História Amor Além do Tempo - A Lente

- E aí, qual a sensação de ter uma cicatriz de batalha originada de um tiro, Batmax?

Chloe perguntou enquanto dirigia do hospital de volta à Blackwell, depois de Max fazer sua última visita ao médico para retirar os pontos do seu ferimento e finalmente poder se livrar do curativo.

Por alguma razão, aquilo significava um novo começo para Max, como se, a partir daquele momento, estivesse iniciando um novo capítulo de sua vida, embora os resquícios do antigo, fosse em forma de pesadelos com memórias do futuro ou traumas vivos de um passado nem tão distante, ainda continuassem bastante presentes em seu dia a dia.

- Parece mais uma queimadura de cigarro. - Ela respondeu ainda analisando a marca com parte da camisa levantada, fazendo Chloe rir.

- Max, você é tão hardcore que chama uma cicatriz causada por uma 9mm de queimadura de cigarro. Sorte a minha estarmos do mesmo lado.

Foi a vez de Max rir, aproveitando a oportunidade para deitar sua cabeça no ombro de Chloe e tentar relaxar um pouco antes de chegarem ao estacionamento do colégio.

- Ainda dói?

- Não... só incomoda um pouco quando faço movimentos bruscos, mas nem dá pra chamar de dor, é mais como um desconforto.

- Hum... eu provavelmente não deveria perguntar isso agora, mas já tá martelando na minha cabeça há algum tempo e eu preciso saber: - Chloe fez um enorme arrodeio antes de chegar ao assunto, dando tempo a Max de entender previamente a que ela se referia - dói quando a gente...

- Doeu um pouco nas primeiras vezes, quando estava mais recente, mas não foi nada que eu não pudesse suportar e valeu a pena. - Max respondeu prontamente sem precisar ouvir a pergunta completa.

- Você deveria ter me dito. Eu teria tentado evitar, sabia? - Chloe rebateu, se sentindo culpada.

- Tenho minhas dúvidas de que seria possível evitar dores provocadas pelas contrações involuntárias do meu abdômen, Che. Além disso, quando você me morde também dói e você nunca me ouviu reclamando. - Max respondeu tranquilamente olhando para Chloe, que agora sorria, com um novo tom de rosa preenchendo as maçãs de seu rosto. - Você precisa parar de me tratar como se eu fosse feita de vidro e pudesse quebrar a qualquer momento.

Chloe desligou o motor do carro e puxou Max de seu ombro para um abraço, mantendo-a assim enquanto respondia.

- Desculpa, mas você deve fazer ideia de como é difícil conseguir isso depois de te assistir levar um tiro bem na minha frente, fora tudo o que veio depois. Ainda não sei como você conseguiu se manter sã, tendo passado pelo que passou.

- Eu entendo, mas agora estou bem, na medida do possível. E você vai ter que confiar em mim quando digo que não precisa se preocupar com isso.

- Eu vou me esforçar. - Chloe concluiu, segurando o rosto de Max com uma das mãos e a beijando. - agora é melhor irmos porque você tem sua aula e eu tenho o maldito teste do Wells pra encarar.

- Teste que você vai detonar pra gente comemorar o feito depois.

Max sorriu descendo do carro e fechando a porta, sendo alcançada por Chloe logo em seguida. A punk se encostou na lataria e puxou a morena para mais um abraço, aproveitando a proximidade das duas para ficar com o rosto colado em seu ouvido antes de voltar a falar.

- Nós vamos estar sem roupa nessa comemoração?

Max sorriu, enterrando sua cabeça no contorno do pescoço de Chloe e inalando um pouco de seu cheiro.

- Não na primeira parte, mas ficaremos em algum momento. Eu prometo.

- Bom saber.

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Não foi uma tarefa nada fácil para Max enfrentar o resto daquela manhã imaginando como Chloe poderia estar se saindo no teste. A ansiedade sempre foi uma grande inimiga em sua vida, mas naquele dia tinha se tornado implacável e simplesmente não a estava deixando se concentrar em mais nada.

Incapaz de prestar atenção em sua segunda aula da manhã e evitando atrapalhar Kate, com quem já tinha passado a primeira quase inteira brincando de jogo da velha, forca ou qualquer outro passatempo rápido para distraí-la do desenrolar das horas, Max resolveu abrir seu diário e começar a rabiscar a esmo, mal tendo ideia do que desenhava.

Naquele dia ela parecia ter adquirido a habilidade de dar mute em todos os sons que se apresentavam ao seu redor, o que se mostrou ótimo para sua tarefa de viajar e ignorar o mundo, mas péssimo para seus estudos, já que estava usando esse novo poder para ignorar há pelo menos uma hora o professor que falava diante de si.

A fotógrafa tinha certeza que nunca tinha olhado para o relógio tantas vezes num período tão curto de tempo como naquele dia, mas podia jurar que os ponteiros estavam se movendo para trás ou não se movendo de modo algum, já que os minutos pareciam simplesmente não passar.

- Você anotou a última coisa que ele disse? 

Max virou o rosto para o lado em direção àquela voz, ao sentir o toque em seu ombro.

- A última coisa que ouvi ele dizendo foi "bom dia, alunos". - Ela confessou para uma Victoria frustrada.

- Minha nossa, Max. Relaxa! Sua ação social vai conseguir passar naquele teste.

- E logo você está me dizendo isso?

Ela questionou com um sorriso debochado, assistindo Victoria revirar os olhos numa batalha interna, antes de dar o braço a torcer em relação à Chloe.

- É... ela continua sendo extremamente irritante, mas depois que consegui fazer aquela prova sem tirar nota baixa, não posso negar que ela sabe de alguma coisa.

- Ei! Não é justo vocês ficarem conversando e me deixarem assistir a aula sozinha. - Kate sussurrou se inclinando em direção a elas.

- É... nós deveríamos simplesmente fazer um círculo e ficar de costas pro professor. - Max brincou fazendo Kate rir.

- Kate, você deveria ser a boa influência aqui e não o contrário. Aliás, vocês duas se controlem, por favor. A aula já tá acabando. - Victoria as repreendeu fazendo suas risadas cessarem quase no mesmo instante.

- Você era tão mais legal quando nos odiava. 

Victoria ficou tão surpresa com a resposta de Kate que nem ao menos foi capaz de rebater a acusação. A outra garota, por sua vez, riu da reação dela e logo voltou a falar.

- Eu tô brincando, Tori. Na verdade é ótimo que você goste da gente agora. E, mesmo que você seja tão cri cri às vezes, nós ainda te adoramos.

Mais uma vez, a rainha de Blackwell ficou sem palavras, sua boca abriu e fechou várias vezes como se tentasse dizer algo, mas desistisse antes das palavras serem formadas e Max começou a se sentir sobrando naquele momento e a refletir sobre qual resposta inadequada Chloe diria numa situação como aquela.

Provavelmente algo como "eu deveria sair do meio pra vocês se beijarem?" ou "melhor eu me retirar pra dar privacidade a vocês". 

Não... é melhor eu me manter calada.

Max se sentiu extremamente deslocada por estar entre as duas, tanto que quase agradeceu aos céus em voz alta, quando o sinal a liberou daquela aula.

Ela logo juntou as coisas, jogou de qualquer jeito na bolsa e saiu da sala seguida por Kate e Victoria pelos corredores de Blackwell até chegar ao pátio onde sentaram numa das mesas livres para esperar Chloe, que não demorou mais que alguns minutos para aparecer.

Depois de alguns minutos escaneando a área, Max finalmente avistou sua namorada se aproximando com as mãos nos bolsos da calça e uma expressão nada animadora no rosto e que se tornou ainda mais evidente quando ela alcançou a mesa.

Max se levantou, indo até ela e a abraçando, sem saber o que dizer naquele momento, se sentindo parcialmente culpada pela sua tristeza.

- Desculpa.

Max enterrou a cabeça no ombro dela, tentando se conter para não chorar e tornar a situação ainda mais melancólica, sem saber o que mais poderia dizer num momento como aquele.

- Tudo bem. - Chloe respondeu alisando as costas dela com as duas mãos. - Eu só lamento ter perdido tanto tempo estudando quando podia estar te assediando.

Max mal podia acreditar que ela ainda estivesse brincando num momento como aquele, mas resolveu relevar dado o contexto em que se encontravam.

- Pelo menos você ainda está de bom humor pra fazer piada sem graça. - Ela respondeu com a voz camuflada pela jaqueta da punk.

- Au contraire, Maxine. - E Max relevou até o uso de seu nome completo. Algo que encararia como uma ofensa gravíssima em um dia comum - É sério. Se eu soubesse que essa prova seria tão fácil, não teria perdido tanto tempo me preparando pra ela.

- O QUÊ?!

Max se afastou parcialmente, de modo a encarar Chloe que agora exibia um sorriso debochado enorme estampado no rosto. Entendendo que tinha sido vítima de mais um brincadeira, ela franziu o cenho e começou a bater no ombro da garota de cabelos azuis.

- Não acredito que você me enganou!

Ainda rindo da indignação de Max, Chloe voltou a se aproximar, se defendendo de seus ataques e a levantando alguns centímetros do chão, enquanto a beijava várias vezes e assistia sua expressão indignada de antes suavizar pouco a pouco.

- É que eu gosto de ver sua carinha de brava seguida dessa sorridente que você faz quando me perdoa.

- Você é muito idiota. - Max respondeu voltando a beijá-la quando Chloe finalmente decidiu botá-la no chão.

- Mas você me ama mesmo assim.

- Vocês poderiam parar, antes que eu acabe vomitando...? Já está quase...

Max revirou os olhos enquanto Chloe apenas riu daquele comentário e as duas logo decidiram se juntar às outras duas garotas que assistiam a cena sentadas à mesa.

- Não fique com inveja, Vic. Tenho certeza que você vai encontrar o amor em breve. - Chloe disse com um olhar sugestivo direcionado para ela, mas olhando de relance para uma Kate distraída antes de completar. - Às vezes ele está muito mais perto do que você imagina.

Victoria mudou de cor instantaneamente ao ouvir aquilo, incapaz de rebater aquela afirmação, enquanto Chloe se divertia internamente com a reação dela, mas decidindo dar um descanso à loira naquele momento, mudando o rumo da conversa.

- Além do mais, hoje é dia de comemorar, então vamos a um bar pra eu pagar uma rodada de bebida pra todas vocês. Inclusive um drink especial cheio de frutas e com gosto de xarope para tosse que tenho certeza que a Vic deve adorar.

- Nós não podemos ir pra um bar... não sei se seria uma boa ideia... porque... tá muito cedo.

Victoria tentou recusar procurando não revelar que seus reais motivos para a negativa estavam relacionados à desastrosa experiência de Kate com bebida na última festa do Clube Vortex. O que as outras garotas logo entenderam e, para sua surpresa, a primeira a acalmá-la foi Kate.

- Tudo bem, Tori. Eu posso ir e beber refrigerante. 

Mesmo com a concordância de Kate, Victoria ainda não parecia plenamente convencida de que aquela seria uma boa ideia e já estava pronta para discordar, quando Chloe tomou a frente.

- Não, Kate. Todas vamos nos divertir juntas. A gente adia essa ideia do bar pra um futuro distante e podemos ir, sei lá, tomar sorvete... o que vocês acham?

Chloe sugeriu, usando todo seu auto controle para evitar fazer alguma piada sugestiva sobre o apelido utilizado por Kate para se referir a Victoria, a qual pareceu satisfeita com a sugestão assim como uma Max sorridente.

- Não vou mentir, a ideia do sorvete é bem mais agradável pra mim que a do bar. - Kate confessou sorrindo.

- Então vamos logo. - Chloe se levantou animada puxando Max pela mão.

- Espera, gênio da matemática. Como você espera que nós quatro caibamos na sua lata velha? Alguém vai na capota, por acaso?

Chloe abriu um sorriso diabólico ao ouvir aquela pergunta, que fez Victoria se arrepender imediatamente de tê-la feito.

- Bem, Vic. Como é uma viagem curta, a Max senta do meu lado, você do dela e a Kate, que é menor, pode ir no seu colo. O que você acha, Kate?

Nem mesmo Max acreditou na sugestão que Chloe havia feito tão naturalmente e permaneceu olhando em sua direção boquiaberta, enquanto ela permanecia com o mesmo sorriso de antes esperando a resposta de Kate. Victoria não falou nada. Ela parecia ter perdido a língua, a cor do rosto e o dom de raciocinar, tudo ao mesmo tempo.

- Por mim tudo bem. - Kate respondeu tranquilamente atraindo todos os olhares incrédulos para si. - Pode ser, Tori? Você só precisa dizer se eu estiver te esmagando.

- Tá... - Foi tudo o que Victoria pôde responder com o resquício de voz que lhe sobrou.

- Então vamos!

Chloe conduziu Max animadamente em direção à caminhonete, sendo seguida à distância por Kate e Victoria. A fotógrafa aproveitou o momento para questionar o comportamento da punk, sem que as outras duas garotas pudessem ouvir.

- Que diabos você está fazendo? - Max sussurrou.

- Bancando o cupido. - Ela respondeu beijando a têmpora de Max. 

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Chloe não mentiu quando disse que o trajeto seria curto, mas isso não a impediu de rir cada vez que olhava para o lado e enxergava de relance uma Victoria completamente vermelha e tensa, sem saber nem ao menos onde colocar as próprias mãos enquanto Max e Kate conversavam animadamente.

Elas logo chegaram à sorveteria, se dirigindo ao balcão para fazer cada uma o seu pedido e, em seguida, sentando numa das mesas livres.

- Kate, qual sabor você pediu? - Chloe perguntou sem fazer muito caso, enquanto encarava seu próprio sorvete.

- Baunilha... - Ela respondeu timidamente. - Eu sei que meio que completa o estereótipo, mas é o que eu sempre peço.

- Hum... - Chloe devolveu arqueando as sobrancelhas - Talvez você devesse experimentar novos sabores pra descobrir qual você prefere. Algumas vezes pode haver um que você poderia amar, mas nem ao menos provou ainda. A Vic, por exemplo. - Ela completou dando uma grande colherada em sua casquinha.

O efeito das palavras de Chloe foi imediato em Victoria. Ela arregalou os olhos, quase engasgando com o sorvete e tossindo repetidamente antes de conseguir soltar um "o quê?!" incrédulo.

- Seu sorvete é de morango, né? - Victoria confirmou com um gesto, ainda desconfiada das intenções da punk. - Você deveria dar um pouco pra Kate. Baunilha combina muito bem com morango.

Chloe tinha certeza que nunca veria Victoria tão vermelha como no trajeto de carro, mas isso só durou até o momento em que Kate olhou fixamente para ela com um sorriso tímido, numa espera silenciosa para receber o que havia sido sugerido. 

E Victoria o fez, desajeitadamente, mantendo os olhos fixos na colher, tentando não olhar para a garota ao seu lado que recebia a oferta alheia ao seu desconcerto. Max estava completamente pasmada com a cena, mal acreditando em seus próprios olhos e só voltando à realidade ao ouvir a menção de seu nome.

- Sabe quem adora experimentar coisas novas? - Chloe apenas apontou na direção de Max após fazer sua pergunta retórica.

- Sério? Pois não parece. - Kate falou olhando a taça, completamente alheia às expressões das outras pessoas da mesa.

- Eu também me deixei enganar pela carinha de nerd no começo, mas depois que você conhece bem, se surpreende. É incrível o quanto de imaginação pode sair dessa cabecinha. - Chloe  comentou, assanhando o cabelo da garota de sardas.

Max sentia seu rosto ferver, mas permaneceu em silêncio, com a certeza absoluta de que Chloe não estava mais falando sobre sabores de sorvete. Uma certeza também compartilhada por Victoria, mas Kate parecia estar muito distante do denominador comum descoberto pelas duas.

- E você tinha razão sobre os sabores. Realmente combinam.

- É... combinar sorvetes não é muito diferente de combinar pessoas. Tem sempre uma muito tímida e inocente que, contrariando todas as previsões, acaba se atraindo por outra meio impulsiva, cabeça dura e de personalidade difícil.

Kate concordou risonhamente e depois direcionou seu olhar para uma Max que permanecia boquiaberta, assistindo a tudo ainda em silêncio.

- Max, você não disse que a Chloe era tão filosófica. - Kate brincou.

- É que tem coisas que prefiro deixar vocês descobrirem por si sós.

- Nós deveríamos fazer mais encontros duplos como esse e trabalhar nisso. 

Chloe sugeriu com um sorriso cínico, que fez Victoria dar um olhar assassino em sua direção, mas que só serviu para diverti-la mais ainda.

- Price, vem comigo até seu carro. Eu esqueci minhas lentes lá.

Chloe apenas pegou as chaves no próprio bolso e inclinou-as na direção dela.

- Eu não vou sozinha até lá.

Victoria não esperou resposta, apenas saiu andando na frente, sendo seguida a passos lentos por uma Chloe contrariada alguns segundos depois. 

Quando já estavam a uma boa distância de onde Max e Kate ficaram, sem nem sequer contato visual com as duas, Victoria parou de andar, dando meia volta para encarar a punk e bater em seu ombro indignada.

- Para de me bater, cara. Você enlouqueceu? - Chloe protestou, se defendendo do ataque da loira com os punhos erguidos.

- Que droga você pensa que está fazendo?! - Ela insistiu ainda mais irritada.

- Indo com você até meu carro buscar sua lente?

- Eu não uso lente! - Victoria respondeu ainda mais indignada do que antes.

- Então eu não tenho a mínima ideia do que estamos fazendo. Eu chutaria "perdendo tempo". - Chloe ironizou, cruzando os braços, nenhum pouco tocada pela irritação crescente de Victoria.

- Você sabe exatamente do que estou falando. - Ela apontou para Chloe - Você dizendo todas aquelas coisas, fazendo a Kate vir pra cá no meu colo, eu dar sorvete pra ela, insinuando que estamos num encontro.

Chloe arqueou as sobrancelhas, finalmente entendendo aonde ela queria chegar e recebendo um olhar incrédulo de Victoria pela demora em sua percepção.

- Ahhh... isso! Bom, eu só estava te ajudando. E você tem um jeito bem incomum de agradecer.

Victoria cerrou os punhos e franziu o cenho se aproximando de Chloe com um tom de voz alterado, mal acreditando na audácia dela.

- Ajudando?! Me constrangendo na frente dela e da Max? Como isso seria me ajudar?

- Te dando um empurrãozinho, ué! Já que você gosta da Kate, mas é covarde demais para admitir isso, especialmente pra si mesma.

Ela arregalou os olhos e tentou negar imediatamente, mas a resposta saiu mais gaguejada do que o esperado, fazendo Chloe se deliciar ainda mais com a reação dela.

- Eu não... como você...? O que...? Urrrrr!

- Confie em mim, Vic. Eu já estive no ponto onde você está agora, me conformando com qualquer migalhinha jogada em minha direção, negando meus sentimentos e vivendo em negação. Eu passei por todas essas fases, pode acreditar.

Chloe afagou o ombro de Victoria com um ar condescendente que só a fez cruzar os braços e se afastar, desviando o olhar na defensiva.

- Eu não sou gay.

- Tudo bem... Então diga que você não gosta dela. Minta na minha cara, Vic. - Chloe a desafiou com um olhar de desdém, a notando vacilar novamente antes de responder.

- Claro que eu gosto da Kate... ela é... uma pessoa tão gentil, doce e boa. - Victoria começou a se defender, apenas parar tornar ainda mais óbvio para Chloe seus reais sentimentos. - A ponto de eu me sentir menos pior por tudo o que fiz só de conversarmos ou fazermos qualquer coisa juntas. Ela tem esse efeito de me fazer sentir melhor comigo mesma. Mas somos apenas amigas.

- Mas bem que você queria ser mais do que isso...

- E-eu nunca disse isso! - Ela recuou alguns passos, encarando o vazio, como se estivesse se sentindo acuada pelas acusações de Chloe.

- Mas também não negou. - Victoria suspirou profundamente, mas não respondeu e Chloe aproveitou seu silêncio para continuar seu discurso. - Tudo bem. Vamos fazer um exercício: apenas imagine ela conhecendo um cara super bacana, bonito e divertido, começando a sair com ele e, com o tempo, acontecendo o que normalmente acontece nessas situações, eles passam a namorar. Agora que vocês são basicamente melhores amigas, ela iria te contar tudo, como foi o primeiro beijo, como ele é cavalheiro e trata ela com carinho, como ele gosta de segurar a mão dela sempre que estão andando juntos, como...

- Eu não sei aonde você está querendo chegar - Victoria a interrompeu visivelmente desconfortável com o rumo da conversa, mas principalmente com aquele exercício de imaginação, o que não passou despercebido aos olhos de Chloe.

- Ok, já que isso te incomoda tanto, pegue toda essa situação hipotética que eu criei mas, em vez do cara, imagine você. Beijando, abraçando, vendo ela sorrir e dizendo que gosta de você do mesmo jeito que você gosta dela. 

Os olhos de Victoria se abriram em choque, assim como sua boca, e seu rosto ficou vermelho de novo, tornando impossível disfarçar sua reação para a punk. E ela nem ao menos tentou. 

Era como se ela tivesse acabado de se tocar de seus reais sentimentos e da magnitude do problema em que tinha se metido. Afinal ela não tinha a mínima ideia de como lidaria com o engodo de estar se apaixonando por Kate Marsh.

- Que droga, Price! Por que você tinha que me deixar consciente disso? É! Eu gosto mesmo dela. Satisfeita? E estou completamente fodida por causa disso. - Victoria confessou em choque, enquanto enterrava as mãos nos cabelos e deixava escapar um suspiro pesado. - Meu deus! Era tão mais fácil quando eu ficava com pessoas com quem não me importava. Agora eu me importo com uma pessoa com quem nunca vou ficar. 

- Não seja tão pessimista, Vic. - Chloe apertou ombro dela numa evidente tentativa de confortá-la - Com todo o pano de fundo religioso familiar, realmente não vai ser nada fácil. Praticamente impossível, eu diria. Mas você não pode esconder isso pra sempre e te garanto por experiência própria que você não vai querer. Pode ter certeza.

- O que você espera que eu faça? Volte agora pra mesa e confesse tudo? Pra depois ela me olhar horrorizada e sair correndo?

- Não... de jeito nenhum. Max e eu vamos te ajudar a fazer o terreno até você se sentir à vontade pra confessar.

- A Max também sabe?!

Chloe riu abertamente da falta de noção de Victoria sobre sua própria situação.

- Vic, Vic... eu estou surpresa que a Kate, que tem convivido com você quase o tempo todo ultimamente, ainda não tenha descoberto.

- Eu tô muito ferrada.

Elas voltaram à mesa um pouco depois, com nenhuma lente e uma expressão estranha que Max não demorou a notar, mas decidiu externar apenas quando ela e Chloe estivessem a sós.

- Vocês demoraram demais. O que houve com a lente?

- A bobinha da Vic lembrou que pode ter deixado no dormitório, mas só depois de virarmos o carro de cima a baixo.

- Você tá bem, Tori? Talvez devêssemos voltar. - Kate sugeriu finalmente notando a expressão sombria no rosto de sua amiga.

- Ela só está preocupada com as lentes. Daqui a pouco passa. Talvez ela só precise de um abraço amigo pra se acalmar. Sempre funciona com essa aqui.

Chloe concluiu abraçando Max de lado e olhando em direção à Victoria, que a encarava furiosamente numa guerra silenciosa, já arrependida pela confissão de momentos antes, se sentindo ainda pior do que imaginava que pudesse sentir, até um dos braços de Kate contornarem delicadamente suas costas e apertarem seu ombro por um leve momento. 

Ela podia sentir o sorriso diabólico de Chloe a encarando mesmo sem ousar olhar em sua direção, assim como sentia seu rosto ficar vermelho e seu corpo estremecer, meramente capaz de ouvir a voz doce de Kate penetrando seus ouvidos. 

- Tudo bem, Tori. Nós vamos encontrar sua lente.