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História Allons-y, Winchester! - Ameaça silenciosa


Escrita por: HunterPriRosen

Notas do Autor


Oi, gente. Mais um capítulo chegando ^^ Acho que é partir daqui que a história começa de fato.

A saber, por ser uma fanfic, tomei algumas liberdades para adaptar elementos dos enredos originais à história que quero contar. Então, nem tudo é ou será como nas séries. Acho que 90% é, mas quando tiver algo diferente é porque eu mexi os meus pauzinhos literários, blz?

Queria ter tido mais tempo para revisar esse capítulo de novo. Qualquer erro, me avisem, por favor.

Boa leitura.

Capítulo 4 - Ameaça silenciosa


Depois de algumas horas na estrada, finalmente eu e Sammy chegamos em Lawrence. Por mais que eu tente encarar essa situação como mais uma viagem de caça, estaria mentindo para mim mesmo se dissesse que esse lugar não mexe comigo de uma forma bem pessoal.  

Tenho certeza que meu irmão sente o mesmo, afinal foi aqui que tudo começou. Foi aqui que nós vivemos durante um curto e feliz período de nossas vidas. Eu tinha quatro anos e ele havia acabado de completar seis meses quando o demônio do olho amarelo — lê-se, o filho da puta do Azazel — veio cobrar um acordo, firmado anos antes com a nossa mãe.  

Mary Winchester morreu aquela noite numa tentativa frustrada de impedir o desgraçado infernal que sangrava na boca do seu bebê. Presa ao teto e em chamas, sua morte nos marcou e mudou as nossas vidas para sempre. 

Eu e Sam tivemos que voltar aqui outras vezes. Quando trabalhamos em um caso e reencontramos o espírito da nossa própria mãe, que tentava proteger uma família de uma força maligna, em nossa antiga casa; e quando meu irmão, possuído pelo próprio diabo, arrastou o desgraçado, Miguel e a si mesmo para a jaula de Lúcifer, através de um portal aberto num cemitério da região, boicotando assim o Apocalipse iminente. 

Estar aqui mais uma vez não deveria ser nenhuma novidade nem nos afetar tanto, mas continua sendo estranho e doloroso mesmo depois de tanto tempo. Mesmo com Azazel morto, Lúcifer queimando nas profundezas do inferno até hoje e o espírito de nossa mãe em paz, é extremamente incômodo reviver o passado e perceber, mais uma vez, o quanto perdemos ao longo do caminho. 

Mas é isso, essa é a vida que nos foi dada e não há nada que possamos fazer para mudar o que nos trouxe até aqui. Tudo o que podemos fazer é continuar lutando, caçando coisas e salvando pessoas. Impedindo que outros tenham a chance de uma vida normal destruída por alguma ameaça sobrenatural. 

Decido então enterrar o lado pessoal que Lawrence me remete em um lugar remoto da minha mente e me concentrar no que tenho que fazer. Resolvo também dar um desconto para Sammy, deixando-o encarregado de cuidar da nossa hospedagem em uma espelunca da região, enquanto eu mesmo vou até a delegacia começar a investigação sobre os misteriosos desaparecimentos que andam acontecendo na cidade há duas semanas. 

Quando vou para o hotel, levando cópias dos relatórios da polícia comigo, encontro Sam debruçado sobre o seu notebook em uma pequena mesa do quarto alugado.  

Acreditando que meu irmão aproveitou para fazer a sua própria investigação pela internet, jogo os documentos sobre a mesa, junto com minha identificação falsa do FBI, e desato a incômoda gravata que estava me sufocando até então. 

— E aí? — Arranco o terno barato e o coloco na cadeira de frente para ele. — Algo relevante? 

Como não obtenho resposta nem qualquer sinal de vida, uma vez que Sam está completamente concentrado em seja lá o que for que está vendo ou lendo, dou a volta na mesa, determinado a checar por conta própria do que se trata. 

A reação de Sam, que enfim desperta do estado absorto, é abaixar a tela do computador rapidamente e colocar as mãos sobre ele de um jeito estranhamente defensivo. 

Arqueio as sobrancelhas, intrigado, e questiono: 

— Por acaso você estava vendo pornografia ou algo assim? 

— Não. — Solta o ar com força, visivelmente irritado com meu comentário e minha intromissão. — Isso seria você. 

Incapaz de negar a última parte, pois aprecio mesmo assistir a um bom anime pornô de vez em quando, inquiro: 

— Então o que é? 

Sam hesita em responder e acaba enrolando: 

— Você não vai gostar da resposta. 

Algo me diz que não vou mesmo, mas estou ansioso para saber o que está acontecendo aqui. 

— Arrisque. 

Atendendo a minha sugestão, Sammy enfim ergue a tela, permitindo que eu veja o que ele andou pesquisando durante o tempo em que estive na delegacia de Lawrence. E tenho que dizer, ele estava certo, não gosto nem um pouco do que vejo. Na verdade, nem sei se compreendo muito bem o conteúdo, mas uma coisa é certa: não é sobre as pessoas que desapareceram, é sobre o Doutor. 

— O que diabos é isso? 

— Olha — Sam ergue um pouco as mãos, como se me pedisse para manter a calma, e então se explica: —, antes que você diga qualquer coisa, eu estava procurando alguma explicação para o caso sim, mas não encontrei absolutamente nada. Então, enquanto esperava você voltar, possivelmente com alguma pista e ponto de partida, eu... lembrei do sujeito que deixamos para trás e resolvi checar a história que ele nos contou. 

— E? — Cruzo os braços. 

Visivelmente receoso, como se temesse que eu não acredite no que vai revelar, meu irmão articula: 

— Eu acho que ele estava nos dizendo a verdade. 

Reviro os olhos, incrédulo, e estou pronto para retrucar e abrir os seus olhos acerca de como tudo isso é loucura, quando Sammy toma a palavra de novo e de forma mais firme: 

— Dean, há relatos sobre a aparição de um homem misterioso, a bordo de uma cabine azul, ao longo do tempo. Um homem que é mencionado apenas como “o Doutor” em certos depoimentos e documentos antigos, que surgiu em momentos cruciais da história da humanidade, desaparecendo logo em seguida, sem deixar rastros, como um fantasma ou... como um... 

Já que ele hesita, talvez com receio de soar ridículo, completo o seu raciocínio: 

— Como um viajante do tempo. 

— Exato. 

Há um longo momento de silêncio, e confesso que uma parte de mim começa a se perguntar se o tal Doutor estava mesmo sendo sincero durante o interrogatório e, portanto, se alguma coisa nessa história surreal pode ser verdade. O problema nem é tanto o lance de viagem no tempo, já que eu mesmo experimentei isso algumas vezes. Sammy também. Mas o lance alienígena da história e a forma como o Doutor fala sobre isso é, no mínimo, bem difícil de engolir. 

Fico confuso com a possibilidade de um alienígena não só existir, como andar por entre nós durante séculos, possivelmente mudando o curso de certas coisas e se intrometendo nos assuntos de um planeta que não é o seu planeta natal. Continua soando como uma ficção científica maluca e de gosto duvidoso para mim. 

Ainda estou refletindo sobre isso e ainda relutante, quando Sammy retoma sua teoria sobre o nosso prisioneiro, mostrando uma gravura engraçada em uma das janelas abertas no navegador. 

— Dê uma olhada nisso. 

Aproximo-me e estreito o olhar na direção da tela, observando a imagem confusa de alguma figura histórica que eu não faço ideia de quem seja, no meio do que parece ser uma reunião qualquer e bem entediante. 

Acho que minha cara de paisagem me denuncia, já que meu irmão questiona indignado com a minha ignorância: 

— Sério, Dean? O que você fazia na escola? 

Sorrio nostálgico e respondo com meu orgulho masculino: 

— Paquerava as líderes de torcida.  

Sammy respira fundo e esclarece: 

— É uma gravura da Rainha Vitória. Agora olha só...  

Ele amplia uma parte da imagem, evidenciando uma figura masculina entre os possíveis conselheiros da tal rainha, que eu continuo sem saber quem é. Mas tenho que reconhecer, o sujeito representado nela lembra muito alguém que conhecemos recentemente. O mesmo cabelo castanho, as mesmas roupas modernas demais para a época retratada na imagem, os mesmos traços faciais. 

Antes que eu admita que sim, o homem no canto da imagem se parece e muito com o Doutor, Sam abre uma outra página, que mostra uma foto de verdade, um momento capturado de relance, num segundo de distração, retratando o nosso prisioneiro saindo de sua cabine azul, numa esquina qualquer, de uma cidade que parece Londres. 

— Sem querer eu acho que hackeei uma ramificação da espionagem britânica. Instituto Torchwood, algo assim... E, bem, a imagem fala por si só. 

Sim, ela fala. Estou vendo, claramente, o nosso Doutor nela. E ele não está sozinho; uma loira muito gata está ao seu lado. Ela parece acompanhá-lo de alguma forma, como uma seguidora, amiga, talvez namorada, enfim, uma maluca qualquer. 

Sem saber o que dizer e assimilando a revelação que meu irmão acabou de jogar na minha cara, afasto-me um pouco e despenco na cadeira a sua frente. Enquanto Sammy me encara com um leve sorriso orgulhoso de quem diz “Viu? Eu estava certo”, solto vencido: 

— Filho da mãe... O Doutor é um viajante do tempo. E nós prendemos um provável alienígena...  

Sam abre a boca para dizer alguma coisa, mas é interrompido pelo meu celular, que começa a tocar no bolso do terno. Pego o aparelho e leio o nome na tela. 

Estranhando minha surpresa e hesitação em atender, Sammy indaga: 

— Quem é? 

Encaro-o e respondo sem entender como isso é possível: 

— Aparentemente... você. 

Rapidamente, ele checa os bolsos da jaqueta surrada, da calça e olha tudo em volta, procurando o próprio aparelho. Então, fica meio em pânico por um instante, como se tivesse se dado conta de algo importante, e diz: 

— Eu acho que esqueci no bunker... na masmorra mais precisamente. 

— Você acha? — ralho, enquanto meu aparelho continua tocando Highway to Hell. — Você deixou o seu celular ao alcance do Doutor?! Genial, Sammy! Agora ele pode ligar para a polícia e ferrar com tudo! 

— Bem, ao que tudo indica, é para nós que ele está ligando — defende-se de pronto, irritado com minha bronca. — Você vai atender ou não? — intima com uma ansiedade tangível. 

— Pode ser a polícia! Se eu atender, eles vão rastrear a ligação! 

Parecendo bem convicto de que não é este o caso, Sammy simplesmente toma o celular da minha mão, aceita a chamada e o coloca sobre a mesa, depois de selecionar a opção viva-voz. 

Há um breve momento de silêncio, até que uma voz animada se pronuncia do outro lado: 

— Olá?! Alô?! Alguém aí?! 

Sammy me olha por um instante e, em seguida, limpa a garganta e pergunta: 

— Como você conseguiu ligar? 

De imediato, e soando bem feliz por não ter sido deixado no vácuo, o Doutor explica: 

— Bem, eu arrastei a cadeira até a mesa onde você deixou o seu celular, usei a ponta do meu nariz para acessar a tela, os contatos, vi o nome do Dean e resolvi arriscar. Ele está por aí, por falar nisso? 

Reviro os olhos e digo seco: 

— Estou sim, ET de Varginha. Então você ainda está preso na masmorra?  

— Positivo! Conforme prometi para o seu irmão, eu não tentei fugir nem vou. As únicas pessoas que vão me tirar daqui serão Sam e Dean Winchester. 

Diante de sua resposta, lanço um olhar questionador para Sammy. Ao que tudo indica, ele esqueceu de me contar que teve uma última conversa com nosso prisioneiro, depois que eu deixei os dois sozinhos por um momento e fui arrumar algumas coisas para a viagem. 

Visivelmente desconfortável com a revelação que o Senhor do Tempo acabou me fazendo, ele apressa-se em retomar o foco da conversa: 

— Então, sem polícia? 

Menos de um segundo depois, o Doutor assegura firme: 

— Sem polícia. 

Ainda preocupado e acreditando que isso pode ser uma armadilha, pressiono: 

— E nós devemos acreditar em você por quê...? 

— Porque, como já disse antes, eu estou aqui para ajudar. 

Estou tentando decidir se confio ou não nisso, quando meu irmão emenda com o olhar cravado em mim: 

— E porque tudo o que você nos contou até agora é verdade, certo? 

Soando muito satisfeito, o Doutor replica de imediato: 

— Isso mesmo! Fico muito feliz em saber que, finalmente, vocês acreditam em mim! Toda aquela desconfiança já estava me deixando desconfortável. Que bom que esclarecemos isso, agora podemos ser amigos, parceiros do crime! 

— Não abuse... — resmungo baixinho. Após uma pausa, avaliando a situação como um todo, engulo o orgulho e recomeço pausadamente: — Bem, se a ligação estivesse sendo rastreada, a polícia já teria enviado uma equipe até aqui. Como isso não aconteceu até agora, parece que você está mesmo sendo sincero com a gente. Então, só desta vez, eu vou te dar o benefício da dúvida, Doutor. 

— Brilhante! Eu agradeço muito pelo voto de confiança! 

Tenho vontade de esmurrar o celular quando ele responde todo animado de novo. Seu otimismo e positividade precisam ser estudados com urgência. É bem irritante. 

— Então por que você está nos ligando? — Sam questiona. 

Do outro lado da linha, o Doutor começa a se explicar de fato: 

— Oh! Espero que você não se importe, Sammy, mas eu fiquei muito curioso quando vocês disseram que estavam indo investigar algo em Lawrence, e usei a internet do seu celular para fazer uma rápida pesquisa.  

Franzo o cenho e sussurro para o meu irmão: 

— Sammy? Sério? 

Constrangido, ele esclarece ao interlocutor: 

— É Sam. 

Dando sequência à explicação, e como se não tivesse ouvido essa parte, o possível alienígena prossegue: 

— Eu tive que usar minha voz para pesquisar no Google, já que minhas mãos estão impossibilitadas de digitar no momento, mas o fato é que eu descobri algo fascinante sobre os nossos desaparecidos. 

— Nossos? — repito, sem gostar nem um pouco da sua intromissão no caso. 

Sam, em contrapartida, parece cada vez mais envolto no papo do último Senhor do Tempo, já que pergunta com muito interesse e ansiedade: 

— O que você descobriu? 

— Ãn... Você pode pesquisar por si só. É possível fazermos isso agora? 

Depois de se ajeitar diante do notebook, pronto para digitar o que o Doutor orientar, meu irmão lhe dá o aval: 

— Sim. 

— Google em Rebecca Marie Stone.  

Lembro deste nome nos registros da polícia e digo: 

— Foi a última pessoa que desapareceu, mas eu tenho certeza que não era esse o sobrenome. 

— Você já vai entender tudo, pequeno gafanhoto. Um pouco de paciência — o Doutor tem a audácia de zombar de mim e fuzilo o celular com o olhar, como se estivesse diante do desgraçado. — Sammy? 

Meu irmão bufa, irritado com a insistência do alienígena folgado em lhe chamar pelo apelido. Mas, de repente, isso parece perder completamente a importância, já que ele fica absorto por algo que descobriu durante a rápida pesquisa.  

Querendo entender o que diabos está acontecendo e por que, subitamente, deixamos o Doutor se intrometer num assunto nosso, questiono: 

— O que foi? 

Sam engole em seco e, sem desviar o olhar da tela, reporta: 

— Eu encontrei o obituário de Rebecca Stone. Aqui diz que ela nasceu em 1902 e faleceu em 1981. Stone era o sobrenome do seu marido, Gregory, mas o seu nome de solteira era... Evans.  Eles tiveram três filhos e sete netos. 

Zonzo e incrédulo, levanto-me dizendo: 

— Isso é impossível. 

Porém, quando paro atrás do meu irmão e vejo uma foto da falecida, reconheço o seu rosto do relatório policial. São idênticas. De alguma forma que eu ainda não compreendi direito, estou olhando para a mesma Rebecca que desapareceu há uma semana. 

— Okay, como isso é possível? — indago, ainda mais aturdido. — O que aconteceu com ela?  

— Infelizmente, o mesmo que aconteceu com os outros desaparecidos, como vocês poderão pesquisar depois — o Doutor sentencia, com um tom de voz sério desta vez. — Rebecca Stone, ou como era conhecida nesse tempo, Rebecca Evans, teve um encontro fatal com os únicos psicopatas do universo que matam gentilmente, sem sujeira e em silêncio. Eles nos mandam para o passado onde, eventualmente, morremos um dia. Então, o resto da sua vida é consumido num piscar de olhos. Morremos no passado e, no presente, eles consomem a energia potencial dos dias que viveríamos, caso seguíssemos o curso normal do tempo. 

— Eles quem? — a pergunta crucial simplesmente escapa da minha garganta. 

Após um instante em silêncio, o Doutor revela com certa tensão na voz: 

— Os Anjos Lamentadores. 

Essa é nova. Nunca ouvi falar dessas criaturas, apesar de tudo que já vivi em anos de estrada, me envolvendo em um caso sobrenatural atrás do outro. 

Enquanto internamente me pergunto que tipo de ser é esse, meu irmão começa uma nova pesquisa na internet. 

Acho que, nesse momento, o Doutor ouve o dedilhar célere no teclado, já que prontamente o avisa: 

— Não adianta, Sammy. Vocês não vão encontrar nada sobre os Anjos Lamentadores nos bancos de dados comuns.  

Dito e feito. A busca por informações se mostra mesmo infrutífera, deixando meu irmão frustrado e eu cada vez mais intrigado com tudo isso. 

— Eu sou a melhor fonte para vocês — o Doutor afirma. 

Convencido disso, Sammy deixa o notebook de lado e lhe pergunta: 

— Certo, então com o que nós estamos lidando? 

A ligação fica muda por um instante. Acho que a bateria do celular do meu irmão está quase no fim. Quando penso que a ligação vai cair fatalmente, a voz do Doutor ressurge e nos explica: 

— Os Anjos Lamentadores são criaturas abstratas que vivem de energia potencial. São criaturas do outro mundo. 

— Ótimo, exatamente o tipo de monstro que caçamos então — deduzo, mais animado. 

— Errado, Deanno! 

Fuzilo com um olhar mortal o aparelho sobre a mesa, sem gostar nem um pouco do atrevimento do Doutor em me dar um apelido. Entretanto, como temos um problema mais urgente em vista, relevo, permitindo assim que ele prossiga com as revelações: 

— Eu quis dizer literalmente de outro mundo. 

— Alienígenas? — Sam parece surpreso, assim como eu. De repente, parece que todos os extraterrestres, que eu nem sabia que existiam, decidiram nos fazer uma visita. 

— Exato — nossa fonte confirma. — Ao mesmo tempo, são estátuas. Só quando estão sendo vistos, na verdade. 

Confuso, cruzo os braços, afasto-me um pouco da mesa e ando pelo quarto, mas continuo prestando atenção no que o Doutor relata, mesmo com algumas falhas pontuais na ligação: 

— Eram chamados de assassinos solitários. Não se sabe sua origem. São tão antigos quanto o Universo, ou quase. Sobreviveram tanto tempo devido a um sistema de defesa perfeito: são quanticamente travados. Ou seja, não existem, quando observados. Ao serem vistos por qualquer ser vivo, tornam-se uma estátua de pedra em formato de anjo. É um fato de sua biologia.  

Enquanto assimilo suas palavras, paro diante da janela e observo o jardim ao redor do hotel. Para minha surpresa e certo choque, vejo algo adiante, em meio a algumas plantas e vasos, bem ao lado de um chafariz. 

Ao mesmo tempo em que engulo em seco e preparo-me para pegar minha arma no coldre, o Senhor do Tempo continua falando feito uma matraca: 

— A qualquer sinal de um ser vivo, transformam-se em pedra. E você não pode matar uma pedra. Uma pedra também não pode matá-lo. Mas, quando você se vira, quando pisca, aí sim, pode acontecer.  

Embora uma parte de mim diga que eu estou sendo paranoico, estou convencido de que esta estátua não se encontrava no jardim quando eu passei com a Baby nas proximidades.  

Além disso, meu sentido aranha... Digo, meu instinto de caçador não consegue acreditar que isso seja uma mera coincidência.  

Sem querer, por puro instinto, pisco por um segundo. E quando torno a abrir os olhos, constato que a estátua de anjo lá fora se moveu um pouco.  

— Doutor? — chamo, sem desviar o olhar da janela e da criatura. 

— Pois não? 

— Por que essas criaturas são chamadas de Anjos Lamentadores mesmo? — Pego a arma devagar. 

Enquanto a aponto para a ameaça silenciosa que me espreita através do vidro, o Senhor do Tempo explana: 

— Oh! Ótima pergunta! Porque elas parecem estar chorando, com as mãos sobre o rosto. Mas a verdade é que estão apenas se protegendo. Seu maior poder também é sua maior fraqueza. Os Anjos não podem ver outro de sua espécie, isso os deixa quanticamente travados, para sempre. 

Adivinhem só? A estátua no jardim é exatamente deste tipo. 

— Dean?  

Ouço Sammy me chamar, de um jeito apreensivo e incerto, quase preocupado. Com certeza, a essa altura ele já deve ter notado o que estou fazendo. Sinto uma leve vibração no assoalho de madeira quando sua cadeira range, deslizando no piso quando ele se levanta. 

Isso acaba me distraindo e pisco de novo. E de novo o Anjo Lamentador lá fora se move, avançando consideravelmente rumo a janela, na minha direção. 

Dou um passo para trás, enquanto Sam solta um murmúrio de surpresa. 

— Deanno? Por que a pergunta? 

Desta vez é o Doutor atrevido, inconveniente, mas com certeza sincero, que fala. 

Sem a menor dúvida do que estou enfrentando nesse exato instante, limpo a garganta e revelo: 

— Porque uma dessas criaturas está aqui. Bem aqui. Eu estou olhando para ela através da janela. 

Engatilho a arma, desviando o olhar por um milésimo de segundo da cena bizarra diante de mim. O suficiente para o Anjo Lamentador avançar de novo. 

— Dean?! — Sammy já não parece apenas preocupado, mas desesperado. 

As mãos do Anjo não estão mais cobrindo o rosto de pedra. Agora, o ser de outro mundo se encontra a menos de dois metros da janela. 

— Eu vou atirar — anuncio, preparando-me. 

— Não faça isso! — O Doutor me impede de prosseguir no último segundo. — Armas humanas são inúteis. Não é assim que nós vamos deter os Anjos. Lembre-se: é uma estátua de pedra. Além disso, o tiro quebraria a janela e, por reflexo, você piscaria. Piscar agora não é uma opção inteligente, Dean Winchester. 

— Então o que você sugere, gênio? — questiono azedo, enquanto meus olhos começam a arder. 

Após um momento em silêncio, o Doutor indaga: 

— Sammy, onde você está agora? 

— Um pouco atrás do meu irmão. Por quê? 

— Bom, bom, muito bom — o alienígena repete de um jeito aleatório, soando pensativo. — Então você tem mais chances de sobreviver a isso. Corra! 

— O quê?! Não! — Sam protesta veementemente e acrescenta com uma teimosia perigosa: — De jeito nenhum... Eu não vou deixar o meu irmão sozinho com essa coisa. 

Se eu pudesse, o enxotaria daqui agora mesmo. Mas não posso olhar em sua direção, então limito-me a ordenar de um jeito duro: 

— Você ouviu o velhote, Sammy. Pegue a chave do Impala no meu terno e corra. 

Não ouço seus passos, muito menos qualquer ruído que indique uma corrida desenfreada rumo à saída do quarto. 

Nesse meio tempo, o Doutor se compromete: 

— Eu vou ajudá-lo, basta você deixar o celular onde está,  a porta aberta e sair daí o mais rápido possível. Eu prometo. 

Algum tempo se passa. Meus olhos ardem cada vez mais. Preciso piscar. Mas não posso. Droga! 

— Okay... Eu vou. Mas se você não conseguir salvar o meu irmão... 

— Eu vou! — O Doutor é firme. 

Finalmente sinto uma lufada de vento quando Sammy deixa o quarto. Segundos depois, reconheço o ronco lindo da minha Baby lá fora. Isso me dá certo ânimo para manter os olhos bem abertos, enquanto ando lentamente para trás, também rumo à saída. 

— Muito bem — O Doutor volta a falar comigo, depois de mais uma oscilação na linha. — Agora me ouça com atenção, sua vida pode depender disso. Não pisque. Nunca. Pisque, e você morrerá. 

— Você sabe mesmo como motivar uma pessoa, não é? — ironizo com escárnio. 

— O Anjo é mais rápido do que você pensa. Não se vire, não desvie o olhar e não pisque. Apenas se afaste, com cuidado para não esbarrar em nada e, principalmente... 

— Sem piscar, entendi. 

Devagar, vou caminhando para trás. Um passo por vez. Guardo a arma, ciente de que ela é inútil mesmo nessa situação, enquanto mantenho o olhar cravado e fixo no Anjo Lamentador.  

Não posso piscar. Aconteça o que acontecer, não pisque. 

— Eu estou me aproximando da porta agora — falo alto, para que o Doutor possa me ouvir de onde estou, cada vez mais longe do celular. 

— Ótimo, ótimo, você está indo muito bem. Feche-a o mais rápido que conseguir ao sair — ele orienta, apreensivo e ansioso como eu. 

A necessidade de piscar é uma maldita pedra no sapato, porém outra coisa começa a me perturbar intimamente. Algo que eu posso resolver agora mesmo, com um pouco de coragem. 

Pensando assim, expiro com força, vencido e deixando meu orgulho de lado. Obrigado a reconhecer quando erro — o que raramente ocorre, só para deixar claro —, deixo as palavras saírem: 

— Olha... Lamento por ter prendido você. E por ter duvidado de cada maluquice que falou antes. E também por ter te cortado com aquela faca. E rido internamente quando o Sammy te encharcou de água benta e você quase se afogou. Foi engraçado. 

Seguro o riso ao me lembrar desta cena. Com receio de perder o foco e acabar piscando acidentalmente, consigo me controlar. 

Após um breve momento de silêncio, o alienígena se manifesta de um jeito calmo e, aparentemente, sem um pingo de rancor: 

— Desculpas aceitas, Deanno. Agora vem aqui me soltar. 

— Fechado, Doutor — comprometo-me, porém algo me diz que ele não tem tempo de ouvir minhas últimas palavras, já que a ligação é tomada por um ruído estático e depois fica no mais completo silêncio. A bateria do celular deve mesmo ter chegado ao fim. 

Completamente sozinho em meu objetivo de sair inteiro dessa situação, continuo com a árdua tarefa de alcançar a saída com passos de caranguejo. 

Sem desviar o olhar da criatura de outro mundo a frente e controlando, não sei como, o instinto de piscar a qualquer momento, tiro a chave da fechadura. Depois, seguro a maçaneta e fecho a porta aos poucos depois de cruzar a soleira. 

A fresta diminui cada vez mais diante de mim. Até que, por fim, bato a porta com força e tranco-a às pressas. No mesmo instante, ouço a janela se espatifar em cacos dentro do quarto, mas a essa altura o Anjo Lamentador nada pode fazer contra mim ou Sammy. 

Aliviado e ouvindo a buzina insistente do meu amado Impala 67, desço os degraus da varanda, depois de fazer uma banana com os braços para a porta, e corro até o carro onde meu irmão está. 

Mal entro, e ele dá a partida, cantando pneus. Mesmo assim, consigo ver, de relance, por um milésimo de segundo e através de outra janela do quarto, a estátua nada angelical com as mãos cobrindo o rosto de pedra. 

Essa foi por pouco.


Notas Finais


Sim, a ameaça silenciosa é os Weeping Angels/Anjos Lamentadores/Estátuas angelicais nada fofíneas.

Dei algumas dicas no prólogo e nos outros capítulos, mas agora vocês têm a confirmação eheheheh

Tretas malignas virão...

Bjs e inté os comentários.


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