História Aos Olhos da Noite - Prateleiras e Becos

Ela estava parada próxima a uma estante, apoiada no espaldar de uma cadeira, como qualquer estudante. Era estranho olhar pra ela. Quer dizer, quando você vê uma garota bonita, você repara nela. Mas assim… Repara, vê que ela é bonita, e pronto. Mas Carmilla não. Ela tinha algo… Uma coisa sedutora. Uma coisa, que mesmo a metros de distância te envolvia. Parecia haver sensualidade em cada gesto seu. Ela simplesmente estava em pé, com as costas apoiadas e as pernas cruzadas à sua frente, lia um livro com tamanha concentração, que não havia me notado. Não era uma cena anormal… Mas eu estava parada, absorvendo cada segundo daquela visão.Um brisa entrou pela janela semi aberta, e naquele instante Carmilla se virou. Ela me olhou por um momento, e voltou a atenção para o livro. Esperei alguma piada, mas nada. Ela continuou lendo. Depois do que me pareceram horas, ela começou a sorrir.

-Vai ficar me olhando por quanto tempo? - Ela me perguntou baixo, sorrindo divertida.

-Você tem algo diferente - Porcaria. Minha língua foi mais rápida que meu cérebro. Ela sorriu ainda olhando o livro.

-Diferente - Murmurou para si e me encarou. - E isso, na sua língua, quer dizer, “Gostosa de olhar”?

-Como é? - Eu corei.

-Nada. - Ela riu baixo e se desencostou da cadeira que estava. Respirou fundo e me encarou.

-Não queria atrapalhar sua leitura. - Ela fechou o livro sem o olhar, e caminhou até mim. Não sei exatamente o porque, mas tentei recuar, e acabei me encostando na estante. Ela se aproximou mais e pegou uma mecha do meu cabelo. Ela entrelaçou os dedos e se, como se ainda fosse possível, aproximou mais.    

-Vós, que sofreis porque amais, amai ainda mais. Morrer de amor é viver dele. - Ela sussurrou próxima a minha boca. Pude sentir o hálito dela. Tentei reagir, mas a proximidade dela me desnorteava. Ela roçou os lábios nos meus e deixou um selinho no canto de minha boca. Eu comecei a suar frio. Havia uma revolta no meu estômago, e um pouco abaixo dele. - Sabe cupcake… Você deveria ter medo de mim. Ser esperta e se afastar. Não agir feito um rato, e correr pra boca do gato - Aquilo me irritou, mas antes que pudesse dizer algo, ela já estava longe. - Tome cuidado com suas companhias, e seja esperta. Ah, e nada de andar por aqui quando escurecer - Ela deu uma piscadela, e saiu com o livro embaixo do braço.

Ok. Isso realmente aconteceu? Eu passei a mão na minha boca… Tá. Não foi meu primeiro beijo, mas eu sentia que foi o primeiro, de algum jeito. Eu suava frio e não conseguia me acalmar. Nunca fomos próximas. Nunca falamos mais do que alguns segundos, sem uma se irritar com a outra e sair batendo a porta. E agora… Ela faz isso. Danny iria me matar se soubesse. Oh, droga. Eu voltei para minha mesa, mas minha cabeça estava longe demais. Não consegui terminar meu trabalho. A boca dela… Me causava coisas no baixo ventre. Passei a maior parte do tempo, olhando para a folha em branco a minha frente.

Quando dei por mim… MERDA! Já estava escurecendo. Eu recolhi minhas coisas numa velocidade ímpar. Quando passei pelas mesas… Eu senti algo ruim. Uma presença. Um calafrio me fez sentir enjoo, e tudo que pude fazer, foi correr.

Eu levaria uma advertência, se alguém me pegasse correndo, mas era como se minha vida dependesse disso. Eu corri, sem olhar pra trás. Apenas corri, e eu sentia se aproximando. Querendo me alcançar. Ignorava a dor, ou o ar gelado entrando em meus pulmões. Corri o quanto pude para longe da biblioteca. Quando faltava apenas um espaço para chegar ao campus iluminado, eu diminui para tomar ar. Algo em minha mente gritava “CONTINUA”, mas eu precisava respirar. Estava perto da claridade. Uns sete metros ou menos. Decidi olhar para trás, senti um certo alívio, mas o desespero parecia crescer novamente. Me virei para correr, mas uma sombra cruzou a lateral do prédio e veio até mim. Meu corpo congelou.