História Às Cegas - Eu te conheço um pouco menos agora

Muita coisa acontece em períodos curtos de tempo. Por exemplo, em uma única noite, com pouco menos de oito horas de sono, Somin havia sonhado que ela era a principal líder de uma grande revolução inglesa, com direito a ter inventado o ônibus de dois andares.

Sim, era algo tão absurdo que Somin acordou rindo de si mesma, fazendo com que sua mãe sorrisse por ter uma filha tão feliz, a maioria dos adolescentes acorda amaldiçoando Deus e o mundo.

Mas sim, de volta para as coisas que aconteceram...

O sonho havia distraído Somin, por breves segundos, do celular que apitava uma nova mensagem no Kakao Talk.

Uma mensagem do King. Somin tentou não parecer tão ansiosa ao esticar-se na cama para alcançar o aparelho, os dedos nervosos se atrapalhando e quase deixando o celular cair ao tentar desbloquear a tela.

King: Bom dia Black Jocker.

Sim, eram poucas palavras, mas que faziam o seu coração flutuar. Somin batucou a unha contra a tela algumas vezes antes de se deixar afundar novamente nos lençóis soltando um suspiro frustrado.

No dia que sucedeu o seu “encontro” com King na biblioteca, Somin se encontrava completamente fora de órbita ao entrar na biblioteca, fazendo com que tivesse recebido questionamentos o dia inteiro sobre seu estado de saúde, principalmente dos professores.

Mas ela já deveria ter percebido que quando se tratava do King, sempre havia algo que ele poderia fazer e ela com certeza não estaria esperando, como pedir seu número de celular para cumprir sua promessa de falar mais com ela.

Somin não se orgulhava nem um pouco do grito que havia dado sem querer em plena área de estudos, recebendo um olhar fuzilante da bibliotecária, uma senhora tão silenciosa que quase sempre Somin esquecia a presença da mulher.

Com o coração aos pulos, ela escreveu seu número no pedaço de madeira descascado, torcendo para que sua letra trêmula não deixasse transparecer todo o seu nervoso.

Ela foi pra casa, e conforme o tempo passava, ela se sentia mais e mais ansiosa, e quando deu a hora do jantar, os olhos não mais tentavam se manter longe do celular, o que arrancou risinhos sugestivos de sua mãe.

-Namorado? –A mulher perguntou e Somin quase derrubou seu copo de suco ao esbarrar-lhe com a mão-.

-Não! –Disse em tom que não convenceu ninguém-. Bom, nada importante na verdade. –Resmungou e se encolheu na cadeira-.

-Amor, você sabe que pode conversar comigo, certo?

Somin apenas fez que sim com a cabeça e sorriu para a mãe, não é que ela quisesse de fato esconder que estava gostando de alguém, mas quando tentava colocar os sentimentos em palavras, se frustrava com o quão absurdo a situação poderia parecer aos olhos de outra pessoa.

Afinal, como dizer que havia se apaixonado por alguém sem saber o rosto dessa pessoa? Como dizer que havia recebido até mesmo um beijo na bochecha? Ou dizer que estava conversando já há um bom tempo com essa pessoa?

E tudo isso sem saber a aparência? Era desanimador pensar no tanto de coisa que teria que explicar.

Além disso, pareceria errado. Tudo aquilo pertencia a ela e ao King, nem mesmo Jiwoo ou Taehyung sabiam da coisa inteira. Somin sentia que contar em detalhes para alguém, mesmo que fosse sua mãe, quebraria toda a magia na qual ela se sentia inserida.

Foi com esses pensamentos que ela tomou banho, já bastante impaciente, eram quase dez horas da noite e nada de receber alguma mensagem do King.

Mas quando pegou o celular para conectar o carregador, o sorriso rasgou sua face ao ver a mensagem.

Eu sinto muito pela demora Black Jocker, passei o dia inteiro ocupado com algumas coisas.

A foto do contato era uma grande letra “K” em um fundo escuro. Somin deveria ter adivinhado, mas ela ainda tinha esperanças de ver o rosto do outro.

Desde esse dia ela passava horas a fio conversando com o King, mas era frustrante perceber que ao invés de saber mais sobre ele, agora ela sentia que o conhecia um pouco menos. King não falava tanto sobre si mesmo.

BJ: Eu tive um sonho essa noite.

King: Sobre o que?

BJ: Eu sonhei que era líder de uma grande revolução inglesa, e eu inventei os ônibus de dois andares.

King: (Vários emojis rindo).

BJ: Ah, qual é! Você tem que admitir que é um sonho muito legal!

King: Você é inacreditável, quando sinto que estou prestes, a saber, quase tudo sobre você, me surpreende.

Somin mordeu os lábios. Falar ou não?

Para ser honesta, não foram poucas as vezes que Somin pensou em falar dos seus sentimentos, desistindo sempre no último segundo, com medo de forçar aquela relação que parecia frágil aos seus olhos.

Mas agora era hora de mostrar sua não passividade, King havia lhe dado uma brecha de ouro, e não seria desperdiçada.

BJ: Talvez agora você entenda como eu me sinto sobre você então.

King: É mesmo?

BJ: Eu sinto que te conheço menos agora. É injusto que você não me deixe saber mais sobre você enquanto você tenta saber sobre mim.

King: Hum...

King: Diga-me Black Jocker, você quer me ver?

Uma batida de coração.

Duas.

Três.

BJ: Eu quero.

King: Então aguarde por mim, My Lady, e prometo que você vai descobrir muitas coisas sobre mim.

Na sala, a Senhora Jeon riu ao ouvir um grito da filha, provavelmente sendo abafado pelo travesseiro. Um barulho de chave na fechadura e ela sorriu com a figura do marido que adentrava a casa, lembrando-se de sua própria reação quando seu marido lhe chamou para sair pela primeira vez.

Ela apenas esperava que quem quer que tivesse o coração de sua filha, soubesse bem o que estava fazendo.

Somin foi para a escola com uma sensação de leveza inexplicável nos pés.