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História Break The Ice - Prom Queen.


Escrita por: SweetScandal

Notas do Autor


Eu sei, sei que demorei! Sorryyyyyyy!
Estava estudando para uma prova aí e depois fiquei presa no dilema: Quantas vezes terei de reescrever esse capítulo até ficar descente? Pois é, às vezes isso leva tempo.
Não tenho muito a dizer sobre esse capítulo além do que irão ver. Só espero que entendam tudo o que me esforcei para passar :D
Quero dedicá-lo a @YoungAlaska, @Angie e a @BabyBat. Demorou, meninas, mas saiu o capítulo de vocês! Mil perdões por não lembrar o user de todo mundo, e se esqueci alguém, mil desculpas também!
Escrevi esse com essa playlist aqui ó;

I - Lil Wayne - Prom Queen
II - Black Veil Brides - Lost It All
III - In this Moment - The Fighter

Ps. Não necessariamente nessa ordem, mas tá valendo.
Ps ²: Agora chega de enrolação!

Boa leitura <3

Capítulo 60 - Prom Queen.


Nós estamos a venda.

O arrepio que senti quando Annie dissera aquilo fez meu corpo tremer como se milhares de volts me transpassassem.

Havia silêncio; não só a ausência de vozes, mas de esperanças também. O barulho no salão principal era angustiante. Gritos, risos e obscenidades capazes de envergonhar qualquer um; os lances pelas garotas lá à mostra eram maiores que todos os nossos cachês e a porção gananciosa em mim sentiu-se no lugar certo, mas todo o resto sentia-se podre. Subir ao palco todas as noites e encarar uma multidão atrás de máscaras, nos fez infinitas vezes mais fortes e frias, mas infelizmente, nem mesmo a Stormy poderia nos preparar para uma coisa daquelas. Acompanhantes de luxo. Prostitutas. Objetos. Era como estar parada à beira de um precipício depois de ter corrido uma vida toda, sem poder fazer nada, a não ser cair.

Observei-as de esgueio pelo espelho. Evelyn encarava inconformada o brilhante e belo vestido verde escuro enquanto Annie a observava ternamente, acariciando seus cabelos. À minha direita, Sammi estava assustadoramente calma, sentada em uma das cadeiras da bancada – era quase como se a ruiva, encarando pensativa o batom vermelho não fosse mais do que uma bela e triste, casca.

Doll maquiou os lábios lenta e suavemente, como se esperasse cada segundo de sua vida por um momento como aquele. Ela estava se rendendo àquela noite miserável e quanto mais seus lábios ficavam vermelhos, mais perturbada eu me sentia. Me sufocava não saber o que dizer, as desculpas – que eu sabia serem inúteis – deixavam um gosto amargo em minha boca. Onde estavam minhas habilidades temporais quando precisava delas?

-O-o que está fazendo? – Amber especulou, aproximando-se da ruiva. Winks lançou-me um olhar gelado; respirei fundo, encarando-a. Que o inferno não a permitisse ver o meu desespero!

-Não é óbvio? – Sammi respondeu, fechando o batom. Sua boca tinha a forma perfeita, mas os olhos brilhavam de ódio e angústia. – Se vão pagar por mim, que seja um preço justo. É o que fazemos agora graças a Brooke, não é? – provocou. Eu poderia rebater? Não, claro que não.

-Sammi... – me aproximei, mas Amber se meteu entre nós como um paredão. Separem os puros e os impuros!

-Você tá de sacanagem, né? – a baterista ironizou. – Pode parar, não tem a menor graça! – esbravejou, socando a bancada.

-Tem uma ideia melhor, Winks? – a guitarrista respondeu, pondo-se de pé. – Porque se tiver, não seja uma filha da puta egoísta e nos tire daqui. – sua voz vacilou, esbarrando no choro que segurava.

Eu precisava pensar em alguma coisa. Arrebentar aquelas paredes, abrir caminho entre todos no salão, não importava. Minha consciência gritava, pedindo por qualquer coisa que pudesse aliviar seu peso.

-Nós nem deveríamos estar aqui, só para começar. – Amber jogou o que havia sobre a bancada, no chão. Uma centena de paletas de sombras brilhantes se desfez. – Espero que esteja satisfeita, Daniels.

Amber avançou contra mim como um raio; me esquivei, apenas o suficiente para que suas unhas, não atingissem meus olhos. Winks era um cão raivoso, louco para beber meu sangue.

-É tudo culpa sua, cadela gananciosa! – acusava. A maneira como ela cuspia cada palavra, dava a entender que eu não estava pensando em uma maldita maneira de nos livrar. E aquilo fazia meu sangue ferver.

Não pensei muito no que fazer. Apanhei uma cadeira vaga e joguei-a em sua direção. Amber se abaixou, protegendo-se dos estilhaços que saíam do grande espelho. Arfei, sentindo a adrenalina misturando-se ao meu medo e ao ódio que sentia por tudo. Por Ângelo, por minha ingenuidade e especialmente por fazê-las passar por aquela merda.

-Eu não escolhi isso! – gritei, atirando mais cadeiras pelo camarim. – Não pedi para que nenhuma de vocês viesse! E me bater, só vai baixar meu preço, Winks, mas não vai nos tirar daqui! – quanto mais eu destruía, menos apertado ficava meu coração. Eu podia respirar quando ouvia o estrondo das paredes e via o vidro quebrando, me fazia sentir um pouco menos estúpida vê-las se protegendo do animal que eu era.

-Amigos de verdade não abandonam, Brooke. – Evelyn choramingou. Gemi, engolindo o choro.

-E eu não abandonei vocês! – esbravejei, fitando-as. A respiração estava pesada, combinando com a frágil linha para o meu descontrole. – O que eu mais quero é nos tirar daqui, não pensem que não me sinto mal, que não me sinto estúpida!

Clark avançou em minha direção. Os grandes e piedosos olhos lutando contra as lágrimas; Evelyn estendeu os braços em minha direção, em um convite para um abraço. Dei-lhe as costas. Fingi que seu carinho não existia e respirei fundo. Sem elas, provavelmente, a burrada teria sido ainda maior, mas nem o singelo conforto que aqueles rostos conhecidos me davam mudava o fato que, se alguém merecia aquilo, eu era esse alguém.

Em poucos minutos, um infeliz qualquer nos arremataria naquele maldito leilão e se acharia no direito de mandar e desmandar.

-Vocês vão sair daqui – disse, contando mentalmente até dez para me acalmar. – e quando passarem pela porta, não precisam ser minhas amigas.

O rapaz que trouxera os vestidos escancarou a porta, como se precisasse expor um pouco mais o que restara de nós. Sujeitinho arrogante. Se tivesse tempo, o jogaria na fogueira também. Ele nos olhou como quem faz uma minuciosa inspeção; deu uma volta completa ao meu redor e passou por entre as meninas. Acompanhei-o discretamente, controlando os impulsos de rasgar seu pescoço. Ele parou a frente de Evelyn, segurou-a pelo maxilar, forçando-a a olhá-lo. A baixista soluçava, tentando manter os olhos abertos.

-Chorar não vai me fazer ter pena, querida. – disse, a voz suave era irritantemente irônica. Sádico filho da mãe! – Engula esse choro porque nenhum dos clientes vai pagar por seus olhos inchados.

-Ainda sim, tenho certeza que ela valeria mais do que você. – insultei. Ele se virou rapidamente para mim, bufando de raiva.

-Não está em posição de blefar, mocinha. – rebateu, aproximando-se. Sorri, irônica.

-Não é blefe, não, é só para te deixar ciente do merdinha que você é. – ele levantou os punhos; permaneci firme, encarando-o.

-Sua vez. – alertou, avançando em direção a porta.

O sangue frio me abandonou. O corredor que levava até o palco era apertado e escuro. Caminhei logo atrás do vermezinho, procurando uma rota de fuga qualquer, mas as paredes que nos cercavam eram inteiramente negras, sem qualquer abertura sequer para a entrada de ar. Cada passo retumbava no carpete vermelho, ao mesmo tempo eram abafados pela batida sensual da música. As luzes eram baixas e no fim de toda aquela escuridão interminável e sufocante, o palco brilhava como uma centena de estrelas ao redor de um gigantesco e mortal buraco negro.

Ângelo estava no palco, incitando aos ocupantes do salão que aumentassem seus lances. Cerrei os punhos. Que ódio eu sentia.

-Seu desgraçado, filho da mãe. – rosnei. Só Dani California era tão odiada quanto ele e, se eu a joguei do palco, pensar no que seria capaz de fazer até me fazia sorrir. – Que se foda.

-Broo! – ignorei os chamados de Evelyn e me joguei sobre Ângelo, apanhando seu microfone. A plateia vaiou imediatamente e o elegante e desonesto apresentador, me olhava boquiaberto. Ah, como era bom saber que faria uma grande merda de propósito!

Me aproximei da beira do palco, próxima a um refletor mal-acabado. As mesas estavam cheias, com pelo menos quatro ocupantes cada. O cheiro de charuto e incenso dominava o ambiente. Lembrei-me das mensagens que Evelyn enviara; ideia estúpida, verdade seja dita, mas se Marcos se compadecesse de nossa desgraça, pelos meus cálculos, eu só precisava suportar por mais vinte minutos.

-Desculpem interromper o seu hobby – fiz aspas com os dedos, cínica. – repulsivo e degradante, mas sabem – comecei a caminhar pelo palco, procurando me acalmar. Ângelo estava paralisado mais ao fundo. – sempre quis saber qual a sensação de ser um fracasso tão grande que precisam pagar pela companhia de alguém.

-Te mostro qual é quando te arrematar no leilão, gracinha! – gritou um rapaz de chapéu cinza, na mesa quatro. Os outros dois que estavam com ele gargalharam, enaltecendo o ego daquele babaca; motivo suficiente para retaliação.  Sorri, achando verdadeira graça.

-E eu aposto que meu dedo mindinho é maior do que o seu pau. – retruquei. A rejeição foi total; garrafas começaram a voar em minha direção e o ódio me fez sentir em casa. Ângelo se aproximou rapidamente e tentou tirar meu microfone.

-Não me faça te castigar. – sussurrou. Empurrei-o, segurando o microfone nas costas.

-Se eu fosse você, começava a correr porque se eu te pegar, vou estourar a sua cara. – ameacei. Ele investiu novamente contra mim; tornei a empurrá-lo. Annie e Amber surgiram logo atrás, segurando-o. Ângelo esperneava, tentando me chutar. – Eu sou Penny Stardust, senhores! E nem eu ou minhas companheiras seremos seus objetos, então, eu sugiro, pela integridade física dos senhores e desse lugar, que nos deixem passar.

-Ou então o que? – um outro machão gritou diretamente da mesa dois. – Você é rebelde, do jeitinho que eu gosto. Dou cinquenta mil por você.

-A sua alma não vale isso, imagina o quanto alguém como eu pode valer. – me vangloriei. – Abram essa porta e nos deixem passar. Vocês simplesmente não têm escolha.  – os seguranças já se movimentavam, contornando o palco. Sentei-me na beira do palco, com as pernas cruzadas.

Apanhei a bebida de uma mesa próxima e dei um longo gole. Era exageradamente doce e alcoólica. Exatamente como jogar gasolina no fogo.

-O seu clubezinho do ego ferido é claramente ilegal, eu e minhas amigas – apontei as meninas, contendo Ângelo. Sammi o segurava pelos cabelos e era extremamente satisfatório ver um homem daqueles rendido. – somos menores de idade. Se chamarem a polícia, darão um tiro no próprio pé, se resolverem nos bater até cairmos inconscientes, na pior das hipóteses, vão estragar a mercadoria. Agora, se forem inteligentes e nos deixarem sair, ninguém se machuca. A escolha é inteiramente dos senhores.

Eu tinha a atenção de todo o lugar e o blefe perfeito. Latas de cerveja, garrafas de uísque e até mesmo maços de notas de cem dólares voavam em direção ao palco. Me mantive firme, encarando a cada um deles. Só mais um pouco, Brooke.

-Você não acha que sou muito justa, Ângelo? – perguntei, virando-me rapidamente para olhá-lo. Ele me encarava sério. Me levantei, satisfeita com sua humilhação. – Meninas, soltem o nosso ilustre enganador, por favor. – pedi. Annie hesitou, soltando-o devagar. Ângelo respirou fundo, aprumando a postura no smoking caro. Ele se aproximou, furioso, e resmungou quando passei o braço por seus ombros. – Você sabe do que eu sou capaz, não banque o esperto comigo porque eu bancarei o demônio com você.

Ângelo bufou, apanhando o microfone.

-Eu te fiz uma oferta, você aceitou. Fim da história. – murmurou.

-Você me enganou. – rosnei de volta, batendo em seu peito. Ele afastou o microfone e segurou minhas mãos com facilidade.

-Eu te enganei? Ou será que foi a sua necessidade de aparecer, Penny Stardust? – ironizou. Aquilo não tinha nada a ver com Penny e tudo o que ela significava.

-Meu nome é Brooke Daniels, seu babaca, e irá se lembrar de mim pelo resto da sua vida miserável. – acertei-o com um direto de esquerda no nariz. Ângelo largou o microfone instantaneamente, amparando o sangramento. 

Bancar a donzela indefesa no alto da torre nunca foi muito a minha cara; o grande salão parecia pequeno demais para todos os sentimentos ruins que borbulhavam dentro de mim. Raiva, frustração, medo; tudo misturado em um imenso caldeirão que fazia cada fibra do meu corpo querer estraçalhar a primeira coisa à frente. Infelizmente, para Ângelo, ele e seu smoking caro eram a coisa mais próxima de mim.

-Eu quero que você veja o meu rosto – disparei outro soco, dessa vez em sua boca. – nos seus pesadelos. Quero que você – outro golpe, novamente no nariz. – chore como uma criança quando eu acabar com você!

Era um prazer estranho agir como uma besta, completamente irracional. Ângelo se defenderia facilmente se quisesse, mas a adrenalina era tanta que se ele me socasse, eu não sentiria. A plateia estava dividida, gritando e apostando pelo simples prazer de fazê-lo; era um ringue desleal, mas extremamente satisfatório.

-Saiam daqui! – gritei para as meninas, que incitavam em interferir. McGregor puxou Evelyn pelo braço e saltou do palco, Amber e Doll a seguiram, mas três seguranças barraram-nas com as costas nos alicerces do palco. – Merda. – murmurei. Ângelo me encarava sádico, como se me desafiasse a ser pior do que era. Cerrei os punhos, com força.

Aquele soco provavelmente quebraria minha mão junto com as fuças daquele desgraçado, mas antes que eu pudesse sequer sentir seus dentes quebrarem, um dos seguranças me segurou pela cintura.

-Me solta! – gritei, esperneando. Não era hora para tirar o doce da boca da criança, cara! O segurança lutava para me manter imobilizada, descendo desajeitado as escadas. Joguei meu corpo para trás, tentando me livrar, mas o infeliz parecia ter o abraço de um urso. Procurei pelas meninas; vigiadas de perto por aqueles três mastins engravatados. – Me solta, porra! – investi uma última vez.

Um estrondo invadiu nossos ouvidos; a porta foi escancarada como que em um golpe de vento.

-Existem duas maneiras de fazermos isso. – não segurei um largo sorriso quando avistei aquelas cinco figuras vestidas de negro adentrando a porta. – Primeira – Andy vinha a frente, com o soco inglês reluzindo em ambas as mãos. -, vocês devolvem as garotas e saímos daqui em cinco minutos. Segunda – enumerou, parando no centro do salão. Jinxx e Christian estavam à sua direita, Ashley e Jake resguardavam a esquerda. -, nós passamos por cima. Eu, particularmente, adoraria dar um jeito na cara feia de vocês.

Meus batimentos aceleraram em segundos; cravei as unhas nos braços do segurança, que achou por bem me soltar. Jinxx olhou piedoso para Sammi, que segurava o choro. Nenhum deles precisava de palavras para dizer o quanto era bom olhar para rostos tão conhecidos. E havia Andy. Seu rosto estava duro, tenso, confiando no bom senso dos presentes; ele olhou diretamente para mim, como se de todas as garotas em vestidos deslumbrantes ali, eu fosse a única. Meu lado apaixonado se iludiu, preferindo acreditar que ele era meu príncipe encantado e destemido, mas quando se prestava mais atenção, era nítido o que pensava. Vim te salvar, Daniels, mas não pense que estou feliz com isso.

Uma gargalhada forçada quebrou o silêncio. Ângelo cuspiu um pouco de sangue no palco e limpou o nariz sanguinolento com as costas da mão; dei um meio sorriso, sentindo-me orgulhosa pelo estrago.

-Adoraria convidá-los a se sentarem, meninos – disse, avançando até a escada onde eu estava. -, mas como veem – ele abriu os braços, indicando o salão. O corpo magro do segurança era a única barreira entre meus pés e Ângelo. -, estamos lotados. Voltem amanhã.

-Engraçado – Purdy tomou a dianteira, aproximando-se da mesa dois. Três rapazes o encaravam com receio. -, essa mesa está vaga. – Ashley virou a mesa e as cadeiras, atingindo um dos ocupantes. As garrafas vazias de cerveja rolaram por baixo das demais mesas. Ângelo respirou fundo. – Viu só?

-Vocês são só cinco frangotes, não vão destruir o meu clube, seus fedelhos! – Ângelo esbravejou, descendo rapidamente. – E ainda por cima usam maquiagem! – provocou. Todos gargalharam como em um show de piadas.

Biersack sorriu junto, sobrepondo as outras vozes. Os ocupantes pararam aos poucos, observando o garoto vestido de negro que gargalhava de alguma piada sádica.

-Você escolheu a segunda opção, não é? – Andy disse, apanhando uma garrafa com um pouco de uísque. – Espero que esteja pronto.

Biersack não deu tempo para qualquer reação; jogou a garrafa na cabeça de Ângelo e virou a mesa.

Foi como entrar no olho de um furacão. Os seguranças e alguns clientes tentavam se manter firmes, mas acabavam sucumbindo à catástrofe. Garrafas, cadeiras e mesas voavam de nossas mãos; Ângelo, ainda zonzo pela garrafada, era chutado de um lado para o outro. Selvageria. Liberdade. Estranha sensação de poder. O caos era divertido; me fazia bem ver como os meninos socavam cada um dos riquinhos babacas que ainda tentavam nos comprar. Ah, como era bom sentir minhas mãos afundando na cara daqueles nojentos! Eu me sentia no auge de toda a raiva, no ápice da violência de um bom filme de ação. Até mesmo Evelyn com toda a sua fragilidade, não hesitava em quebrar uma cadeira em quem a tentasse tocar. Destruição, para qualquer lugar que olhasse.

-Saiam do meu clube! – Ângelo gritava, histérico, amparando-se em uma pilastra. – Sumam daqui! – gritava. – Deixe-os passar, deixe-os passar! – pedia.

Christian correu em direção a Annie, abraçando-a fortemente e levando-a para fora. Ashley e Evelyn. Jinxx e Sammi. Jake correu a frente, sinalizando para que Marcos, que aguardava na van, se aproximasse.

Parei, próxima a porta, encarando Ângelo. Seus olhos pareciam dois vulcões, cuspindo lavas de ódio e repulsa.

-Espero que tenha entendido que nosso custo é um pouquinho alto para o seu clubinho! – gritei, recebendo restos dos móveis em resposta. - Da próxima vez em que quiser nos ver, nos procure no inferno. – fiz questão de cuspir exatamente em cima do tapete com o logo do clube.

Andy esbarrou em mim, arrastando-me pelo braço.

-Eu nem sei por onde começar, Daniels. – rosnou.

 Os níveis de adrenalina em minha corrente sanguínea eram altíssimos; eu pulava e gritava qualquer coisa, apenas para ouvir os protestos dentre os destroços das mesas e cadeiras. Virei-me para a van, mas antes que eu sequer cogitasse a hipótese de entrar, Sammi saltou de dentro do veículo e me acertou um soco no estômago.

-Mas que porra...! – disse, quase sem ar.

-Você quase nos matou! – devolveu, vindo em minha direção. – Sua cadela egoísta!

-Ei, ei, ei! – o roadie interveio, pondo-se entre nós. – Quero deixar claro que não tive nada a ver com isso e não apoio essa porcaria de ideia, seja ela de quem for, mas caso não tenham percebido, nós precisamos ir! Vamos resolver isso no hotel como seres humanos que somos, ok? – expôs. Doll respirou fundo.

-Tira ela da minha frente. – murmurou, entrando na van novamente.

-Parece tão satisfeita. – Biersack assuntou. O roadie colocou uma mão em seu peito, barrando-o.

-Vamos resolver isso no hotel, já disse. – instruiu. Marcos abriu a porta da frente da van e me empurrou para dentro da mesma. – Eu juro que quero te internar, menina. Eu juro! – resmungou, assumindo seu lugar.

Não era preciso ter uma super audição para saber do que se falava nos bancos de trás. O êxtase e toda a excitação se esvaiam junto aos fluídos do motor à medida em que Marcos acelerava. Abrimos uma boa distância de Ângelo e seu clube nojento, mas ainda havia a pertinente sensação de que mesmo que cortássemos o estado, não estaríamos a salvo. Algo parecia morrer dentro de mim e tudo parecia perto demais. Observei a rua pouco movimentada e foi o suficiente para me sentir murchar. Eu não poderia chamar aquilo de deslize.

-Não sei o que seria de nós se não tivesse aparecido. – admiti em um sussurro.

-Para falar a verdade – Marcos dizia sem tirar os olhos da avenida. -, eu acharia um exagero se aquelas mensagens viessem de qualquer uma de vocês – o roadie virou à esquerda, adentrando a rua larga e bem iluminada do hotel. -, mas Evelyn jamais pediria socorro à toa.

-Não planejei nada disso. – rebati. Dizer aquilo em voz alta soava como um pedido de desculpas inconsciente, mas ainda não era o bastante para me fazer sentir menos infeliz.

-Não adianta muito me dizer isso – Marcos contrapôs, sinalizando para adentrar a garagem. -, não muda nada do que aconteceu.

Eu não sabia muito sobre Marcos além do que contara aquela noite no hospital, mas até mesmo ele, sempre preso em seu mundo de seringas e Fleetwood Mac não fazia muita questão de esconder a decepção. À gregos e troianos, eu provocava um sentimento comum.

Quando o roadie estacionou em nossa vaga e o motor fora desligado, senti a corda em meu pescoço apertar. A brisa fria e a noite silenciosa após a tormenta, davam todos os sinais necessários de um desastre eminente. O tipo de noite em que os arrependimentos sufocam as alegrias.

Desci da van sem me preocupar se seria atacada novamente por Sammi. Meu coração pulsava em cada extremidade do meu corpo e o gosto amargo da culpa me fazia buscar por ar como um peixe fora d’água. Passei apressada pela recepção, percebendo vagarosamente os olhares confusos de alguns hóspedes e das recepcionistas; passos tão rápidos quanto os meus vinham logo atrás. Entrei rapidamente no elevador e Andy entrou logo atrás de mim.

-Tenho sangue em minhas mãos e por sua culpa, Daniels. – murmurou, encarando as mãos manchadas de vermelho.

-Estava tudo sob controle, Biersack. – murmurei, afastando-me o quanto podia à medida em que o elevador tornava-se cheio.

Os pensamentos de minhas companheiras e meus amigos eram tão nítidos quanto os olhares gélidos e raivosos de cada um deles. Comecei a suar, tensa. Nem mesmo em Plutão eu fugiria de todas as acusações engasgadas na garganta de cada um deles.

-Eu quero te matar, Daniels. – Annie sussurrou, cerrando os punhos.

Muitas mentes no mesmo lugar me deixavam acuada como uma criança medrosa. Onde estava toda a coragem que mostrara no clube? Onde estava Penny quando eu precisava ficar inteira? Àquela altura, não me surpreenderia que até minha sombra me abandonasse em meio a vergonha.

Deixar aquele elevador fora como caminhar de olhos vendados entre dois imensos desfiladeiros; distância pequena no tamanho, mas estupidamente mortal. Fui à frente, na ilusão de que se chegasse antes de todo mundo e pedisse desculpas, não arderia na fogueira, mas o devaneio não durou muito.

-Que merda vocês têm na cabeça? – Jake gritou assim que entrou no quarto. – Foram parar na porra de um bordel!

-Ah claro! Pedimos por isso a vida toda! – Amber esbravejou, avançando contra Pitts.

-Parou, parou, parou! – Marcos interveio, separando-os e correu para fechar a porta escancarada, para deleite de todo o corredor. – Nós somos maduros o bastante para resolvermos isso sem chegarmos as vias, de fato. – argumentou. – Jake – apontou o guitarrista. -, não se meta nisso. Você e os meninos só estão aqui por que tem participação nessa confusão toda. E, meninas – indicou-nos. -, podem começar quando quiserem.

Pressão. Estávamos divididos como nunca estivemos – todos nós. Eu seria atirada aos leões sem sequer conseguir correr. Annie e Sammi me encaravam com genuína raiva; Amber não se importava em deixar-me ver como seus sentimentos por mim morriam brutalmente e Evelyn parecia não acreditar na noite que estava tendo. Atrás de cada uma delas, com suas pinturas de guerras, estavam os meninos. Me vi novamente no pátio da escola, mentindo para Ashley para proteger Jack.

Andy mantinha-se distante, estranhamente calmo, como se soubesse desde o início que aquele dia chegaria. Era o meu apocalipse e não havia nada de glorioso nele.

-E então? – o roadie incitou uma continuação, colocando-se entre nós.

-Não é claro para você? – Andy questionou. – Brooke foi impulsiva de novo, é simples. – expôs, cruzando os braços.

-Que parte do não é da sua conta, você não entendeu? – o roadie devolveu. – Até que alguém me explique o que realmente aconteceu, estou assumindo que todos são inocentes.  – Annie sorriu, nervosa.

-Na boa, Marcos, vá se foder. Só uma de nós seria tão estúpida. – Annie rebateu, olhando-me fixamente.

McGregor ergueu-se como um paredão entre mim e o restante da banda. Andy ali, tão próximo, não ajudava em nada meus impulsos assassinos.

-Você pode me acusar do que quiser, McGregor, mas nunca terá a minha coragem. – murmurei. Respirei fundo. – Recebi uma proposta enquanto esperávamos Loren para um show particular, eu aceitei e deu errado. – expliquei.

-Esqueceu de mencionar a parte em que aceitou sem nos consultar! – Annie completou. – Por que não diz logo que foi egoísmo?

-Porque fiz pensando na Stormy, como em tantas outras vezes! – gritei de volta.

-Você quase nos vendeu! – Sammi se pronunciou e só não me socou pela segunda vez porque Jinxx a segurou. – Não fez absolutamente nada para impedir isso!

-Olha bem para as minhas mãos, Doll! – mostrei-lhe o dorso dos dedos, manchados de sangue e de todas as coisas que tínhamos destruídos. O bom senso não estava a meu favor. – Diz olhando na minha cara – insultei, batendo em meu próprio rosto. – que eu não defendi cada uma de vocês!

-Não tente colocar a culpa em nós por um erro seu, cretina! – Sammi esbravejou. Marcos e Jinxx esforçavam-se para nos manter longe.

-Enquanto vocês choramingam pelos cantos quando algo sai errado, sou eu quem dá a cara a tapa! – desabafei, atirando um vaso de flores artificiais do outro lado do quarto. – Fui eu quem passou noites em claro compondo aquelas músicas! Foi o meu rosto que estampou os noticiários quando eu quase morri naquele palco e vocês não continuaram sem mim pelo bem da banda! É o meu nome que a multidão grita! O meu!

Amber me atingiu com um tapa no rosto, acompanhada de perto por Annie, orgulhosa de sua atitude.

-Você pode fazer o que quiser com a porcaria da sua vida, mas não vai foder com a minha banda. – Annie pontuou. – Nenhuma de nós é obrigada a te coroar só porque sua mãe não te aceita e porque sobe ao palco todas as noites.  Stormy Guillotine é minha -  continuou. -, é o sonho do qual eu deixei que fizesse parte. Nem o nome de Penny Stardust te pertence. Não se ache dona de nada.

Não tive forças para erguer minha cabeça e encará-la como queria. O silêncio dos demais era prova suficiente de que concordavam com Annie. Cabisbaixa, vi Andy virar o rosto, enojado por ter optado por alguém que valia tão pouco.

-Annie, não precisa de tudo isso. – Marcos tentou acalmar os ânimos.

-Está enganado. – Evelyn falou, deixando a proteção de Ashley e colocando-se ao lado da guitarrista. – Brooke nos levou sim a lugares que, talvez, jamais chegássemos sozinhas, mas ela corta as asas que ela mesma nos dá. Eu acho que – soluçou. – já passou da hora de termos essa conversa.

Não notei o quanto tremia até ouvi-la dizer, a seu modo, que desistia de mim. Reuni o que me restava de orgulho e os olhei. Estar naquele banco dos réus, sem defesa alguma, não era justo, mas sabia que merecia; por todas as vezes em que nos escondemos atrás das máscaras, fingindo que estava tudo bem quando, nos bastidores, estávamos desmoronando – fosse por um mal entendido, fosse pela saudade de casa. Eu já tinha lutado rounds demais naquela noite.

-Isso começou a ruir quando você se fechou em seu mundo, Brooke. – Amber avaliou. Marcos libertou Sammi e instintivamente um círculo se formou ao meu redor. A plateia pronta para testemunhar a tragédia.

-Nós somos nossas próprias companhias ou está conosco ou contra nós. – Doll completou.

Meus olhos se encheram de lágrimas. Quantas vezes quis despejar as coisas que sentia! Mas será que Amber, que até então nutria sentimentos por mim, suportaria me ouvir chorar por todas as vezes em que Andy me fez sentir tão diminuta quanto pó? Será que Annie, que obrigatoriamente se enchia de morfina para não agonizar, compreenderia minha necessidade em encher minhas veias de heroína para não sentir medo?

-Eu não queria que nada disso acontecesse. – choraminguei. Por favor, não me olhem.

-Não aconteceria se tivesse confiado em nós. – McGregor contrapôs, com a voz trêmula. – Se não confia o suficiente nas pessoas com as quais tem convivido nos últimos meses, não sei se deve continuar.

Olhei-a, boquiaberta. Meu peito apertou como se tentasse proteger meu coração de vidro de ser estilhaçado de novo. Suava frio, ignorando a sensação ruim que engolia minha mente. Eu não fazia ideia do que se passava atrás daqueles olhos negros, mas torcia de antemão para um fim não tão doloroso.

-Não faça nada do que possa se arrepender depois, Annie. – Christian alertou, colocando uma mão sobre seus ombros.

-E-eu posso consertar isso, sabe que posso. – argumentei com a voz embargada.

-Eu sei disso, sei do que é capaz. – Annie disse, séria. McGregor fitou Christian carinhosamente, como se pedisse desculpas. – Há uma centena de coisas que eu gostaria de te dizer, mas você não me veria da mesma maneira – morfina. Quanta ingenuidade a minha achar que somente eu e Andy tínhamos um revólver apontado um para o outro. – e eu quero que saiba que é necessário e, se quiser me julgar, que seja pelo que vou fazer agora.

McGregor se aproximou. Meus nervos queimavam, querendo abraçá-la e lhe pedir desculpas por não ser uma boa amiga, mas tudo o que conseguia fazer era me arrepender de cada escolha errada na vida.

-Annie, por favor... – chorei.

-Você pode sim se reerguer, mas não hoje e não na minha banda. Eu quero você fora.

Uma bala me atravessou. A surpresa tomou conta de todos no quarto. Perdi a fala, a sensação do chão impecavelmente limpo sob minhas botas.  Marcos, cabisbaixo, tocou o braço de Annie; ela se esquivou, como se o mais singelo toque lhe causasse dor. O roadie deu um longo suspiro e, de repente, eu sabia que era um adeus.

-Acho que temos uma votação. – anunciou, abrindo espaço para as demais. Olhei para Andy, procurando por ajuda, mas não havia nada ali. Surpresa, revolta... Nada.

-Eu tentei de todas as formas que podia – Sammi foi a primeira. -, tentei ser a melhor amiga que conseguia, a melhor companheira de banda, mas não dá mais. Eu voto para que saia, Brooke.

Sufoquei um grito. Amigos de verdade não abandonam, Brooke.

-Acho que é o bastante para você, Daniels. – Winks votara.

-Amber... – sussurrei. Ela passou rapidamente por mim, deixando o quarto. Por um átimo de segundo achei que seus sentimentos sobrepunham sua razão. Para variar, eu estava errada.

Meu último recurso era Evelyn; a doçura da garota de cabelos verdes era poderosa o bastante para me redimir? Mas, quando Clark segurou a mão de Annie e me olhou já aos prantos, arrebentou o último fio de esperança.

-Tchau, Brooke. – tão logo disse, Evelyn correu novamente ao encontro de Ashley, que a abraçou fortemente, abafando seu choro contra seu peito.

Estava acabado. Todo o martírio, todas as barreiras construídas entre Alysson e eu e todas as vezes em que senti pertencer a algum lugar. Eu estava fora da Stormy.

-Eu errei, eu sei! – finalmente consegui falar, tão abalada que quase não me reconheci. – Me desculpem por ter escolhido errado, me desculpem por achar que não me entenderiam. – choraminguei. – Mas, nós prometemos que ficaríamos juntas.

Jake e Christian passaram em silêncio por mim, logo depois, Evelyn e Purdy. Marcos se deteve por um momento, com os olhos marejados.

-Não estava ao meu alcance, me desculpe. – justificou, seguindo os outros.

 Jinxx abraçou Sammi que pareceu hesitar antes de me dar as costas também. McGregor fora a última; ela parou a minha frente, deu um longo suspiro e piscou rapidamente, forçando as lágrimas a não saírem. Eu não tinha o menor controle sobre o que fazia. Talvez chorasse. Talvez sorrisse. O emaranhado de emoções e a sensação de perda faziam de mim um ser inanimado, mas extremamente machucado.

-Guarde suas coisas, arrume todas as suas malas. Vou pensar no que fazer e no que dizer a Michael ainda hoje. – justificou.

-Mas, e os shows? Temos uma reunião amanhã. – lembrei-a, tocando-a inconscientemente. Annie se afastou.

-São compromissos da banda e você não faz mais parte dela. – devolveu. – Quando voltarmos, não quero te ver aqui. Pode pedir ajuda para Ângelo, para quem quiser. Penny Stardust e Brooke Daniels não são mais problema meu. – Annie seguiu em direção ao corredor.

Nunca despenquei tão violentamente. Todos os sonhos pelos quais lutei tinham tanto valor quanto os cacos daquele vaso. Me restava apenas me ajoelhar e chorar.

Biersack silenciosamente fechara a porta que Annie deixara escancarada; sentei-me na cama, encarando as malas amontoadas próximas ao criado mudo da direita.  Tudo o que eu tinha cabia em duas malas e uma mochila. Deprimente, assim como eu.

-Não precisa ficar – disse, de costas para Andy. Apanhei a máscara vermelha jogada sobre um dos figurinos. -, não me importaria se ficasse com os outros. Já apanhei o bastante.

-Você está no chão, Daniels, não posso te fazer descer mais, mesmo que quisesse. – rebateu, sentando-se do outro lado da cama. Chegava a ser irônico que não fosse o primeiro a me atirar pedras.

Não dei atenção a sua provocação barata; era uma questão de sobrevivência tirá-lo do topo da minha lista.  Como Michael reagiria? Logo ele que apostou tanto em nós! O que Jack diria quando soubesse que a fama de traidora de sua irmã não era infundada?

Nós não mais dominaríamos o mundo; não mais mostraríamos as garotas que não eram obrigadas a aceitar submissão, que poderiam morder e chutar qualquer babaca que tentasse dizer o contrário. Não mais lotaríamos estádios inteiros ao redor do globo. Não éramos mais Stormy Guillotine.

Nós sequer éramos amigas mais.

-Ficar não significa que não estou decepcionado com você. – Andy puxou assunto. – Não significa que não ache merecido o que te aconteceu hoje, que te ache menos inconsequente por ter socado aqueles caras.

Biersack prosseguiu com seu sermão, mas eu nem ouvia. Enquanto ele falava, ainda de costas para mim, eu só conseguia olhar aquela máscara e rolar em uma avalanche emocional. Penny era uma mentira. Uma cômoda mentira. Fingir que era outra pessoa quando perdia o controle parecia mais aceitável do que admitir que não era a filha perfeita, a garota mais inteligente ou a irmã mais dedicada. No fundo, talvez, tivesse medo de não ser uma coisa só.

-Por que insiste em se atirar na direção errada, Brooke? – de todas as coisas em que poderia ter prestado atenção, aquela fora a única capaz de me trazer de volta. Coloquei a máscara novamente sobre as roupas, descansei os braços ao lado do corpo e encarei a janela aberta.

Definitivamente não era para sentir a adrenalina correndo no sangue ou pelo suspense até descobrir se estava certa ou não. Eu era uma medrosa de merda.

-Não tem que fazer nada disso. – insisti. Fitei minha mão esquerda e esfreguei com força o sangue e a sujeira. Honestamente, um tornado parecia ter passado por mim. Perder a Stormy e minhas amigas de uma vez era um pouco mais do que podia suportar. A separação abrupta fez lágrimas de ódio brotarem em meus olhos. – Me deixe sozinha.

-Não vou sair. – Andy insistiu. Me levantei, nervosa. Biersack também se levantou, encarando-me sério do outro lado do colchão.

-Não estou em um bom momento, Andy. – minha voz não vacilou, mas os olhos não seguraram as lágrimas lentas e pesadas. Cerrei os punhos, frustrada por mostrar fraqueza na frente dele outra vez.

-Tudo o que você menos precisa agora é ficar sozinha. – rebateu. Sorri, irônica.

-Estou me quebrando em uma centena de pedaços agora e há uma dezena de coisas queimando dentro de mim. – disse, entredentes, socando meu próprio corpo. Autopunição realmente aliviava. – Sabe o que parece no fim das contas? – me vi gritando sem qualquer motivo. – Parece que finalmente sou a rainha do baile! – joguei os braços para cima, desesperada. Eu mal conseguia enxergar Andy com todo aquele choro guardado. – Não a princesa all-star que Juliet sempre almejara, mas a rainha! Tenho o vestido mais caro, o garoto mais bonito do colégio, mas ninguém ficou na porra do meu baile!

Gritava porque não podia pedir socorro. Biersack não movia um músculo, assistindo indiferente a minha ira. O peso em mim ficava mais suportável com os gritos, mas alguma outra parte ficava à flor da pele.

-Eu sei como se sente. – Andy murmurou, baixando rapidamente o olhar.

-Já te mandei embora, pode ir! – insisti, me perguntando porque não sentia ironia no que dissera.

-Sei como se sente porque se tornou igual a mim! – Biersack devolveu. Prendi a respiração. Olhar naqueles olhos, de repente, tornou-se impossível. À medida em que Andy se aproximava, receoso, eu me via cada vez mais nele. A maneira como os cabelos ficavam jogados no rosto, a sutileza com que apertava o olhar às vezes, exatamente como um espelho. – A raiva, o desespero, a angústia, essa sensação de que seu corpo é pequeno demais para as coisas que está sentindo. Eu já estive aí. – disse, parando a minha frente. – Já estive na beira do precipício em que está agora e você não sabe se pula ou volta para tentar mais uma vez.

-Não me compare a você. – sibilei.

-Você estava lá quando eu quis pular, Brooke. Agora eu entendo o quanto era desesperador para você não me ver sorrir. – continuou, pegando minhas mãos feridas. O sangue que resistia no soco inglês marcou novamente minha pele. – Não consigo olhar para você agora, tentando engolir o choro e me convencer que é a mesma garota. Sentir é o que nos faz humanos. Se lembra disso? Ou mentiu para mim?

Havia algo além da expulsão da banda. Tinha a confiança quebrada e a necessidade de tentar justificar toda a tristeza. Debaixo de tudo isso, eu ainda achava um absurdo me permitir sofrer de peito aberto. Não tinha obrigação em ser forte – não mais –, de arrumar minhas coisas e sair como se não quisesse desesperadamente ficar. Eu não tinha que ser racional.

-Eu vi o abismo – sussurrei, encarando nossas mãos unidas. -, fui ao lugar em que os heróis vão para morrer. É frio e escuro, e mesmo que você não queira, deseja desesperadamente o sol porque – solucei. – é a única coisa que te faz sentir vivo.

Andy enxugou uma das minhas lágrimas que insistiu em sair fora de hora. Biersack se aproximou, a poucos centímetros de um caloroso abraço; ele levantou meu rosto para si devagar.

-Você acha que é o mal nesse mundo, Brooke, e que tudo o que você faz é fruto do caos, mas está errada. – explicou. – Você é a inocência.

Suas palavras me tomaram de assalto, como o perdão divino a quem fora um pecador a vida inteira.  Fechei os olhos, deixando as pequeninas gotas salgadas saírem de mim como bem entendiam. Andy fechou seus braços ao meu redor, enquanto eu escondi o rosto em seu peito sem ter forças sequer para correspondê-lo. Sentir seu calor contra meu corpo frio naquela noite me trouxe de volta a tempos felizes – tempos só nossos, secretos e infinitos.

-Eu não vou te dar as costas agora – reconfortou-me. -, simplesmente não consigo, mesmo sabendo que o que fez não foi bonito. Fico a seu lado porque ficou do meu tantas outras vezes. Chame como quiser, diga que estou fazendo isso pela música e pelo rock ‘n’ roll. Eu chamo de lealdade.

Me peguei lamentado por feridas que julgada cicatrizadas há muito tempo. Aquele desabafo era pelo filho que nenhum de nós seguraria nos braços, pela família perfeita que não formaríamos e pelos momentos bons que trocamos por brigas e gritos. Se eu fosse chorar até sentir-me pura outra vez, levaria outra turnê inteira.

Andy era, pura e simplesmente, minha salvação em meio ao oceano de lamúrias; a força capaz de me trazer do fundo desse mar. Era irônico – e até surpreendente – que tivéssemos trocado de lugar sem nem perceber, mesmo depois de todos os abandonados, físicos e emocionais, ainda estávamos de pé um pelo outro.

-Não era para ser assim, Andy, não era para ninguém sair machucado. Eu não queria fazer mal para ninguém. Ai. – continuei, aos prantos.

Meu corpo estava mais do que exausto, mas ainda queria chorar até secar. Funguei, forçando meus batimentos cardíacos a acompanharem o ritmo suave de sua respiração. Ficar naquele quarto relembrando tudo o que Annie dissera, fazia minha cabeça doer.

Andy cantarolava baixinho, embalando meu corpo no seu como quem deseja afastar a angústia e o medo. Repeti mentalmente infinitas vezes a mim mesma que tudo aquilo não passava de um pesadelo, que se fechasse com força os olhos, quando os reabrisse, ainda veria cada uma das minhas amigas adormecidas, esperando pela próxima apresentação. Confesso que fiz isso, infelizmente, o quarto continuava quase vazio, envolto por uma névoa de coisas não ditas.

Três batidas rápidas na porta chamaram nossa atenção. Me agarrei mais a Andy, preparando-me psicologicamente para ser escorraçada; Biersack franziu o cenho, olhando fixamente para a porta. Mas fora Marcos quem a entreabriu.

O roadie parecia cansado, com tímidas olheiras formando-se nos olhos. Ele espiou, certificando-se que não seríamos pegos. Receoso, Marcos entrou e fechou a porta logo atrás de si. Fitei-o, acuada no abraço protetor de Andy. O que mais aquele viciado poderia querer comigo?

-Vim ver se precisava de alguma coisa. – assuntou, aproximando-se.

-Consigo carregar minhas malas sozinha, não preciso de ajuda. – devolvi, separando-me de Andy. Eu sabia que Marcos não tinha culpa, mas isso não mudava o fato de que ele também cruzara aquela porta.

-O mínimo que poderia fazer era alugar um quarto para ela. – Andy sugeriu.

-Não precisa. – recusei, me dirigindo novamente as malas. Marcos me seguiu, afastando minha bagagem do meu alcance. Encarei-o, indiferente.

-Pode ficar na van, se quiser. Eu ficaria bem mais tranquilo sabendo onde você está. – pediu.

-Bela maneira de compensar. – Andy bufou. Continuei a encarar o roadie, que parecia angustiado com a minha partida. Não é que eu queira ir, Marcos, é que não posso ficar.

-Eu deveria ter preparado vocês para isso. – murmurou, abrindo caminho. – Não fui um bom roadie e nem um bom amigo. Eu não vi onde estavam quebrando.

-Mas não estava ao seu alcance, é você disse. – lembrei-o, apanhando minhas coisas. – Nada disso é sua culpa, não se torture por isso.

-Resolva isso amanhã – o roadie pediu, pegando meu braço. -, deixe que Annie diga a Michael o que ocorreu. Fique na van, eu resolvo tudo aqui.

-Eu não vou contar nada a Wills, mesmo estando fora, eu não sou uma traidora. – pontuei. A todo instante, eu desviava meus pensamentos das seringas carregadas de heroína. Ser chutada não significava que eu contaria a alguém os segredos do roadie ou os de Annie. – Não tem com o que se preocupar. – tentei continuar, mas ele me segurou com força.

-Eu diria isso a minha filha se pudesse. – disparou. – Fique onde eu sei que está segura.

Não parecia a boca de um viciado que falava, arriscaria até a dizer que Marcos nunca estivera tão sóbrio. Por um momento, eu achei que deveria contar, que já que iria embora, pelo menos podia lhe dar um pouquinho mais de esperança de dizer-lhe que, se minha intuição maluca estivesse certa, sua filha estava bem mais próxima do que ele pensava. Olhei para Andy, que procurava sentido nas palavras do roadie, mas visivelmente considerava válida a ideia de não dormir na rua.

-Tudo bem. – cedi, muito mais pelo pai desamparado que Marcos era do que pelo apelo em si. – Mas, amanhã eu vou embora.

-Tudo bem, tudo bem. – concordou, tirando as malas das minhas mãos e colocando-as junto as outras novamente. – Acho que não vamos nos meter em problemas se precisar levar algum cobertor. – levantei a mão, em recusa.

-Não estou indo para nenhum acampamento, Marcos. Não quero nada. – cortei.

Passei pelo roadie sem ceder ao impulso de olhar para trás. Andy estava ao meu lado, silencioso como um túmulo.

-Não sabia que Marcos tinha uma filha – assuntou, aguardando-me no elevador. – e muito menos que isso tivesse tanta influência sobre você.

-Ficaria surpreso com os segredos que guardo como se fossem meus. – resmunguei, apoiando-me em seu ombro enquanto descíamos.

Nos primeiros cinco minutos daquela briga, eu ainda acreditava que Annie só estivesse me dando uma lição, mas depois de um tempo, aceitar que ela falava sério fez com que sua atitude fizesse mais sentido. McGregor estava protegendo ao restante de nós das insanidades que eu poderia fazer e, de certa forma, eu precisava agradecê-la por ter me feito parar e olhar para dentro de mim.

Stormy Guillotine poderia nunca sair do underground, mas seria para sempre a melhor banda do mundo para mim, mesmo que eu não fizesse mais parte dela; mesmo que Kristen voltasse a assumir o microfone ou que cada uma seguisse seu rumo. Eu nunca esqueceria do quanto nós éramos vibrantes.

Atravessamos a recepção do hotel sem pressa. Meus olhos vasculhavam todos as pequenas áreas comuns, buscando pelos meus ex-companheiros de estrada, mas nem sinal deles. Quando pisei no estacionamento, foi como se o hotel logo atrás de nós sumisse como poeira.

-O que acha que Michael vai dizer? – assuntei, abrindo a van. Marcos não trancar a van era um presságio. Sentei na porta; Andy sentou-se ao meu lado, apertado com aquele tamanho todo.

-Se quer mesmo saber, não acho que Annie teria coragem de contar – arriscou. – e mesmo que tivesse, acho que ele não acreditaria. – fitei-o.

-Para onde eu vou? – choraminguei. – Se eu já não tinha onde ficar quando a turnê acabasse, imagina agora. – observei. – Não vou voltar com o rabo entre as pernas para Alysson.

-Dê um passo de cada vez, por favor, às vezes não consigo acompanhar seu raciocínio. – brincou. Sorri involuntariamente. Apesar do cansaço e dos arranhões no rosto, Andy parecia estranhamente satisfeito em deixar o conforto do hotel para se apertar naquela van comigo.

-O que você fez hoje, ficando do meu lado ... – sibilei, enrolando a barra da camisa nos dedos, sem graça. – Foi muito importante para mim.

-Meu esporte favorito é mostrar que está errada, Daniels – rebateu, passando o braço por meus ombros. – não poderia perder essa chance. – sorri com um pouco mais de vontade.

Em meio a toda aquela merda e de todas as questões realmente importantes com as quais eu deveria me preocupar – como voltar para Ohio e conseguir um teto, por exemplo – me peguei pensando em como parecíamos ali, tão próximos. Me vi tentando fazê-lo sorrir de novo, provocando-lhe cócegas e fazendo piadinhas sem graça, mas tinha que admitir que ficava mais apaixonante quando era ele quem o fazia. Me recostei em seu ombro, entrelaçando meus dedos aos seus.

-Acho que isso é algum tipo de, hum, sinal maluco, sabe? – assuntei. – Um sinal do universo para que eu reescreva algumas partes da minha história, para que não seja tão pavio curto.

-Eu não gostaria dessa Brooke sem graça, ah não. – zombou. – Eu acho que o que você precisa é uma nova aposta. – balancei a cabeça, desacreditada.

-Não é hora para isso, Andy. – repreendi.

-O direito de ser inconveniente não é só seu, sabia? – respondeu, dando-me um leve beliscão na coxa. – Se até o fim dessa turnê você não se meter mais em encrencas, eu te digo como verdadeiramente me sinto em relação a você. Se tiver que te tirar de mais um apuro como o de hoje, você me diz, pelo resto de seus dias, o que sente por mim.

Separei-nos, olhando-o pasma por tanta audácia. O que aconteceu com o rapaz que compreendia minha dor cinco segundos trás?

-Sabe que essa aposta não faz sentido algum, não é? – pontuei. – Eu estou fora, então, tecnicamente, posso fazer quantas merdas eu quiser.

-Fico feliz que tenha aceitado.

-Mas eu não aceitei nada! – protestei.

-Eu aceitei por você e não se preocupe, você vai ficar. – disse. – Ainda não superei Penny Stardust e não seria honrado da parte dela desistir agora.

Tencionei rebater, mas pareceu mais tentador começar as reescrever as páginas queimadas da minha vida a partir daquela noite. 


Notas Finais


Olha, eu não vou nem me pronunciar sobre os próximos aqui, mas já adianto que toda essa desgraceira foi necessária. Quero palpites dignos de teorias da conspiração nesses reviews, hein?!
Vou respondendo os reviews ao longo da semana e tentando trabalhar no próximo já.
xoxo


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