia.

Ele debruçou-se sobre a bancada de mármore escuro e virou a cabeça, encarando a jovem seriamente.

– Achei que tinha parado com isso.

– Eu parei, mas Jessica apareceu e...

– Essa mulher de novo?! – interrompeu exasperado. – Tiffany, você precisa parar de ser tão boazinha. As pessoas se aproveitam!

– Não é para ela, é para um dos inumanos que estou mantendo no galpão.

– Inumano? – Seunghyun franziu o cenho e cruzou os braços. – O que está planejando garota?

– Ele veio da Zona Industrial, pouco depois da invasão. – explicou enquanto coçava a sobrancelha. – Ele quer voltar para lá, porque acredita que tem pessoas esperando.

– Essa história está incompleta. – murmurou desligando o fogão. – Vai para o escritório, desço em alguns minutos.

– Vai fazer o quê? – indagou vendo o homem subir as escadas, indo em direção aos quartos.

– Trocar de roupa. – retrucou. – Não quer que eu converse com você só de cueca, não é?

Tiffany franziu a testa e saiu da cozinha, percorreu o largo corredor e abriu uma porta dupla de madeira cinza se deparando com uma sala com pouco mais de cinco metros quadrados. Havia uma mesa em formato de L colada a uma das paredes onde um computador com vários monitores e uma pilha de livros descansava, no lado oposto, uma estante de madeira escura exibia fileiras e mais fileiras de arquivos. Ela sentou na poltrona e esperou alguns minutos até que Seunghyun retornasse, trazendo consigo duas canecas de café. De fato havia trocado de roupa, em vez do roupão, ele agora vestia uma calça de moletom cinza e uma camiseta branca.

– Aqui. – falou entregando-lhe uma das canecas. – Você está encharcada e sei que está sentindo frio.

Tiffany agradeceu e então bebericou.

– Obrigada. – falou vendo o homem gesticular como resposta. – Não sabia que estudava.

Seunghyun arqueou uma sobrancelha e então colocou os óculos. As mãos deslizaram sobre o teclado e ele rapidamente começou a digitar, a tela se acendeu revelando linhas de códigos.

– Não estou estudando, são apenas livros de informações. – explicou, voltando a encarar a jovem. – Agora me explica o que está acontecendo.

Tiffany depositou a caneca na mesa e passou as palmas das mãos na calça. Após alguns minutos de organização de pensamentos, ela discorreu sobre o havia se passado – desde o primeiro contato com Jessica até a confusão no esgoto. Não escondeu nada, não mentiu sobre nada. Seunghyun era digno de confiança e provavelmente descobriria se alguma informação estivesse faltando. Quando terminou de contar o relato, ela cruzou os dedos e mordeu o canto do lábio, apreensiva.

– Andrew sabe sobre isso?

– Sim e está me ajudando.

– Aquele garoto mudou para estar concordando com essa loucura. – resmungou balançando a cabeça.

– Por favor, Seunghyun, você praticamente sabe tudo o que está acontecendo nas ruas da Zona Comercial. – Tiffany suplicou. – Me ajuda.

– E os outros contatos que você possui? – Seunghyun cruzou os braços. – Nenhum deles vai te ajudar?

A jovem respondeu com um menear negativo de cabeça.

– Alguns fugiram e a grande maioria está com medo.

– Um bando de fracos. – cuspiu a última palavra com nojo. – Não sei como ajudavam seu pai.

– Acho que agem dessa forma por que sou mulher. – revelou tomando mais um pouco de café. – Ou porque pensam que sou fraca demais e não sei lidar com certas situações.

Seunghyun balançou a cabeça, bebeu um pouco de café e voltou a digitar no teclado.

– Descobri algo que talvez possa ser útil. – falou momentos depois.

– Estou ouvindo.

– Haverá uma manifestação depois de amanhã, na praça central em frente à Sede. – continuou. – Parece que alguns revoltosos vão tentar mais uma vez ganhar atenção do povo, toda a polícia estará lá e as saídas da cidade estarão com um número menor de fardados, podem aproveitar essa deixa.

– Certo.

– O evento ocorrerá às sete da manhã, segundo os organizadores. – continuou ajeitando os óculos. – Antes de qualquer coisa, e como cumplice dessa loucura, eu tenho o dever de perguntar: Você sabe como esse rapaz vai sair daqui?

– Pensei em dar um carro ou usar um dos buracos na muralha...

– Perigoso demais. – interrompeu de maneira séria e voltou a encarar um dos monitores. – Consegui um contêiner que poderá leva-lo até metade do caminho.

– Como fez isso? – ela não conseguiu esconder a descrença.

– Tiffany, toda a cidade está conectada com a internet. – informou. – Para um hacker isso é o paraíso. É como uma fila de dominós basta empurrar um e os outros caem na sequência.

– Tudo bem. – Tiffany relaxou. – Mas e o resto do trajeto?

– Coloque uma moto dentro do contêiner junto dele. – aconselhou. – O caminhão que o levará tem como destino a Zona Habitacional e toda ou qualquer encomenda para lá não está passando pela revista de segurança.

– Por quê?

– O motivo não está sendo tratado por e-mails, se fosse, eu já saberia. – Seunghyun recostou-se na cadeira. – O motorista é um grande amigo meu e avisará quando for a hora certa de descer.

– Onde tenho que encontra-lo?

– No posto de gasolina, em frente à joalheria. – suspirou. – Mas antes que vá, preciso lhe dizer que essa viagem até a Zona Industrial será perda de tempo. Foi completamente destruída e duvido que ainda haja alguém por lá.

Tiffany bebeu o resto do café que tinha na caneca e levantou, vendo que o homem fazia o mesmo. Ela se aproximou e o abraçou, não costumava fazer isso, mas Seunghyun era uma amizade que valia a pena manter.

– Não sei como agradecer.

– Fique viva. – murmurou dando tapinhas na cabeça da jovem. – Seu pai me mataria se algo acontecesse com você ou seu irmão.

Tiffany deixou um sorriso escapar e saiu para o corredor, a casa continuava silenciosa – com exceção do ruído da televisão no segundo andar. Seunghyun abriu a porta da saída e assistiu em silêncio enquanto a garota descia a rua e virava em um beco, sumindo na escuridão da noite.


Notas Finais


E ai? O que acharam?
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