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História ANIMALS - A Newtmas Fanfic - Last Chapter - I am YOU!


Escrita por: LadyNewt e DearTommy

Notas do Autor


Animaiszinhos,

Finalmente chegamos no último capitulo de ANIMALS.
Amanhã posto o epilogo.

Obrigada a todos que nos acompanharam até aqui, viajando nessa história insana.

Uma última vez:

B o a L e i t u r a!
LadyNewt
&DearTommy

Capítulo 64 - Last Chapter - I am YOU!


Fanfic / Fanfiction ANIMALS - A Newtmas Fanfic - Last Chapter - I am YOU!

Point of View of Newton Brodie-Sangster

 

A impaciência.

Oposto de paciente; estado de preocupação; desassossego que impede o repouso e uma incapacidade para sofrer sem se desesperar ou suportar algo. Em outras palavras: Newton Brodie-Sangster, prazer, eu mesmo.

Meu estado citado acima reflete os acontecimentos das últimas 48 horas e como me sinto com Thomas O’Brien e também por ter meu melhor amigo internado na UTI, correndo risco de morte. Não preguei o olho desde que tive que voltar para casa e abandonar o hospital.

Decido que é hora de levantar, mesmo sem ter descansado picas, mesmo com O’Brien fodendo minha cabeça. Cansei desse joguinho de ficar rolando de um lado para o outro na cama. Descarto a chance de aproveitar e descansar um pouco mais. Janson me liberou da escola por alguns dias já que não tenho capacidade de focar em mais nada até que Minho melhore seu estado em ao menos 1%.

O relógio do meu celular marca 07:01 da manhã. Parece que a hora estanca nesse eterno minuto, quando na realidade sou somente eu que já chequei o horário pela oitava vez dentro de 60 segundos.

Engulo a seco e tendo abstrair qualquer pensamento negativo que ousa cruzar minha mente. “Seja positivo, filho! Energias boas atraem coisas boas.” - me apego as palavras do meu pai ontem a noite ao literalmente me colocar na cama para dormir.

Carrego o telefone grudado comigo como se fosse parte do meu corpo e entro no box, disposto a jogar na cara um injeção de realidade que me faça digerir toda essa merda acontecendo. Ligo no frio pois é isso que a vida tem sido ultimamente comigo: fria, dura, severa, de causar arrepios. Quente remete abraço, carinho, aconchego, fogo. Sinto falta. Frio nada mais é o contrário de tudo isso. Encaro como uma punição pela minha fraqueza desde que o conheci.

Após o banho gelado me arrasto até o primeiro andar. A cena da mesa posta, cristalina, lotada de comidas coloridas e cheia de fartura me enoja, como ontem. Ao menos Thomas não está aqui. Não estou no clima para bancar o garoto rico feliz numa divertida refeição com a sua família rica e feliz, no mundinho fictício rico feliz.

07:13.

Essa hora não passa...

Suspiro com uma baguete, suco de laranja, alguns pedaços de mamão, cream cheese, peito de peru e cereal com leite. Tudo fake. Mordisco aqui e ali, mas nada desce nessa minha fome encenada diante dos meus pais distraídos e preocupados com coisas bem alheias as minhas. Mamãe checa suas unhas e come tranquilamente como uma perfeita dama, longe demais da realidade que me atinge. Papai lê seu jornal como de costume, atualizando as notícias que controla diariamente. Eles comem, comem, e comem, conversam aqui e ali sobre o fim de semana e os planos para irmos até Montana. Eu não quero ir. Eu não posso ir e simplesmente deixar Minho sozinho no hospital.

07:14.

Isso é brincadeira!

Travo novamente meu celular e vejo que nada mudou em 1 minuto. Tudo pareceu tão arrastado que podia jurar já ter se passado no mínimo meia hora. Baguete, suco de laranja, alguns pedaços de mamão, cream cheese, peito de peru e cereal com leite. Tudo fake. Janson e Ava continuam em suas posições, parecem dois bonecos de cera. Brinco com a colher de prata no cereal, consigo enxergar meu reflexo na superfície convexa da colher. Rio sozinho. O côncavo da parte interna do talher funciona como um espelho, a imagem refletida é sempre real segundo a lei da Óptica, apesar de ser menor e invertida em relação ao objeto. Mas observo meu reflexo no convexo, um espelho que produz imagens virtuais, não reais, maiores e invertidas.

Não reais.

Me apego nesse significado. O Newt que vejo ali está longe de ser o Newt de meses atrás. Tenho olheiras grotescas abaixo dos olhos, um eterno corte a cicatrizar nos lábios, uma casca totalmente transformada por fora. A mudança é nítida aos olhos alheios, porém a grande guerra acontece dentro de mim.

- ... Não acha, Newton? – papai me pega de surpresa.

- O que? – indago sem ter ciência do que ele estava falando.

07:16.

Um milagre.

Um minuto inteiro se passou sem que eu olhasse apreensivo para o relógio.

- Jude. – apenas revela o nome do meu tio.

- Claro! – devolvo sorrindo. Tudo que engloba o nome do meu tio  mais novo deve ser divertido, então uma resposta afirmativa cai muito bem para a pergunta que ainda não faço ideia sobre o que é.

- Vai se encontrar com Thomas hoje? – não sei da onde tiro o assunto O’Brien e boto em pauta na mesa do café da manhã.

- Hoje não, Newton. Dei folga ao rapaz. Ele passou muito tempo ao seu lado no hospital e ontem se desdobrou aqui na Casa Branca para cuidar do caos que isso se transforma sem ele.

- Uh... – não sei se isso é bom ou ruim.

07:17.

Argh!

Completo 200 anos, mas a hora definitivamente não passa. Saio de mansinho de perto deles e sigo até a sala de TV. Nada me atrai ao zapear os canais. Talvez Bob Esponja, Pink e o Cérebro, ou quem sabe Os Simpsons, mas nem eles tem a capacidade de me acalmar no dia de hoje. Desisto da televisão. Jogo o controle remoto no sofá e cruzo as pernas sobre a mesa de centro, encarando o nada. Tenho meus polegares dentro da boca. Eu os mordisco alternando força ou raspando meus dentes na carne, isso de uma forma me relaxa e não me faz pensar no que aconteceu ontem no bar do meu pai.

07:20.

Evoluí.

Quem sabe se morder minha mão inteira o horário não pule direto para 7 da noite ou algo do gênero.

O silêncio matador do ambiente externo, que brinca com a minha inquietude interna gritante acaba quando meu telefone toca.

07:21.

Número desconhecido.

Eu ignoro. Bato minha cabeça uma, duas, três vezes contra o estofado de couro até que a tela do meu celular apague. Nada contra a ligação, somente não tenho forças para falar com quem quer que seja. Meus dedões a essa altura estão cobertos de baba, então troco para os nós do indicador. Escuto passadas rápidas pelo corredor, somente meus olhos acompanham a movimentação do lado de fora da sala. Papai surge minutos depois no meu campo periférico segurando seu celular, permanecendo totalmente mudo. Ele encara o aparelho por tempo suficiente para me deixar preocupado. No exato instante em que levanta sua cabeça e direciona seus olhos azuis pra mim, já sei o que aconteceu.

- NÃO! – murmuro respirando fundo, voltando a bater minha nuca e minha cabeça contra o sofá.

07:25.

Não mesmo!

- Newt... – papai suspira pesadamente caminhando na minha direção.

- NÃO! – repito mais alto e impondo, trazendo agora meus joelhos até meu peito, um ato de proteção que uso desde pequeno.

- Eu sinto muito filho...

- Por que? – enfio a cabeça entre as pernas fechando com força meus olhos. As lágrimas molham minha calça com facilidade. Também pudera, elas brotam como dois chafarizes.

- Nós fizemos o possível, e... – ele argumenta me abraçando.

- ENTÃO FAÇAM MELHOR! MINHO MERECE O MELHOR. ELE MERECE O MELH...

- Acabou, Newt. Ele faleceu  – nem seu abraço mais apertado do mundo vai me salvar.

- NÃO ME DIGA QUE ACABOU!

Mordo meus lábios travando minha mandíbula, a frieza que corta meu peito é surreal. O gosto de sangue já passeia pelos meus lábios, mas ele perdeu o encanto, assim como acabei de perder meu melhor amigo. Eu explodo. Não de raiva. Nem de ódio. Nem de culpa.

Explodo em dor.

 

*****

 

08:37.

Sofrimento.

- Newt, abra essa porta, filho, vamos conversar, deixe a mamãe cuidar de você.

Eu não quero conversar, quero ficar sozinho. Não quero que cuide de mim, quero ver o Tommy.

- Você já está a mais de uma hora trancado ai dentro desse banheiro. Se está vivo ao menos bata na porta.

Toc. Toc. Toc.

- Ufa! Menos mal.

Ava tenta travar o diálogo comigo enfurnado dentro da lavabo principal da Casa Branca, a primeira rota de fuga que optei assim que papai me soltou dos seus braços após a notícia de que Minho havia morrido.

08:38.

Lembranças.

Um flashback passa correndo pela minha mente. Sorriso, piadas, despertador, Allisson, ronco, carinho, escola, gravata, filmes, trabalho de casa, Aspen, risada, hospital, Montana, o primeiro oi, intervalo, provas, ataque de bobeira, festa do pijama, Celine Dion.

08:39.

Minho.

Sufoco lentamente por opção. Repasso cada momento juntos, porque a gente tem essa mania de querer sofrer e relembrar tudo quando uma pessoa querida morre.  Eu lamento. E lamento muito. Me cobro por não ter feito isso e aquilo enquanto ele ainda estava vivo. Essa é outra mania besta de gente besta. Mas acho necessária para avaliar o que realizamos enquanto ele ainda estava ao meu lado.

Onde será que ele está agora? Foi direto para o céu ou parou no meio do caminho tentando se decidir se o inferno não era mesmo a melhor opção pra me encontrar mais tarde?

- Eu sei que está chateado. Essa não será a primeira e nem a última pessoa especial que perderá, filho. Mas eu garanto a você que outras virão e farão sua vida valer a pena, como Minho fez. – a compaixão de Ava me espanta. As palavras bonitas vem do fundo do seu coração ou do fundo da garrafa de champagne que já deve ter virado desde que acordou?!

08:40.

Tommy.

Levanto minha carcaça da porta, varro as lágrimas do rosto, espalmo as mãos na pia e intimido o reflexo no espelho.

- Eu preciso fugir daqui.

 

*****

 

08:57

Fuga.

Rompo a Casa Branca como um foguete em lançamento numa missão espacial para Marte. Minha mãe não acompanha meu ritmo e desiste de me perseguir quando alcanço o jardim. Cavill graças a Deus estava distraído o suficiente para me deixar escapar. É uma luta constante contra o tempo. Escapo pela falha de sempre no portão e pego facilmente um taxi quadras a frente.

- Nebrasca Avenue, por favor. – peço ao taxista, selando a porta do carro amarelo.

- Você não é o filho do... – debruça curioso para trás.

- NÃO! – devolvo curto e grosso, fazendo o senhor acelerar o automóvel até meu destino.

- Qual altura vai descer, garoto?

- Qualquer uma.

08:59.

Me deixem em paz!

Meu celular não para de tocar. Cavill, Janson, Ava, tio Jude, até minha avó Elizabeth me liga. Decido que é hora de desligar o aparelho. Eu o encaro entre meus dedos, pensativo. Preciso me desfazer dele.

09:14.

Regras e astúcia!

Lição 1) nunca confie em ninguém. Lição 2) nunca dê um endereço importante quando se é uma pessoa “conhecida”. Thomas mora nessa rua, mas a cada dia desço num ponto diferente. Lição 3) rastreador e celular são coisas que combinam, por isso largo o meu iPhone de propósito no taxi. Lição 4) uma distração. Agora com meu telefone naquele carro, meu pai e o FBI provavelmente ficarão rodando atrás de mim por um bom tempo, dando o que preciso: paz.

09:18.

Senha 2513.

O elevador abre e destranco a porta do seu apartamento. Tudo está quieto demais. Uma rápida espiada até a cozinha e nem vestígio de Tommy. Sinais constatados: torradeira desligada, pia limpa, nenhum aroma de cafeína no ambiente. O néctar que brinda minhas narinas é de limpeza, purificação, Thomas O’Brien e sabonete. O moreno está no banho. Cada passo até seu quarto é um decibel a mais das gotas de água atingindo o chão do seu box. Tommy está animado hoje, assovia uma melodia que desconheço. Desvio meu percurso por um minuto. Eu acho que tenho uma coisa importante para fazer na sua câmara secreta antes de encontra-lo no banheiro.

09:21.

Achei você!

- Que surpresa agradável, Blondie! – escoro meu quadril na pia de mármore observando O’Brien enxugando seus cabelos. – Está um lindo dia hoje, você não acha? – enrola uma segunda toalha branca na cintura e caminha até mim.

Ele me cerca, ronda, analisa minha expressão. Posso afirmar até que deu uma leve fungada identificando meu aroma. E então ri. Lança a cabeça para trás e ri irônico.

- Já posso imaginar o que aconteceu. Eu não lamento. – diz dando de ombros - Se veio até aqui atrás de um abraço, bem, vou ficar te devendo.

Dá as costas e segue até o closet. Vou atrás como sempre, calado. Eu realmente queria um abraço.

- Não sei porque se importa tanto. Foi bem melhor para ele, garotinho. – sibila escolhendo uma roupa casual para aproveitar seu dia de folga. – Que horas será o enterro?

- Não sei... – murmuro perdido entre meus pensamentos e minha dor.

- Bem... – ele sorri e iça meu corpo junto com o dele para fora do armário – Então vamos tomar café da manhã juntos e curtir esse dia peculiar.

09:25.

Suspiro.

Thomas rodopia feliz entre a bancada e a geladeira. Sai carregado de frutas, frios e uma caixa de ovos. Sento na bancada segurando meu queixo com a palma das mãos observando seus movimentos despreocupados. Ele é tão lindo e isso me machuca.

- Vai querer uma omelete?

Nego com a cabeça.

- Uma salada de frutas? – indaga e quebra três ovos num pote, separando apenas uma gema na sua injeção de proteína matutina.

Novamente nego.

Despeja tudo em uma frigideira, desliza seus dedos até o iPod próximo a bancada e enquanto faz seus ovos mexidos dançando sexy pra caramba ao som de “She so Cold” dos Rolling Stones.

- Ahhh... – suspira docemente, piscando pra mim – Eu adoro esses carinhas da sua terrinha!

09:28.

Suspiro.

Inspiro.

Expiro.

Não tenho certeza disso.

- Já sei, Blondie! Farei uma panqueca pra você. O que vai numa panqueca? Acho que só tem farinha integral aqui em casa...

Reviro os olhos num gesto imaturo.

Ele nota. E novamente ri.

- Pare com essa carinha de quem está muito sentido com a morte daquele babaquinha inútil. Você não vê que nós dois somos muito melhores sozinhos? – sibila remexendo o quadril e brincando com a frigideira na chama quente do fogão. – Farei uma daquelas panquecas nojentas que você e seu pai amam, mas já vou logo avisando que não tenho mel nem o caralinho a quatro pra passar nela.

Seus pés descalços arrastam pelo chão sentido a dispensa, bailando exageradamente, explorando todo o espaço até a porta de vidro.

09:29.

Inspiro.

Expiro.

Inspiro.

É agora.

- Eu não quero panqueca! – murmuro alto saltando da bancada num baque brusco, posicionando-me atrás dele.

Ainda de costas, Thomas estanca seus movimentos, levando as mãos na cintura e relaxando uma perna. Eleva o braço direito até a nuca, num sinal de introspecção. Ele disfere uma longa fungada na atmosfera.

- 500 S&W Magnum, curta distância, calibre 12.7mm, capacidade para 5 munições, arma de mão para caça, só a mais potente do mundo. Você está me caçando, Blondie? – gira lentamente o tronco na minha direção, sustentando meu olhar. Somente meu olhar. Ele ignora a arma que conhece tão bem, sendo comprimida com precisão pelas minhas mãos, mirando diretamente ele.

- Eu entendo. – balança a cabeça positivamente, lançando dois passos para frente. Mantenho a mira contra sua cabeça, tenho um tremor perceptível atingindo meus braços que sustentam o alvo. – Sei que não quer fazer isso. Você quer fazer isso, Blondie? Quer machucar seu amorzinho? Quer se tornar tão sujo quanto eu?

09:31.

Não faz isso comigo, Tommy...

Quatro passos para trás. É isso que dou a medida que ele caminha sorrindo até mim. Minha bunda encontra a borda da pia, dizimando minha rota de fuga.

- Você não vai apertar esse gatilho e sabe por que? – finalmente ele me alcança, meus braços fraquejam com a proximidade, então ele pressiona seu peitoral contra o cano do revolver. – Porque sua vida sem mim será reduzida a nada. Pode não perceber agora que está fragilizado, choramingando pelo seu melhor amigo de merda, mas quando acordar pra realidade, verás que sou tudo aquilo que precisa. Somente eu sou aquilo que precisa, meu garotinho.

Arfo fundo relaxando os ombros, um gosto amargo açoita minha garganta.

Meu queixo já está na prisão dos seus dedos, dominando meus movimentos da cabeça, sou obrigado a fita-lo, cada vez mais acuado. Com a outra mão ele segura a arma com cautela, sorrindo docemente.

- Eu cuido disso. Você pode se machucar.

Afrouxa meus dedos do revolver, acariciando o dorso da minha mão. Permito que ele a retire de mim. Em um movimento brusco Thomas joga a arma longe, um tilintar grotesco atinge o piso de mármore e ecoa pela casa toda. Meus ombros saltam com o poder do baque e seus olhos julgadores queimando os meus.

- Tommy, eu... – sibilo minha desculpa quando o moreno espalma um braço de cada lado da pia, me prensando ainda mais ali. – Eu... – gaguejo mais uma vez – Eu não sei o que deu em mim... – levo o lábio inferior a prisão dos meus dentes, é a combinação da inocência mesclada com meu olhar confuso e imaturo. – Você tem razão! Você sempre tem razão...

Ele estala a língua e corre a mesma sobre os lábios.

- Por favor, Tommy, me perdoe. Todos esses sentimentos tem fodido a minha cabeça... você... sem dúvida alguma... é...

- A pessoa mais importante da sua vida! – O’Brien corta minha frase tomando meu tronco encolhido em seus braços.

09:35.

Talvez seja...

Eu finalmente recebo meu abraço, aquele que ansiei desde que Minho morreu, esse que vim buscar diretamente dos seus braços. Ele é quente, aconchegante, o encaixe perfeito entre preto e branco. Ele me entorpece, quase chega a desvia por uma fração de segundos toda minha sanidade. Mas não hoje! Hoje definitivamente não!

09:35.

Desculpe, Tommy!

Minha testa franzida é comprimida abruptamente contra seu tórax quente, a sensação de poder em mãos é conflitante. Forço a lâmina contra sua pele macia, depurando cada vez mais a carne transbordando uma guinada de sangue, sangue frio. Com a mão esquerda fincada em seu ombro, empurro a faca mais a fundo com a destra, cravando minha decisão nessa manhã de terça-feira.

09:35.

Backup!

A faca extra escondida propositalmente no cós da minha calça toma uma decisão: eu quero ser livre.

Thomas engasga, titubeando seu corpo a minha frente, tenta espalmar as mãos na bancada, então retiro a lâmina da sua pele e a finco novamente, alguns centímetros mais para o lado. Acho que peguei algum órgão vital. Ah não, espera, ali é o lugar do coração e isso é algo que Thomas O’Brien não tem!

09:36.

Sou amador.

Observo e anoto suas reação sobre meu comando, descrente do que fiz. Da sua boca um pequeno filete de sangue escorre, beijando a tonalidade pálida que sua pele adquire a cada segundo.

- Você tinha razão, Tommy. Nosso contraste é insano! – retiro a faca, assistindo seu corpo alcançar o chão.

- Newt... – ele murmura contorcendo o tronco de maneira miserável. Não me orgulho do que vejo.

- Por que tudo tinha que terminar assim? – digo e ele me fita com seus olhos baixos, tentando estancar o sangue que jorra para fora do seu peito. – Eu te amo, porra! Eu sou o único que quer seu bem e o que você me dá em troca? Dor e mais dor? Não, Tommy! – murmuro secando minhas lágrimas insistentes.

Solto a faca no piso manchado de carmim, olhando apavorado para minhas mãos lavadas com seu sangue. Esfrego-as desesperadamente contra o tecido da minha jeans.

Seu grunhido ferido de dor pune minha alma e tudo que ele faz é contorcer e contorcer o corpo de maneira terrífica, sentido tudo ruir, sentido o colapso o alcançando, sentindo a porra do caos tomando controle.

- Por que? – o moreno chia cuspindo uma bola de sangue escarlate vivo, mas ainda assim é a droga do seu sangue frio que magoa.

Agacho numa distância segura, eu quero tocá-lo, quero abraça-lo e dizer que tudo vai ficar bem, que nosso final feliz será lindo como um conto de fadas, mas essa é a droga da vida real. Poderia encostar e reivindicar seu rosto pra mim, tocar seu queixo e dar-lhe até um beijo de despedida, mas não o faço.

- Simplesmente porque alguém precisa impor um limite em você. Não pode simplesmente sair por ai acabando e dominando a vida das pessoas, como se fosse Deus. Você não é Deus, Tommy.

09:48.

Eu só queria que você me amasse de verdade...

Thomas já fechou os olhos e tem sua respiração quase imperceptível a mais de 6 minutos. Está imóvel e a poça de sangue parece eterna a sua volta. Estou sentado ao seu lado com meus joelhos tocando o peito e segurando seu mindinho. Faço isso desde o momento em que ele parou de arfar fundo e cerrou as pálpebras. Não quero soltá-lo.

Mas eu preciso.

Antes de sair da cozinha ensanguentada rastejo até ele, sem me importar com minhas roupas. Deposito um beijo no topo da sua testa, pedindo mais uma vez perdão pelo que fiz.

Ando apressado até sua suíte, disposto a pegar uma recordação do moreno. Adentro no closet e percorro meus olhos pelas suas roupas extremamente organizadas.

- Onde foi parar aquela blusa branca de manga longa que me emprestou outro dia? – o cheio dele incutido nela é surreal.

Reviro as prateleiras em busca do meu tesouro e apesar de bem focado nessa busca, não desvio o olhar um segundo sequer da entrada do closet. Vai que ele aparece, né?

Uma curva divertida molda meu rosto ao encontrar a tal blusa e algo mais. Uma pequena caixa de madeira entalhada escondida entre alguns agasalhos brilha e reluz como ouro. Decido abri-la depois. Preciso sair dessa apartamento o mais rápido possível antes que o baque da culpa me atinja ainda mais.

09:52.

É isso.

Eu o fito pela última vez, estirado no chão de mármore negro como sua alma, antes de deixar... antes de deixar meu homem para trás.

- Adeus, Tommy. – agarro a maçaneta e abro a porta para a rua, o ar purificado do hall atinge minha face, cortando-a lentamente. Uma perna no inferno.

Uma perna no paraíso.

Desfiro o ultimo passo na direção da luz. Eu escolhi finalmente sair da escuridão.

09:54.

Taxi!

Sorrio ao taxista que encosta do carro na porta do prédio e me encara absorto. Não entendo o porque até descer o olhar para minhas roupas sujas de sangue.

- Festa a fantasia! – dou de ombros e acomodo meu corpo no banco de trás, indicando meu endereço.

Entre meu choro e meu sofrimento, sou tentado a abrir a caixa de madeira e checar o que Thomas O’Brien esconde ali. Ergo o fecho prateado e libero a tampa, o cheiro de lembranças automaticamente espanca minha rinite. Retiro um pequeno calhamaço de fotos antigas, analiso uma a uma. Meu coração vibra na garganta ao conhecer um O’Brien totalmente diferente. São fotos da sua infância, percebo que ela não foi nada fácil a julgar pelo estado em que ele se encontra nas fotografias. Suas roupas são largas, como se ele as tivesse emprestado de alguém. Ele é bem magrinho, franzino, tem as mesmas bochechas rosadas, mas seu olhar me parte ao meio. Ele é opaco, distante, como quando me olhou a pouco na cozinha.

Vejo dois adultos, um casal. Julgo ser seus pais, ou não. Thomas nunca me falou sobre eles. Me retenho ao redor, ao segundo plano da fotografia e não nas pessoas em si. A casa é bem pobre, tem paredes descascadas e ao fundo vejo um colchão velho jogado no chão, um travesseiro infantil e uma manta suja. Mordo os lábios quando penso que jogava meu colchão no chão somente para escorregar na escada de madeira da casa da vovó Judith.

09:58.

Isso machuca...

Nauseado, viro estas recordações do avesso. Meus dedos curiosos encontram um pequeno cordão de ouro, preso nele um pingente de coração. Minhas mãos trêmulas custam a abri-lo. Um click sutil  libera o fecho. O lado direito, vazio. O lado esquerdo...

- NÃO PODE SER...

Chio em voz alta, chocado ao reconhecer a mulher da foto.

Não! Não! Não! Não! Não!

Isso não é verdade!

Será que ele é filho da Sra. McCall? Ou essa seria a tal tia dele?

Eu tenho certeza absoluta! A mulher da foto é a senhora Melissa McCall, mãe do Scott, só que anos mais jovem. Meu corpo treme inteiro com as possibilidades.

É quando meu telefone extra vibra. O telefone que ganhei do moreno ao volta de NY denuncia uma ligação. Atendo sem pensar duas vezes. Minho o tem, mas está morto. Thomas o tem, igualmente morto. Scott o tem...

- Alô?

- Senhor Sangster?

- Ele.

- Aqui é o hospital MedStar, seu número está na ficha de pessoas autorizadas a receber informações do paciente Minho Hong Lee. Eu gostaria de avisar que...

- Eu já sei. Obrigado. – corto a voz feminina e esmago o cordão de ouro entre meu punho fechado, ainda absorto na fotografia presente ali.

- Vou avisar ao paciente Lee que o senhor está liberado para visita-lo hoje. Logo ele terá alta.

- COMO ASSIM? – hiperventilo estarrecido. – MINHO MORREU! NOS AVISARAM HOJE CEDO.

- Creio que houve algum engano senhor. Minho Hong Lee acordou hoje cedo e est...

Desligo o telefone, dando uma sequencia de murros contra o banco do motorista. Ligo de imediato para seus pais e confirmo o engano. Minho está mais vivo do que nunca. A falta de ar me tinge, minhas mãos perdem o controle e uma guinada de pânico corta minha estrutura. Salto do taxi e corro. Fujo do maior erro que cometi.

10:00.

O que foi que eu fiz?!

Eu matei o Tommy!

 

*****

 

10:11.

Deus, me perdoe...

Eu nunca fui insano, exceto quando permiti que meu coração fosse tocado. Levo a frase de Oscar Levant ao pé da letra ao adentrar na Casa Branca com a roupa, minhas mãos e minha alma suja de sangue. Com o sangue do meu Tommy.

O que foi que eu fiz?

 

“Existe uma linha tênue entre a genialidade e a insanidade. Eu escolhi apaga-la”.

 

Apaguei a linha que separava dois polos distintos que, se unidos, podem ser bem proveitosos para minha defesa.

- Newton, pelo amor de Deus, o que aconteceu meu filho? – Janson é o primeiro a constatar meu estado deplorável assim que alcanço o corredor principal do primeiro andar.

Desabo minha carcaça aos seus pés, chorando como um bebê. Deixo a faca ruir no carpete do corredor, denunciando meu erro. Agora ele sabe que seu filho é um assassino.

17:21.

Blá. Blá. Blá.

Sou jogado de um lado para o outro nesse interrogatório sem fim. A delegacia mudou, acho que a pauta exige um profissionalismo mais assertivo. Estou agora sob a mira de no mínimo 4 agentes do FBI, dando minha versão dos fatos. A única verdadeira, claro. Meu pai exigiu acompanhar tudo ao meu lado, juntamente com o advogado da família. Não que os Sangster fossem precisar dele. É mais para cumprir um protocolo.

As perguntas giram em torno de O’Brien, claro.

E eu entrego tudo que sei.

Na verdade entrego o que eu quero, tornando Thomas o culpado de tudo. Eu sou apenas um garoto indefeso, vitima do sistema.

A merda, eu sou um mentiroso filho da puta.

20:33.

Auto defesa.

- Senhoras e senhores, com vocês, o Presidente Janson Sangster.

Papai convocou uma coletiva de última hora para esclarecer o caso ao povo americano. “Mantenha-se unido a sua família, senhor” - esse seria o conselho de O’Brien para horas de escuridão que atingem o interior influenciável de meu pai. Por falar nele, está arrasado. Não é pra menos. Thomas traiu sua confiança, manipulou sua mente e me usou. Fiz coisas que não me orgulho, mas aprendi com o melhor. Acho que o moreno ficaria orgulhoso do meu teatro.

- ... Uma vitima. É isso que meu filho é, assim como toda a família Sangster e as vidas perdidas nesta história sórdida. O povo Americano hoje pode deitar a cabeça no travesseiro e dormir de consciência tranquila. Thomas O’Brien e seu parceiro Frederick Waren não mais manipularão vidas, brincando com a justiça do País e acima de tudo com a justiça divina. O serial killer de Washington está morto!

- Newton! Newton! Uma palavra para a CNN! – um ruivo implora insistente, apontando seu microfone e câmera na minha direção.

A sala de coletiva está apinhada de repórteres, gente ensandecida em busca de maiores respostas para meu sequestro e as atrocidades que o serial killer cometeu comigo durante todo esse tempo. Flashes, gritos, perguntas ofensivas, todos querem entender o que aconteceu. Mantenho os ombros encolhidos, dando apoio ao meu pai e segurando a mão da minha mãe.

O que aconteceu? Simples!

Fui manipulado todo esse tempo por uma mente doentia que ameaçava minha família e a vida dos meus amigos caso abrisse minha boca. Era submetido a torturas, agressões diárias e sexo não consentido para inflar seu ego. No final, eu explodi. Matei o vilão em legitima defesa e ainda aleguei síndrome de Estocolmo, pois estou apaixonado por ele.

E não é que colou?!

Colou com todo mundo!

Com meu pai, com a polícia, com o FBI, até com a minha consciência filha da mãe. Eu sou um mentiroso do caramba. O trabalho que Thomas fez comigo funcionou direitinho.

21:53.

Compre o seu papel.

Limpo minhas lágrimas juntamente com mamãe, que funga de maneira deselegante diante das câmeras, mas a apoio incondicionalmente, afinal, sou um bom menino. E o próximo vencedor do Oscar.

- Agradeço o carinho de todos vocês, isso significa muito para nossa família. A coletiva está encerrada, boa noite. – papai coloca um basta no circo, abraçando-me de forma carinhosa ao sairmos unidos do tablado.

É pecado dizer que um pequeno vislumbre de sorriso forma-se em meus lábios ao dar as costas para a mentira mais deslavada da minha vida?

22:12.

Insanidade.

Deslizo minhas mãos pela parede creme do segundo andar, notando nos dedos resquícios de sangue. Toco com gentileza o papel de parede frio, sentindo a leve textura provocar uma cosquinha na ponta dos dedos. Eu brinco com eles. Os movimento para cima e para baixo, criando um ritmo alucinante, como um maestro regendo nada menos que Nossun Dorma, a famosa ária do último ato da ópera Turandot.

- Ma il mio mistero e chiuso in me(mas o meu mistério está fechado comigo)! – cantarolo em voz baixa e divertida.

Vou carregar essa mentira pra sempre comigo.

Eu estou dançando ao som da loucura dentro de mim.

22:14.

Dor. Muita, dor.

Alcanço meu quarto e tranco a porta em um baque surdo.

A quem eu quero enganar?

FBI? Meu pai? Uma nação? Meus amigos?

Eu não apenas menti diante de todo mundo, inventando uma coisinha aqui e outra ali para pagar de bom moço. Eu acabei com a vida dele, do meu Tommy, meu amor, e essa sensação de vazio de merda está acabando comigo.

Corro para o banheiro largando minhas roupas no chão, esmurro a porta do box e ligo a ducha desesperado.

- Tira isso de mim! Eu quero isso fora de mim! - imploro esfregando freneticamente a esponja no sangue impregnado em meu corpo.

22:16.

Tudo em vão.

Não sei se estou livre.

Não sei até que ponto minha vida agora vai voltar ao normal.

... Afinal não se pode tirar Thomas O’Brien assim, esfregando e ensaboando, polindo e renovando, ainda mais quando o único lugar que não alcanço é meu coração.

 

 

 

Point of View of Thomas O’Brien

 

A dor, ela deve ser sentida, concordo plenamente. Mas não assim não era para ser assim. Não era!

Abro os olhos, fitando o teto liso do ambiente, completamente desacreditado. Arrasto meu corpo para longe da poça absurdamente violenta e grotesca, um grunhido se forma em meu peito, pedindo passagem por entre meus lábios, meu corpo está fraco demais, minha mente permanece potente, ofego forçando os braços sobre o piso frio, flexionando firmemente, tentando ao máximo erguer-me e tornar-me o ser humano não humilhado.

Eu senti, senti tudo o que todas essas pessoas sentiram todo esse tempo. O aroma da morte é convidativo, ele me embala, é podre, mas ainda assim chama minha atenção, volto-me a ele. Estou sendo arrastado, lentamente, ouço um relógio imaginário e seus ponteiros ressoarem em minha mente, como em um sinal de que já está na hora de parar de lutar.
Ele deixou meu apartamento a minutos atrás. Com as mãos banhadas pelo meu próprio sangue. Inexperiente de merda! O que mais me desaponta foi seu crime mal cometido, totalmente imundo, nada imaculado e planejado.

Backup! Ele tinha a porra de um backup! Você deveria saber disso! Até porque você foi a pessoa a ensiná-lo isso.

Filho de uma puta! Eu sou um filho de uma puta, burro, cego, fraco como um demônio.

Paciência. Teste minha paciência.

Você deveria ter me dito. Deveria ter me dito, garotinho! E agora sangrarei até a morte sem a menor chance de defesa.

Não! Esse não é o meu destino. E se for... Foda-se. Não aceitarei!

Arrasto cada vez mais meu corpo pesado, em poucos minutos atinjo o meu celular, estendo o braço, o capturando sobre a bancada.

A hesitação também está me matando, e eu não pude salvar. Não pude salvar nada! Eu ao menos sou o cara certo para salvar algo se esse for o caso.

Minha vista escurece, o gosto de ferro se faz presente em minha boca, recosto o dorso contra o concreto da bancada, estico as pernas doloridas, sentindo o corte profundo em minha pele, ele pinica, formigando toda a região.

E então disco, teclando em meu celular.

Uma voz baixa e feminina atende de imediato.

- 911. Qual sua emergência?

Cuspo para longe o ferro em minha boca, salivando feito um cão raivoso. Ouço um ruído e então percebo que meus ouvidos estão começando a serem abafados. Tusso repetidas vezes até ser capaz de pronunciar uma palavra que seja.

- Ele disse que não sou Deus. – Rio lambendo o sangue em meus lábios. – Está certo. Deus não planejaria o furacão infernal prestes a atingir sua vida!

- Senhor? – A mulher chia na linha. – Senhor ainda está aí? O senhor está bem?

 

 

 

Fim.


Notas Finais


Gostaria de agradecer a parceria com a @DearTommy.
Ganhei muito mais que uma amiga virtual.
Love u, girl. <3


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