- Qual é o contrário de existir? – Alice perguntou ao coelho.
- Não existir.
- Não existir são duas palavras. Eu quero uma palavra pra quando me der vontade de deixar de existir.
- Se você quer deixar de existir por que quer uma palavra pra isso?
- Porque gosto das palavras.
- Hum... Que tal dexistir?
- Desistir já existe. É outra coisa. Não quero desistir da minha vida, quero parar de existir por umas horas e depois eu volto, entendeu?
- Dexistir, Alice. Dexistir com X. É essa a palavra que você está procurando.
- Mas dexistir com X não existe.
- Exatamente! Por isso é perfeita. Mas por que você quer dexistir?
- Você nunca cansa da sua existência? Eu canso.
- Eu não. Existir é maravilhoso! Alice, olha.
Alice olhou na direção que o coelho apontou. Depois de terem atravessado um túnel escuro, os dois finalmente chegaram ao país das maravilhas. Havia na frente deles uma rua com orelhões coloridos e calçadas pavimentadas, com algumas casas bonitas de varandas grandes, e crianças brincando com bolas. Uma música alegre tocava ao fundo.
- É... Então... É esse o país das maravilhas? – Alice questionou, parecendo decepcionada.
- Lógico! Olha que lugar incrível. Olha essas calçadas sem nenhum buraquinho. Olha esses carros movidos à energia solar. Não tem poluição! Ar puro, colega. Espera! Liga o wifi! Aqui pega em qualquer esquina!
- Sei... Poxa, que bacana.
- Bacana?
- É que, sei lá, eu esperava algo tipo Oz...
- Fadas e anões? Ah por favor, Alice! Já não é suficiente pra você um coelho que fala e um lugar com trilha sonora própria?
- Pois é! Que porra é essa música? De onde vem?
- Do Além! – o coelho disse, empolgado – É o som natural do país das maravilhas, miga, aqui é tudo cantado.
- Tipo Glee? Que inferno!
- Para de tentar comparar o país das maravilhas ao seu limitado conhecimento de mundo. Venha. Siga-me.
Alice seguiu o coelho, como de costume. E por mais que o país das maravilhas realmente fosse legal, Alice estava insatisfeita. Ela continuava querendo deixar de existir. O coelho, notando sua carinha triste, parou por um momento, olhou-a com ternura e passou as patinhas em suas bochechas.
- Como eu existo pra você, coelho?
- Ué, como assim?
- Você existe pra mim como amigo. Como eu existo pra você?
- Ah, como amiga também. Somos amigos, não somos?
- Somos, claro que somos. Mas por que é que eu sinto que não existo pra você como amiga?
- Porque você é tonta, Alice! Para de falar bobagem. No país das maravilhas, tudo que você imagina, existe. Se você me imagina seu amigo, seu amigo eu sou.
- Não sei se te imagino meu amigo. Te imagino várias coisas. Muda. Eu nunca mudo pra você?
- Não.
Alice sentou-se numa pedra.
- Não sei se quero continuar te seguindo.
- O unfollow é free, baby. Fica à vontade.
Por mais que o coelho quisesse convencer Alice de que ela era importante, ele mesmo, transparente como um coelho de vidro, não conseguia disfarçar o descaso que às vezes sentia por ela. E o descaso pesava em Alice.
- Tá bom, fica aí, eu volto depois. – o coelho disse, deixando Alice sozinha com as várias Alices dentro de sua cabeça.
A música do país das maravilhas nunca mudava. Sempre alegre, sempre igual, e incomodava os ouvidos de todas as Alices. A verdadeira Alice então começou a se desfigurar e virou um desenho desanimado.
Nenhum lugar tinha muita graça sem o coelho.
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