Capítulo 1 - Sangue Mágico
Era quase o término da madrugada, o sol levantava-se e, com os pouquíssimos raios solares, iluminava parte da quadra em que moramos. Eu estava em pé, olhando, pela janela, o clarear do bairro.
A ansiedade fora tanta que não consegui dormir, diferente de Luiz, que dormia profundamente. Eu o conhecia tempo o suficiente para saber que, se não fosse por mim, ele perderia o horário.
O velho alarme na cabeceira indicava que restavam-me apenas quatro minutos de silêncio. Eu, sinceramente, adorava o silêncio. Este proporciona um momento de reflexão e de esquecimento dos problemas. Lamento, internamente, por ter aceitado ir a aquele acampamento, o qual eu teria que dividir uma cabana com mais pessoas do que o necessário.
Então, restando apenas dois minutos, adianto-me. Sigo até sua cama e o cutuco uma, duas, três vezes até ele responder. Se olhar matasse, eu já estaria morto. Sua cabeça virou de mim para o despertador e do despertador para mim.
-Eu ainda tinha um minuto e meio de sono... - Ele resmungou.
-Lide com isso. - Falei, antes de abandonar o quarto, rumando o banheiro.
Após longos trinta minutos de reclamações e piadinhas, terminamos de nos arrumar. Ainda restava quinze minutos até o ônibus passar. Isso é bem estranho. Um acampamento mágico que tem um ônibus como transporte.
A ideia de passar seis meses em um acampamento era excitante e aterrorizante ao mesmo tempo. Tudo poderia acontecer. Desde se perder na mata a briga internas.
-Vamos. Melhor cedo do que atrasado. - Disse, em um tom autoritário.
-Você é muito mandão. - Luiz retrucou.
-Óbvio. Você colocou sua mãe em coma. Alguém tem que te controlar.
-Tu és bem detestável as vezes... - Ele finalizou, então, saiu para a rua.
Após trancar a porta, comecei a segui-lo. Andamos lado-a-lado, desfrutando do silêncio. Uma das coisas que sempre compartilhamos: o silêncio.
Esperamos poucos minutos até o ônibus chegar. Entramos e, para a nossa infelicidade, não havia lugares juntos. Olhei para o Luiz e ele fez o mesmo olhar que o meu. Os lugares restantes eram distantes, ainda por cima. Um na frente e outro no fundo. Luiz sentou-se na frente e eu fui para o fundo, sentando ao lado de um menino de óculos.
-André e manipulação temporal. - Me assustei e olhei para ele.
-O quê? - Questionei.
-Meu nome e meu poder. - Ele disse, como se fosse a coisa mais óbvia. - E você?
-Gabriel... - Não acho que seria uma boa ideia falar do meu poder - Umbracinese.
Creio que não seja o momento certo para comentar sobre minhas habilidades; ele, como os demais, pode não aceitar.
Pelo resto do caminho, conversamos sobre coisas banais, nossas expectativas sobre o acampamento e sobre o domínio que temos em nossos poderes.
Assim que chegamos no local, meu celular marcava meio-dia. Aos poucos, o ônibus se esvaziava. Luiz me esperava do lado de fora. Quando saí, o apresentei a André. Eles se deram muito bem.
Quando todos saíram do ônibus, o automóvel foi desmaterializado. Então, as folhas, das árvores que cercavam o local, começaram a se agrupar. Logo, uma bela mulher apareceu. Suas vestes consistiam em um longo vestido verde e seus cabelos eram loiros.
-Muitos diriam que fitocinese é inútil, mas não ousem me desafiar. - Ela bradou.
Um silêncio fez-se presente, ela continuou.
-Sigam-me.
Sem esperar por respostas, ela andou entre os adolescentes. Suas madeixas movendo-se, conforme seus passos. Ela entrou na maior cabana que tinha ali.
Logo, todos seguiram-na, comigo incluído. Ao entrarmos, nos deparamos com a mulher em cima de um palco. Um homem, mais jovem, estava ao seu lado. Ele levantou-se e disse:
-Sentem-se. Começaremos as apresentações e as boas-vindas.
Sem delongas, obedecemos. Os bancos eram feitos de madeira; incômodos e desconfortáveis.
-Chamem-me de Rafael, o diretor do acampamento. Esta é Sônia, uma das professoras. Não deixem a aparência enganá-los, ela é um pouco mais "experiente" do que nós. - Ele tentou fazer uma piada.
A mulher, vulgo Sônia, bateu na nuca do diretor, fazendo-o resmungar.
-Como sabem, passaremos seis meses aqui. O Sangue Mágico possui uma ótima proteção. Nada passa por aquela floresta, inclusive vocês. - Ele disse, sério.
Alguns murmúrios foram ouvidos, inclusive um dos meus.
-Bem, tendo isso em mente, só falta a divisão das equipes. Vocês serão divididos em duas equipes, oito em cada uma. - Ele pegou uma lista em seu palanque - André, Gabriel, Ryan, Luiz Otávio, José Miguel, Eliúde, João Pedro e Diego; primeira equipe.
Quando ele falaria a outra equipe, uma coruja voou em sua direção, carregando um papel em suas mãos. Rafael leu o que estava escrito e disse:
-Desculpem-me, mas terei que ausentar-me. Sônia, continue. - Ele pediu.
A mulher pegou a lista das equipes, enquanto o diretor sumia em chamas.
-Jean, João Victor, José Guilherme, Luan, Luís Eduardo, Matheus, Rian Freitas e Vinícius; segunda equipe.
Após sua última palavra, todos começaram a procurar por seus companheiros. Sônia revirou os olhos.
-Cabana da primeira equipe à esquerda e da segunda à direita. Vão para suas cabanas, vossas malas já vos esperam. - Terminando sua frase, ela sumiu em folhas, deixando-nos perdidos e cheios de perguntas.