Seus passos eram leves e sorrateiros, debaixo da chuva fina, na noite escura, sua presença era quase imperceptível. Eram dez e quarenta da noite e o ultimo ônibus havia deixado de circular pelas ruas há meia hora atrás, mas o ultimo trem sairia em vinte minutos. As ruas estavam vazias, para o seu desagrado, os noticiários estavam dando resultados, exatamente como a polícia tanto queria. No entanto, ele era persistente, articulado e ardiloso como um verdadeiro demônio. A demora em ser descoberto inflava seu ego e fazia sua mente fervilhar em novas possibilidades.
Vestindo uma capa de chuva cinza e botas de couro, ele se infiltrava como um rato nos buracos de Seul, respirando fundo e farejando um novo odor que possa lhe despertar os sentidos.
Há dois quarteirões da estação de trem uma figura baixa e encurvada andava apressadamente, provavelmente um universitário correndo de volta para casa, ou correndo da chuva. Com calma e mantendo um sorriso amigável sobre os lábios, retirou sua capa de chuva e a deixou solitária na calçada, acreditando aparentar mais amigável e menos sombrio sem ela. Precisou correr um pouco, mas o alcançou em uma esquina escura.
– Ei.... Eu estou perdido. Quis voltar mais cedo de uma festa e me perdi no caminho.... Você conhece o Palace Hotel? Eu estou hospedado lá. – Sorriu gentil e curvou-se levemente.
– Hm... Está um pouco longe, mas eu posso te acompanhar se quiser, estou indo mesmo por essa direção.
Sorrindo em concordância, passaram a caminhar juntos.
– Qual é o seu nome?
– Baekhyun, e o seu?
– Eu gosto que me chamem de anônimo.
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Jongin não dormia direito há dias, e suas orelhas roxas estavam mais profundas do que conseguiu enxergar no dia anterior. Estava preso entre recortes de jornal e anotações valiosas. Um mural em seu escritório tomava toda a sua parede. Riscos vermelhos ligavam os pontos e os círculos pretos indicavam todos os lugares em que corpos foram encontrados. Tudo o que tinha de mais valioso eram as informações recentes divulgadas entre policiais, por ser um agente federal tinha notícias em primeira mão do caso Anonymous.
Eram nove e meia da manhã e sua mesa de madeira estava repleta de xícaras de café e pílulas para se manter acordado, se isto durasse mais do que duas semanas, e continuasse neste ritmo, estaria acabado antes de colocar as mãos no assassino. Houve um motivo para Sehun ser morto, ou então o assassino não estaria no cemitério naquela madrugada, aguardando a chegada do corpo como um atleta espera ansiosamente por seu prêmio. Naquela madrugada seu noivo era o prêmio. Isso o corroía e o matava aos poucos, sequer poderia perder-se em seu luto, estava ocupado demais caçando o culpado, como a caça e o caçador.
Quando o relógio despertou as dez horas da manhã, seu celular tocou. Era uma mensagem de Kyungsoo.
Desde o acontecido ficara com pena do mesmo, assim como também ficará preocupado. Não precisava de todo o seu conhecimento como agente federal para saber que o modo como ele fora tratado pelo assassino significava algo a mais, algo que ainda não conseguira despertar. De qualquer modo o devia proteção, e nisso os policias responsáveis pelo serviço de proteção a testemunha eram completamente imprestáveis, e também havia o fato de Kyungsoo não ter presenciado crime algum, o que dificultavam suas possibilidades de ser ajudado mesmo com o perigo iminente do novo serial killer que atormentava Seul. Depois de o mandar uma mensagem de texto, colocou seu casaco e saiu de casa para conversar com o chefe de polícia, passaria na casa de Kyungsoo depois.
O departamento de polícia estava lotado, várias viaturas se encontravam estacionadas. Depois de suspirando, esperando pelo pior, entrou e dirigiu-se sem cerimônias ao escritório do chefe de polícia, recusando falar com qualquer policial que cruzasse seu caminho. Por sorte ele estava sozinho, à espera de sua visita.
– Credo, Kim. Você está horrível.
– Não é para menos, não durmo bem há dias. – Ripostou seco.
– Bom... – Ele se levantou, ajeitando a gravata e tirando de sua gaveta dois envelopes gordos de papel pardo. – Veio buscar isso, não é? – os colocou sobre a mesa.
– Isso não é tudo, eu quero saber exatamente tudo o que descobriram até agora.
– Não muito mais do que você sabe – deu de ombros. – Mais um corpo foi achado nessa manhã, mesmos cortes, mesmas marcas, dessa vez uma mulher, cerca de quinze anos. Os psicólogos fizeram uma análise comportamental, mas está tudo aqui – bateu com as palmas sobre os envelopes. – É muita coisa para analisar, mas contamos com a sua ajuda.
– Eu estou trabalhando duro no caso, chefe Jinki.
– Continue assim, nós- Mal tivera tempo de continuar, uma chamada no rádio o fez se desconcertar. Ele a respondeu de imediato, ao que parecia, um novo corpo fora encontrado a duas quadras da estação de metrô, desta vez o de um universitário de vinte e dois anos de idade. – Mais problemas, Kim. Mais um corpo, tenho que ir. Apareça aqui de novo daqui a dois dias, terei mais informações.
– Tudo bem, pode ir.
Jongin lembrava-se bem do caminho até a casa de Kyungsoo, costumava o visitar muitas vezes com Sehun para saírem entre casais, Kyungsoo com Yifan, seu namorado, e Sehun com o Kim. O mais velho o estava esperando, e provavelmente tinha muitas perguntas a lhe fazer, embora nenhuma delas tenha resposta ainda.
Quando finalmente chegou o menor o atendeu com sorriso amarelo, suas olheiras de tão fundas assemelhavam-se as suas. Não precisou de muito para constatar a marca negra em seus braços, estava bastante evidente em seus braços desnudos, e Kyungsoo sequer preocupava-se em esconde-la com uma camisa de mangas cumpridas. Ao ser direcionado para o sofá, sentou-se e recebeu uma xicara de chá que lhe foi oferecida, Kyungsoo sentou-se ao seu lado, em silêncio.
– Alguma notícia nova?
– Na verdade não, mais dois corpos foram encontrados.
– Alguém conhecido?
– Não, mas eu deveria estar acompanhando os policiais na cena do crime, talvez eu ache alguma coisa importante. Sabe como são esses policiais de Seul, uns imprestáveis. Tenho certeza de que o relatório do psicólogo é uma merda também.
– Bom... Você deveria mesmo ter ido, poderia deixar para passar aqui depois.
– E te deixar sozinho? Nem pensar.
– Não ia fazer diferença.
– Sabe que iria fazer, e como-
– Eu sei, é como se eu estivesse marcado pelo assassino.
– Pois é, é por isso que estou aqui. Você deveria ir ficar comigo, na minha casa.
– Nem pensar, é muito bom o que tem feito por mim, mas tenho que encarar isso também, sem medo. Sei me cuidar.
– Sabe mesmo? – Riu sem som.
– É claro.
– Te vejo mais tarde – Jongin levantou-se, pronto para ir embora. – Yifan vem te ver?
– Ele vem amanhã.
– Certo, me ligue se precisar.
Jongin despediu-se e foi levado até a porta, caminhou lentamente até sua casa e pôs-se a pensar em todas as possibilidades. Pensava em Sehun, em tudo o que ele possivelmente teria lhe escondido, e sabe-se lá por quanto tempo. Havia algum motivo para ter sido morto. Ele fora arrancado de sua casa, morto cruelmente e deixado sobre sua cama novamente, posicionado perfeitamente sobre a cama. Mas o padrão do assassino era diferente, era muito menos cruel e optava por andarilhos e desconhecidos andando na calada da noite. Era assim que caçava.
Oh Sehun não fora uma caça qualquer.
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O relógio da sala de estar o irritava. O tic-tack insistente ecoava pelas paredes e o deixava aflito. A espera pela chegada de Yifan nunca o deixou tão ansioso. Três dias se passaram desde que Sehun fora enterrado, desde que fora deixado acordado sobre o gramado do cemitério ao lado do noivo de seu melhor amigo. Por alguma razão, tornou-se uma vítima também dos ataques de Anonymous. O matador estava no cemitério quando chegara ao lado de Jongin para receber o corpo tão querido de Sehun. Ele os aguardava ali, por algum motivo, e quando finalmente os achara apontou uma arma para si e o atingiu na cabeça, assim como fizera com Jongin. Agora, cheio de medo, Kyungsoo esperava Yifan bater a sua porta para enfim aninhar-se entre seus braços e sentir-se protegido.
Seu namorado havia ligado a pouco, alertando que demoraria mais alguns minutos. Kim Jongin também havia ligado mais cedo, avisando que recolheu conteúdo o suficiente para iniciar uma busca implacável pelo culpado pela morte de Sehun. Ele afirmou suas palavras e disse que o protegeria. Com toda certeza ele sabia que estava correndo perigo, já que o psicopata capturara seus rostos. Estavam em sua mira e a mercê das vontades do assassino.
Depois de trinta minutos esperando, Yifan aparecera em sua porta vestindo a camisa a qual ganhara de aniversário e esboçando o sorriso largo que tanto acalmavam Kyungsoo.
– Oi, como você está? – Perguntou preocupado.
– Bem melhor, obrigada. – Sorrindo, o puxou para dentro.
Sentaram-se lado a lado no sofá, embalados em um beijo simples que se findou quando a tevê ligada passou a anunciar o noticiário. A jornalista dava novas informações sobre o caso anonymous. Uma das máscaras usadas pelo assassino foi encontrada ao lado dos corpos esquartejados de uma mulher de meia idade e uma criança de sete anos, aparentemente seu filho. Uma completa barbaridade.
– Isso é horrível, não acha?
– Tenho náuseas só de pensar. – Yifan esboçou um semblante enjoado, capturou o controle remoto e trocou de canal, impedindo Kyungsoo de chocar-se ainda mais com as notícias. Ele estava nitidamente amedrontado.
Agora no canal das onze passava algumas músicas antigas, rock clássico. Kyungsoo aninhou-se mais aos braços de Yifan e ambos trocaram um beijo lento, cheio de volúpia e caricias urgentes.
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Uma carta foi endereçada a casa de Jongin, ela chegou as nove e meia da manhã pelas mãos de um carteiro baixo e carrancudo. Nela continham algumas informações valiosas sobre alguns documentos secretos do caso. O Kim não demorou a descobrir que o assassino era também um hacker, ou contava com ajuda de certeiros. Primeiro, matava a vítima, entrava nos sistemas policiais e alterava dados, com toda certeza implantava provas falsas na cena do crime.
Ao todo, foram descobertos até então sete corpos, quatro deles com sua marca registrada e três com indícios de serem apenas um grupo de suicídio coletivo. Não demorou muito a dirigir-se a delegacia e mostrar a carta ao delegado.
– Escute, Jinki. Eu cansei de brincar de gato e rato, esse jogo não é para mim. Eu vou fazer ele pagar.
Jinki concordou silencioso, colocou sobre sua mesa uma pasta com quatro identidades e voltou-se para o Kim.
– Estes são os quatros suspeitos mais prováveis, foram detidos ano passado por crimes semelhantes.
– Trabalharei sozinho a partir de agora.
Jongin pegou a pasta e saiu da delegacia em direção a sua casa, iria visitar o primeiro suspeito assim que anoitecesse.
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