• 02/10 •
Romeu e Julieta
Estávamos no Tom, eu sem dizer uma palavra, e ele tentando se concentrar em algo que não fosse aquele momento. Minha decisão estava feita, mesmo que eu quisesse não poderia aceitar o convite, somos amigos e isso não vai mudar, fim.
Melhor assim.
- John, me desculpe. Eu não vou aceitar! O baile vai ser legal, você deveria levar a Amber mesmo.
Ele ficou calado, só me encarando sem fala.
- Será melhor assim.- Falei me levantando, e saindo do carro.
Era estranho dizer e pensar aquilo, visto que quem causou essa confusão fui eu, eu que comecei isso, eu que pedi pra que ele fosse comigo, e foi eu quem negou quando ele aceitou.
- Espera. - Parei de pé, na porta. - Por que?
- Somos amigos, não quero que isso mude.- dei uma pausa.- Sobre a Amber, eu consideraria uma provocação se tivesse me dito que iria com ela ontem mais cedo, só que agora, não me importo mais. - Completei e saí.
Entrei na casa e me virei para dar tchau a ele, cometi um erro, ou talvez a melhor decisão da minha vida.
- Jay.- Ele estava de pé ao lado do carro.- Espera, um minuto.
Disse isso voltando para o carro. Em alguns segundos, comecei a ouvir a música, Angel.
- O que você está fazendo? Abaixa isso, são 2:30 da manhã! - disse gritando baixo.
- Só escuta, Ok?- Ele saiu do carro, e veio até mim. - Olha, você e eu somos amigos, sempre seremos, não é um baile que vai mudar isso. Se você realmente não quer vir comigo, eu aceito, mas não irei com a Amber porque não faria o menor sentido passar uma noite como essa sem você.
Fiquei em choque, era um sentimento recíproco, mas não seguro. Não tinha resposta, queria ir com ele, e não queria ao mesmo tempo. Complicado, minha paixão surgiu muito rápido, e a dele por mim já existia, cometi o erro de me apaixonar por ele agora, deveria ter o olhado dessa forma antes. Mas não seria certo insistir nesse "romance", amigos devem ser sempre amigos, quando envolvem mais do que apenas amizade na relação, se arrependem. E eu não queria perder o que já temos, é perfeito como está. Ou não.
- John, Ham.. olha, eu. - Estava tropeçando nas palavras.
- Calma, não quero força-la a vir comigo. Mesmo que seja o que parece, não quero te forçar a fazer nada, só não quero te ver mal por não ter feito algo que queria.
Ele me entendia sempre, em todos os momentos, mas algumas vezes falhava em paciência. Eu sei que não sou uma das pessoas mais decididas da vida, e sei que sou difícil em questões emocionais, mas não significa que não sinta, eu o amo, e o quero, mas não posso fazer isso sabendo que talvez me arrependa.
Estou olhando a situação com medo, e insegurança, sei que é errado mas depois de muito tempo me afundando em arrependimento, precisei mudar. E mudei.
- Jay, quer saber? Tudo bem, você sabe o que faz. Vou voltar pro carro, não tem sentido voltar pra casa agora, afinal vou ter que vir novamente te buscar. - Chegou mais perto, me abraçou e deu um beijo em minha testa.
Eu o agarrei, e beijei. Viver no talvez, é pior que o arrependimento, e ele merecia uma chance. Amber e Miranda, que se explodam elo rabo, não faz o menor sentido dar ouvidos a elas e não a John.
- Entra logo, acha mesmo que vou deixar você dormir aqui fora?
- Sabia que a música ia dar certo. E combina sabe? Você é o motivo que eu morro, Você é o motivo que eu dou quando eu não aguento e choro.
- Tá Romeu. Entra logo, e desliga o som meu pai está dormindo.
Antes de conseguir me responder, uma voz surgiu no escuro da casa.
- Boa noite, crianças. Estou atrapalhando?
- Claro que não. - Dissemos juntos.
Gelei a espinha, meu estômago embrulhou e eu não tinha pra onde correr, só enfrentar meu pai, que poderia ter escutado e visto tudo.
- Não se preocupem, se é pra ela namorar alguém prefiro que seja você! - disse sorrindo, feliz. - E por isso quero te pedir uma coisa, meu jovem.
- Pode falar, Sr. Gülliver. - John, com a voz trêmula, engolindo a seco.
- Cuide da minha filha Johnson, ela é tudo pra mim, e você foi mais presente na vida dela do que eu. Sei que ficará tudo bem, se ela estiver ao seu lado.
Fiquei sem palavras, isso soou como uma benção para o casamento. Ele viu demais, mas foi bom. John, assentiu com a cabeça e meu pai entrou como se nada houvesse, sorridente, desde a morte de minha mãe eu não via aquele sorriso, era o mesmo que ele fazia quando ela assava uma torta de amora, sua favorita. Uma vez tentei fazer, mas não deu certo, quase pus fogo em casa, ele não viu por estar trancado no escritório, mas tive de ficar o dia inteiro limpando a cozinha, que ainda está preta em algumas partes da madeira no teto.
~~~~~~~
Achamos um colchão velho, e o colocamos em meu quarto para que ele pudesse dormir, já que na sala não tinha espaço e minha casa não tem quarto de hóspedes.
- Veja só, o filho do prefeito dormindo no chão do meu quarto, no meio de pilhas de CDs e livros antigos. Estranho né?
- Só porque sou filho do homem de terno, não quer dizer que reclamaria de dormir no chão. Principalmente no seu quarto.
A última vez que ele dormiu aqui, foi no ano novo de 2014, estávamos juntos na festa da cidade e a casa dele estava cheia por conta disso, então saímos de lá e viemos para minha casa. Nesse dia ele dormiu no sofá da sala, agora não cabe mais.
- Falando nisso, você pensa em continuar o legado de seu pai? Tipo, virar um "Homem de Terno".
- Ser prefeito por aqui, não é nada. Gisabela tomou conta da cidade, como se fosse dela. Prefiro deixar Joel fazer isso, passarei essa bomba pra ele.
Joel, é o irmão mais velho de John. Eles dois se dão muito bem, embora ele more em Londres. Provavelmente nem sabe quem é Gisabela, e isso da chances para que John consiga convence-lo a assumir, mesmo que isso só vá acontecer daqui a 4 ou 5 anos.
- Quero sair daqui, esse lugar parece um buraco. Tipo, o fundo dele.
Quando ele disse as palavras, demorou a cair a ficha. Era como se meu sonho estivesse voltando pra mim. Fiquei tonta no mesmo minuto, ele ainda estava falando.
- Eu queria que o Morgan assumisse, ele sim daria um bom prefeito, afinal a cidade é dele, né. Não acha?
Sentei na cama, tentando me manter concentrada no que ele estava dizendo. Acredito que tenha funcionado, pelo menos ele não pareceu perceber.
- Sim. - Disse ainda meio desnorteada.
- Enfim, só não quero assumir esse cargo. Sabe, eu estive pensando. Sei que ainda falta muito, mas procurei algumas faculdades, e Washington me parece bom.
Me dei conta de que ainda não tinha pensado nisso, na verdade assim como ele eu so quero sair daqui, mas pra onde ir, isso eu nunca pensei.
- Pode ser uma boa ideia. Mas prefiro deixar isso pro futuro, estou meio perdida nesse assunto.
- Tem razão, Boa noite! - Disse se reencostando no travesseiro.
- Boa noite, John.
~~~~~~~~~~~~
Acordei com barulhos vindo da cozinha, era John tentando não incinerar os ovos.
Desci as escadas e me deparei com a zona que ele havia feito. Enquanto ele tentava salvar o bacon que tinha caído na pia, eu estava limpando a bancada que estava cheia de panquecas cruas.
- Você é péssimo nisso.
- Achei que estava fazendo certo, mas queimei os ovos, os bacons deram certo, mas acho que queimei as beiradas. - Ele deu uma pausa, por finalmente ter tirado o bacon do ralo. - Ah, queimei sua panela, mas juro que compro uma nova. Falando nisso, fiz torradas.
Fiquei boquiaberta com o fato de ter conseguido fazer torradas, mas era de se esperar que soubesse usar uma torradeira, ela liga na tomada. A panela estava destruída, gostaria de entender como ele fez aquilo, mas preferi não perguntar, apenas a joguei pela janela.
- Limpa tudo, eu faço alguma coisa comestível com o que sobrou de panelas limpas.
Ele assentiu e fez o pedido.
- Onde está meu pai? Não vai aparecer pra comer?
- Pois é, acho que ele ja foi.
Parei no mesmo momento. Ele tinha ido sem ao menos me dar um abraço, eu passaria quase um ano longe dele, e mesmo assim não ganhei nem sequer um abraço. Tudo bem, talvez ele não quisesse me ver triste, sabe que odeio despedidas, pelo menos sabia alguma coisa sobre mim.
- Ah.. Ok. Ele disse alguma coisa?
- Só disse que mandaria notícias.
Notícias. Espero que mande mesmo, me consentrei no que estava fazendo.
As panquecas e os ovos ficaram prontos bem rápido, mas o bacon tinha acabado, teria de comer os que John fez, não pareciam tão queimados.
- Vou ao mercado depois do colégio.
- Quer carona? - disse com sabão no cabelo.
- Sim, falando nisso, quero que me ensine a dirigir. Meu pai, deixou o carro antigo dele na garagem e acho que poderia dirigi-lo.
Embora ele dirija como um louco, é a única pessoa que tenho para me ensinar. E não deve ser tão difícil, é só ter controle.
- Claro. - parou colocando os dois pratos na mesa que tinha arrumado. - Merda, olha a minha franja, tá dura feito pedra.
Não dava para olhar a cena e não rir. Eu já estava colocando as panquecas e ovos nos pratos, quando ele simplesmente saiu correndo pra arrumar o cabelo.
- Não precisa disso tudo, é so uma franja. - Gritei pra que ele pudesse me ouvir do banheiro de baixo.
- Não é apenas uma franja, é a minha franja e quero ela linda e normal.
Em poucos minutos ele voltou, arrumado e faminto. Comeu tudo muito rápido e bebeu meia garrafa de coca.
- Não vai se vestir?
- Sim, é claro. - disse me levantando de pressa, ja estava atrasada.
Assim que acabei o banho, corri para me arrumar. E percebi que além de tentar fazer o café, arrumou a cama, e minhas pilhas de Cds e livros. Talvez te-lo aqui, não fosse tão ruim.
- Rápida. - disse irônico.
- Ao menos tentei, vamos?
Ele se virou e deu uma olhada em como eu estava. Passou os olhos em meu jeans rasgado, minha camiseta surrada do Slipknot e o velho All Star preto, quase a mesma roupa de sempre a única diferença era a blusa, e minha jaqueta hoje não era a preta comum, era minha jaqueta vermelha que tinha ganhado de presente no natal, minha avó podia ter um péssimo gosto para carros, mas sabia comprar roupas.
- Gostou?
- Não, mas Asher vai adorar com certeza.
- Esquece o Ash, seu idiota! - disse dando um empurrãozinho em seu ombro, rindo.
- Está linda, como sempre. Vamos logo. - disse sorrindo de volta.
Moro na rua Chars Denil, fica a 7 quadras do colégio e 5 da esquina do Mike&Mark, mas para dias como este - atrasados- pegavamos a estrada 27 e contornavamos o Lago, como um atalho. Sempre que passava por ali, pensava em como seria atravessar a estrada e ir direto para a pista 99, em direção a outra cidade que não fosse Gilles. Mas infelizmente essa cidade, prende todos nós, como um cativeiro grande.
A cidade em si não é tão ruim, mas é pequena e cheia de gente com a mente tão minúscula quanto. Viver aqui é como viver em um aquário, só que sem a parte de ver através do vidro.
- Escute essa música, é a minha primeira com a banda.
Assim que ele pôs o CD, meus ouvidos gritaram por socorro. A voz dele era ótima, o problema eram os amigos tentando tocar seus instrumentos, acho que nenhum deles sabia o que estava fazendo. Se soubessem teriam parado, era péssimo, tão ruim que ao acabar eu não sabia se dizia obrigada, ou chorava.
- Ótima. Mas seus amigos sabem que precisam tocar né? Tipo, bem.
- Não gostou né?
- Sinceramente, por que não segue carreira solo?
- Posso considerar, mas no momento vou tentar ensinar algumas coisinhas para meus colegas de banda. Acho que posso começar com um show.
- Show, já?
- Não meu, de uma outra banda. - ele deu uma pausa, com um sorrisinho de canto que me deixou nervosa. - Olha no embrulho vermelho.
Era o mesmo embrulho de ontem à noite, fiquei com medo de ver o que havia dentro. Mas enfrentei, e abri. Eram ingressos para o show do Aerosmith.
- Como conseguiu?
- Sou filho do Homem de Terno, esqueceu? - disse dando uma pausa sorrindo - eles vão vir pra cá no ano novo. Meu pai, conseguiu ingressos para nós dois, ele sabe o quanto você gosta deles. Mas não deixe Gisabela saber disso, ela acha que rock é coisa do demônio, e se souber vai mandar cancelar. Precisamos vender alguns ingressos, antes que ela tenha um ataque, se conseguir vender no mínimo 30 desses, não adianta chorar, o show continua.
Não tinha como reagir a tal feito, estava anestesiada pela felicidade daquele momento.
- Obri.. Obrigada. John, isso é incrível. - Disse tropeçando nas palavras e gritando por dentro.
- Somos amigos, isso que fazemos.
Ele disse as palavras com leveza, parecia não ligar pro fato de que éramos apenas amigos. Não podia estragar o momento, então deixei pra lá, guardei o ingresso na bolsa e me voltei para a estrada. E é claro, tive meu momento de fofura e o abracei muto forte, quase saímos da estrada e caímos no lago, mas foi apenas QUASE.
Pouco tempo depois, chegamos ao colégio. Hoje, nós dois ficaríamos na mesma sala, com o trio do horror: Miranda, Asher e Amber. Aula de História, professor Agenor. A um verão atrás, esse seria o melhor dia da semana, mas agora tudo mudou, meu pai está longe, meu melhor amigo se tornou minha quedinha, minha quedinha virou uma piada e bom, minhas inimigas continuam sendo minhas inimigas, só que agora elas tinham motivos reais para falar de mim, o quanto quiserem.
Entrei, e três cadeira atras na fileira do meio, estava eu. Ao lado de John que não parava de escrever nem por um segundo, e na frente de Cassie Grand, uma aluna turista, nunca aparece, só quando tem algum trabalho ou tem de entregar os uniformes de torcida.
- Outra música?
- Um poema. Vi que você tem um caderno cheio desses, achei uma boa ideia, vai que sai uma ideia para novas músicas?
- Leu meus poemas?
- São seus? Me desculpe, são tão bons que pensei serem copiados de autores famosos.
- Sim, são meus. Não acredito que os leu.
- Calma, são ótimos! Quando começou?
A um ano quando comecei a ter pesadelos e não conseguir ficar em casa depois deles. Comprei o caderno em uma feira de verão em 2014 e deixei de canto até ano passado quando tive a segunda noite de insônia por conta do mesmo pesadelo.
Meus pesadelos estão presentes na minha vida desde muito nova, na verdade eu até conversava com uma mulher neles. Ela não tinha nome, então eu a chamava de Pesadelo. Lembrava de todos, não como lembro do que tenho a quase 2 anos, mas me lembro bastante. E não poderia explicar a ele como isso é possível, ou porque os tenho.
- Tinha desenhos nele também, você é boa nisso. Vi que tem uma obsessão por buracos e lugares com grama e essas coisas, sabe daria um bom livro.
- Não quero que mexa nos meus cadernos, Ok? Deixa isso pra lá, são apenas rabiscos e idéias que vem e vão a todo momento.
- Tá, tá! Calma, juro que não faço mais.- disse com as mãos pra cima - Só que são tão bons, não pude parar no primeiro. Me desculpe!
Revirei os olhos. Não podia ficar brava por um elogio, ou com a curiosidade dele. Não tem nada de mais lá, apenas coisas da minha cabeça, nada que alguém possa se surpreender, até porque eu sou meio viajada as vezes.
- Turma, hoje falaremos sobre o livro que mandei lerem durante o verão. Romeu e Julieta. Alguém ja acabou, ou gostaria de falar algo?
Amber levantou a mão.
- Eu acho, que esse livro não deveria ser recomendado pelo senhor, afinal foi proibido.
- É, minha mãe não gostou nada disso. - disse Miranda se metendo.
- É um ótimo livro, sua mãe que não consegue fazer alguma coisa sem que Gisabela aprove.- falei.
Sr. Agenor riu, ele sabia que eu tinha razão e concordava, mas dizer isso para Miranda seria como tentar domar um leão, dizendo para ficar na jaula. Não daria certo.
- Srta. Rose, por favor queira de comportar. E vocês duas Scholer e Vanner, eu tenho permissão para recomendar o livro. A reclamação da mãe das duas ou de Gisabela, não mudará nada. Leiam o livro, se quiserem pontos, se não sinto muito mas irão repetir o ano.
- Esse livro combina muito com uma pessoa que eu conheço. Julieta não se da ao respeito como Jaded, e Romeu não sabe se por em seu devido lugar como Johnson. - Disse Miranda, apontando e rindo com Janet Rosevelt e o resto da classe.
Meu sangue ferveu, não poderia deixar assim calmo e sem uma resposta.
E foi aí que aconteceu.
-------------------------------------------
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.