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História Behind the roses - V - Talk with me


Escrita por: wellcarryon

Notas do Autor


Mil perdões pela demora!!!!! Estive totalmente sem tempo, mas finalmente consegui vir aqui postar. Espero que o capítulo gordinho compense a ausência. Boa leitura!

Capítulo 5 - V - Talk with me


Frank abriu os olhos ao acordar três dias depois, e piscou lentamente. Sentia-se completamente perdido. Uma luz pálida entrava pela janela de seu quarto, atravessando a cortina florida e refletindo nos objetos, como se um refletor estivesse instalado do lado de fora de sua janela.

Seu coração começou a bater acelerado. Seria uma invasão alienígena? Apoiando-se nos cotovelos, ergueu-se e sentou-se na cama. Abrir a cortina era uma péssima ideia, pois se ele ainda estava ali, a razão era porque provavelmente não fora visto. Se os alienígenas o vissem, não hesitariam em quebrar a janela e sugá-lo para dentro da nave.

Mas algo surgiu nos ouvidos de Frank, e foi como se a realidade o tivesse acertado com um martelo e o derrubado de volta no mundo real. Ele puxou seus cabelos com força, repreendendo-se pelo vergonhoso momento de total imaginação fértil, e deixou-se cair de volta na cama.

Não havia nada de errado acontecendo. Os passarinhos estavam cantando, em vez do chiado que estava acostumando-se a ouvir nos últimos dias e a luz que invadia seu quarto provinha do sol, que finalmente resolvera aparecer após quatro dias longos e chuvosos.

Cobrindo sua cabeça com o travesseiro, Frank sentiu-se envergonhado por ter de carregar a partir de então aquela lembrança em sua memória. Toda vez que estivesse em público, sentiria medo de que alguém pudesse ler sua mente e encontrasse aquilo em algum lugar.

Permaneceu por mais alguns minutos em sua cama, ouvindo os passarinhos cantando nas árvores ao redor e as vozes agitadas de Ray e Bob na cozinha. Lembrou de que com a volta do sol precisava ir até a lavanderia. Lembrou de que à noite uma emissora de televisão transmitiria um jogo de basquete, ao qual os colegas de trabalho estavam ansiosos para assistir. Lembrou que isso significava tarde de folga para Ray, para que pudesse comprar bebidas para assistirem ao jogo na televisão. Lembrou ainda, que isso significava trabalho dobrado.

Quando uma pancada extremamente alta soou na cozinha, retumbando pelas paredes e fazendo a porta de seu quarto tremer, Frank decidiu que era hora de levantar. Descobriu a cabeça, jogou as cobertas para o lado e levantou com maior facilidade agora que a maioria de suas dores o abandonara, depois de inúmeros sacos de gelo. Pegou no armário uma muda de roupas e rumou para o banheiro.

De banho tomado e devidamente vestido, Frank voltou sua atenção para o reflexo no espelho, fazendo uma careta. Seu olho já havia desinchado um pouco, mas seu rosto ainda apresentava alguns hematomas roxos em alguns pontos, enquanto em outros o amarelado começava a surgir.

Estava se sentindo horrível. A todo momento precisava lembrar a si mesmo de que já estivera pior, mas mostrar aquilo para as pessoas com quem precisava conviver diariamente era diferente de sair na rua daquele jeito. Puxou os fios crescidos de cabelo em frente ao rosto tentando cobri-lo, mas não adiantaria nada se quisesse continuar com os olhos livres para enxergar.

Frustrado, saiu do banheiro, deixou suas roupas no quarto e foi para a cozinha, onde encontrou Bob e Ray ajoelhados, com as cabeças enfiadas para baixo de um armário, engajados em uma discussão.

– O que vocês estão fazendo? – perguntou, observando-os com uma expressão intrigada.

– Colocando uma ratoeira. Temos um novo hóspede – disse Bob, levantando a cabeça com teias de aranha presas no cabelo. Frank sentiu um arrepio descer por sua coluna.

– E o danadinho fez um estrago e tanto nessa parede – acrescentou Ray, pondo-se de joelhos antes de levantar.

Frank sentou-se lentamente na cadeira, observando horrorizado uma aranha de pernas finas movimentando-se pelo topo da cabeça de Ray. Levou uma mão à boca, assistindo de olhos arregalados quando Bob levantou-se, percebeu o ocorrido e pegou um guardanapo no balcão, passando a acertá-lo repetidamente na cabeça de Ray que, atordoado, cambaleou para trás e derrubou, com uma batida do braço, uma caneca que estava em cima da mesa e que se espatifou no chão.

A aranha se prendeu ao pano, caiu no chão e foi esmagada por Bob. Não era preciso ser um especialista em ler expressões faciais para perceber que Ray estava furioso, fuzilando o colega com os olhos enquanto sua real intenção ia além de fuzilá-lo apenas dessa forma.

Envolto novamente em sua máscara de auto-suficiência, Ray virou-se, chutou os cacos da caneca para os pés de Bob e substituiu-a por outra, sentando-se para tomar seu café.

Bob sentou-se também, com a expressão indiferente, e começou a preparar seu café. Frank não perguntou, mas enquanto ajeitava-se na cadeira e cobria de manteiga uma fatia de torrada, imaginou porque eles estavam tão preocupados com um rato quando havia tantas teias de aranha pela cozinha.

 

Depois do café da manhã, Bob e Ray se ocuparam de suas tarefas na horta e no interior da casa, respectivamente, enquanto Frank foi até a lavanderia, ao lado da cozinha. Após quatro dias chuvosos, dentro dos quais Frank deveria ter ido até a lavanderia da cidade, havia muitas roupas acumuladas precisando ser lavadas.

Juntou as roupas do cesto dos funcionários e enfiou dentro de um saco, e estava inclinado sobre o cesto do Sr. Way quando uma muda de roupas caiu sobre sua cabeça. Mais do que depressa Frank se desvencilhou delas e encarou irritado o buraco no teto da lavanderia. Enquanto ele, Bob e Ray precisavam carregar suas roupas até ali, o chefe só precisava jogá-las pelo buraco na parede do banheiro.

Enfiou as peças caras e sociais – até demais para alguém que nunca saía de casa, pensou Frank – dentro de outro saco e arrastou os dois para a porta da cozinha, que levava ao quintal.

Ziguezagueou pelo gramado carregando os sacos nos braços e tentando desviar das poças de água acumulada, mas estava tudo tão molhado que conforme desviava de uma acabava pisando em outra. Quando chegou até o carro que o esperava na entrada, seus pés estavam encharcados, e seus sapatos pareciam uma banheira.

Murmurou um bom dia para o motorista quando abriu a porta, arremessando tudo para o canto do banco de trás e sentando-se pesadamente ao lado. Frustrado, tirou as meias e secou os pés e o sapato com uma de suas calças que ia para a lavanderia. Quando finalmente terminou, o carro estava parando em frente ao prédio com a fachada envidraçada.

Julian estava no balcão lendo um folheto, e ergueu a cabeça quando ouviu a porta se abrir. Seu rosto se transformou em uma mistura de alegria e curiosidade.

– Ei, seu sacana desaparecido! – disse ela, empoleirando-se no balcão. – Meu deus, o que houve com o seu rosto?

Frank baixou a cabeça, desejando poder escondê-la dentro da roupa como uma tartaruga.

– Não foi nada – desconversou, colocando os sacos sobre o balcão entre eles.

– Tudo bem – disse ela, descendo do balcão. – Então, o que tem feito?

– O de sempre. Limpo coisas limpas, organizo coisas organizadas. Nada de mais – respondeu Frank, dando de ombros. – E você?

– Ah, eu estou testando uns novos exercícios para os braços – respondeu ela, mostrando seu bíceps. – Dobradura de roupas. É muito bom, li numa revista. E também tenho assistido pessoas que aparentemente nunca usaram uma máquina de lavar destruindo suas próprias roupas.

Frank riu, visualizando a cena mentalmente.

– Bom, é por isso que eu sempre deixo vocês encarregados desse papel. O que você tem para mim aí? – perguntou.

– Muitas roupas dobradas, passadas e prontinhas para serem levadas. Vem, vamos buscá-las – disse ela, abrindo a porta do balcão para que Frank pudesse entrar.

Ela o conduziu por um corredor e eles adentraram uma sala repleta de prateleiras e cabides, tudo lotado por pilhas de roupas empacotadas. Ela parou em frente a uma das prateleiras, leu a nota que indicava de quem eram as roupas e começou a entregar os pacotes para Frank. Em seguida, foram até uma arara, onde ela pegou mais roupas.

– Não quero ser intrometida, mas você quer ajuda com isso aí? – perguntou ela, baixinho, indicando o rosto de Frank com a cabeça.

– Como assim? – perguntou ele, franzindo o cenho.

– Maquiagem – respondeu ela. – Eu poderia cobrir toda essa bagunça e deixar você novinho em folha.

– Você quer me maquiar? – perguntou Frank, um tom de pilhéria em sua voz. – Vai usar um batom pink em mim?

Julian revirou os olhos e entregou-lhe o restante das roupas, conduzindo-o de volta por onde vieram.

– Não é disso que eu estou falando. Vamos lá, vou considerar isso como um sim.

Tomou de volta as roupas de Frank, guardou-as no balcão e carregou os sacos que ele trouxera para a área da lavanderia. Em seguida, arrastou-o pelo braço para o banheiro dos funcionários e deixou-o sozinho, voltando minutos depois com uma bolsa e uma cadeira de rodinhas.

– Senta aí – disse ela, e Frank obedeceu.

Com movimentos rápidos e alguns pincéis, Julian transformou o rosto de Frank, apagando todas as marcas da agressão e deixando-o com um ar saudável e natural. Quando ele viu seu reflexo no espelho, seu queixo caiu.

– Nossa – murmurou, incrédulo. – Você é muito boa nisso.

Ela sorriu, seus olhos brilhando.

– Eu sou voluntária em um grupo de apoio às mulheres vítimas de agressão, então faço isso toda hora – explicou ela. – É algo bem simples, mas faz muito bem para a auto estima delas.

– É incrível! – exclamou Frank, maravilhado.

– Obrigada! Eu gosto de como a maquiagem consegue transformar as pessoas, e não precisa ser de uma forma artificial. É como um editor de imagem.

– Eu nunca havia pensado nisso – admitiu ele.

Julian sorriu, tirando uma escova pequena de dentro da bolsa e arrumando o cabelo de Frank, cobrindo um pouco o olho que estava inchado.

– Agora você não precisa se preocupar tanto com isso. Pelo menos não vai ficar tão evidente quando as pessoas olharem para você.

– Obrigado – agradeceu ele, levantando.

– Você não precisa agradecer. Se quiser passar aqui de novo, fique a vontade. Eu estou aqui de segunda à sexta.

– Não quero ficar tomando seu tempo com isso, nem gastando suas coisas – disse Frank, sincero. Era um trabalho muito interessante para que ela o desperdiçasse com ele. Aquele assalto não o prejudicaria tanto psicologicamente quanto as agressões sofridas por uma mulher, causadas por alguém que deveria tratá-la bem.

– Não é desperdício nenhum! E nós somos amigos, amigos fazem essas coisas – disse Julian, abrindo a porta do banheiro e acompanhando-o de volta ao balcão na entrada da lavanderia.

– Nós somos amigos? – murmurou Frank, surpreso.

– E não? – perguntou ela, observando-o com as sobrancelhas erguidas.

Frank observou o rosto dela, que o encarava como se isso fosse óbvio. Na verdade, ele não sabia que eram amigos. Se conheciam há tão pouco tempo, e mesmo que ela tivesse sido a pessoa mais legal a falar com ele em tempos, e sempre o tivesse tratado como igual, não achou que ela o considerasse um amigo.

– Claro – concordou, por fim.

Com o sorriso gentil de Julian em mente, Frank voltou para o carro carregando seus novos pacotes, e foi levado de volta para casa. O motorista lançou alguns olhares desconfiados para seu rosto, mas depois de conversar com Julian e recuperar a fé na humanidade, ele acreditava que nada mais poderia incomodá-lo naquele dia.

É claro que ele estava redondamente enganado.

 

Atravessar os portões da propriedade do Sr. Way era como cruzar um portal. Já estava acostumado a oscilar entre a agitação e a calmaria, mas sempre havia alguma coisa muito estranha acontecendo lá dentro.

Ray ainda estava irritado pelo episódio com o guardanapo, então Frank não encontrou os colegas juntos quando ultrapassou a porta da cozinha, apenas Bob e um maravilhoso cheiro de comida no ar.

– O que está fazendo? – Frank perguntou, lançando um olhar para o fogão e para os ingredientes que Bob estava utilizando.

– Lasanha, acompanhada por salada de rúcula e erva-doce. Mas o cheiro é da lasanha – respondeu ele, sorrindo.

– Hmm... E vai sobrar pra nós? – cochichou Frank, esperançoso.

Bob riu, abaixando-se até o forno e acendendo a luz interior, mostrando uma forma grande.

– A menos que o Sr. Way esteja com muita fome hoje, com certeza nós também vamos comer.

Satisfeito, Frank deu-lhe as costas e deixou a cozinha. Estava indo para seu quarto com os pacotes para separá-los quando Ray surgiu em seu caminho.

– Preciso que você limpe as janelas hoje à tarde. A chuva deixou os vidros imundos.

Mais sapatos molhados, ótimo – pensou Frank. Mas tudo o que disse foi:

– Claro.

– O que você fez com seu rosto? – perguntou Ray, franzindo o cenho.

– Maquiagem – murmurou Frank.

Ray ergueu as sobrancelhas e o encarou. Foi a vez de Frank franzir o cenho, e sem receber nenhuma outra palavra, seguiu seu caminho para o seu quarto e deu continuidade ao que pretendia fazer antes de ser interrompido. Separou as suas roupas e dos colegas, bem como as do Sr. Way. Aproveitou os minutos restantes antes do almoço para arrumar a cama que ainda estava desfeita e abrir a janela do quarto para renovar o ar do ambiente. Em seguida, foi até a cozinha e ajudou Bob a colocar a mesa para que almoçassem.

Ray levou a refeição do Sr. Way para a sala de jantar, e voltou em seguida para almoçar. Ele e Bob ainda não estavam se falando, e Frank começou a se perguntar quanto tempo aquilo duraria, se iria até a hora do jogo ou se avançaria até várias garrafas de cerveja depois, quando qualquer um é um amigo em potencial.

Fosse como fosse, o almoço chegou ao fim, Ray abandonou suas roupas de trabalho e saiu, e Frank retirou a louça usada pelo Sr. Way para a cozinha. Em seguida, perguntou à Bob se ele tinha um par de botas de chuva, e contente ao receber um sim e constatar que lhe serviam, rumou para o lado de fora e começou a limpar as janelas do andar inferior.

Mesmo com o sol, fazia um dia frio do lado de fora. Os termômetros estavam positivos, mas ainda assim o vento gelado era suficiente para atravessar a camisa e o blazer e fazer com que corressem arrepios por sua coluna. Levou o tempo de terminar a terceira janela para que o frio passasse. Depois disso, Frank pegou o ritmo de trabalho e começou a realizar a tarefa de forma mecânica, deixando a mente vagar.

Não estava muito interessado em assistir a nenhum esporte na televisão naquela noite. Pra falar a verdade, em nenhuma outra noite também. Não gostava de esportes. Mas aceitara o convite de Bob e Ray para não ser a pessoa sem graça que não quer participar de nada. Aparentemente, eram raras as vezes em que algo parecido acontecia naquela casa.

Decidira se condenar ao tédio para o bem de suas relações interpessoais.

Ouviu um farfalhar acima de sua cabeça e virou-se a tempo de ver algo desaparecer pela abertura de uma janela. Afastou-se da casa e olhou para a janela, reconhecendo a pesada cortina cinza. Era o escritório do Sr. Way.

Balançou a cabeça e voltou ao trabalho. Não via o chefe desde a fatídica noite na cozinha, em que deixara muito claro que sua coragem – que já não era muita – ia até o momento em que a energia acaba. Depois disso, até mesmo uma mariposa pode tornar-se um morcego.

Mas com relação ao Sr. Way, Ray o via diariamente quando levava as refeições, e não comentou nada sobre ele estar mais retraído – se é que isso era possível. Frank não sabia se devia se preocupar, ou se o fato de Ray não estar comentando nada significava que tudo estava bem. Ou também, se Ray não estava comentando porque comentar a vida dos outros não é algo politicamente correto de se fazer.

Qualquer que fosse o problema, o fato é que Frank não sabia nada sobre o homem e por mais que não quisesse admitir, as reações que ele estava demonstrando o faziam pensar se ele não estaria com algum problema e precisando de ajuda. Longe de Frank querer se meter na vida de uma pessoa aparentemente e possivelmente tão complicada, mas sua mãe sempre tivera uma política de convivência que implicava em fazer para os outros o que gostaria que lhe fizessem. E se Frank estivesse passando por algum problema gostaria que alguém percebesse e o ajudasse.

Assim que concluiu sua tarefa, voltou para dentro de casa, guardou os materiais de limpeza e se limpou. Ray chegou nesse meio tempo e voltou ao trabalho, o que lhe deu maior confiança para fazer o que pretendia, pois teria mais tempo, sem se preocupar com a possibilidade de alguém tocar o interfone e ele precisar atender. Pegou as roupas do Sr. Way que separara no seu quarto, e rumou para o segundo andar.

Era estranho para Frank como tudo parecia sempre tão escuro quando andava lá em cima. Os corredores eram razoavelmente iluminados, mas qualquer cômodo que entrava parecia mais com um porão do que com um quarto ou o que quer que fosse.

Deixou as roupas na salinha onde fora levado da primeira vez que trouxera roupas da lavanderia, e tornou a sair. Voltou pelo corredor, parando em frente à porta do escritório, e se perguntou se era realmente uma boa ideia. De qualquer forma, seu pretexto de estar ali era que queria pedir um livro emprestado, o que de fato queria. Se o Sr. Way não estivesse no escritório, Frank desistiria e continuaria com sua vida sem se importar com o bem estar do chefe.

 Respirou fundo, juntou sua coragem e bateu à porta.

– Entre – disse a voz imponente, da mesma forma que ouvira quando esteve ali pela primeira vez.

Frank girou a maçaneta, abriu a porta e enfiou sua cabeça para dentro.

Um momento constrangedor se passou, em que Frank encarou o homem sentado atrás da escrivaninha, vendo-o encará-lo de volta, e sentiu que seu cérebro havia virado espuma e sumido. De onde diabos ele havia tirado aquela péssima ideia mesmo?

– Sim? – perguntou o homem, rompendo o silêncio.

– Ahn... E-eu... – gaguejou, pigarreando em seguida para disfarçar. – Eu penso que talvez não seja apropriado, mas imaginei que o senhor estaria aqui e me pergunto se talvez o senhor poderia me emprestar algum livro.

A frase totalmente sem sentindo pairou na mente de Frank, acusadora enquanto lhe apontava um dedo e o chamava de patético.

– Talvez o senhor possa me perguntar, então – disse o homem.

E mais uma vez ele estava tirando sarro da sua cara. Revirando os olhos, e com parte de sua tensão se perdendo à medida que a irritação assumiu o controle momentâneo de sua mente, acabou entrando na onda.

– O senhor poderia me emprestar algum livro? – perguntou.

– Claro – respondeu o homem, e Frank percebeu um toque de diversão em seu tom de voz.

Frank adentrou a sala e caminhou sem pressa até a estante. Abriu o vidro devagar, sentindo o olhar do outro queimar às suas costas, e correu os olhos pelas lombadas dos livros, sem realmente lê-las. Não podia parar de se repreender por uma ideia tão ruim.

Estava na metade da terceira prateleira quando a voz do homem tornou a surgir.

– O que você fez com seu rosto? – ele perguntou, e Frank pode ouvir a curiosidade em seu tom de voz.

– Maquiagem – resmungou, já imaginando a mesma expressão que vira no rosto de Ray estampada também no rosto do homem.

– Interessante – disse ele, para surpresa de Frank.

Resolvendo se concentrar realmente nos livros, Frank continuou a correr os olhos pelas lombadas de onde havia parado ao ser interrompido, dessa vez demorando-se um pouco em cada título. Esticou a mão e, com cuidado, retirou um livro que lhe pareceu interessante. Virou-o e leu a sinopse na contra-capa. Guardou-o novamente na prateleira e continuou.

Passaram-se alguns minutos, até que Frank encontrou um livro que quisesse ler. Virou-se com ele em mãos, e se surpreendeu por encontrar o homem lhe fitando. Por um momento, perdera-se nos livros e se esquecera de onde estava.

A luz do abajur iluminava o lado direito do rosto do homem, que segurava uma caneta entre os dedos indicador e médio, e encostava a tampa casualmente em sua boca. Frank encarou-o de volta, sentindo o sangue transformar seu rosto em um tomate por baixo de tudo o que Julian lhe passara, e torcendo para que os produtos disfarçassem essa reação.

Permaneceram se encarando por um instante, quando então um grito soou vindo do andar de baixo, e em um segundo a cena se transformou.

– Gerard! – gritou a voz, desconhecida para Frank, mas que fez com que seu chefe levantasse da cadeira de supetão, derrubando-a para trás, e encarasse a porta como se seu olhar pudesse explodi-la.

– O que você está fazendo aqui?! – gritou ele de volta, socando a mesa. – Vá embora!

– Gerard, nós precisamos conversar! – gritou o homem no andar de baixo.

Frank ouviu um rebuliço de vozes, que deveriam pertencer a Ray e ao homem, e deu um salto para trás quando o abajur voou em direção à porta e se espatifou.

– Gerard, pare com isso! – gritou o homem no andar de baixo.

– Cale a boca! Por que você está aqui? – gritou o Sr. Way. – Eu já disse para ir embora, não tenho nada pra falar com você!

Frank abraçou o livro contra o peito e desejou poder se fundir à parede. O Sr. Way agarrava as bordas da mesa com força.

– Tranque a porta! – gritou ele em direção a Frank, que deu um salto e correu para fazer o que lhe fora mandado.

Suas mãos trêmulas giraram a chave na maçaneta e ele se virou bem na hora que um livro pesado foi arremessado contra a porta. O livro bateu contra a madeira e caiu, levando consigo metade da chave.

Frank encarou o chaveiro no chão, com a chave quebrada, e olhou para seu chefe, que parecia ainda mais atordoado com o que fizera.

Ele se adiantou em direção à outra porta e tentou abri-la, grunhindo de indignação quando encontrou-a trancada. Em mais um acesso de fúria, o homem chutou a escrivaninha e derrubou tudo que havia em cima dela.

– Gerard, por favor, vamos conversar! – gritou o homem no andar de baixo.

– NÃO! – rugiu o Sr. Way. – Vá embora Michael!

As coisas passaram a fazer um pouco mais de sentido para Frank nesse momento. Era a pessoa que enviara o convite, a pessoa que causara o primeiro arremesso de abajur e provavelmente causaria ainda muitos outros. E Frank teria que limpar a sujeira.

Escapou de volta para o lugar onde estivera, em frente à estante de livros, e escorregou para o chão, encolhendo-se longe da linha de fogo. Assistiu uma imensidão de coisas serem arremessadas pela sala, chocarem-se contra a porta e caírem. Ouviu uma imensa quantidade de palavras serem gritadas para a porta e do outro lado dela, ouviu barulhos estranhos, rugidos de fúria e frustração. Ouviu o silêncio que tomou conta de tudo quando o visitante indesejado finalmente foi embora – finalmente, pois o Sr. Way estava ficando sem opções do que jogar contra a porta.

Ouviu quando Ray subiu as escadas e se aproximou, avisando que o Sr. Way podia sair. Ouviu quando seu chefe comunicou, com os dentes trincados, que a chave havia quebrado na maçaneta. Ouviu Ray, e em seguida Bob, tentarem arrombar a porta sem sucesso.

Eles passaram algum tempo tentando, mas aquela porta parecia muito determinada a se manter no lugar, mesmo com todos os pontapés que recebeu. Se seu dono era turrão, ela também era.

Frank, que já estava sentado no chão, assistiu ao seu chefe andar de um lado para o outro no escritório pisando em cima de tudo que arremessara, abrir as cortinas para que a luz entrasse e voltar a andar, até finalmente cansar e se sentar também, bufando.

Revirando os olhos, Frank pegou o livro que havia escolhido para ler e deu início à sua leitura. Estava cansado de toda a movimentação e não havia nada que pudesse fazer se não esperar que Ray e Bob encontrassem um chaveiro, que ele chegasse e destrancasse a porta. Enquanto houvesse luz diurna do lado de fora estava tudo bem. Era só esperar que tudo acontecesse antes de o anoitecer cair. Porque o abajur estava quebrado, e não havia nenhuma outra fonte de luz no quarto. Seu chefe realmente gostava muito do escuro.

Páginas e páginas foram viradas, e Frank estava muito entretido com a história quando foi interrompido.

– O que? – perguntou, pois não havia entendido o que seu chefe lhe dissera.

– Pedi para você parar de ler, porque o barulho está me irritando.

Frank encarou o homem sentado no chão do outro da sala, e procurou traços de zombaria em seu rosto, mas não encontrou nenhum. Ele parecia estar falando sério.

– Como assim? – perguntou, sem acreditar no que ouvira.

– As folhas – disse o homem, com um gesto vago das mãos que indicava que estava farto.

Frank sentiu uma comichão na ponta da língua. Depois de todo aquele espetáculo ridículo que fora obrigado a assistir, estava começando a se irritar.

– O que você quer que eu faça? – perguntou, insolente, deixando para trás todo seu acanhamento. – Quer que eu me sente aqui e fique encarando você até que alguém abra essa maldita porta? Lembre-se de que não fui eu a pessoa instável e descontrolada que causou essa situação.

O olhar profundo e afiado que Frank recebeu quase o fez recuar, mas ele se manteve firme.

– Você não sabe nada sobre isso – disse o homem, os dentes cerrados novamente.

– Realmente, não sei. E sinceramente? Acho que você está precisando colocar o que quer que você esteja guardando aí dentro dessa cabeça dura pra fora, porque por mais rico que você seja, não acho que vá ter dinheiro para sempre pra arremessar coisas longe, quebrá-las e substituí-las. Acho que você precisa conversar com alguém. Deveria procurar um profissional. Mas como eu não acredito que você fará isso, se quiser conversar comigo pode conversar. Eu posso ouvir o que você tiver a dizer. Mas, por enquanto, pare de agir como uma criança, porque você não é. Eu não tenho nada a ver com isso, e eu vou ler essa porcaria de livro, e espero que você não me interrompa.

Com isso, Frank escondeu seu rosto atrás do livro em suas mãos, e começou a tremer. Aguçou os ouvidos, tentando descobrir se estava prestes a ser arremessado pela janela também, mas não ouviu nada.

Continuou dessa forma, escondido, sem conseguir mais se concentrar na história que estava lendo, até que finalmente o chaveiro chegou e abriu a porta. Quando isso aconteceu, ele foi o primeiro a levantar e sair da sala, sem direcionar o olhar pra seu chefe. Marchou pelo corredor e escada abaixo, foi para seu quarto, largou o livro na escrivaninha e pegou seu celular. Colocou os fones de ouvido, se deitou, fechou os olhos e deixou a música conduzir seus pensamentos, se desconectando de tudo ao redor e recuperando a calma.

Por isso ele gostava tanto de música. Ela sempre era capaz de lhe ajudar em qualquer situação que precisasse.


Notas Finais


O que acharam? Deixem comentários, vamos conversar! ;)
Espero conseguir voltar mais rápido, mas de qualquer forma nos vemos em breve! xoxo


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