História Autoescola Fracassada - "Supetão"

Eu realmente estava surpresa com a sua presença inesperada ali. De todas as pessoas no mundo que eu imaginaria encontrar na minha faculdade, Yoongi seria a última delas. Assim como Nam, imaginei que ele também tivesse terminado...

Seus olhos se ascenderam rapidamente em surpresa, mas logo ele sorriu abertamente me olhando de cima a baixo.

- Jeon Agnes... - Seus olhos se voltaram para mim. - Também estou surpreso de te ver sem calças jeans.

Tentei não rir da sua piadinha mas não deu muito certo. Aproveitei para vê-lo sem as costumeiras roupas da Autoescola: O uniforme azul marinho e branco lhe dava mesmo um ar de "universitário rebelde". Tirando isso, eram os mesmos jeans e Converse preto de sempre. Nada estranho, a não ser o fato de ele estar ali.

- E eu por você estudar aqui. - Voltei a me encostar na parece e Yoongi fez o mesmo. Era bom ter alguém para conversar, já estava ficando entediante. - Foi transferido esse ano?

Ele negou com a cabeça e não pude deixar de notar um leve vermelhão em seu pescoço.

Um chupão para ser mais específica.

- Não... Estudo aqui a bastante tempo. - Ele viu que meus olhos estavam em sua "tatuagem" e tratou de escondê-lo com a gola dá camisa. Um sorriso maroto se abriu em seus lábios. - Sei que meu pescoço é lindo assim como todo o resto.

Corei, envergonhada por ter sido pega. Não sei porque mas a ideia de Yoongi agarrando alguém em becos escuros parecia muito surreal. Ele não aparentava ser esse tipo de cara!

E pelo visto eu estou bem enganada.

Pigarreei e o olhei com indiferença.

- Nossa... Também estudo aqui a muito tempo e nunca nos esbarramos.

Ele notou minha mudança rápida de assunto, mas não disse nada a respeito. Que bom! O que eu menos quero agora é investigar um chupão no pescoço de Min Yoongi.

- Deve ser porque eu pego o turno da noite e como você deve saber, muitos poucos alunos estudam nesse horário. - Ele não parava de olhar para todos os lados, como se procurasse alguém ou alguma coisa.

Engoli minha curiosidade de também olhar. Sinceramente, de todos os amigos estranhos que eu tenho (acho que nem meu amigo Yoongi é) ninguém supera ele. É aquele tipo de pessoa que você não se surpreenderia nem um pouco se falasse: "Ei! Sou chefe de uma máfia italiana que vende anabolizantes modificados geneticamente!".

O pensamento de Yoongi com um bigodinho típico da Itália me fez soltar uma risada baixa, o que atraiu sua atenção para mim.

- Tá rindo de que maluca? - Murmurou, mas também sorriu.

Era realmente fofo aquela gengiva rosada e os dentinhos pequenos. O sorriso mais doce que eu já vi. Não pude deixar de imaginar o quão lindo deve ter sido ele quando era criança...

- Nada que mereça sua preciosa atenção. - Disse irônica, o que alargou seu sorriso ainda mais.

Yoongi abriu a boca para dizer algo, provavelmente uma alfinetada, mas desistiu e balançou a cabeça em negação voltando a vasculhar a escola com os olhos.

Esse garoto conseguia testar todos os meus níveis de curiosidade. Eu o encarei por alguns minutos, na tentativa de encoraja-lo a me dizer o que quer que seja, mas o mesmo apenas me ignorou.

Suspirei. Era melhor ir olhar logo em que turma eu havia caído.

- Bom... Eu vou lá dentro ver minha turma. - Ele apenas assentiu e voltou a me encarar. Cheguei até a porta mas virei novamente para ele, sorrindo. - E se esbarrar em mim de novo daquele jeito, faço você ficar preto de tanta pancada.

- Igualmente. - Retrucou, mordendo os lábios numa careta fofa.

Revirei os olhos e adentrei a sala, internamente agradecida por aquele esbarrão.

Saber que Suga estaria ali na mesma escola que eu, me deixava animada... Seria muito abuso pedir para que pegássemos pelo menos o mesmo horário?

Para mim, Yoongi parecia um jogo divertido e complicado. E eu adorava quebra-cabeças.

Um pouco da minha tensão foi embora ao saber que graças ao bom Deus peguei a tarde, um horário ótimo para mim e meu trabalho. Por outro lado, vários dos meus colegas do ano passado pegaram o pior dos horários: Noite.

Quer dizer, não parecia ser tão ruim assim mas para uma pessoa sedentária como eu era horrível! Noites serviam para comer, dormir, assistir doramas e dormir de novo. Nada de estudo, não mesmo!

Apesar da confusão na sala que dava os resultados das turmas, logo a coisa se acalmou com a chegada da diretora Han Young Lee acompanhada de alguns seguranças que já faziam parte da nossa escola. Apesar de ter um rosto dócil e um pouco envelhecido e os cabelos sempre presos em um coque grisalho, diretora Han era temida e respeitada por onde quer que passasse. Sua amizade de longa data com minha mãe e meu esforço indiscutível, me renderam uma vaga nesta universidade.

Até pensei em tentar alguma vaga na SKY... Mas por ser nascida no Brasil as coisas não foram tão fáceis pra mim. Os olhares dos meus competidores eram claros: "Fique bem longe daqui, mestiça".

E sinceramente, eu não queria mais pesos e mais problemas. O importante é que estou seguindo meus sonhos: Me tornar uma das melhores advogadas da Coréia

Somos guiados para dentro do refeitório, já que a quadra é usada apenas para eventos especiais. Tento não me entediar com o discurso clichê que a diretora irá fazer. E sento ao lado de duas garotas que eu não faço a mínima ideia de quem seja. Queria que Tae estivesse aqui...

- Por favor, por favor, peço a atenção de vocês por um momento. - Disse a diretora do meio do refeitório, atraindo a atenção dos alunos falantes. Todos se calaram. - Muito obrigada.

As meninas (ambas asiáticas até o tutano, com longos cabelos negros e olhos finos) não fazem a mínima questão de puxar assunto e eu também não estou muito afim. Vasculho a multidão de uniformes a procura de alguma alma que eu conheça.

Involuntariamente, encontro Yoongi quase desaparecendo, numa mesa vazia no canto direito da sala. Apesar de tentar esconder com os cabelos, claramente vejo os fones negros sob seu rosto. Ele parece estar fazendo um enorme esforço para ficar acordado.

Sorrio, imaginando o porque de esse garoto estar quase sempre sonolento.

- ... Final do último mês. - Pisquei, ficando envergonhada ao perceber que a diretora já havia começado com o discurso. Eu e essa mania tosca de viajar em horas indevidas... - Ao longo do ano decidiremos se haverá uma festa ou algo do tipo. Mas a entrega dos diplomas será do modo tradicional e respeitoso de sempre.

Ouvi alguns murmúrios de reprovação, o que fez a diretora dar uma pausa. Os boatos sobre a formatura não eram o dos piores... Claro, se você não fosse escolhido como orador.

Outras histórias disseram que alguns alunos se sentiram tão pressionados a ponto de se suicidar. Eu já sabia que a educação era rígida, afinal passei praticamente minha vida toda aqui. Mas esses pensamentos me causavam calafrios...

- Qualquer informação, seja sobre a formatura deste ano ou sobre outra coisa, passem na minha sala ou conversem com os inspetores. Desde já agradeço a atenção de vocês e desejo um ano excelente e de muito sucesso. Se esforcem o máximo possível, afinal nada é impossível. Basta crer e dar tudo de si.

Uma salva de palmas ecoou por todo o refeitório, enquanto a diretora fazia uma breve reverência e se retirava do local. Depois de alguns minutos, todos igualmente foram se retirando procurando suas respectivas salas.

Suspirei. É... Oficialmente as aulas estavam de volta.

&

- Bom, por hoje é só. Para começar do jeito animado de sempre... - Professor Mark ajeitou seus óculos e abriu seu costumeiro "sorriso animador", que mostrava seus dentes levemente separados e brancos. Eu achava aquilo fofo. Coreano é uma das minhas matérias favoritas. - Leiam "O Exótico Mundo das Palavras", e me tragam uma revisão sobre ele até o fim de semana. Digam o que acharam das palavras mais estranhas!

O sinal tocou naquele exato momento, e apesar de amar aquela matéria eu não via a hora de chegar em casa. Suspirei derrotada ao lembrar que ainda tinha que dar uma passada no meu trabalho para acertar alguns documentos que definiriam minha carga horária, salário, e coisas chatas do tipo.

O corredor que atravessava um andar a outro dava uma linda vista do jardim lá embaixo. Vários alunos conversavam e caminhavam. Suspirei mais uma vez, tanto por não ter Taehyung na minha sala quanto por não ter conseguido fazer uma mínima amizade com os outros. Essa timidez acabava com todos e qualquer chance que eu tinha de fazer amizades. Não chegava a ser "nível Jungkook". Desço as escadas e começo a rir ao lembrar que quando tínhamos 8 anos ele tinha um estranho medo de meninas, e não falava com nenhuma a não ser eu. Isso não se estende até hoje, mas ele ainda tem dificuldades em conhecer novas pessoas.

Pelas palavras de Jane, ele não é nem um pouco tímido perto dela.

Meu celular treme no bolso da mochila, afastando meus pensamentos. Só depois de pega-lo percebo que se trata de uma ligação.

Número desconhecido... Tae já conseguiu meu número... Quem será?

Atendo e aceno para os porteiros, que sorriem educadamente.

- Alô? - Murmuro e mesmo que os carros atrapalhem um pouco, consigo ouvir uma respiração pesada do outro lado. Arregalo os olhos e paro assustada no meio da rua. Meu pai! O que é isso?! - Alô?! Meu Deus do céu, quem é?! Responde! Jungkook é você? Está tudo bem? Tae? Ai meu Deus, é você?

- Agnes! Ai caramba, até que enfim! - A voz explode do outro lado, me enchendo de mais pavor. Sinto meus olhos marejarem apesar de não fazer a mínima ideia de quem seja e do que está acontecendo. Antes que eu diga algo, a voz me corta e dessa vez reconheço. - É o Namjoon! Preciso muito da sua ajuda! Muito mesmo! E tem de ser agora!

Várias coisas ruins (entre elas um assalto em que ele é um refém) passam pela minha cabeça. Minhas mãos soam e não consigo parar de tremer.

- Namjoon, olha só: Não se mexe! Faça tudo que ele pedir e diga que eu tenho o dinheiro do resgate! A polícia está a caminho! - Abro minha mochila a procura do número da Polícia local. Onde está...

Mas uma gargalhada gostosa me faz parar imediatamente.

Parece um... Bebê.

Abro a boca incrédula, mas Namjoon me corta mais uma vez, desesperado:

- Você ouviu?! De vez em quando ele faz isso, mas algumas horas fica me encarando com uma cara que eu não sei explicar. Aí eu pergunto as coisas e ele não responde. - Namjoon suspirou e agora eu é que me segurava para não gargalhar, tanto de mim quanto de Nam. - Agnes, por favor... Venha pra minha casa. Agora. Eu não faço a mínima ideia de como cuidar de um bebê.

E, depois disso, ele simplesmente desligou na minha cara.

Por via das dúvidas comecei a gargalhar e tentar achar uma desculpa para dizer ao meu chefe.

Namjoon

Esse filhinho fofo de uma mãe coreana tomou o celular de mim.

O olhei incrédulo enquanto o mesmo terminava de apertar aleatoriamente no celular e o jogava no chão.

O barulho não foi muito legal. E eu não estava muito ansioso para saber o que tinha acontecido com a película que eu acabei de trocar.

Desviei meus olhos do celular para o bebê sentado ao meu lado no sofá. Se ele não fosse tão fofinho (e uma criança) alguma coisa naquela sala teria voado na cara dele.

Fala sério. Porque eu?!

- Você desligou na cara da Agnes. - Murmurei choroso, enquanto enterrava as mãos na cabeça. - O que eu faço com você, sobrinho do Tae?

O olhei suplicante, tentando convencê-lo a me dar algum mínimo sinal do que fazer. Como todas as outras vezes, ele balbuciou palavras estranhas, desceu do sofá e mexeu no meu celular.

Eu. Não. Nasci. Pra. Isso.

E definitivamente não estava nos meus planos ser babá hoje. Em nenhum dia na verdade! Eu não odeio crianças. Não mesmo. Só não sei lidar com elas.

Tentei lembrar de alguma coisa que Taehyung disse. "Dá essa mamadeira se ele chorar! Ele tem 2 anos e 7 meses! O nome dele é...".

E aí ele saiu correndo pela porta, me deixando sem nem saber como segurar o menino. Muito mole... Foi a primeira coisa que pensei enquanto o tinha em meus braços. E a segunda foi ligar desesperadamente para a Agnes.