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História Bells of Notre-Dame - Reencontro


Escrita por: ElvishSong

Notas do Autor


Oláááááa! Voltei! Depois de um século, as aulas acabaram e poderei postar outra vez! Assim sendo, aqui vamos com um novo capítulo!

Capítulo 11 - Reencontro


Fanfic / Fanfiction Bells of Notre-Dame - Reencontro

                - Esmeralda! – exclamou o organista, ao ver a mulher diante de si, extremamente constrangido pela situação em que fora pego – Por todos os santos, o que está fazendo aqui?! – ele puxou o cobertor, morrendo de vergonha ao perceber que seu corpo reagira de modo inconveniente ao sonho, mas a cigana parecia totalmente alheia ao fato, soltando uma sonora gargalhada.

                - Aaron, assim vou até pensar que não queria me ver! – censurou ela, e o puxou pela mão – venha, tenho pouco tempo, e quero falar com você! – O homem tratou de puxar a mão e, tentando desconversar, disse:

                - Esmeralda, eu não durmo vestido... Não posso me levantar com você aqui! – melhor ela pensar que ele dormia nu do que saber o verdadeiro motivo pelo qual não queria sair de onde estava... Seria muito constrangedor.

                - Vou esperar lá fora. Vista-se logo, que eu tenho de correr! – havia urgência na voz dela, mas ainda assim a jovem deixou o quarto e fechou a porta atrás de si. Aliviado por se ver sozinho, Aaron suspirou e se levantou, indo até a bacia de água que deixava sempre em sua cômoda; com as mãos em concha jogou um pouco no peito e no rosto, lavando a nuca e os ombros, sentindo o líquido frio remover o calor deixado em seu corpo por aquele sonho tão... Indecente. Sentia-se um pecador sujo por ter aquele tipo de pensamentos acerca de Esmeralda, mas como não tê-los?! Afastava-os quando estava consciente, mas eles insistiam em retornar quando se distraía ou sonhava... E ele se sentia um pervertido por isso. Porque a Esmeralda que conhecera era pura e gentil, e não merecia que ele tivesse tais sonhos depravados a seu respeito! Como poderia sequer encará-la, lá fora?

                Recompondo-se ele vestiu a camisa e amarrou os cabelos antes de sair ao encontro de Esmeralda. Esta o aguardava encostada a um pilar de madeira, e aos seus pés estava uma coisinha pequena, branca, com uma fita colorida no pescoço... Aquilo era uma cabra?! Sua expressão deve ter revelado seus pensamentos, pois a jovem de imediato sorriu e explicou:

                - Esta é Djali. Minha nova companhia. – Aaron se abaixou e acariciou a cabeça do pequeno animal, que parecia muito à vontade em ser afagado e mimado.

                - Ela é adorável – elogiou o homem, pondo-se em pé – mas quem, afinal, tem uma cabra de estimação?

                - Eu tenho – afirmou a cigana, com aquele sorriso atrevido do qual Aaron sentira tanta falta; ela suspirou e afastou aquela mecha rebelde que sempre insistia em cair sobre seu rosto – mas não vim aqui para falar sobre Djali.

                - E o que traz você aqui, quando o sol mal surgiu no horizonte?

                - Você – respondeu ela – eu sei que desapareci, e não dei mais notícia alguma... Eu precisava lhe dar alguma explicação, afinal.

                - Esmeralda, você não tem dever algum de me dar explicações...

                - Eu sei. Mas queria lhe dizer, mesmo assim; não sumi por minha vontade... Devido a meu desaparecimento, fiquei impedida de deixar a Corte dos Milagres por todos esses meses. Eu queria vir vê-lo... Saber como estava. Mas não pude, e fiquei muito angustiada, por isso... Não queria que você pensasse ter sido esquecido.

                Aaron a encarou, confuso: por que ela se preocupava com o que ele pensava? De que importava à moça se ele pensaria ter sido esquecido? Fitou aquelas esmeraldas em chamas que eram os olhos dela, mas eles não lhe deram pista alguma, insondáveis como o mar.

                - Por que se importa com o que penso, Esmeralda?

                - Bem... – ela corou e começou a gaguejar – eu... Eu não sei. Mas me importo.

                Vendo-a sem graça e levemente incomodada, Aaron se enterneceu por aquela figura tão adorável e, rendendo-se ao encanto da menina-mulher, aproximou-se dela. Por mais que não devesse se aproximar, para o próprio bem de Esmeralda... por mais que pertencessem a mundos distintos, e houvesse inúmeras razões para que não houvesse sequer uma amizade entre ambos – razões que ele repassara exaustivamente em seus pensamentos, tentando esquecer-se dela – a verdade era que, afinal, sentira muita falta da jovem de boca sem freios e ações impulsivas. Sentira falta do jeito direto e irreverente, daqueles olhos que tanto o intrigavam quanto fascinavam... Uma cigana, uma feiticeira... Uma deusa.

                - Não devia ficar tão perto de mim, Esmeralda. – disse ele, num murmúrio, mas se aproximou ainda mais. Ela sorriu para Aaron e tocou seu rosto por cima da máscara:

                - Porque vivemos em mundos diferentes?

                - Sou uma ameaça para você.

                - O seu mundo talvez seja... Não você. – ele sentiu o toque dos dedos dela, mornos contra sua pele... Quem já o tocara daquele modo tão... Tão terno?! Tão gentil! Ele segurou aquela mão pequena junto a seu rosto e a fitou longamente:

                - Senti sua falta.

                - Eu também. – respondeu ela – ou não teria vindo aqui.

                O casal permaneceu um longo apenas se encarando, quando seu silêncio foi quebrado pela súbita aparição de Grigoire, que exclamou:

                - Esmeralda! – a cigana fitou o amigo e abriu um lindo sorriso:

                - Grigoire! – o sineiro correu em abraçar a jovem, girando-a em seu abraço antes de coloca-la no chão:

                - Mas o que faz aqui?!

                - Vim lhes mostrar que ainda estou viva, oras! – riu-se.

                - Nem sabe como fez bem em vir – ele encarou o amigo, que meneou a cabeça e sussurrou um “não se atreva” com cara de poucos amigos, que o moço fez questão de ignorar – Aaron tem estado com o humor de um funeral, desde que você desapareceu. Suas músicas parecem um requiém, quando tenta compor! – e ao ver o organista cruzar os braços, visivelmente constrangido e furioso – ele sentiu muito a sua falta, por mais que vá tentar negar isso.

                - Eu sei – a adolescente entrou na brincadeira – ele estava sonhando comigo, quando cheguei.

                - Sonhando com ela, Aaron?! – perguntou o mais jovem – isso você não me contou!

                - Porque não é de sua conta, Grigoire! – rosnou o homem moreno, passando um braço pelos ombros de Esmeralda – agora, se não se importa, eu agradeceria se parasse de me constranger!

                - Ah, não seja tímido, homem! – continuou o sineiro, agora rindo claramente, sem ligar para a carranca de zanga do amigo – se continuar com esta cara, Esmeralda vai achar que não quer ela aqui.

                - É claro que não quero! – ele disse aquilo quase como um rosnado, mas odiou a si mesmo quando viu a mágoa nos olhos da cigana – entenda, Esmeralda... É perigoso! Eu não posso deixar você se expor a tal risco.

                - Não cabe a você me dizer que riscos correr, ou não. – devolveu ela, firme – não sou uma criança, Aaron, e sei as consequências de meus atos. Qualquer risco que esteja correndo fui eu quem fez esta opção.

                - Disse-me, da última vez em que nos vimos, que não voltaria aqui. Por que não fez como falou?

                - Porque senti sua falta, seu idiota! – aquelas palavras acertaram Aaron como uma bofetada; vendo a tensão entre ambos, Grigoire preferiu esquivar-se ao casal enfurecido e ir cuidar de seus próprios afazeres, antes que acabasse entrando naquela discussão por mero infortúnio... E tão ocupado estava o casal, que não percebeu sua ligeira escapada. A cigana encarava o organista com misto de zanga e incredulidade, e ele retribuiu com um olhar perplexo.

                - O que está tentando fazer, garota? – perguntou ele, enfim, com uma nota similar a raiva em sua voz enquanto apoiava um braço bem acima da cabeça de Esmeralda, prendendo a pequena mulher entre si e a pilastra de madeira – você sabe quem eu sou, sabe O QUE eu sou! Aprisionei, matei e torturei que conviveram com você, pessoas pelas quais tinha estima e carinho! Tentei sequestra-la! Graças a mim, Frollo agora sabe de sua existência! Ainda não percebeu que sou uma criatura completamente nociva?

                - Talvez eu tenha visto mais do que isso. Talvez eu tenha visto a arte e a paixão que transbordam de sua alma. Acha que uma alma corrupta poderia criar tanta beleza?! – ela acenou com o braço para todas as obras de Aaron, espalhadas pelo campanário - Eu vejo um homem sozinho, amargurado e torturado por um mundo que o julga tanto quanto a mim, e desejei proteger esse homem. Desejei salvá-lo de si mesmo, de sua dor. Da dor que eu só consegui enxergar quando o vi ferido e exposto, quando o medo que tinha de você se afastou para que eu visse o homem de verdade, por trás do capuz de inquisidor.

                - Mas por que?! Não existe motivo lógico para fazê-lo! Não há motivos para que queira me salvar! Na verdade, há menos motivos do que você teve para me ajudar quando fui supliciado!

                - E desde quando apaixonar-se é lógico, Aaron?! – ela disparou sem pensar, e agora estava dito. Que ele soubesse, então! Ao acaso pensava que o beijo roubado há três meses fora apenas um capricho, ou que ela viera até ali sem um forte motivo?! Ah, que ele soubesse que Esmeralda, aquela que pensara jamais se apaixonar, fora totalmente rendida de amores por um homem ao qual deveria temer e odiar! – Desde quando é possível escolher por quem nos apaixonamos?!

                - A-Apaixonar-se? – havia apenas espanto no olhar dele, quando caiu de joelhos diante da cigana, rendido – Não brinque assim comigo, cigana. Se isso for uma brincadeira, é muito cruel...

                - Não é uma brincadeira – respondeu ela, séria, até mesmo magoada – eu queria que fosse. Em minha mente, já repassei todos os motivos pelos quais deveria temê-lo e odiá-lo, mas... Não consigo. – ela fitou as paredes cobertas por desenhos e textos do artista, e pousou a testa contra a madeira, as mãos pequenas crispando-se no material duro – quando vi seus olhos, pela primeira vez, naquele dia em Notre-Dame... Eles me capturaram. Pensei que fosse medo, e que o temor não me deixasse esquecer o ouro em seu olhar... Então, quando nos vimos outra vez, no Festival... Soube que não havia escapatória, para mim. Comecei a pensar em você, a sonhar com seus olhos... E quando o salvei e trouxe para cá, e vi todas as maravilhas que você cria... – ela ergueu o rosto e fitou com maravilha aquele mundo que, até conhecer Aaron, havia-lhe sido completamente impensável - Nenhuma alma pérfida poderia criar tanta beleza e maravilha! Eu vi sua arte, e ela me mostrou sua alma... – ela tinha os olhos arregalados ao virar-se bruscamente para ele, e deu de ombros – eu me apaixonei pela alma que vi em cada traço, em cada cor, no modo como você enxerga o mundo. Vi em cada folha uma reprodução do modo como eu mesma vejo o mundo e... E vi em você alguém como eu. – Ela se virou de costas outra vez, envergonhada– pode chamar-me tola, insultar-me, expulsar-me... Eu não me importo! Pelo menos disse o que precisava dizer desde o dia em que deixei este lugar, pela primeira vez.

                A jovem baixou a cabeça, abraçada a um pilar de madeira, e estremeceu ao sentir as mãos de Aaron em seus ombros, quentes e carinhosas. A voz rouca soou bem ao lado de seu ouvido, arrepiando completamente a pele morena ante as palavras murmuradas:

                - Expulsá-la? Insultá-la? Como eu poderia, Esmeralda, quando tudo o que desejo desde que a vi pela primeira vez é beijar seus lábios e ajoelhar-me a seus pés em adoração, como se fosse uma deusa ou santa? – ela se voltou para ele, e uma lágrima brilhante escorreu por seu rosto; já fazia tanto tempo que não chorava, que mal reconheceu a sensação, mas o homem à sua frente secou seu rosto com as mãos, ele próprio tendo os olhos marejados – como isso foi acontecer conosco, Esmeralda?

                - Eu não sei, Aaron, não sei! – jogando aos ares tudo o que não fosse seus sentimentos por ele, a moça abraçou com força o homem de olhos dourados – mas aconteceu, e agora... Não há como voltar atrás. Ah, céus, eu sou uma tola! Uma tola que o ama, sem sequer saber o motivo, mas que não consegue esquecê-lo! – ele segurou as mãos dela e as beijou ternamente; ao fazê-lo, porém, viu a aliança que brilhava na mão esquerda da moça, e seu semblante tornou-se denso:

                - O que é isso, Esmeralda? – havia mesmo uma pontada de raiva na voz grave: ela ia até ali e declarava seu amor, tendo no dedo uma aliança?! Como podia ser tão cínica?! – você se casou?!

                Ela recolheu as mãos, surpresa com os súbitos ciúmes na voz dele, e explicou rapidamente:

                - É apenas um casamento de fachada, um acordo quase comercial. Clopin me obrigou a isso, mas foi uma punição por meu desaparecimento... O homem com quem me forçou ao casamento não é... Quer dizer, Miro e eu... – e ante o cenho franzido do gigante – Oras, você entendeu! Miro e eu crescemos como irmãos, e... Isso é só um anel! Um anel para manter longe propostas indesejadas, e nada mais! – ela segurou o rosto de Aaron nas mãos – por favor, acredite em mim. Sou uma cigana, pagã, tenho inúmeros defeitos, mas nunca fui desleal... Acha que eu teria vindo até aqui, fitado seus olhos e dito tudo o que falei, se não o amasse?! Por favor, acredite em mim quando digo que este anel é só um capricho de meu pai! Miro e eu não levamos uma vida de casal, juro em nome de tudo o que é mais sagrado! Sequer compartilhamos a mesma tenda, e a única coisa que lhe faço como esposa é preparar suas refeições.

                Aaron parecia atordoado, sem saber como responder: eram coisas demais em sua mente, ao mesmo tempo... Primeiro reencontrava Esmeralda, na qual pensara a cada segundo desde que ela partira, crente de que jamais tornariam a se ver... Em seguida, ouvia a confissão dela sobre estar apaixonada por ele – teria feito qualquer coisa para ouvir aquelas palavras, nos meses que haviam passado, ao mesmo tempo em que teria rezado para jamais ouvi-las – e, finalmente, ao ver a verdade no olhar de Esmeralda, recebia o golpe final: ela estava casada. Um casamento de fachada, de acordo com ela, mas casada... O que poderia dizer? O que poderia fazer? Uma vida inteira em meio a livros e estudos jamais o haviam preparado para algo assim... Sentia-se jogado no centro de um turbilhão de emoções e pensamentos que não podia organizar, quanto mais conter!

                - Aaron, por favor, não me ignore. – pediu a adolescente, começando a desejar jamais ter ido ali. Afinal, o que estava esperando?! Que Aaron retribuísse seu amor, a beijasse e fugisse com ela para os confins do mundo? Sabia perfeitamente que isso não aconteceria, e agora só conseguia imaginar por que, com mil diabos, havia se deixado portar como uma garotinha estúpida e apaixonada, mendigando o amor de alguém de um modo que teria feito a antiga Esmeralda enraivecer-se e encher-se de vergonha!

                - Não estou ignorando você... – suspirou ele, esfregando a nuca, nervoso – mas... São muitas coisas de uma vez só, cigana.

                - Eu sei. – ela se recostou ao pilar de madeira e escorregou para o chão. Curiosa, Djali começou a farejar sua dona, que a acariciou ternamente; já não sabia mais dizer por que havia ido até ali. Confessar seu amor por Aaron? Isso era ridículo. Sentia-se uma menininha tola e apaixonada e, num estalo de desagrado, percebeu ser esta exatamente a definição de sua situação... Tola, jovem e apaixonada. A armadilha na qual jurara que jamais cairia, e caíra justamente pelo último homem a quem devia amar.

                Porém, suas dúvidas e sua vergonha pareceram desvanecer um pouco quando o homem ao seu lado ajoelhou-se diante dela: havia muitas coisas em seus olhos, mas ela podia jurar que a emoção predominante era... Carinho? Ah, que não fosse isso uma peça pregada por seu coração insensato!

                - Esmeralda, eu não sei o que dizer a você. – ele foi sincero. Tão sincero que as palavras quase doeram no coração da moça, que ainda ansiava por ouvir uma nada provável declaração de amor... Uma declaração que ela sabia impossível... – não sei o que é isso que sinto em mim e, por Deus, já a chamei de bruxa inúmeras vezes em meus pensamentos. – Ele viu o medo no rosto dela, e tratou de se explicar – sempre me considerei um homem... Virtuoso. Meu coração era como o gelo, e minha alma era o inverno... Ou assim eu pensava. Então você chegou, com esses olhos da cor do mar, e tudo o que eu pensava saber sobre o mundo, sobre minha alma e meus sentimentos mudou completamente. O chão escapou a meus pés, e a única coisa que sei é que meu coração arde no afã de vê-la simplesmente em pensar que você irá desaparecer outra vez, mesmo que por alguns segundos. Anseio vê-la a salvo, e odeio-me porque, ao mesmo tempo, desespero-me para estreitá-la em meus braços e mantê-la a salvo de todo o mundo, de toda a dor. Vejo sua dança, e meu corpo se inflama com... Sensações... Não sei como isso se chama, ou o que é, mas envergonho-me de sentimentos tão carnais quando ergo o olhar de seu corpo e encontro seu rosto. Seu olhar, tão puro e tão cheio de luz, que me faz desejar cair sobre os joelhos e venerá-la como a uma santa. Seu sorriso tão cheio de bondade, que me faz crer existir redenção até mesmo para mim... Olho para você, e sinto tudo ao mesmo tempo. Você me assusta, e também me fascina. Quero tê-la em meus braços, ao mesmo tempo em que desejo fugir para longe, apavorado com todas as coisas que me causa. – ele tinha lágrimas nos olhos, e a respiração estava entrecortada – Todas as noites oro, na escuridão, pedindo em desespero por uma luz que me mostre o caminho a seguir... Mas não enxergo luz alguma, senão você. – ele acariciou o rosto delicado, e secou com os polegares as lágrimas que escorriam para o sorriso da cigana – é aterrorizante. Já não tenho certeza de nada, e sequer sei como se chama... Mas a sua imagem, a sua luz, o seu cheiro... Você se tornou a inspiração da minha arte, a luz que me faz crer na bondade. Que Deus me perdoe a blasfêmia, mas você se tornou o motivo de minha fé. E se digo que a desejo longe de mim, é porque jamais poderia me perdoar se algo lhe acontecesse. – ele segurou a mão esquerda dela – então, vejo esta aliança em sua mão, e é como se algo me gritasse a verdade: você nunca poderá ser minha. Um mortal não pode possuir um anjo. Um pecador não pode aspirar ao amor de uma deusa...

                - Não diga nada, Aaron – sussurrou ela, entre lágrimas – eu entendo o que quer dizer. Olho em seus olhos, e eles me dizem mil vezes mais do que suas palavras. Sinto muito por ter colocado a nós dois nesta armadilha e, ao mesmo tempo, agradeço a Deus que nos tenha posto no caminho um do outro. Não importam as armadilhas da vida, os perigos que nos rodeiem ou o julgamento de todos à nossa volta: eu te amo, Aaron. E se o que você me disse realmente é verdade, então você também me ama! – estavam ambos de joelhos, seus rostos a milímetros um do outro.

                - E ainda assim, isso não muda nada, não é? – perguntou ele – você ainda está casada com um cigano, como você. Eu ainda sou um filho da Igreja. O mundo ainda está entre nós, como uma muralha de pedras.

                Ela baixou a cabeça, compreendendo que aquilo também era verdade; quando o fito outra vez, porém, estava serena como não se sentia há meses:

                - Não importa. Amor é amor, e situação alguma pode torna-lo mais ou menos legítimo. Ele apenas existe, e nos une. Não sei o que faremos, agora, Aaron, mas não importa. Eu amo você. Você me ama. E assim será, não importa o que haja. – ela fitou o horizonte, já claro com os raios de sol – não posso ficar. Meu povo não pode saber que vim aqui, ou serei restrita à Corte dos Milagres, outra vez...

                - Esmeralda... O que posso fazer?! – perguntou ele, quase em desespero ao perceber que sua musa desapareceria outra vez – Preciso de você como um afogado precisa de ar...

                - Eu juro, Aaron, em nome de tudo o que é sagrado, que retornarei – ela segurou o rosto dele e, num movimento repentino, uniu seus lábios. Não esperava, contudo, que ele retribuísse àquilo, entreabrindo a boca e correspondendo apaixonadamente. As mãos fortes a seguraram pela cintura e ele se levantou, tirando-a do chão e encostando-a à parede de pedras, seu corpo contra o dela, suas bocas se buscando com sofreguidão, as respirações aceleradas, os olhos fechados, numa entrega única e completa como se seus próprias vidas dependessem daquele beijo.

                Foi só após um longo minuto que, enfim, seus rostos se afastaram, e o organista sussurrou:

                - Faça o que tenha de fazer, meu amor. Mas eu juro: não importa como, ou quando, encontrarei um modo de revê-la.

                - Espere por mim aqui. – pediu ela – em três dias, após a missa da noite, encontre-me na passagem que lhe mostrei, na primeira vez em que parti. – ela fitou o horizonte com urgência – eu estarei lá.

                - Não se esqueça. – pediu o homem, sentindo em seu coração uma alegria como jamais experimentara antes!

                - Nunca – sorriu ela, esquivando-se então aos braços fortes e pegando no chão a cabritinha Djali – Vamos, Djali! Alba deve estar louca atrás de nós! – e com seus modos impulsivos e agitados, correu para a saída; antes de descer, porém, voltou-se para Aaron e lançou-lhe um último sorriso, feliz pela primeira vez em três longos meses. Ah, sim, a ida à Catedral fora, de fato, uma magnífica ideia!

                Sozinho no campanário, o organista tentou organizar os próprios pensamentos mas, ante o palpitar acelerado do coração e a sensação de ter borboletas em seu estômago, desistiu de fazê-lo. Esmeralda o amava... Amava... Amor... Ele, logo o pior dentre os homens, era abençoado com a mais sublime das graças! E por mais impuro, indigno e pecador que fosse, sentia que seu amor por ela, de algum modo, o enobrecia. Sim, pois compreendia agora que não se tratava de desejo... Não apenas. É claro que, como homem, seu corpo reagira às belas formas e figura perfeita da jovem... Mas se trtava de muito mais. Um sentimento tão maravilhoso, uma sensação tão maravilhosamente perfeita, que não podia haver nisso qualquer coisa de pecaminosa. Pela primeira vez em sua vida, estava em paz. Pela primeira vez na vida, ele não era um pecador: era um homem capaz de amar completa e puramente outro ser, e sua alma estava cheia não de culpa, mas apenas de amor...

                Mais tarde, ao sentar-se ao órgão da catedral e tocar durante a missa, toda a alegria que havia em si preenche os demais, e até mesmo o padre que celebrava a cerimônia seria capaz de dizer – se não conhecesse muito bem o homem que estava ali, produzindo a música – que um Anjo parecia ter descido dos céus para abençoar a terra. E não estaria errado, embora jamais pudesse adivinhar que o Anjo enviado não era o organista, mas uma mulher que usava como disfarce de sua alma as roupas surradas e o sorriso simples de uma cigana da multidão.


Notas Finais


E aííííí? Mereço reviews?


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