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História Além das Quadras - Memórias que ferem


Escrita por: MarcelineA

Notas do Autor


Olaar meus amores e amoras! Como cês tão?
Agradeço a todos que mandam comentários (estou atrasada em respondê-los, eu sei. Mas vou responder, não me matem) e saibam que amo tudo o que vocês dizem para mim lá! Muito obrigada mesmo ♥
Espero que gostem do capítulo, pois foi um dos que eu mais gostei de escrever!
Nos vemos nas notas finais
Ghost Kisses
~Marceline

Capítulo 11 - Memórias que ferem


Fanfic / Fanfiction Além das Quadras - Memórias que ferem

Fevereiro de 2014

Erick estava animado para começar a treinar vôlei no Colégio Militar do Rio de Janeiro.

Ouvindo da boca da maioria dos veteranos do CMBH, ele sabia que o CMRJ era bem forte quando se tratava de esportes. Os Jogos da União e da Amizade estavam ai para provar o fato. Lembrava-se de uma vez em que um dos Jogos da União foi em Belo Horizonte e ele e Henry assistiram a vários jogos, principalmente os de vôlei.

Então ele estava empolgado, já que vôlei nunca foi o forte do CMBH. Queria um time de verdade para competir com outros times de verdade. Henry sempre dizia que a competitividade de Erick o mataria, mas ele nunca deu ouvidos.

Tinha feito vários amigos durante as primeiras semanas de aula, além de Amanda. Tudo o que ela falara em seu primeiro dia de aula estava se provando verdade, mas, mesmo assim, ele conseguia a simpatia de alguns alunos. E estava feliz por poder fazer amizade com a galera do time de vôlei.

Almoçou no Colégio com alguns colegas de sua turma e depois se dirigiu ao vestiário do ginásio para trocar de roupa. Ao chegar lá, viu vários garotos brincando e conversando, com certeza eram mais velhos que Erick. Ele preferiu ficar na dele, contendo a empolgação.

Entrou em uma das seções e trocou de roupa rapidamente, conversando com Henry por mensagem enquanto isso.

“Não vou perguntar se está animado, você deve estar morrendo de alegria”, Henry mandou.

Erick fez uma careta. Henry o conhecia bem demais.

“Idiota... Eu to de boas”

“Tá mesmo? Duvido que não esteja quase pulando de tanta animação”

Após isso, Erick reparou que estava mesmo quase pulando. Ele fazia muito isso quando estava animado ou nervoso. Parecia que a descarga de animação podia ser dissipada se ficasse dando pulinho, mesmo sabendo que isso não iria acontecer. Acabava sendo um ato involuntário.

Obrigou-se a parar de dar pulinhos, revirando os olhos mesmo que Henry não pudesse ver.

“Odeio quando você tá certo...”

“Haha sabia!”

Erick terminou de se vestir, pegou suas coisas e saiu do vestiário com o celular em mãos.

“Cara, eu também tenho treino agr, então mais tarde conversamos. Bom treino, flw”

“Okay, bom treino pra você também! Beijos, até mais tarde”

Guardou o celular na mochila e caminhou para as arquibancadas, já que ainda faltavam alguns minutos para o treino começar. Ficou ali, lendo A Guerra dos Tronos enquanto esperava o treino começar. As conversas e barulhos dos outros alunos do recinto não incomodavam Erick, estava submerso demais na leitura para prestar atenção neles.

Levantava a cabeça hora ou outra para ver se o professor já tinha chegado e por sorte, na terceira vez em que fez isso, pode ver o professor de vôlei chegando. Fechou o livro, colocou-o na mochila e colocou-a no ombro. Desceu rapidamente as escadas da arquibancada e se juntou ao outros alunos e professor.

Temos caras novas por aqui – disse o professor olhando diretamente para Erick. – Você é filho do coronel Schneider?

O que me dedurou? O nome de guerra ou a cara?”, pensou Erick. Mal tinha frequentado as aulas e a maioria dos professores e sargentos já sabiam que ele era filho do subcomandante do Colégio. Com certeza esse era um dos motivos para ele não querer trocar de nome de guerra, mas Nathália havia falado que não faria muita diferença, já que Erick era a cópia quase fiel de Anderson.

Sou sim – confirmou Erick, tentando não demostrar o quanto aquilo lhe incomodava.

Muito bem – sorriu o professor e se dirigiu aos outros dois novatos que tinha lá.

A conversa foi interrompida por um indivíduo que entrou no ginásio correndo, ainda com o uniforme normal de aula.

Está atrasado de novo, Roní – disse o professor com uma cara não muito boa.

E quando eu não estou? – perguntou Roní com desdém.

Erick congelou por alguns segundos. Não sabia que o garoto estudava no CMRJ também. Provavelmente estava em outra série ou então em outra arma, fazendo com que eles não tivessem contato. Porém, se ele treinasse mesmo vôlei, o encontro entre os dois seria inevitável.

Os olhos de Erick tentaram desviar de Roní, mas o outro foi mais rápido, notando rapidamente sua presença. Erick viu o sorriso presunçoso e maléfico sendo formado no rosto de Roní. “Eu devo ter cuspido na cruz”, pensou ele.

Graças a todos os bons deuses, Roní apenas se dirigiu para o vestiário, não comentando nada. Porém, Erick sabia muito bem que não estava livre dele. Nunca estava nos treinos do clube, ali no Colégio também não estaria.

Erick tentou de tudo para prestar atenção no que o professor estava dizendo, mas estava difícil. Saber que Roní estava ali lhe deixava tenso. O garoto lhe perturbava até a alma nos treinos do clube, principalmente por andar com Emerson. Esperava que não o importunasse ali também. Não era de desgostar das pessoas, mas Roní tinha conseguido isso com louvor.

Ficou feliz quando o professor mandou formar duplas e um dos garotos lhe chamou para fazer dupla consigo. Não queria em nem um milhão de anos ser a dupla de Roní. Eles se cumprimentaram falando os nomes, deixando de lado os nomes de guerra bordados na camisa branca.

Começaram a fazer um aquecimento de toque, passando um para o outro. Como estavam um pouco longe, não puderam conversar, por mais que Erick quisesse e muito. Ficava um pouco agoniado quando não podia falar ou conversar com alguém.

Tinham passado para a manchete e depois para o ataque e defesa. Estava posicionado para receber o ataque de Fernando quando uma bola bateu fortemente contra sua cabeça. Erick quase caiu pra frente com a bolada ,e assim que se endireitou, voltou seu olhar para trás.

Lá estava ele, o sorriso irônico no rosto e o olhar pregado em Erick.

Desculpa aí, princesinha – pediu Roní, mas Erick sabia que aquelas palavras eram totalmente falsas.

Ele conteve a vontade de mandá-lo para puta que pariu ou lhe mandar o dedo do meio. Erick não era de fazer tal coisa, apenas quando o irritavam profundamente, o que era muito difícil. Mas Roní conseguia levar Erick a um auge de raiva que ele próprio não sabia que conseguia nutrir por alguém.

Não disse nada, apenas voltou-se para Fernando.

Você está bem? – ele perguntou chegando perto de Erick.

Estou – respondeu com certa raiva na voz. – Vamos voltar.

Fernando apenas assentiu e atacou a bola em Erick, que a recebeu um pouco desajeitado e depois levantou para si mesmo para fazer o ataque.

Não demorou dois minutos para receber outra bolada.

Foi mal aí, viadinho! – provocou Roní.

Mais uma vez, Erick não falou nada, simplesmente respirou fundo e voltou sua atenção para Fernando. Foram fazer os últimos exercícios em dupla e demorou um pouco para Roní perturbar Erick novamente, mas assim que o iria fazer, foi interrompido.

Você tá atrapalhando a porra do treino – disse um garoto bem alto segurando o braço de Roní, que estava preparado para lançar a bola em Erick. – Você vai se arrepender de continuar com essa merda.

Roní era alguns centímetros mais baixo que o garoto loiro, mas a cara ameaçadora que este sustentava daria medo em qualquer pessoa. Roní soltou um tsc e se desvencilhou do aperto do outro, não falando nada e se afastando com alguns caras.

Erick estava impressionado com a altura do garoto que acabara de lhe defender. Com certeza ele estava na casa dos 1,80m, provavelmente ficaria com uns 2m quando fosse mais velho. Ele não ficou tão intimidado com o outro, então queria ir até ele e pelo menos agradecer. Porém, o professor os chamou, fazendo com que Erick não conseguisse falar com o garoto naquele momento.

Muito bem, vamos fazer um aquecimento de rede – instruiu o professor – Schneider, você joga de levantador, certo?

Sim, senhor – confirmou Erick, tentando não fazer careta com a forma como fora chamado.

Pode ir pra rede. Nascimento, pro outro lado. Os demais façam filas pra atacar. Quem for atacar pelo meio, avise antes ao levantador. Vamos, é só um aquecimento.

Então se posicionaram da forma como o professor ordenou, Erick e Nascimento ficando no meio da quadra, mas em metades opostas. Erick levantava para a fila que era formada à direita, enquanto Nascimento o fazia à esquerda, para que não houvesse conflito na hora dos ataques. Vez ou outra, Erick tinha que perguntar para um central como ele preferia que a bola fosse levantada e se esforçava para levantar bolas boas paras estes.

Erick tentou conter a empolgação quando foi a vez do cara loiro realizar o ataque. Ele estava com uma camisa de competições passadas e Erick pode ver o nome “Danilo Mendes” nas costas dele quando se virou.

Oi, sou Erick – ele cumprimentou sorrindo simpático. – Obrigado pelo o que fez mais cedo.

Danilo – o outro respondeu, sem muita animação. – Não foi nada.

É sério, esse cara tem me enchido o saco faz muito tempo – comentou Erick, tentando puxar assunto.

Hm... – respondeu Danilo.

Erick franziu levemente o cenho, aparentemente o outro não queria conversa.

Então, que tipo de bola você prefere?

Tanto faz.

Erick apenas assentiu, Danilo se afastando um pouco e tocando a bola para Erick. Ele fez o levantamento, a bola um pouco mais alta do que costumava a levantar para os centrais. Não viu exatamente o que aconteceu, mas escutou a bola sendo cravada com força na quadra do outro lado. Erick olhou para Danilo maravilhado.

De novo – disse Erick animado. Danilo franziu o cenho.

Eu tenho que ir para o outro lado, cara.

Não, por favor! – implorou Erick – Deixa eu levantar mais uma vez para você.

Danilo o analisou por uns segundos, então pegou uma bola que estava vindo do outro lado. Erick fez o levantamento na ponta para um dos jogadores que estava na fila e voltou-se rapidamente para Danilo.

Vamos, bola rápida – informou Erick e Danilo assentiu.

O central mandou a bola para Erick com toque, que o levantou da mesma forma, porém medindo a força para que a bola não fosse muito alta e fosse próxima a rede. Erick conseguiu apena captar Danilo no ar, descendo o braço em direção a bola e cravando-a mais uma vez do outro lado da quadra. Seu sorriso aumentou, seu coração acelerou e seu estômago se apertou com a animação. Queria levantar mais para aquele cara.

De novo – repetiu Erick, os olhos castanhos brilhando.

Mas eu tenho que para o outro lado. – argumentou Danilo, estranhando o outro.

Antes que Erick pudesse falar alguma coisa, o treinador mandou agilizarem o aquecimento, Erick vendo que uma fila enorme já se formava do seu lado da quadra. Então teve que acatar, levantando para os outros colegas o mais rápido que podia. Queria ver o ataque de Danilo com o outro levantador.

Ele ficava toda hora olhando para o lado e quando finalmente viu que Danilo iria atacar, ele levantou rapidamente a bola que estava vindo em sua direção de algum dos colegas e olhou para o outro. Ficou ainda mais maravilhado com os movimentos do garoto. Ele executava as passadas para o ataque tão perfeitamente que chegava a ser bonito de se ver. Todo o movimento de ataque era bem executado e Erick se animou, pois não via muito disso nos garotos de sua idade.

Então fora treinar saque, Erick fazendo questão de ficar ao lado de Danilo para analisar seus movimentos. Se o garoto fizesse um saque viagem, onde o jogador executava o movimento de ataque para colocar a bola em jogo, Erick com certeza iria querê-lo em seu time sempre.

Para o seu azar, Danilo não sacava daquele modo, mas Erick não soube dizer se ele não sabia ou se simplesmente não estava a fim de fazê-lo. Ele conseguia ver que o outro não era tão animado assim com o esporte. Parecia que era obrigado a estar ali. Tinha a cara fechada e parecia que daria um fora na primeira pessoa que chegasse perto.

Porém ele não se intimidou com aquilo. Estava acostumado a lidar com pessoas introvertidas. Claro que sabia, tinha Henry como melhor amigo, uma das pessoas mais introvertidas que ele já conhecera.

Iria conquistar a empatia de Danilo, mesmo que demorasse a acontecer.

[…]

Durante as próximas semanas, descobrira com Amanda e outras pessoas que Danilo era alguns meses mais velho que Henry e que estava na Cavalaria, fazendo com que não visse o garoto muitas vezes ao dia. O prédio da Cavalaria era bem afastado do de Comunicações, então o via mais na saída e nos treinos. E sempre que Erick via Danilo sozinho, ele fazia questão de falar com o garoto.

Ei! – exclamou chegando perto do outro. Amanda ficaria no Colégio para o ensaio da banda de música.

Danilo o olhou, a expressão meio indiferente, meio ameaçadora, dizendo claramente que não queria conversa. Mesmo assim, Erick continuou ao seu lado, um sorriso simpático nos lábios mostrando que estava lá em paz.

Cê treina vôlei há muito tempo? Cê é muito bom, sério! – ele disse animado – Tem algum lugar onde cê treina? Eu estou no Botafogo.

Não me lembro de ter dado brecha pra conversar com você – respondeu Danilo e virou-se para frente, andando um pouco mais rápido para se afastar de Erick.

Não queria admitir que a tirada tinha doído, então apertou o passo e voltou para o lado de Danilo.

Eu só to tentando ser legal. Não conheço muita gente por aqui, sabe? Cheguei aqui no Rio tem um pouco mais de um mês, então não fiz muitos amigos e pensei que...

Pensou que só porque jogamos juntos somos amigos? – interrompeu Danilo com um leve tom sarcástico na voz. – Pensou errado.

Então saiu andando, dessa vez Erick não o seguindo, chocado demais com as palavras rudes do outro para ir atrás dele.

Danilo tinha sido até menos indiferente em relação a Erick nas semanas anteriores àquilo, então ele realmente não entendeu aquela reação do outro. Mas Erick era conhecido por não desistir de seus objetivos, decidindo que daria um tempo para Danilo. Não sabia o motivo de sentir-se daquela forma, com uma vontade enorme de conhecê-lo melhor, de provar pra si mesmo que Danilo só aparentava ser grosso, chato e ameaçador.

Nas semanas seguintes, Erick deu um espaço para Danilo, apenas falando com o outro nos treinos de vôlei. Erick via nitidamente que algo estava incomodando-o, pois fazia a mesma expressão quando acontecia algo. Ele não sabia disfarçar quando algo estava errado e aparentemente Danilo também não.

Usou esse tempo para analisá-lo melhor. O garoto tinha uma técnica impressionante e parecia aprender muito rápido qualquer tipo de movimento. Nessas horas, Erick se continha para não sair correndo na direção de Danilo e implorar para que ficassem o dia inteiro treinando os ataques do central.

Depois daquela tirada, todas as vezes que Erick tentava alguma coisa, Danilo o repelia ou o destratava. Com isso, passou a notar que não era algo pessoal, ele fazia isso com a maioria das pessoas, porém nenhuma delas parecia tão insistente como Erick.

Os meses foram passando e Erick percebeu que não conseguiria ter brecha com Danilo. Estava correndo demais atrás dele, já estava ficando cansativo e em nenhum momento ele parecia que cederia.

Mas o que fez mesmo desistir de tentar uma amizade com Danilo foi algo que ocorreu no meio do ano, quando estavam no treino. Tinham acabado de jogar em trincas, Erick, Danilo e Nascimento sendo uma das trincas. Quando saíram de quadra por terem perdido, Erick chamou por Danilo.

Danilo, eu acho que...

Pelo amor de Deus, cale a boca! – exclamou ele, a voz num tom de fúria palpável. – Eu não quero saber se podemos melhorar ou se poderíamos ter ficado mais tempo! Não me importo! Você é a pessoa mais irritante que eu já conheci na vida. Só me deixe em paz, caralho.

Aquilo deixou Erick sem palavras. Não teve como reagir e também nem reagiu quando Roní começou a zombar dizendo que os namoradinhos estavam tendo uma discussão de relacionamento. Erick só queria um amigo. Só queria alguém para conversar que não fosse Amanda, já que todos pareciam falsos demais aos olhos dele.

Desde então, nunca mais tentou nada.

Ambos viraram quase estranhos um para o outro.

Até as coisas começarem a mudar para Erick.

 

* * *

Atualmente – Outubro de 2016

Erick estava deitado naquela tarde de outubro, o calor consumindo cada célula de seu corpo.

Não estava com vontade de fazer nada, não estava com vontade nem de respirar. Por mais que gostasse de calor, às vezes o Rio de Janeiro virava um verdadeiro inferno na Terra. Ele desejou intensamente pegar um ônibus e ir para a praia, mas beber estava na sua lista de prioridades naquele momento.

O time de vôlei faria um churrasco na casa de Oliveira em comemoração ao fim do terceiro bimestre e a vitória deles sobre o CMBH, de novo. Eles já tinham saído para comemorar antes, alguns dias depois de voltarem de Campinas, mas Erick estava tão mal que resolveu ficar em casa, algo de que só mais tarde ele se arrependeu amargamente.

Ele não queria ir ao churrasco e também os outros companheiros de equipe pareciam que não faziam questão de que ele comparecesse, mas Erick precisava de alguma coisa para esfriar a cabeça diante do que estava acontecendo em sua vida. Ele preferia gastar 25 reais e beber a vontade do que gastar mais de 50 e não chegar aos pés de ficar bêbado do jeito que queria. Mesmo que fosse fraco pra bebida, ele precisava passar dos limites de vez em quando e viu o churrasco como uma oportunidade para fazer isso.

O que lhe preocupava era o fato de Danilo provavelmente estar lá.

Lembrava-se perfeitamente de quando o conheceu, de como o outro fora grosseiro com ele no meio daquele ano e de como desistiu de ter uma amizade com o garoto depois daquilo. Mas, após os acontecimentos com Henry, Danilo pareceu começar a se afeiçoar a Erick, mesmo de maneira totalmente esquisita.

Enquanto estava bem, Danilo estava cagando para Erick. Depois que começou a agir estranho devido aos acontecimentos com Henry e o pai, Danilo pareceu querer ficar próximo a Erick. E ele não entendia, talvez nunca entendesse o que se passava na cabeça do central.

Não queria Danilo por perto, principalmente naquele momento em que o outro não parava de ligar ou tentar falar com Erick no Colégio.

Era inevitável se encontrarem nos treinos, mas Erick conseguia driblá-lo rapidamente e sair sem que o outro fosse atrás. Também conseguia passar despercebido no final das aulas, quando Danilo ficava no portão de entrada com seu grupinho da Cavalaria. Almoçava o mais distante possível e fazendo de tudo pra ocupar um lugar em mesas lotadas.

Mas ele não conseguia se livrar do celular. Danilo mandava mensagens com frequência e até chegou a ligar algumas vezes. Erick logo o bloqueou, não querendo conversa. Entretanto, volta e meia recebia mensagens e ligações, descobrindo mais tarde que Amanda o tinha desbloqueado, insistindo para que os dois conversassem.

Ficaram nesse bloqueia-desbloqueia por muito tempo, Erick fazendo de tudo para que a garota não respirasse perto de seu celular. Ela não entendia porque Erick estava agindo daquela forma. Na verdade, nem ele próprio sabia, só não queria ficar perto do outro, não depois de tudo o que ele presenciou nos Jogos.

Olhou a lista do WhatsApp, seus olhos caindo imediatamente na última mensagem de Danilo.

“Você vai conversar comigo em algum momento, quer queira quer não”

Erick revirou os olhos, descendo mais, indo para uma das últimas conversas que tivera. Sentiu um aperto no coração assim que viu a foto de perfil de Nathália. Ele sentia muito a falta dela, mas não a culpava por ter saído de casa depois de tudo o que seu pai fizera. Erick não queria lembrar-se das vezes que impediu seu pai de fazer coisas horríveis com sua mãe e sua irmã, mas era inevitável toda vez que olhava para alguma foto de Nathália pela casa, ou para as cicatrizes no próprio corpo, ou para a mãe.

Nathy não estava aguentando aquela situação toda, então, com o dinheiro que estava juntando com o trabalho, voltou para Belo Horizonte, indo morar com a avó materna deles enquanto não arrumava um apartamento para si. Eles conversaram poucas vezes desde que ela saiu de casa e, por mais que ele quisesse muito chamar a irmã, nunca o fazia.

Levantou da cama quando eram 13h para se arrumar, jogando o celular no colchão na tentativa de ignorar ao máximo os devaneios sobre as coisas que ainda rondavam sua cabeça. Tacaria um foda-se para tudo, iria beber até desmaiar e não precisaria dar satisfação para ninguém.

Tomou um banho gelado, dando um alívio temporário no calor. Saiu do chuveiro depois de alguns minutos, se enxugando rapidamente e indo para o quarto com a toalha na cintura. Tinha sorte que estava sozinho, sua mãe estava trabalhando naquele sábado, e não fazia ideia de onde seu pai tinha ido. Não queria saber de qualquer jeito, esperava que saísse bem antes de ele chegar.

Arrancou da gaveta uma cueca branca, depois pegou uma bermuda quadriculada cinza. Vestiu ambas as peças e ficou um tempo de frente para o ventilador, os olhos fechados e a mente em outro mundo. Ouviu o celular vibrando, então foi até onde o objeto estava para ver o que era.

“Você vai no churras né?” Amanda mandou. Erick franziu o cenho e uma centelha de esperança de Mandy ir acendeu em seu peito.

“Vou... Tu vai também?” ele mandou, olhando fixamente para o aparelho esperando uma resposta.

“Mas é claro” ela respondeu e Erick sorriu. “Que não”.

Ele revirou os olhos, a pequena animação se apagou.

“Pq n? Eu já disse q n vou sair do seu lado”

“Vc sabe q eu n bebo e q eu odeio o Nascimento” ela mandou, Erick soltou um suspiro.

Ele lembrava-se muito bem de quando Amanda e Nascimento começaram um rolo. Teria dado tudo certo se o garoto não tivesse ficado com outra na frente de Amanda. Erick insistiu em dizer para ela que os dois não estavam namorando, mas ela sempre rebatia dizendo que ela não se importava com ele ter ficado com outra e sim pelas mentiras que ele lhe dizia.

Desde aquele pequeno problema, ela não frequentava as saídas com o time de vôlei. Dizia que já era sacrificante demais ser da mesma turma que ele no Prevest. E “sacrificante” significava uma enorme vontade de castrar o garoto.

“Mas Renan inventou de sair com Artur e a Priscilla e eu vou bancar a babá”

Por um segundo, Erick cogitou sair com Mandy e os pequenos.

“Vc quer q eu vá cntg? Eu n me importo, vc sabe”

“Aaaah n. N precisa, sei q quer beber um pouco” ela respondeu “Só queria saber msm se vai. Se cuida pelo amor de Deus, beleza? Me avisa qnd chegar em casa. To saindo agr com as pestes, beijos baby”

Erick suspirou, queria a companhia da amiga.

“Okay... Divirta-se, beijos”

Quando checou o horário, viu que tinha se passado meia hora. O churrasco já tinha começado fazia uma hora, pelo menos foi o horário que haviam marcado. Foi até seu armário novamente e pegou a uma camisa de gola V vermelha.

Pegou um kit de maquiagem que Nathy tinha deixado para si e foi para o banheiro. Lá ela havia deixado maquiagem suficiente para muitos anos, todas apenas com a cor da pele de Erick. Ele se olhou no espelho pela primeira vez em muito tempo.

As olheiras sob os olhos castanhos viviam ali por conta das noites mal dormidas, porém um roxo cobria seu olho direito, assim como o queixo, e um corte no supercílio ainda estava cicatrizando. Seu pai, que não lhe batia no rosto fazia algum tempo, o fez na noite passada.

Nathália havia ensinado o irmão a passar maquiagem para cobrir aqueles machucados. Erick perdera as contas de quantas vezes a irmã tinha que acordar cedo para esconder aqueles hematomas de seu rosto para que ele pudesse ir para a escola sem que ficassem perguntando onde os arrumara.

Passou o corretivo claro sobre os machucados, tomando cuidado, pois alguns ainda doíam ao toque. Depois passou a base em todo o rosto para uniformizar o tom de pele e em seguida fez o mesmo com o pó compacto. Ele ficou alguns segundo observando seu trabalho. Tinha ficado bom naquilo com o tempo. Não precisou passar nos braços, nos quais havia apenas o suficiente para dizer que ele era desastrado e batia nos móveis da casa constantemente.

Calçou o All Star preto, pegou a carteira, a chave de casa e o celular, indo em direção à porta.

Oliveira morava em Copacabana, então Erick demoraria um bom tempo até chegar à casa do colega. O ônibus fez o favor de demorar um pouco a passar, mas graças a Deus passou e Erick pode ficar sossegado lendo A Espada do Verão no celular. Depois de um pouco mais de uma hora, Erick finalmente chegou ao seu destino.

Identificou-se para o porteiro, que o guiou até a área de lazer do condomínio em que Oliveira morava. Ao chegar, viu que seus colegas de time estavam bebendo e comendo. Ele cumprimentou os outros de maneira genérica, alguns respondendo e outros não.

– Achei que não viria – disse Oliveira se aproximando.

– Decidi vir de última hora – mentiu. Oliveira assentiu.

– Bom, tem carne na mesa e bebida no freezer – apontou – Qualquer coisa que tu precisar, é só me falar.

– Valeu – Erick agradeceu e virou-se de costas, indo até o freezer, mas antes de dar um passo, virou-se novamente para Oliveira – Você sabe se... ham... O Danilo vem?

Erick viu os olhos de Oliveira analisando-o por míseros segundos antes de responder.

– Ele disse que vai chegar um pouco mais tarde – respondeu.

Erick assentiu, virando-se de novo e indo até o freezer.

Não soube se se sentiu aliviado ou triste ao saber que o outro chegaria mais tarde. Por mais que tivessem uma relação estranha, Danilo sempre cuidava de Erick quando este bebia, então talvez ele tivesse se acostumado com isso, sentindo-se mais seguro em beber se Danilo estivesse por perto. Ao mesmo tempo, não queria que o outro aparecesse uma vez que provavelmente o forçaria a conversar sobre o que rolou em Campinas.

Pegou um latão de cerveja e se dirigiu para a mesa onde os garotos estavam reunidos conversando e rindo. Sentou-se na única cadeira vazia e ficou apenas escutando a conversa, como sempre fazia quando estava com seus colegas.

Lembrou-se do primeiro churrasco que foi, quando entrou para o time, Roní implicando com Erick a cada segundo. Ele deu graças a Deus que o outro tinha se formado ano passado e, como os outros não iam muito com a cara dele, não fizeram questão de convidá-lo, assim como convidaram alguns outros formandos.

Um dos formandos que estava perto de Erick começou a puxar assunto com ele, que só respondia indiferentemente e devolvia a pergunta com um “e você?”, apenas por educação. Em algum momento, Nascimento passou por ali com uma jarra, enchendo os copos dos outros com uma mistura de vodka com tang de morango.

E assim o tempo foi se passando, Erick enchendo seu copo ou pegando uma latinha cada vez que a anterior ficava vazia. Conversava esporadicamente com os formandos, já que Amanda estava sem crédito para conversar com ele enquanto tinha saído com o irmão.

Erick já estava sentindo o efeito do álcool quando Danilo chegou. Já não sabia quantas latinhas ou copos tinha bebido, mas com certeza o suficiente para deixá-lo tonto e falando alguma merda ou outra para seus colegas.

Seus olhos encontraram com os claros de Danilo, Erick vendo a expressão não muito contente do central. Tratou de desviar logo o olhar, tomando o conteúdo claro de seu copo para disfarçar.

Danilo começou a se aproximar, o que fez com que Erick tomasse o líquido mais rápido. Assim que o outro chegou perto, Erick levantou-se com a desculpa de que iria pegar mais bebida. Caminhou rapidamente até o freezer, suspirando aliviado por Danilo não ir atrás dele.

Ficou ali perto, fingindo que estava conversando com alguém para que não tivesse que voltar para perto de Danilo. Não sabia quanto conseguiria driblá-lo, mas, quanto mais tempo e mais bebida, melhor. Acabou por ficar conversando com o cara que estava fazendo o churrasco, Erick na função de encher os copos dos dois assim que ficassem vazios.

Vez ou outra lançava um olhar na direção da mesa, às vezes vendo Danilo rindo para algo idiota dito por seus colegas ali presentes. Mas, de vez em quando, ambos os olhares se encontravam e Danilo dizia com o olhar um claro “você não vai escapar de mim por tanto tempo”. Erick verdadeiramente não entendia por que o outro estava querendo tanto uma conversa.

O dia começou a escurecer e Erick já não conseguia mais identificar as coisas que estavam a sua frente. Sua visão estava muito turva e ele ria de qualquer coisa que os outros colegas bêbados diziam. Além de não conseguir dar dois passos sem tropeçar nos próprios pés. Talvez tivesse passado demais do limite.

Estava na rodinha com os colegas, rindo debilmente com seus colegas quando viu que não tinha nada em mãos. Não sabia se a última coisa que bebera era uma latinha de cerveja ou um copo com vodka e tang, mas sabia que queria mais. Então se virou desajeitadamente na direção do freezer, tropeçando no próprio pé. Teria caído lindamente de cara no chão se alguém não o tivesse amparado.

– Já chega, você bebeu de mais – a voz de Danilo entrou nos ouvidos de Erick, mesmo que ele não pudesse ver claramente a face do outro.

– Me solta – resmungou Erick se desvencilhando de Danilo com força desnecessária, fazendo-o cair no chão. – Olha o que você fez, idiota.

Erick não viu, mas tinha certeza que Danilo revirou os olhos.

– Não vou discutir com você, Erick – disse Danilo pegando o outro pelo braço e levantando-o. – Você preci...

Antes mesmo que Danilo pudesse terminar, Erick vomitou em cima dele. Erick não soube o que foi dito, mas ele ouviu o coro de pessoas rindo de sua situação.

– Puta merda – resmungou Danilo se afastando um pouco de Erick, mas chegou pra frente ao ver que o outro ia cair.

– Está tudo bem com ele? – perguntou Oliveira, os olhos levemente arregalados.

– Vai ficar – respondeu Danilo por Erick. – Nós podemos subir? Vou dar um jeito nele, não se preocupa.

– Claro. – respondeu Oliveira apalpando os bolsos e entregando as chaves para Danilo. – É esse bloco aqui da frente, apartamento 403. Por favor, não deixa ele vomitar minha casa.

– Beleza, tem alguém lá?

– Não, podem ficar a vontade. Tem roupa no meu armário, pode pegar qualquer coisa. Deixa ele na minha cama. Pode ligar o ar condicionado também.

Danilo assentiu, sentando Erick na mesa para que pudesse tirar pelo menos o excesso de vômito da camisa azul. Ficou de olho no outro enquanto se limpava com alguns guardanapos. Erick cruzou os braços em cima da mesa e deitou a cabeça. Danilo correu rapidamente até ele, dizendo para ele não abaixar a cabeça.

Parcialmente limpo, Danilo levantou Erick, perguntando se ele conseguia andar.

– Claro que consigo – respondeu, virando-se de costas para Danilo e parando.

Erick piscou algumas vezes. As coisas pareciam girar ao seu redor, nada parecia ter a profundidade certa, muito menos pareciam estar nos lugares em que estavam. Ele deu o primeiro passo, abrindo os braços para se equilibrar. Conseguiu dar o segundo, mas seu cérebro parou de funcionar como se dissesse que era trabalho demais dar mais de dois passos, então Erick tombou pra frente, sendo segurado pela camisa por Danilo.

– Você passou a porra do limite, lógico que não consegue andar. – reclamou Danilo, passando o braço na cintura de Erick e levando o braço do outro até seus ombros. – Vamos devagar, eu vou te levar lá pra cima.

– Não! Me solta! – Erick não soube se gritou ou não – Eu quero beber mais! Ainda não estou bêbado o suficiente.

– Cale a boca, você vai entrar em coma alcoólico se continuar assim – Danilo beliscou a cintura de Erick. Quando o outro não reagiu, soube que ele estava muito mal.

– Mas eu não...

– Calado.

Então Erick se calou com um bufo. Deixou-se ser levado por Danilo, ambos em um silêncio tão incômodo que Erick queria gritar tudo o que se passava em sua cabeça. Bem, ele não gritou, mas disse.

– Porque se preocupa tanto comigo? Vai se foder – a voz era um emaranhado de palavras tão grande que nem ele soube o que disse exatamente – Você me odeia.

Danilo suspirou.

– Você vai dizer que não se preocupa, não é? – disse Erick, soltando uma risada amarga. – Você sempre diz isso. Então por que continua do meu lado? Você disse que eu era a pessoa mais irritante que você já conheceu.

Aquilo mexeu com Danilo de uma forma que ele não soube explicar direito. E as perguntas de Erick eram as mesmas que ele mesmo fazia para si. Erick tinha virado uma pessoa arrogante e problemática, ninguém queria ficar do lado dele. Mas Danilo sabia que o outro não era assim. Talvez ele apenas quisesse entender Erick. Por mais que conseguisse ver que o outro estava sofrendo, dava agonia em Danilo não saber o motivo para tal.

Talvez ver a mudança drástica de Erick o tenha feito ter uma empatia pelo outro mais do que estava acostumado.

Danilo sabia o que era ser separado de alguém que amava e confiava. Sabia como as coisas mudavam diante disso. Talvez fosse por isso que ele queria ajudar Erick tão desesperadamente.

– Só vamos cuidar de você, okay? – disse Danilo arrastando Erick até o elevador. – Me avise se quiser vomitar.

– Eu estou bem.

– Aham, tá bom – rebateu com ironia.

Erick ficou calado, Danilo apertou o botão do quarto andar e subiram em silêncio. O apartamento de Oliveira era de frente para o elevador, facilitando o trabalho de Danilo. Ele abriu a porta e, sem aviso prévio, como Danilo havia pedido, Erick vomitou na entrada da casa.

– Puta que pariu, Erick – reclamou Danilo – Eu falei pra avisar.

Erick apenas riu.

Danilo deixou a porta aberta, procurando o banheiro rapidamente enquanto deixava o outro apoiado na parede. Assim que viu onde era, ele voltou, pegou Erick novamente e o levou até o local. Levantou a tampa da privada e mandou Erick se ajoelhar ali e esperar.

– Não saia daí e, pelo amor de Deus, acerte o buraco – ordenou.

Erick falou alguma coisa incompreensível. Danilo apenas ignorou e foi limpar o vômito de Erick.

O chão estava frio por ser de azulejo, assim como a privada por ser de cerâmica. Erick estava praticamente deitado sobre o objeto, os olhos pesando enquanto sua mente viajava. Sem sentir ou sequer saber o motivo, ele começou a chorar. Ele limpou as lágrimas, o nariz escorrendo e a boca resmungando alguma coisa que nem ele mesmo sabia o que era.

Não sentia nada, tanto fisicamente quanto emocionalmente. Não conseguia ter um pensamento coerente por conta do etanol em sua corrente sanguínea. Se lhe perguntassem por que estava chorando, ele não saberia responder.

Danilo voltou depois de algum tempo, mas Erick não viu quando isso aconteceu. Só soube que o outro estava de volta ao banheiro quando foi tocado no ombro. Erick virou o rosto na direção de Danilo.

– Vai vomitar de novo? – ele perguntou.

Danilo sabia que, se quisesse arrancar alguma coisa de Erick, a hora era aquela, mas se conteve. Por mais que quisesse saber o que estava acontecendo com ele, não faria uma coisa dessas. Sabia que Erick bebia para esquecer-se das coisas e, se ele o relembrasse do que queria esquecer, não seria nada bom. Além do mais, queria conversar com o outro puramente sóbrio.

Erick negou com a cabeça, então Danilo assentiu e o levantou, fechando a tampa da privada e sentando o outro ali. Tirou a camisa de Erick, que não reclamou, apenas ergueu os braços para facilitar a saída da peça.

Danilo sufocou uma exclamação de espanto após ver o tronco do outro. Seu abdome estava coberto de roxos vívidos, assim como alguns esverdeados por conta do tempo. Além dos hematomas, alguns cortes ainda em processo de cicatrização estavam espalhados pelo corpo de Erick e ele podia ver também algumas linhas mais brancas, cicatrizes que ele nunca imaginou que o outro teria.

Não soube o que sentir naquele momento. Queria saber desesperadamente onde Erick tinha conseguido aqueles hematomas e cortes. Mas não perguntaria, pelo menos não com ele naquele estado.

Voltou ao seu trabalho engolindo em seco, se abaixando para tirar os tênis e as meias de Erick antes de levantá-lo e tirar seus shorts. A roupa de Erick só não estava mais vomitada que a de Danilo.

Ele desligou o chuveiro e abriu o registro, a água gelada caindo forte no chão. Conteve outra exclamação de surpresa após virar Erick na direção do box. Cicatrizes, longas e brancas cobriam toda as costas do garoto, assim como hematomas e cortes, como os que havia em seu abdome. Mesmo não sabendo como Erick os havia conseguido, apesar de já ter uma leve noção, Danilo entendeu o motivo de o outro nunca trocar de roupa na frente de ninguém. Soltando o ar que não sabia que estava prendendo, Danilo colocou Erick dentro do box e fechou.

– Tente não se afogar enquanto eu pego roupas. – avisou Danilo antes de sair do banheiro novamente.

Ele estava tremendo quando finalmente saiu. Ver aquelas coisas pelo corpo de Erick tinha lhe apertado intensamente o coração, e Danilo queria apenas dizer ao outro que ficaria tudo bem, mesmo sem saber o que aconteceu. Queria saber o motivo daquilo tudo, queria que Erick lhe contasse. Queria ajudá-lo.

O jato gelado atingiu o corpo de Erick fazendo a pele se arrepiar, mas ele não estava incomodado com o frio, na verdade, não o sentia direito. Fechou os olhos, mas logo os abriu, pois a sensação de que estava em alto-mar o atingiu fortemente, deixando-o enjoado e tonto.

Em algum momento, cansou-se de ficar em pé, então se apoiou na parede e deslizou até sentar-se no chão. A água batia em seu corpo e, por ele estar com a cabeça para trás, ela não atingia sua cara. As lágrimas quentes ainda corriam, mas ele não se importou muito, deixou que elas saíssem, mesmo que o fato de não saber o motivo pelo qual estava chorando o irritasse.

Não soube quanto tempo se passou até Danilo voltar e levantá-lo, fechando o registro e lhe dando um copo de água antes de enrolar uma toalha branca em seu corpo.

– Tá um pouco melhor? – ele perguntou, a voz calma.

– Quem é você? – perguntou Erick franzindo o cenho. Por mais que não estivesse com a melhor visão possível, ele podia identificar que aquelas cores de roupas não eram a que Danilo estava.

– Sou eu, Erick – respondeu suspirando. – Danilo. Só troquei de roupa.

– Ah – soltou Erick e deu uma risada. – Eu odeio minha vida.

– Sim, eu sei disso – disse Danilo e começou a enxugar Erick após ver que o outro não faria aquilo sozinho.

Era a primeira vez que tinha que fazer aquilo pelo outro. Todas as vezes em que Erick bebeu e Danilo estava junto, o garoto não tinha chegado ao ponto de vomitar e trocar os pés ao andar. Água e doce sempre foram as únicas formas de tratar Erick da bebedeira. Ele já havia cuidado de Erick daquele jeito mil vezes, mas as coisas estavam mais complicadas do que Danilo imaginava. Provavelmente era por causa da tensão que tinha entre os dois desde os Jogos e que havia piorando ainda mais ao ver as cicatrizes de Erick.

Danilo enxugou todo o corpo de Erick, contendo a vontade de pegá-lo no colo e levá-lo para o quarto de Oliveira, o que facilitaria seu trabalho. Mas não o fez, não queria saber a reação do outro ao ser pego no colo.

Quando terminou com as pernas e levantou-se para encarar Erick, Danilo viu algo estranho no rosto do outro, como se sua cor estivesse escorrendo. Ele passou a toalha branca pelo rosto de Erick, constatando que o que o outro usava no rosto era maquiagem. Danilo fechou os olhos e respirou fundo ao ver o roxo no olho de Erick, assim como o corte no supercílio e o hematoma no queixo.

Não podia deixar que aquelas coisas lhe atrapalhassem, mas o aperto no coração era inevitável.

– Você consegue tirar a cueca sozinho? Você se importa de ficar só de shorts? – a sua voz estava tremendo um pouco. Danilo sabia que Erick não notaria o tom estranho em sua voz, então não se importou com aquilo.

Erick franziu o cenho, provavelmente confuso com as duas perguntas que foram feitas.

– Só tira a cueca – disse Danilo.

Erick assentiu lentamente, os membros parecendo mais pesados do que de costume. Ele apoiou o ombro na parede ao mesmo tempo em que levantava a perna e levava as mãos para o cós da cueca. Danilo teve que segurar seus ombros para que ele não caísse para frente. Com muita dificuldade, Erick conseguiu despir a peça, resmungando e bufando quando Danilo lhe entregou uma calça de moletom.

– Quero ficar assim – murmurou meio grogue – Não me faça colocar a calça.

– Vamos, Erick. Você não pode ficar pelado na cama dos outros. Já está usando as roupas de outra pessoa e...

Erick tinha parado de prestar atenção, os olhos sonolentos faziam com que ele parecesse que estava dormindo encostado na parede. Danilo respirou fundo, pedindo paciência para todos os deuses que existissem.

Pegou o corpo do outro e o sentou no vaso sanitário após enrolar desajeitadamente a toalha na cintura alheia. Agachou-se na frente de Erick e levantou uma de suas pernas para colocar a perna do moletom. Repetiu o processo com a outra e subiu o cós da calça até a altura dos joelhos de Erick. Danilo o levantou da privada e terminou de colocar a calça no outro. Tinha sorte que estava acostumado a vestir outras pessoas bêbadas, pois houve uma época em que Dante e Diogo, seus irmãos mais velhos, adoravam chegar tribêbados em casa.

Largando a toalha na pia, Danilo amparou Erick até o quarto de Oliveira, onde tinha deixado o ar condicionado ligado. Colocou o outro sobre a cama e pegou a jarra de água que tinha deixado ali para Erick. Pegou o copo e o encheu, entregando para Erick, que bebeu sem reclamar.

– Como está se sentindo?

– Nada.

– Que?

– Não to sentindo nada – repetiu Erick e deu um sorriso meio débil – Exatamente como eu queria.

– É tão importante assim esquecer? – perguntou Danilo, tomando cuidado com as palavras.

Erick soltou a risada mais amarga que Danilo ouvira dele. Nem sóbrio ele conseguia dar uma risada como aquela. Erick deixou os olhos castanhos caírem sobre Danilo, que viu o quanto o outro parecia estranhamente vazio.

– Se eu não esquecesse por pelo menos alguns momentos – disse Erick e deu um gole na água – Eu teria surtado há muito tempo.

[…]

Estava passando pelo prédio de Cavalaria, já que tinha que entregar um documento para um sargento que ficava lá, e rapidamente seus olhos foram capturados pelo treino de equitação.

Era legal ver os alunos montados em cavalos e passando por obstáculos. Também era legal ver alguns caindo do cavalo. Ficou alguns minutos observando o treino e só depois de um tempo reparou que estava sendo encarado por olhos claros. Assim que identificou Danilo ao longe, Erick desviou e seguiu seu rumo apressadamente.

– Ei, Erick! – ouviu a voz de Danilo gritando-o de longe.

Erick não parou para olhar pra trás, apenas apertou o passo. Porém foi logo alcançado pelo outro. Claro, Danilo tinha pernas muito longas, lógico que conseguiria cobrir a distância entre os dois com facilidade, por mais que Erick se esforçasse.

– Ei, precisamos conversar. – falou Danilo ao alcançá-lo.

Danilo estava levemente vermelho e suado, o cheiro do suor misturado com o cheiro de bosta de cavalo vindo do garoto era forte.

– Você está fedendo. – comentou Erick e virou-se para ir embora, mas Danilo o pegou pelo braço com força.

– Foda-se – respondeu – Nós precisamos conversar seriamente. Eu não aguento mais te ver assim. Não aguento mais você fugindo de mim.

Erick se surpreendeu com a sinceridade que saia das palavras de Danilo. Mas também sentiu raiva por identificar pena.

– Não temos nada para conversar. – respondeu Erick, desvencilhando do aperto do outro e virando-se, quase saindo correndo.

– Eu vi as cicatrizes, Erick. – disse Danilo, fazendo Erick estagnar onde estava.

Um turbilhão de coisas veio a sua mente. Claro que ele tinha visto as cicatrizes. Erick foi burro em achar que podia ultrapassar seu limite naquela merda de churrasco sem que tivessem que levá-lo para o chuveiro para que pudesse melhorar.

Amaldiçoou-se mil vezes por isso. Sempre foi muito cuidadoso quanto a tirar a roupa e, por causa de uma merda de bebida, ele tinha estragado tudo.

Erick virou-se lentamente para Danilo, a expressão ao mesmo tempo ameaçadora e cansada.

– Mais alguém viu? – foi o que perguntou.

– Não, só eu – respondeu Danilo, a voz totalmente tensa. – Eu só quero conversar. Vamos à praia no sábado?

Aquilo despertou o interesse de Erick. Uma das poucas coisas que ele amava naquele lugar infernal era praia. Então, ele considerou a ideia, uma vez que podia ir à praia depois de tantos meses sem ver o mar.

– Tudo bem – respondeu Erick após alguns segundo pensando.

– Ótimo – Erick viu que Danilo conteve o sorriso – Nos encontramos na central e vamos ao Arpoador, hm... Às 8h tá bom pra você?

Erick apenas assentiu. Dessa vez, Danilo não conteve o sorriso, mesmo que fosse mínimo.

– Então nos vemos no sábado – disse e ficou alguns segundo parado, analisando Erick, que não esboçava reação alguma.

Quando viu que Erick não iria falar nada, Danilo despediu-se e virou-se, voltando novamente para o treino de equitação.

Erick soltou um suspiro e voltou para seu caminho, ainda se amaldiçoando completamente.

[…]

– Me desculpe, eu perdi a hora – disse um Danilo ofegante chegando próximo de Erick.

Erick sabia que o outro morava em São Gonçalo, um município longe pra cacete da área onde estavam, então não o culpou, provavelmente tivera que pegar dois ou mais ônibus para estar ali.

– Tudo bem – ele falou dando de ombros. Danilo assentiu e esboçou um sorriso para o outro.

– Tudo bem contigo? – perguntou de maneira aleatória quando começaram a andar para fora da Central.

– Sim – respondeu Erick simplesmente, dando fim à conversa.

Danilo não sabia muito bem o que falar e Erick não parecia que queria muita conversa. Então caminharam até a Av. Presidente Vargas para pegarem o ônibus para a praia Arpoador. Para o alívio e Danilo, o ônibus passou rapidamente, mas logo esse alívio passou e foi substituído por tensão novamente, pois estava em um silêncio desconfortável.

Passaram o percurso todo em silêncio, cada um perdido nos próprios pensamentos.

Demoraram um pouco para chegar, mas, logo que sentiu o cheiro de maresia, Erick sentiu-se bem. Não sabia exatamente o motivo pelo qual gostava tanto de praia, mas sabia que lhe tranquilizava de maneira que apenas café e vôlei faziam.

A praia não estava muito cheia onde saltaram, então puderam ficar numa distância boa da água, sem muitas pessoas ao redor deles. Erick tirou uma toalha da bolsa e a colocou na areia, sentando-se logo em seguida e abraçando as pernas, olhando para o mar.

– Não vai tirar a blusa? – perguntou Danilo fazendo exatamente o que perguntara ao outro.

Erick lhe lançou um olhar meio mortal, como se fosse óbvio o porquê de ele não tirar a regata. Danilo pareceu se tocar.

– Ah – ele soltou, coçando a nuca de maneira nervosa – Desculpe.

Erick assentiu.

– Você quer que eu alugue uma barraca pra não ficar muito no sol? Sua pele é muito branca, vai se queimar fácil.

– Já me entupi de protetor solar, preocupe-se com a sua pele – rebateu Erick, sem muita paciência para aquelas atitudes de Danilo.

Com um suspiro, o outro assentiu, tirando a própria toalha e esticando na areia ao lado de Erick. Tirou também o protetor solar, começando a passá-lo pelo corpo. Enquanto isso, Erick apreciava o mar e tirava algumas fotos, mandando para Amanda, que Danilo insistiu em não chamar. Erick estava contendo a vontade de sair correndo e se jogar na água.

– Você... ahm... Passa nas minhas costas? – Danilo perguntou após um tempo, tirando Erick de seus devaneios.

Em resposta, ele apenas pegou o protetor das mãos do outro e espremeu um pouco do conteúdo na mão, Danilo já se virando de costas e esperando. Rapidamente, Erick espalhou o produto branco pelas coisas brancas de Danilo.

– Valeu, cara – agradeceu Dan e sorriu para Erick, que apenas assentiu.

Então caíram mais uma vez num silêncio sufocante, pelo menos para Danilo. Erick parecia à vontade com a falta de palavras, parecia bem em apenas observar o mar.

Era impressionante como uma coisa simples da natureza poderia trazer tanta paz a Erick. Porém, ele sabia que era uma paz passageira, que logo teria que voltar para a vida real, a qual não era tão tranquila quanto queria.

– Um dos meus irmãos mais velhos foi expulso de casa na época em que nos conhecemos. – disse Danilo de repente, quebrando o silêncio entre eles.

Erick virou o rosto para encarar o outro, mas este estava olhando o mar, os olhos claros um pouco tristes.

– Eu não consegui acreditar naquilo – continuou – Foi uma coisa horrível... Meus pais gritaram com ele e o mandaram sair da casa deles. Eu não sei qual o motivo ao certo, mas sei que Diogo não deveria ter falado para eles que faria engenharia civil e que era gay na mesma hora. Até hoje não sei se meus pais o expulsaram por não querer ser educador físico ou por beijar outros homens.

Erick franziu o cenho, não entendendo muito bem. Danilo soltou uma risada meio triste.

– Meus pais são formados em educação física... Talvez você os conheça... Virgínia Mendes e Edson Carneiro.

Erick arregalou os olhos e evitou abrir a boca em um perfeito “O”. Era óbvio que Erick conhecia os dois, seria um verdadeiro poser em voleibol se não soubesse quem era os jogadores famosos da seleção brasileira que mais tarde viraram técnicos com vários e vários títulos nos ombros. Eram nomes de peso no mundo do voleibol nacional, Virgínia sendo uma das primeiras técnicas mulheres a liderar a seleção brasileira feminina no início dos anos 2000.

Danilo riu ao ver a expressão de Erick.

– Surpresa! – disse sem muita animação e voltou seu olhar para o mar. – Pois é... Eles são meus pais. Então você também deve conhecer meu irmão, Dante.

Mais uma vez, Erick soube de quem Danilo estava falando. Dante Mendes Carneiro, um dos melhores centrais da atualidade. Lembrava-se perfeitamente de um jogo em que ele veio do banco e simplesmente conseguiu virar o placar do jogo em 2 sets, levando o jogo ao tie-break e ganhando a partida.

– Dante é maravilhoso – prosseguiu Danilo, a voz com um leve tom de orgulho ao falar do irmão. – Admiro muito ele por ser um excelente jogador e tudo o mais, mas às vezes o culpo por fazer, inconscientemente, meus pais esperarem tanto de mim ou de Diogo no voleibol. Meus pais sempre sonharam em ter uma família inteira de jogadores profissionais e, com o peso do nome deles, seria fácil para a gente conseguir algo no meio, né? Pois é... Eles viviam falando isso para mim e Diogo.

“Mas Diogo nunca se interessou tanto por vôlei. Era forçado a jogar e tinha que dizer que ele jogava muito mal, o que fazia meus pais pegarem ainda mais no pé dele. Vendo que não tinha como progredir, ele desistiu do esporte, o que foi um baque tremendo para meus pais. Mesmo assim, eles não desistiram. Forçaram Dio a entrar para uma faculdade de educação física para ser técnico. Ele detestava aquilo. O ouvia chorando algumas noites, conversando com alguém... Ele dizia que não estava aguentando a pressão e estava odiando cada segundo que passava naquele curso.”

“Eu não sabia com quem ele estava falando. Mais tarde, eu fui descobrir que se tratava de um namorado. Aquilo foi um choque para mim, pois eu descobri acidentalmente e, mesmo que meus pais não falasse muito sobre o assunto, eu sabia que eles eram pelo menos um pouco preconceituosos quanto a isso. Claro que seriam, estavam inseridos no meio esportivo, sem contar que eles têm mais de 50 anos, era de se esperar que fossem.”

“Então, sem aviso prévio ou qualquer coisa do tipo, Dio simplesmente chegou uma noite, Dante tinha acabado de voltar de um campeonato na Rússia, e declarou que tinha pedido transferência da faculdade para engenharia civil e que não precisava da aprovação dos nossos pais para isso, que o namorado dele era o suficiente para isso.”

Danilo fez uma pausa, aparentemente imerso nas cenas que viveu naquele momento. Ele não chorou, mas Erick viu claramente a tristeza nos olhos do garoto.

– Dio tinha desistido do vôlei, da educação física e era gay. Isso foi a mistura perfeita para o desgosto dos meus pais. – prosseguiu após uns segundos – Minha mãe deu a última palavra, dizendo que não queria vê-lo naquela casa no dia seguinte.

Danilo respirou fundo e soltou o ar devagar.

– Eu não acreditei que ela estava falando sério, então não me importei muito com aquilo. Dei um espaço para meu irmão, sabia que ele não iria querer conversar depois daquilo, conversaríamos no dia seguinte quando estaria tudo mais calmo. Nunca me arrependi tanto de não ter ido atrás de Dio como naquele dia em que acordei e vi seu quarto totalmente vazio.

“Meu mundo caiu quando não o vi. Meu coração foi rasgado em mil pedaços, pois eu era muito apegado à ele. Veja bem, meus pais não param em casa por conta dos treinos e viagens para competições. Dante é um jogador profissional, que também vive viajando por causa do vôlei. Minha avó é muito velha e já na época não tinha condições de cuidar de mim e Dio de maneira eficiente. Então foi Dio quem praticamente me criou. Ele é cinco anos mais velho que eu e basicamente foi meu pai desde que eu me entendo por gente. Eu fiquei completamente perdido só de ele fazer um mochilão pela Europa com 18 anos, então quase surtei quando ele foi arrancado de mim. Eu tinha uma conexão muito grande com ele e meus pais me proibiram de ter contato.”

“Algumas vezes, depois da escola eu escapava para a casa dele, que mora com o namorado, ou ex, não sei bem direito. Era fácil, pois eles moram perto da UERJ por causa da faculdade. Mas eu não podia ficar muito tempo, minha mãe iria desconfiar se eu chegasse muito tarde em dias que não era para eu chegar tarde. Não podia visitá-lo com frequência. Mantemos conversa por celular às vezes, mas nem sempre ele pode me dar atenção.”

Danilo soltou um suspiro, como se contar aquilo para alguém tirasse um peso de suas costas. Erick sabia perfeitamente como era.

– Então não... Eu não te acho a pessoa mais irritante do mundo – Danilo virou-se para encarar Erick, que o olhava fixamente, absorvendo a história. – Eu só estava extremamente mal pela separação repentina e sem sentido que tive do meu irmão. Aquilo me afetou de uma forma que eu não soube lidar e acabe descontando um pouco em você e em outras pessoas. Então eu peço desculpas por ter te tratado daquela forma. Se nada disse tivesse acontecido comigo naquela época, as coisas não seriam assim.

Demorou um tempo para Erick responder, ele ainda estava um pouco impactado com a história que Danilo acabara de contar.

– Talvez eu tivesse visto em você o que eu vi em mim naquela época – disse Danilo antes de Erick sequer abrir a boca para falar alguma coisa. – Eu notei como você mudou de repente. Vi que alguma coisa de ruim aconteceu com você, pois eu sabia como era. Você não quer as pessoas por perto quando as coisas não estão bem, certo? Eu sei como é sua vida mudar completamente.

Caíram num silêncio novamente, pois Erick sabia perfeitamente do que Danilo estava falando. Algo fora tirado dele e a única forma de ele conseguir aguentar aquilo fora afastando as pessoas de si. A mesma coisa acontecera com Erick, mas talvez de modo bem mais profundo e doloroso que com Danilo.

– A única coisa que conseguiu me manter no chão foi a Karine – Danilo comentou – Devo muito isso a ela. A Kah foi a única pessoa que não se afastou de mim quando eu fui um filho da puta com todo mundo. Achava que nosso namoro ia acabar por conta das minha atitudes, mas ela não desistiu de mim. Pedi desculpas a ela e continuamos a namorar, ela não ligando para o que eu tinha me tornado naquela época. Por isso que eu falei que nunca é tarde demais para pedir desculpas e se arrepender das suas atitudes. Quem se importa mesmo vai te perdoar.

Erick vira Karine umas duas ou três vezes no máximo. Sabia que a garota era namorada de Danilo fazia uns 4 ou 5 anos e que estudava no Colégio Pedro I. Não sabia como eles haviam se conhecido, mas não era importante naquele momento.

Ele parou para pensar no que Danilo tinha acabado de lhe dizer, que quem se importa mesmo perdoaria. Então se lembrou da noite da festa, em que ele fez a babaquice de tirar a pulseira da amizade dele e de Henry. Lembrava o modo como o outro lhe olhou antes de ele fazer aquilo. Não havia julgamento, raiva ou rancor no olhar de Henry. Erick viu apenas a confusão e tristeza nos olhos do amigo. Se ele tivesse sido um pouquinho mais racional, poderia ter pedido desculpas, e Henry as aceitaria. Sabia disso. Sabia que Henry o perdoaria.

– Eu... – Erick começou após intermináveis minutos sem dizer nada. Não sabia por onde começar. – As cicatrizes... Foram feitas pelo meu pai.

Danilo arregalou os olhos, mesmo que já suspeitava que o Tenente Coronel Schneider era autor daquelas coisas horrendas nas costas de Erick.

Vendo que Danilo não comentaria nada, Erick continuou.

– Isso começou depois daquele lance com as fotos... Aquelas do clube, você sabe...– Erick prendeu a respiração por uns segundos e depois soltou. – A maioria tratou o negócio com descaso... Mas, de alguma forma, elas chegaram até meu pai.

Danilo sabia perfeitamente de que fotos Erick estava falando. Quando as viu, realmente não viu nada demais nelas, a maioria das pessoas tratou aquilo como uma coisa normal que era. Porém, ele não sabia que tinham chegado ao pai de Erick.

– Ele me espancou com cinto naquele dia. – prosseguiu Erick – Gritava nomes horríveis para mim, dizia que eu era uma desonra e um desgosto para a família. A partir daí ele começou a me bater com frequência, principalmente quando estava bêbado. Ele... Bem, ele foi alcoólatra por muito tempo, mas minha mãe conseguiu convencer ele a parar... Porém, com essa história toda, ele voltou a beber e, sempre que chega em casa bêbado, ele bate em minha mãe ou em mim, gritando coisas rudes para nós e culpando a minha mãe por ter me feito.

Ao contrário de Danilo, Erick deixou algumas lágrimas escorrerem de seu rosto. Era doloroso falar sobre aquilo.

– Toda vez que ele batia na minha mãe, eu dava um jeito de me enfiar no meio e apanhar por ela. Como se não bastasse, ele começou a bater em Nathália também. – Erick engoliu em seco, lembrando-se das coisas horríveis que ele fizera com Nathy. – Eu já não me importava mais com as marcas em meu corpo, simplesmente não pensava duas vezes antes de entrar na frente de qualquer uma das duas. E você deve estar se perguntando por que ninguém o denunciou... Ele ameaçou matar as duas se eu falasse algo para alguém. E, depois de todas as coisas que ele fez, eu não duvidei que mataria mesmo se eu falasse... O medo de eu contar e alguma coisa acontecer com elas... Eu nunca me perdoaria. Jamais. Eu com certeza ia sentir que eu tinha matado as duas mulheres mais importantes da minha vida. Para minha sorte, Nathália não aguentou e conseguiu sair de casa, voltou para Belo Horizonte. Então passei a temer mais pela minha mãe. Meu pai pirou com a partida de Nathália e começou a bater em minha mãe todas as vezes que ambos estavam em casa. Passava a apanhar por ela quase todas as noites em que ela não ficava de plantão no hospital. Eu só queria mantê-las a salvo, então não podia simplesmente deixar de ser o saco de pancadas do meu pai.

Erick parou antes de chegar à pior parte da história. Confiava em Danilo, mas havia demônios com os quais ele não saberia lidar se os libertasse. Então parou por ali e ficou apenas sentindo o peso que aquela palavras tinham, sentindo o significado horrível e doloroso que existia nelas. Tinha vezes que ele simplesmente queria sumir, queria largar tudo e começar a vida do zero. Mas não podia largar a mãe, jamais faria tal coisa. E ela , infelizmente, ainda estava amarada ao pai pelo casamento.

Danilo estava totalmente estupefato com aquela história. Nunca imaginou que Erick tinha passado por aquelas coisas. Nunca lhe passou pela cabeça que as vezes em que ele faltava os treinos poderia ser para o caso de ter apanhado tanto que não conseguia levantar da cama.

– Eu... – começou ele, ainda sem saber o que dizer.

– Por favor, não diga nada – Erick limpou as lágrimas remanescentes e respirou fundo. – Só de ter me ouvido já fico agradecido.

Danilo assentiu, mesmo assim queria falar algo. Queria dizer que tudo ia ficar bem, mas realmente não sabia se aquelas palavras se tornariam verdadeiras. Erick estava preso ao pai de uma forma que era difícil de se separar. Para se sentir pelo menos um pouco útil, Danilo pousou a mão no ombro de Erick, fazendo o outro o olhar, e deu um leve aperto como se dissesse “eu estou aqui, pode contar comigo”.

Erick lhe lançou um sorriso sem dentes triste e virou-se para olhar o mar novamente. Danilo afastou a mão e olhou para o mar também, ambos caindo mais uma vez num silêncio.

Porém, não tão desconfortável quanto os outros.

 

 


Notas Finais


Então gente... É o seguinte. Eu tinha escrito uns 5 ou 4 capítulos antes de começar a postar a história, então eu sempre tinha mais capítulos escritos do que postados. Infelizmente eu consegui alcançar os capítulos escritos, então eu não tenho mais nenhum por enquanto. Estou escrevendo o capítulo 12 e vou fazer o máximo pra terminar o arco antes de postar o 12, mas se eu não conseguir escrever pelo menos dois capítulos até a data da previsão, eu não vou postar... Me desculpem >.< Não desistam de mim! Os capítulos são grandes e demoram para serem escritos e ficarem bons, então entendam o meu lado, por favor!
Vou responder os comentários nesse final de semana, então deixem o feedback de vocês, por favor! Comentários são super importantes para a história!
PREVISÃO (NÃO TÃO CERTA) PARA O PRÓXIMO CAPÍTULO: 17/03
Nos vemos nos comentários!
Ghost Kisses
~Marceline


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