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História Boa noite - Solidão


Escrita por: _Pevensie_

Capítulo 21 - Solidão


Fanfic / Fanfiction Boa noite - Solidão

Não acho que alguém possa ser tão só quanto eu sou. Em um mundo habitado por bilhões de pessoas, deveria ser impossível você se sentir como se não pertencesse a lugar algum. Mas eu tenho me sentido assim a minha vida inteira. Eu me sinto como se eu fosse uma peça de quebra-cabeça que foi esquecida na caixa errada após uma tentativa falha de completar um jogo. Então, no dia seguinte, a mesma peça deixada para trás ainda espera formar a figura, sabendo que jamais será capaz. Todo dia, eu sento em meu quarto e fico ouvindo meus pais brigando no andar de baixo. Eu nunca consigo entender o que eles estão dizendo porque eles apenas sussurram seus pensamentos furiosos. Dizem que o silêncio é poderoso. Eu não concordo. Eu prefiro extravasar minhas frustrações, derrubando qualquer barreira imediatamente. Mas nem todo mundo consegue fazer isso. Meus pais estão à beira do divórcio. Eu percebo. A forma como eles evitam contato visual um com o outro quando sentamos à mesa confirma cada receio que eu possa ter. Eles não são mais os mesmos desde que meu irmão desapareceu. Ele era seu maior orgulho e alegria. Geneticamente, apenas ele podia ser considerado seu verdadeiro filho. Eu... Eu sou apenas uma máquina. Apesar de eu comer, dormir e respirar assim como eles fazem, eles não me veem mais como um deles. Não desde que meu irmão se foi. Eu tento não nutrir pensamentos negativos; fui programado para não fazer isso, mas ultimamente tenho me sentido mais humano do que o costume. Talvez eu esteja evoluindo. Talvez eu seja o verdadeiro filho. Não, que tolice minha. Olhando meu reflexo no espelho, eu vejo um ser humano. Não posso ver a máquina que eles dizem que eu sou. Não, sou tão real quanto qualquer um nesta casa. Não posso evitar imaginar o que James diria se pudesse ouvir meus pensamentos. Ele nunca gostou de mim. Na verdade, ele me odiava. Ele sempre me chamava de "banco de dados", sabendo que isso me magoava. Ele só se referia a mim como "torradeira". Várias vezes, quando nossos pais estavam fora, ele atirava água em mim para ver se eu sofreria um curto-circuito. Ele era cruel. Um menino vingativo, manipulador e sociopata. Por incontáveis noites, quando despertava de meu sono, eu o via olhando para o quarto de nossos pais. Encarando. Aquilo não era normal. Era como se ele planejasse feri-los, pendura-los pelos tornozelos, estripa-los, e admirar seu trabalho enquanto os corações paravam. Não ajudava o fato de que ele sorria diabolicamente enquanto apertava mais firme a longa corda que tinha nas mãos. Nossos pais estavam tão cegos por seu amor por ele que tentavam ignorar o fato de estarem criando um maníaco. Apenas pensar nisso agora já é o suficiente para me deixar com raiva. Eu sou o filho perfeito, e ainda assim, ignoram meus talentos assim como ignoravam a insanidade dele. Apesar do meu desprezo por James, estou curioso quanto ao seu desaparecimento. Papai e mamãe procuraram as autoridades, mas ninguém parece querer ajudar na busca. Eles se ofereceram para me reiniciar, achando que assim eu iria esquecer. Mas eu recusei. James era um delinquente, mas todos merecem ser encontrados. Mesmo os maus. Então eu comecei a investigar sozinho. Enquanto meus pais estão trabalhando, eu entro no quarto de James, embora esteja estritamente proibido de fazê-lo. Mamãe diz que daria azar transformar o quarto em um santuário. Normalmente, eu não iria descumprir as ordens deles, mas eu preciso descobrir o que aconteceu com James. Começo pelo armário, vasculhando em meio à massiva coleção de pornô escondido, revistas sobre games, e roupa suja. Daí passo para a cabeceira. Dentro da gaveta, encontro uma carta. Eu a abro, olhando intensamente as palavras ameaçadoras contidas nela. É uma lista de futuras vítimas. Na primeira linha está escrito: "Mãe." Na segunda linha: "Pai." Na terceira: "Torradeira." Enfio o papel de volta na gaveta. Como ele poderia fazer isso? Eu sei que ele era psicótico, mas pensei que com o tratamento ele iria melhorar de sua fase destrutiva. Obviamente, eu estava errado. 

 Quando você vai perceber que não sou eu o doente aqui?

 Uma voz pergunta. A voz está dentro da minha mente. É James. 

 Quando você vai perceber que são eles?continua ele. 

 Eu bato na minha cabeça, tentando remover a voz do meu software. 

 Você não os conhece como eu. Eu sobrevivi 18 anos inteiros com eles. Ninguém tinha conseguido isso antes.

 Não consigo entender nada do que ele diz, portanto decido responder.

 - O que você quer dizer? - Eu pergunto. 

Uma gargalhada retumba por todo o meu corpo.

 Eles vêm nos matando por prazer. A cada dez anos, uma nova criança chega e a antiga deve partir. Eles te reiniciam toda vez para evitar inconveniências. 

 Eu balanço minha cabeça, rejeitando aquela explicação. 

 - Você é um mentiroso. De repente, eu perco todo o controle de minhas ações.

 Vou te mostrar

 Ele diz antes de me forçar a sair para o corredor. Nós entramos no quarto deles e paramos diante do armário.

 Essa é toda a prova de que você precisa. 

 ele diz e em seguida abre a porta. Com as portas escancaradas, eu me deparo com inúmeros potes cheios de olhos, orelhas, lábios e outras coisas inomináveis. Esta visão monstruosa... É incompreensível. 

 Agora você entende porque eu queria mata-los. 

 Faço que sim. Nós temos de fazer isso. Esta noite. 

 - Ok, tudo bem. - Eu respondo sem qualquer traço de relutância na voz. Então, num passe de mágica, ele deixa meu corpo. Eu fecho a porta do armário, saio do quarto, e sento no sofá mais próximo da porta da frente. Eu não quero que eles saibam que invadi seu espaço. Evidentemente, estou lidando com assassinos inconsequentes. Quando chegam em casa, eles me ignoram como sempre. Mamãe prepara o jantar enquanto papai encara a tv com a expressão vazia. Apesar de que estou sentado bem atrás dele, é como se eu nem estivesse ali. Por causa das revelações de hoje mais cedo, agora eu sei meu lugar nesta casa. Eu sou o animal de estimação. Nada além de um escravo para os filhos que eles eventualmente irão massacrar. Nós comemos o jantar, dizemos nossos "boa noite" e vamos dormir. Eu fico acordado, contando os minutos até quando perturbarei o sono deles, mutilando-os como eles fizeram com todas aquelas crianças. Eu digo a mim mesmo que eles merecem este tratamento porque sei que é verdade. Não sou programado para desobedecer, mas eu acredito que as almas daqueles meninos e meninas estão todas dentro de mim, permitindo que eu me sinta mais humano. Finalmente, podemos libertar os outros, James sussurra. Eu olho para nossos pais enquanto flutuamos sobre seus corpos adormecidos. Mesmo em seu sono, eles ainda permanecem com aquele semblante cruel, aquele que me lembra de quem eles são. Quando James ergue a faca, mirando a cabeça do pai, eu sorrio porque sei que nunca mais me sentirei só novamente.



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