Capítulo 3
O jeito como eles me olhavam, era como eu me sentia: um vagabundo, sujo e ladrão. É o jeito como esse apartamento que eu não posso pagar está, é o que minha mente grita toda vez que minha barriga ronca. As pessoas me olham, e eu sinto esperança enquanto elas preenchem uma ficha e ajeitam os óculos, eu sempre acredito em suas promessas falsas de emprego. E hoje, eu estava tão faminto.
Fazem três meses desde que estive desempregado, e no começo sonhador, tudo iria se ajeitar. Porém, eu olho o chão tão fétido, as contas que se acumulam e os armários vazios. Eu digo ao meu amigo, que está tudo bem, e que em breve estarei empregado, mas hoje eu roubei para comer. Minha cabeça estava tão turbulenta, imersa em pensamentos ruins, que eu mal pude entender o que estava acontecendo, quando aquele garoto me segurou, e me olhou nos olhos.
A expressão assustada da menina que eu quase roubei se projeta em minha mente, e me culpo por tê-la feito medo. Minhas mãos naquela bolsa lilás, e um fiapo de alegria ao pensar que poderia me alimentar depois daquilo. O que eu me tornei? Como uma pessoa desce a algo tão baixo? Isto é, amedrontador.
Ele está aqui novamente, batendo tão forte em minha porta e gritando meu nome com bravura. E eu me levanto, como se fosse desmaiar a qualquer momento, e tudo se abafa, quando eu caio no chão.
QUANDO acordo, uma carta feita a mão — diz que eu devo pagar todo o aluguel até o final deste mês — foi jogada para dentro. O desespero corre como um cavalo de corrida, percorrendo meu corpo tão rápido, quanto inquietante. O relógio marca a hora em que devo me arrumar para a faculdade, então tão rápido quanto me atingiu, a notícia tem que esperar. Banho, roupas limpas, e ir a pé para a faculdade. Isto é a rotina de um calouro completamente ferrado.
Depois do que pareceram anos, estava frente a todos os mauricinhos da capital, reunidos em uma instituição que os aprovaria baseado no quanto cabia em seus bolsos fundos. Peguei a mochila, ajeitei as mechas desbotadas com um castanho que sucede a verde limão, e finalmente adentrei a sala, rumando as ultimas cadeiras. Dois dias sem absolutamente nada em meu estômago, além de dor. E ainda sim, com uma expressão igual as outras.
Todos meus pelos eriçam, e me sinto estremecer, quando o garoto do dia anterior, entra na sala, completamente sério e senta-se, ao meu lado. Sem olhar para os lados, se distrai com seu celular, e tira alguns livros de sua mochila. Desleixado, se conforta na cadeira e fecha os olhos.
— Oi. — seu tom de voz é grave e forte.
— Oi. — engulo em seco.
— Carpe Diem, e cicatriz na mão. — afirmou. — É uma mistura interessante, não é?— indagou sem abrir os olhos.
— Não sei do que está falando. — concluí.
— Não quer que eu diga em voz alta, quer?
— Irá me denunciar?— questionei, escondendo aflição. — Se for, faça logo.
— Não. — abriu seus olhos. — Mas você vai ter que, bom, almoçar comigo hoje. — condicionou.
O que?
FINALMENTE o horário de almoço chegou, e meu colega ameaçador, obrigou-me a segui-lo pelos corredores, até um restaurante próximo. Minha barriga roncou, quando pensei em fugir e me mantive implacável enquanto ele me direcionava a alguma mesa. O que ele planejava? Me chantagear? Eu não tinha uma moeda sequer. E bom, eu não sou gay, então fechar os olhos e imaginar-me atrás das grades, beirava ainda mais a realidade.
— Não. — negou, me analisando. — Eu não sou gay.— completou.
— Por que eu estou aqui? — questionei, direto e sério.
— Porque está com fome, e porque ontem, não queria estar fazendo aquilo. — afirmou. — Eu acho.
— Como sabe disso? — me ajeitei na cadeira.
— Um ladrão não chora daquele jeito, ou tem olhos tão primitivos. E qual é? Na luz do dia, com a chance tão próxima de ser pego, ou você precisava muito, ou era um completo idiota. — disse.
— Mesmo assim, como saberia disso? — não me convenci. — E porque está me trazendo em um restaurante? Você ao menos me conhece. — instiguei.
— Porque eu irei te ajudar, então faça menos perguntas, e aceite. — disse. — Não quero ameaçar você pra melhorar a sua vida.
— Por que?
— Vamos começar com o motivo de você ter que estar ali, naquele momento. — olhou o menu. — Me conte.
— Por que eu faria isso? — me irritei. — Eu vou embora. — fiz menção de levantar-me.
— Não há muitas bolsas lilás por agora. — sua mão em meu pulso me fez pausar. — Sente-se, e me conte logo.
— Eu nem sei o seu nome.
— Kim Taehyung, agora me conte, e escolha seu prato. — continuou analisando o menu, com uma falta de interesse aparente.
— Estou desempregado, prestes a ser despejado e não comia nada faz dois dias. — resumi. — Agora, posso ir?
— E se eu pudesse arranjar emprego pra você? Aceitaria? — perguntou.
— Por que você quer tanto me ajudar?
— Olha, não faça tantas perguntas, só aceite minha ajuda, ok? Eu não costumo ser altruísta, então você é uma excessão nisso, você não precisa mais fazer o mesmo que ontem. — me encarou. — Não precisa ser aquele garoto, e se culpar por ser ele.
— Vai realmente me ajudar? Sem promessas falsas? — toquei o menu.
— Sim, bom, eu não sei seu nome. — coçou a nuca. — Pode me dizer?
— Min Yoongi. — abri o cardápio. — Posso escolher qualquer um?— questionei, ele não parecia um mauricinho.
Porém talvez fosse alguém com peso demais na consciência, e precisasse de limpar ajudando a mim. E eu não quero ser um brinquedo para algum menino rico ajudar e se sentir a Angelina Jolie por um dia.
— Escolha, e bem, aquele é meu amigo. — um garoto chegou e se sentou, me encarando. — Jungguk, esse é Yoongi, e Yoongi, esse é o Jungguk.
O garoto ficou vermelho.
VOLTEI para casa, relendo aquela carta várias vezes. Não seria nada agradável acabar parando na rua, muito menos, voltar para os meus pais e dizer que eles estavam certos e que me renderia aos seus planos para o meu futuro.
E não, isso não é orgulho, é a minha vida, que deve ser decidida apenas por mim.
Refletindo dentro do carro luxuoso de Jeon Jungguk, me propus a entender o contraste de personalidade entre as três pessoas dentro do carro. Quem era quem naquela história? E quem eu deveria estar sendo ali? Quem poderia ser, caso fosse ajudado?
E qual dessas opções, era a melhor.
Por fim, lendo mais uma vez, decidi que a rua não era boa, tampouco a casa dos meus pais, então, eu me permitiria olhar Kim Taehyung com outros olhos.
Fechei meus olhos, e o cheiro ruim do apartamento me incomodou, então pelo resto do dia, fiz alguns deveres da faculdade — torcendo para que a luz não fosse cortada — e limpei o apartamento, usando minhas forças obtidas no almoço.
Olhei o balcão, e o saco de comida para viagem que ele me entregou. Talvez ele não seja tão mau.

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