Acho incrível como as coisas simplesmente saem do nosso controle. Como o nosso destino pode ser roubado simplesmente antes de nascermos -sobre como não temos escolha de quem somos ou do que somos. Nós simplesmente somos e as coisas simplesmente acontecem, sem mais nem menos. É assim a lei da vida -as pessoas nascem, constroem uma vida e simplesmente morrem, deixando tudo para trás
Mas bem, antes morrer que conviver com a morte.
Sim, a morte está aqui -ela está em todo lugar. Ela está ali, nos controlando, nos observando. Apenas esperando a hora certa de atacar.
As pessoas a temem, mas depois de tanto conviver com ela, a considero uma boa e velha amiga. Uma boa e velha amiga que me tirou tudo -menos a vida. Isso chega até a ser engraçado. Por que não me levar também? Já foram tantas pessoas... Mamãe, papai, vovó, vovô, até mesmo o tio Logan. Por que não me levar também?
-Não tinha como a garota mata-los, ela sequer estava na cidade!- Disse o meu advogado, Luiz.
Suspirei despreocupada. Eu simplesmente não me importava com esse maldito julgamento- já sabia o resultado final mesmo. Eles poderiam simplesmente me jogar numa maldita cela que eu não ligaria, simplesmente não ligaria.
Mas por que iria ligar, não é mesmo?
O fato é que uma hora ou outra, todos vamos morrer. Pra que lutar contra isso? Perder o nosso tempo construindo coisas que não valem a pena, vivendo numa ilusão de felicidade, algo tão temporário e insignificante. Até porque nada dura para sempre -nada além da morte.
Não sei quanto tempo se passou -pode ter sido minutos, horas, não sei. Apenas sei que o juiz me encarava como se eu fosse um monstro desalmado. Sorri com isso.
-Inocente.- Disse em alto e bom som. Era óbvio que isso aconteceria -eu sequer estava na cidade quando os assassinatos aconteceram.
-E sobre a guarda da garota...?- Tia Ana perguntou. Quase senti pena dela. Quase.
"Por favor, que não fique comigo." Ela pensava.
"Coitada." O juiz pensou.
Desisti de ler os pensamentos alheios, suspirando em seguida, apenas esperando que o juiz desse o golpe final.
-A guarda de Maria ficará com a sua tia Ana Bennevolt até que a mesma complete 18 anos.
Seriam só oito meses. Apenas oito meses. Eu suportaria oito meses, não é?
Para alguém que suportou quase oito anos, oito meses é fácil.
"Espero conseguir matricula-la em alguma escola, de preferência num internato." Tudo bem, essa parte foi maldade.
-Ela terá que frequentar uma psicóloga de sua preferência uma vez ao dia. Maria possui tendências suicidas e devido ao TEPT (Transtorno do estresse Pós-traumático), ela, bem... -O meu advogado começou a falar.
-Desembucha.- Ana disse já estressada.
Olhar para ela doía -ao menos eu ainda era capaz de sentir dor. Ela era a irmã gêmea da minha mãe, era quase como se ela estivesse aqui novamente... Mas ela estava morta.
Os seus cabelos eram loiros e curtos, repletos de mechas brancas devido a idade -o que apenas a deixava mais charmosa. Os seus olhos azuis e a sua pele extremamente clara -porém cheia de linhas de expressão. Ela sofria, isso era claro. Talvez ela tenha sido a que mais sofreu com tudo isso. Isso me fazia sentir pena.
-Maria as vezes tem alguns surtos.- Luiz disse por fim.- Vendo pessoas que não estão, até mesmo que já morreram.- Ana fez uma expressão assustada e eu precisei me controlar muito para não bisbilhotar os seus pensamentos.- Ela tem também muitas crises de pânico e, bem, muitos pesadelos...
-Então eu estou levando uma esquizofrênica para casa? É isso?- Ana estava completamente fora de si.
-Pare de agir como se ela não estivesse aqui.- Luiz parecia preocupado, isso me fez sorrir. Ele era como um pai para mim.- Não é porque ela não está falando que ela é incapaz de ouvir.
-E não é porque eu vou leva-la para casa que eu sou obrigada a gostar dela.
Talvez fosse melhor ter ido para a prisão.
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