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História Baile de Máscaras - Dez


Escrita por: _naomiq

Notas do Autor


ai como eu adorei escrever esse capítulo

Capítulo 11 - Dez


 

Abrir meus olhos nunca fora tão difícil. Parte porque eu chorei durante toda a madrugada, e outra parte porque eu sabia o que me esperava naquele dia. A lanchonete estava fechada e eu não teria de ir trabalhar, porém estava de pé antes mesmo de o relógio marcar sete horas da manhã. 

Os papéis rabiscados estavam por toda parte quando encostei meus pés descalços no piso laminado. Assim que cheguei em casa na noite anterior, vasculhei em todas as minhas gavetas atrás de um caderno em branco e desenhei como se minha vida dependesse daquilo. Desenhei Hera, minha mãe, Jihyo e o casal que aparecia em meus pesadelos, sempre com os olhos marejados. Depois de um tempo, Baekhyun continuou surgindo em cada linha que marcava o papel, ainda que contra a minha vontade. Seus traços misturavam-se às lágrimas que despencavam de meu rosto, e eu nunca me senti tão patética. Não era aquilo que eu queria? Vê-lo ir embora, deixando para trás uma dor que eu teria de sentir sozinha. Eu sempre pensava que seria abandonada, mas nunca achei que com ele seria tão pungente.

Talvez eu realmente desejasse nossa separação. Separações estavam dentro da minha zona de conforto - eu sabia lidar com elas. Mas o amor? Ah, o amor era difícil demais. Uma vez dentro de nossos corações, é necessário muito tempo até que ele nos deixe. Amar Byun Baekhyun era ainda pior. Eu nunca tinha visto tamanha profundidade em uma só pessoa. Humilde, altruísta, sensual e lascivo, todos adjetivos que o caracterizariam perfeitamente. O frio e o quente personificados em uma das pessoas mais belas que já cruzaram o meu caminho. Ele era, sem dúvidas, minha salvação e minha condenação.

Enquanto dirigia no centro da cidade naquela tarde, acelerando e reduzindo quando via um possível presente para minha progenitora, Chanyeol e Jongin falavam sem parar em como eu e Jihyo deveríamos voltar às corridas.

— Por que eu convidei vocês para vir comigo? - Perguntei sem um destinatário certo, ouvindo uma buzina entrar em meus ouvidos quando freei bruscamente em frente à uma joalheria com relógios dourados na vitrine.

— Você nos convidou porque somos seus amigos, e como seus amigos, não podemos deixar que você dê uma toalha de banho de presente para sua mãe novamente - respondeu Chanyeol, debruçado entre os bancos dianteiros, fazendo tanto eu quanto o loiro ao meu lado sorrirmos.

— Mas e o Baekhyun? Por que ele não veio conosco? - Disse Jongin, e por um momento eu senti meu peito se contrair. Nos últimos meses, eu e meu ex namorado havíamos ficado muito próximos. Querendo ou não, nós nos conhecíamos muito bem e parecíamos à vontade para falar de diversos assuntos, incluindo Byun Baekhyun e a nova namorada do loiro, que nunca dera às caras em lugar algum.

Respirei algumas vezes, recobrando meus sentidos e vestindo o melhor sorriso que pude encontrar naquela hora.

— Não vamos falar nele hoje - respondi, virando-me de lado e visualizando os rostos de Chanyeol e de Jongin antes de prosseguir. - Eu tenho estado tão afastada de todos. Hoje eu quero que nós fiquemos alegres, tudo bem? Vamos comer algo bom, comprar alguma roupa bonita e esquecer os nossos problemas!

Minha animação causou, a princípio, um estranhamento em ambos, mas eles não demoraram a entrar na onda e se animarem com a ideia de passarmos uma tarde inteira juntos.

— E quanto à sua mãe? Você não vai vê-la? - O loiro perguntou, atraindo as atenções para mim, que esperavam uma resposta.

— Vou, mas só durante a noite. Mamãe deve estar na casa da minha avó agora. Ela tem passado muito tempo lá desde que Jihyo se mudou.

Com maneios singelos de cabeça, o carro foi estacionado no subterrâneo do shopping e nós descemos, sentindo a umidade claustrofóbica encontrar nossas peles. O Porsche, que tinha sido completamente restaurado há menos de uma semana, teve suas portas trancadas assim que pressionei o comando na chave. Vê-lo daquele jeito, tão limpo e renovado, fazia a corredora dentro de mim dar pulos de felicidade e ansiedade. Ansiedade para voltar às ruas.

— Okay, então... O que nós fazemos primeiro?

 

xxxx

 

— Você parece uma uva passa com esse vestido. Tira isso, por favor!

Já fazia mais de trinta minutos que eu entrava e saía do provador daquela loja, e aquilo só estava servindo para fazer nós três rirmos até perdermos o fôlego. Chanyeol fazia piadas sobre meu péssimo senso de moda, Jongin tentava transparecer seriedade - não conseguindo - e eu acabava desistindo e voltando ao provador às gargalhadas. 

Arrumando o último vestido que me fora escolhido, olhei-me no espelho e me senti verdadeiramente bonita. Ele era simples, mas inegavelmente belo. O tecido preto caía livre desde a cintura até um pouco acima dos joelhos. Suas mangas, curtas como uma regata, eram de uma renda minimamente desenhada que preenchia todo o espaço até o elástico que demarcava a silhueta. Imaginei-me ao lado de Baekhyun, trajado em um smoking preto e uma gravata, e senti cada pelo de meu corpo se arrepiar.

— Deixa de ser idiota! - Esbravejei, balançando com força a cabeça e deixando de lado qualquer pensamento sobre o moreno. 
Marchei para fora do lugar, chamando, com um pigarro, a atenção dos dois garotos que conversavam.

— E-Então, muito feio? - Perguntei assim que seus olhos pousaram em mim.

Fui analisada dos pés à cabeça mais de uma vez, ficando mais nervosa ainda. Os mais altos revezavam seu olhar entre meu corpo e eles mesmos, abrindo os lábios como se tivessem algo para falar, e logo depois os fechando novamente.

— Mia, você está... Uau! - Suspirou Chanyeol, vindo até mim e segurando minha mão, rodando-me de maneira que o tecido rodasse junto. 

— Desse jeito você vai me deixar com a auto estima na estratosfera - sorri, brincando com o rodado do vestido.

— Ficou lindo em você, de verdade - disse a voz do loiro, juntando-se a nós com um sorriso.

— Obrigada pessoal, não sei o que seria de mim sem-

Antes que eu terminasse de falar, a porta da loja foi aberta e dois homens de estaturas visivelmente diferentes entraram.

— Kyungsoo? - Dissemos em uníssono, os três com uma expressão surpresa no rosto.

— Oi, pessoal... Oi, Jongin - respondeu, a última parte mais baixa e mais acanhada.

Acho que fui a única a notar o desconforto que pairava entre os dois. Jongin vez ou outra encarava o mais baixo, que desviava o olhar ou abaixava a cabeça. Aquilo estava muito estranho, mas decidi não perguntar nada.

— E então, o que vocês vieram fazer aqui? - O avermelhado indagou, tanto para Kyungsoo quanto para o rapaz alto e esguio que o acompanhava.

— Eu e meu irmão estávamos apenas dando uma olhada, mas já vamos embora.

— Se quiserem, podem tomar café conosco. Mia dá uma carona para vocês e-

— Não precisa - o menor interrompeu Chanyeol, trocando as sacolas de mão. - Nós temos mesmo que ir embora, mas obrigado.

Com um sorriso fraco, Kyungsoo acenou em nossa direção enquanto virava as costas e deixava o lugar.

— Que coisa estranha... - disse o mais alto, estreitando os olhos. - Bom, voltando ao assunto: Mia, você tem que comprar esse vestido! Ele ficou maravilhoso e...

Não sei ao certo o que Chanyeol disse depois daquilo, pois minha atenção estava completamente voltada a Jongin, que, com os olhos nublados e inertes, ainda encarava o vidro que alguns segundos atrás se abrira para que o pequeno de lábios carnudos pudesse sair.

 

xxxx

 

Pisei de leve no freio, estacionando na frente da casa de Jongin, assim como fiz com Chanyeol alguns minutos antes. O céu já denunciava a noite, e as luzes em frente à sua casa estavam acesas. A casa que costumávamos ficar nos finais de semana como aquele. Sorri ao perceber que nossa relação não havia sido de toda ruim.

— Obrigado por hoje. Mesmo triste, você fez de tudo para abrir um sorriso e não nos preocupar - disse, abrindo a porta do carro e deixando a brisa noturna entrar.

— Como você sabe? - Perguntei, fazendo-o rir com minha expressão surpresa.

— Eu te conheço como ninguém, esqueceu? Sei quando tem algo te incomodando - suspirou. - É o Baekhyun? Vocês brigaram?

"Sim, brigamos. Ou será que terminamos?" Eu não sabia. "Estamos sempre brigando, já que eu sou cabeça dura demais para ceder."

— Não, nós estamos bem - menti, mirando qualquer coisa que não fosse os olhos do garoto. - Obrigada por se preocupar, de qualquer jeito.

Senti-o me analisando, estudando cada parte do meu rosto mentiroso.

— As coisas não têm que ser assim, Mia - falou, me surpreendendo. - Você não precisa ficar presa dentro de si mesma pra sempre, vivendo e esperando o momento em que as pessoas vão te abandonar, para então colocar toda a culpa no seu medo. 

— O que você está dizendo?

— Ah, Mia, você sabe que é verdade. Você sempre foi assim, e me dói ter que dizer isso, mas eu fui incapaz de perceber enquanto nós namorávamos. Nós não demos certo, mas eu não posso deixar que o que você tem com ele acabe do mesmo jeito - segurando minhas mãos, Jongin prosseguiu. - Abra seu coração, pelo menos uma vez. O amor que ele tem por você é quase palpável, assim como você por ele, então por que se privar disso? Deixe que as coisas aconteçam, e se um dia o amor acabar - o que eu acho bem improvável -, você tem família e amigos com quem pode contar.

Ainda boquiaberta, fui envolta por seus braços em um abraço apertado e duradouro. 

— Viva, Mia, é tudo que eu te peço - sussurrou, ajeitando as sacolas nas mãos e fechando a porta do carro com um baque surdo.

Enquanto via-o subindo desajeitadamente as escadas até o portão principal, girei a chave na ignição e permiti que, depois de tanto tempo, o ar enchesse meus pulmões novamente.

 

xxxx

 

Jogando o sobretudo preto sobre meus ombros, afaguei uma última vez a cabeça de Hera e fechei a porta atrás de mim. Estava usando o vestido preto que comprara mais cedo, e em minhas mãos balançava a sacola que abrigava o pequeno relógio de ouro que seria entregue à minha mãe. Meus saltos faziam eco no grande corredor que levava ao elevador. 

Já dentro do carro, fiz a baliza no estacionamento e acelerei até finalmente chegar à rua. Estava escuro; passava das dez da noite. Eu não sabia se minha mãe ficaria feliz em me ver, ou surpresa - só sabia que precisava vê-la. Baekhyun não ligara nem uma única vez, então eu concluí que ele não voltaria para casa de novo. Já estava sentindo o frio que faria sem seu corpo ao meu lado na cama.

As ruas não estavam muito movimentadas, então não demorei a chegar na singela casa de janelas brancas. Assim que estacionei, alguns metros antes, envolvi a Taurus 44 que estava no porta luvas e ajeitei-a no bolso interno do sobretudo. Parece loucura, mas eu não me sentia segura sem senti-la contra minha pele.

Com o presente em mãos, tranquei o Porsche e fui até a calçada, do outro lado da rua. O único ruído que ressoava naquela rua deserta era o de meus sapatos contra o cimento. O céu também estava negro, quase livre de nuvens, e a imagem da grande lua cheia no horizonte era tranquilizadora.

Parada em frente ao pequeno portão, chequei uma última vez o celular em meu bolso. Nenhuma mensagem de Baekhyun. Suspirei, guardando o aparelho e subindo as escadas até a porta de entrada.

Toquei a campainha. Os segundos passaram, e não havia nem um sinal de vida. Inclinei-me para trás, tendo a vista de todas as janelas da frente. Tentei empurrá-las, sem sucesso. As luzes também estavam todas apagadas. Será que ela já estava dormindo? Não, mamãe tinha sono leve, teria acordado só com o barulho dos saltos na escada. Será que a campainha estava com defeito?

Insistindo, apertei novamente o botão, dessa vez com a orelha colada à porta. Lá dentro, o barulho agudo surgiu. 

— Que estranho - sussurrei ao relento, girando a maçaneta da porta que, surpreendentemente, estava aberta.

Abri-a devagar, ainda em choque com a situação. Minha mãe nunca fora tão descuidada a ponto de esquecer a porta da frente destrancada. 

— Mamãe? - Chamei, ouvindo minha voz entrar em cada um dos cômodos e retornar sem resposta.

O breu tomava cada pedaço da casa, e eu senti meu coração disparar ao mínimo balanço das folhas das árvores no jardim. Parecia o cenário perfeito para um terror sobrenatural. Meus pés me equilibraram, um após o outro, até que o relógio em minhas mãos fosse colocado na mesa mais próxima e desse lugar à Taurus, mais gelada que nunca. Com a mão esquerda livre, tateei a parede ao lado da entrada e pressionei o interruptor, deixando que a luz invadisse meus olhos e me cegasse por alguns instantes.

Quando já estava acostumada ao brilho repentino, retirei a mão que me protegia da frente do rosto e varri o local com os olhos. Tudo estava em seu devido lugar. O sofá castanho, a televisão de tela plana, o relógio de madeira na parede. 

— Mamãe, você está aqui? - Tentei, mais uma vez, mas como de costume, não obtive resposta.

Deixando que meus músculos relaxassem, avaliei novamente a situação.

— Ela deve estar na vovó - concluí, zombando a mim mesma por ter me preocupado por nada.

De repente, em meio às risadas, notei um pequeno pedaço de papel caído ao lado de meus pés, como se tivesse ido parar ali com o vento que entrara pela porta aberta. Abaixei-me, envolvendo-o com minhas mãos e abrindo-o enquanto me sentava no braço do sofá estofado. Foi especialmente difícil o desenrolar com uma calibre 44 nos dedos.

"Mia, se você estiver lendo esse bilhete, quero que saiba que estou bem... - deixei o ar escapar de meus pulmões, aliviada. - ...mas você tem que sair daqui imediatamente. Você corre um perigo imenso e eu nem sei o que faria se você se machucasse. Entrarei em contato assim que possível, mas por enquanto, quero que pegue suas coisas e vá para algum lugar que ninguém conheça. Com amor, mamãe".

Segurando o pedaço de papel com as mãos trêmulas, não sei quanto tempo foi necessário para que pudesse pensar novamente. O que estava acontecendo? E como assim eu estava correndo perigo?

Guardando aquela pequena folha em meu bolso, engatilhei a arma presa aos meus dedos e recuperei o presente que fora deixado sobre a mesa mais cedo, porém, assim que abri a porta para sair, vi dois carros pretos parados em frente ao portão. Cinco homens, altos e robustos, com metralhadoras de diferentes tipos nas mãos, deixaram cada um dos carros e arrumaram seus ternos, ainda sem notar a minha presença. 

Opa, cedo demais para comemorações. 

Assim que fiz menção de retornar furtivamente para dentro da casa, o salto em meus pés encontrou o piso laminado e avisou-os de minha presença. Dez pares de olhos se depositaram em mim, e a única coisa que consegui fazer foi trancar a porta, apagar a luz e correr.

Fui até a cozinha, onde ficava a porta que levava ao jardim dos fundos. Trancada, e sem a chave.

— Droga! - Amaldiçoei o pedaço de madeira, ouvindo os passos fora da casa ficarem cada vez mais altos e presentes.

Respirei fundo e tentei, por mais difícil que fosse, não entrar em pânico. Eu precisava sair dali, e precisava sair rápido. Mas por onde? As janelas estavam trancadas e as portas não eram uma opção. Tateei meus bolsos em busca de meu celular. Nada. Provavelmente deixei-o sobre a mesa ao lado da porta. Porta essa que, naquele momento, estava sendo aberta aos chutes.

Controlando minha respiração e fazendo o mínimo ruído, agachei-me e fechei meus olhos, me concentrando no que estava ouvindo. Sabia que os homens já estavam dentro da casa, e não demoraria muito para que me achassem. 

A luz longínqua da lua só era suficiente para acusar movimentações em meio à penumbra, criando alguns pontos cegos nos vértices da mobília. Mas havia uma coisa que eu possuía, e eles não. Familiaridade. Eu conhecia cada centímetro daquele lugar. Cada móvel, cada cômodo. Estava escuro, mas eu não precisava da luz para reconhecer a minha casa.

Desatei a fivela de meus sapatos enquanto escutava alguns cochichos por entre as paredes. Dado o som diverso que vinha do piso laminado, eles provavelmente se dividiram e procuravam em vários lugares ao mesmo tempo.

— Você não tem para onde correr, vadia! - Gritou um deles, com a voz grossa, fazendo-me engolir em seco só de pensar no que poderia acontecer se fosse encontrada.

Já livre dos objetos que faziam mais barulho, continuei agachada, indo em direção aos balcões da cozinha. O silêncio era assustadoramente incômodo, mas eu dependia daquilo para sobreviver. 

"Pensa, Mia, pensa!"

Puxei o cinto que prendia meu sobretudo ao corpo e enrolei suas extremidades em cada uma de minhas mãos. A Taurus continuava ao meu alcance, mas ela era a última coisa que usaria naquela hora.

Posicionei-me na parte mais escura da cozinha, prendendo a respiração assim que ouvi passos adentrando o cômodo.

— É mais fácil se você se entregar agora, quem sabe assim eu não bato tanto em você - disse a voz rouca, locomovendo-se apenas alguns centímetros à minha frente.

Assim que vi o corpo musculoso passando rente à janela oposta a mim, segui silenciosamente sua silhueta e, perto o suficiente para alcançá-lo, envolvi seu pescoço com o cinto em minhas mãos em um só movimento. Eu puxava o objeto com tanta força que sentia que meus dedos iam ser cortados ao meio.

O homem se debateu, tentando arrancar o cinto de seu pescoço, mas aos poucos foi deixando de resistir e começou a pesar em cima de mim. Quase deixei-o cair quando seu corpo amoleceu e se lançou contra o meu, desmaiado, porém consegui depositá-lo no chão sem maiores barulhos. O arrastei até a parte invisível do local, enrolando novamente o cinto em meus dedos e indo ao cômodo do lado.

Engatinhando e respirando o mínimo possível, cheguei até o quarto de Jihyo. A cortina estava fechada - deixando o lugar em um breu completo -, e eu quase achei que aquele era o meu fim, entretanto, a esperança retornou assim que um barulho de vidro sendo quebrado ecoou pelas quatro paredes. 

Jihyo nunca gostou de porta-retratos. Ela dizia que eles davam medo quando vistos à noite, com pouca luz, e por esse motivo, existia apenas um porta-retratos em seu quarto - em cima de sua única mesa de cabeceira, ao lado da cama.

Sorri vitoriosa, me esgueirando por todo o perímetro da cama e me levantando de uma vez só quando senti a presença de alguém em minha frente. Mais uma vez, envolvi o pescoço do homem - que dessa vez era bem mais baixo e fraco - e puxei com todas as minhas forças. Eu não enxergava absolutamente nada, mas podia ouvir suas mãos tentando arrancar o cinto de sua garganta. Como seu parceiro, ele se debateu por um tempo e logo já estava desmaiado no chão. Meus pés começaram a doer, mas aquela não era a hora ideal para me preocupar com aquilo. Havia oito homens há menos de vinte metros de distância que queriam minha cabeça como prêmio.

Voltei até a sala de estar, planejando meus próximos movimentos, mas assim que me agachei perto do sofá, escutei todos os passos indo para o mesmo lugar: o centro da sala. Provavelmente eles vasculharam cada cômodo e, sem encontrar coisa alguma, retornaram ao ponto de encontro. Se todos ficassem juntos, meu cinto seria inútil. Era impossível nocautear alguém tão perto de outra pessoa, mesmo no escuro.

Para minha alegria - ou tristeza -, a sala era o cômodo mais iluminado da casa, já que possuía quatro janelas na parte da frente e três atrás. Como as costas do sofá eram viradas para a porta de entrada, e as janelas ficavam duas em cada lado da porta, escondi-me na frente do sofá e usei a luz escassa que vinha das janelas para visualizar as sombras dos homens. Agradeci naquele momento por ter deixado a cor natural nos meus fios novamente, já que assim eles nunca seriam capazes de distinguir o preto em meu cabelo ao resto da escuridão.

Eu precisava fazer algo, montar uma estratégia, mas nada parecia viável. A única saída estava depois daqueles brutamontes, e eu nunca conseguiria sair sem ser notada. De repente, eles começaram a andar em minha direção, todos de uma vez, como se tivessem sido alertados por algum ruído. 

Era meu fim, e eu quase saquei a Taurus do bolso interno e comecei a atirar, mas então, como se alguém nos assistisse de fora e esperasse que aquilo fosse acontecer, o celular que estava sobre a mesa ao lado da porta vibrou e se acendeu, denunciando sua localização.

— Que susto, porra! - Reclamou um deles, apontando sua arma naquela direção.

— Que merda é essa? - Disse outro, andando até lá e sendo seguido pelo resto.

Só então notei que estava prendendo a respiração. Permiti-me inspirar, aliviada, pelo menos conseguindo algum tempo para pensar. Foi quando reparei que eles estavam perigosamente perto das janelas; perigosamente perto da claridade que vinha da lua. Suas silhuetas estavam perfeitamente demarcadas, e aquela era a minha única chance.

— Desde quando essa vagabunda conhece esse cara?! - Questionou aquele que tinha meu celular em mãos, esse que iluminava perfeitamente seu rosto.

— Ninguém tinha nos dito que eles se conheciam, caralho! - Protestou o outro, carregando um certo desespero em sua voz.

Eu não tinha tempo para pensar sobre quem eles estavam falando. Era agora ou nunca. Fiquei de pé lentamente, estendendo ambos os braços à frente e envolvendo a Taurus em meus dedos. Desenhei um mapa mental sobre o percurso que minha arma faria. Anotei cada uma das silhuetas e, assim que o engatilhar do metal os fez virar na direção do barulho, esvaziei todo o cartucho da pistola em suas cabeças.

O barulho foi ensurdecedor, e a força necessária para manter a Taurus estabilizada queimou meus músculos como lava fervente. Não houve nem tempo para que qualquer um deles preparasse sua arma. Os corpos caíram em uma sincronia quase perfeita, um após o outro. 

Quando o último baque reverberou pela penumbra, já não havia mais sombra alguma em frente às janelas. Estavam todos mortos. Oito balas, oito cadáveres. Se eu houvesse errado um único tiro, quem estaria morta seria eu.

Deixei que minhas pernas amolecessem e despenquei ao chão, só então voltando a respirar. A escuridão ainda se fazia presente, e eu lancei o revólver o mais longe que consegui. Minhas mãos tremiam como nunca tremeram antes, e eu achei que meu coração fosse escapar pela boca. Eu havia matado dez homens! Nenhum clube de tiro preparava você para aquilo.

Assim que minha respiração voltou ao normal e eu consegui digerir um pouco da informação, me pus de pé novamente, só então sentindo uma dor excruciante em minha sola direita. Passando a mão no local, reconheci um pedaço de vidro fincado em minha pele, de onde escorria um líquido quente e volumoso. Sangue. Estava com tanta adrenalina antes que nem percebi quando pisei em um dos cacos originados pela queda do porta-retratos.

Me preparei para ir embora logo dali, entretanto, assim que atravessei o sofá, mancando, um clique no interruptor fez a luz retornar e o pior dos meus pesadelos ganhar vida. Eu não contava que eles estivessem em onze, e não em dez. 

O asiático, completamente trajado em preto e com a cabeça raspada, demorou menos do que meus olhos puderam acompanhar para sacar uma calibre 38 do paletó e atirar, acertando o projétil na parte inferior esquerda da minha barriga.

— Achei você, cadela - xingou, antes que meu corpo perdesse a força e caísse no chão, assim como os homens que eu matara mais cedo. - Acabou o pique-esconde!

Minha visão embaçou e, por Deus, eu nunca senti tanta dor em toda a minha vida. Nada se comparava com aquilo; o chumbo cortando e rasgando e perfurando os tecidos sem receio algum. O ferimento sangrava e sangrava e meus dedos não eram o suficiente para manter o líquido dentro de minhas entranhas. Eu queria gritar, espernear e pedir ajuda, mas não encontrei nenhum resquício de voz.

— Parece que você não é mais tão durona, não é? - Vi-o se aproximar a passos lentos, visivelmente brincando com a minha situação.

Seus dedos giravam o armazenador da munição, e quando ele finalmente chegou até mim, forçou a sola de seu sapato contra o ferimento em minha barriga.

Se antes eu não gritara, naquela hora cada parte de mim encontrou voz e reclamou sua dor. O som gutural que saiu por minhas cordas vocais era tão agonizante quanto a própria situação. Eu estava a ponto de desmaiar, e ele sabia disso.

— Oh não, eu quero que você fique acordada - cuspiu, com um sorriso horrendo no rosto, retirando a força que fizera sobre a abertura em minha pele. - Quero que esteja completamente atenta quando eu atirar bem no meio dos seus olhos, para que seu pai, seja lá onde ele estiver, saiba exatamente quem fez isso com você - completou, alinhando a arma em sua mão bem em cima do meu rosto.

As tatuagens em seus dedos eram exatamente iguais às que eu vira na filmagem que Sehun encontrara. Iguais àquelas que o homem que me levara ao orfanato possuía. Quem eram aquelas pessoas? Eu não sabia de nada, e morreria na ignorância.

Tantas coisas passaram em minha cabeça. Tantos arrependimentos. Então assim que era a morte? Rostos, momentos, cheiros. Meu primeiro beijo, minha primeira vez. Minha família, meus amigos. Baekhyun. Me forcei a esquecer as últimas palavras que proferi a ele e ainda assim era muito doloroso. Eu queria vê-lo de novo. Abraçá-lo de novo, beijá-lo, sentir seu toque, sua pele. 

— Suas últimas palavras, vadia? - Perguntou, em escárnio, prendendo um cigarro no meio dos lábios.

Juntei todas as forças que pude para abrir meus olhos e encará-lo sem pudor.

— Vá se foder.

Sua risada agrediu meus tímpanos e, assim que vi-o contrair os músculos da mão que segurava o revólver, fechei meus olhos e esperei a morte me buscar. 

Um tiro foi disparado, mas eu continuava respirando. Foi quando abri meus olhos que percebi que o barulho não vira do homem sobre mim, esse que manchou-me de sangue e se lançou no chão ao meu lado, sem vida. 

De repente, passos correram até mim, exasperados, e eu vi a única coisa que precisava naquele momento: Byun Baekhyun.

— Mia! Mia, fica comigo, por favor! Eu te amo, Mia, eu imploro...

Sirenes ao longe se misturavam com sua voz, e eu já não sabia mais se aquilo era real. Aquela franja desajeitada, aqueles lábios perfeitamente demarcados. As sobrancelhas unidas, os olhos marejados e o perfume. Ah, o perfume! Se não estivesse tão fraca, com certeza estaria sorrindo.

Dezenas de pessoas entraram na casa, trajadas em uniforme azuis e com armas nas mãos. Por falar em arma, Baekhyun também tinha uma em seus dedos, mas eu não tinha condições de questioná-lo sobre aquilo.

Suas mãos me acariciavam, impacientes, ora arrumando meus fios desajeitados, ora pressionando o ferimento em minha barriga. Ele uniu sua testa à minha, e eu pude sentir seu calor mais uma vez.

— Eu te amo Mia, por favor, você não pode me deixar - choramingou, deixando escorrer uma lágrima em sua bochecha angelicalmente esculpida.

Umas quatro ou cinco pessoas surgiram em meu campo de visão, afastando Baekhyun de mim e me colocando sobre uma maca móvel. No caminho até o lado de fora da casa, vi os homens uniformizados adentrando todos os cômodos, gritando e conversando, mas não conseguia me concentrar em nada.

Deitada dentro daquilo que julguei ser uma ambulância com uma lâmpada extremamente branca, duas médicas iam e vinham, vasculhando armários e dizendo coisas que eu não entendia. Em meio ao caos, eu só via Baekhyun, sentado ao meu lado e segurando minha mão próxima à sua boca, murmurando súplicas inaudíveis e vez ou outra beijando minha pele. Acho que sorri.

E então as portas da ambulância fecharam somente alguns segundos antes que tudo ficasse escuro e minha dor se tornasse apenas mais uma lembrança angustiante em meio a tantas outras.
 


Notas Finais


finalmente a história ta começando a tomar forma, isso me deixa muito mais animada!!!


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