1. Spirit Fanfics >
  2. British Sin >
  3. Capítulo Único

História British Sin - Capítulo Único


Escrita por: May_Nimmy

Notas do Autor


(créditos da capa da fanfic e da capa do capítulo nas próprias imagens)
Obs: Capa do capítulo para aflorar a imaginacão de vocês quanto às vestimentas do kook e do jimin, mas imaginem roupas em tons escuros (marrom, branco e preto) e mais pobrinhas :v

Olá... Cá estou com a segunda oneshot do universo de Era Vitoriana que eu criei adka;sldka;sld A primeira one foi British Affair, com Namjoon e Seokjin, essa daqui, como vocês já puderam ver, é Jimin e Jungkook.
Aliás, no meu teclado do pc novo não tem cedilha, por ser estrangeiro, então se acharem palavras sem o cedilha, me desculpem, eu tentei corrigir todas na edicão, mas é bem foda q
E a sinopse tá uma bosta, pq como sempre eu deixo pra fazer de última hora

Lembrando que, eu, de forma alguma, sou a favor da pedofilia ou algo do tipo; visando isso, a classificacão está como +18 apenas por se tratar de um romance homossexual.

Capítulo 1 - Capítulo Único


Fanfic / Fanfiction British Sin - Capítulo Único


Farinha, fermento, água e sal estavam contidos em uma massa firme e consistente, a qual era moldada e amaciada por mãos hábeis e minuciosas. O resultado esperado desta mistura de ingredientes era uma assadeira grande e cheia de baguetes prontos para serem postos à venda; contudo, desta receita também fora originado um espirro baixo daquele que a manuseava.
   Atendido pelo nome de Park Jimin, o coreano de estatura baixa e corpo musculoso, colocara a massa para descansar, ganhando poucos segundos de tempo livre para relaxar os braços fartos e admirar seu patrão confeitar um bolo branco naquela mesa comprida e coberta das mais variadas especiarias. Tinha certo apresso pelo chefe; Kim Seokjin era seu nome, um chinês bem mais alto que si, com fios em um tom claro de castanho, característica peculiar para um asiático, os olhos grandes e negros como chumbo e a pele clórica tornavam-no um dos homens mais belos daquele bairro, se não o único. Seria o marido ideal se não tivesse suas estranhezas, como o hábito de dar pausas em seu serviço para apreciar a vista da vitrine com um olhar perdido e cheio de brilho. 
  Tão absorto em sua apreciação, o adolescente mal se deu conta de uma voz preguiçosa e rouca gritar o nome de seu patrão do lado de fora da loja. O solicitado, por estar ocupado demais em suas tarefas, acabou pedindo para que o jovem fosse até a rua, já tendo em mente que a pessoa que o gritara fosse o entregador com suas compras daquele mês. 
  E, como ordenado, tão cedo o coreano caminhava até a calçada ao encontro do chinês que sempre aparecia uma vez por mês na padaria com uma carroça cheia de sacos de caixas. Era baixinho e ranzinza, sempre com uma careta desgostosa na face. Os fios eram aparados em um corte reto e simples, os olhos eram três vezes menores que os de Kim Seokjin, contudo, tal característica lhe caía tão bem quanto os lábios finos e róseos como boneca de porcelana. Todavia, aquilo que mais atraía a atenção para si era a pele branquinha como neve, sem manchas, pintinhas ou sardas. O rapaz, com o nome de Min Yoongi, pouca coisa mais jovem que o chefe do Park, aparentava ser indefeso, se não fosse, é claro, pela língua afiada e certeira que não poupava respostas ácidas para quem quer que fosse. Seria mais belo do que já era se não tivesse o humor amarrado, pensou o mais novo. 
  Percorreu os orbes pela carga na carroceria e não maneirou o semblante cansado apenas de imaginar carregar todos aqueles pacotes pesados nos ombros. Fez sua melhor expressão pedinte e virou-se novamente para o chinês pequenino com um bico nos lábios cheinhos, ganhando em consequência um cenho franzido e questionador. 
— Acho que hoje precisarei de sua ajuda, senhor Min... – Disse todo cheio de receio, pensando na possibilidade de receber uma resposta rude.
  Todavia, ao contrário do que imaginava, o de olhos pequenos somente bufou contrariado e desceu de seu posto na carroça, seguindo até a parte traseira da mesma e alcançando dois pacotinhos simples de açúcar. O Park sorriu com aquilo, pois tinha consciência de que o outro era bem mais magro e fraquinho que si, portanto não conseguiria erguer os demais sacos dali, apenas os menores. 
  Deixando de lado toda a fadiga que contaminara seus poros apenas por vistoriar os pesos que carregaria, encaminhou-se até a carroceria e jogou dois sacos de dez quilos em um ombro e usou a palma esquerda para equilibra-los, tão logo já se dirigindo para o interior do comércio e ajeitando os pacotes de farinha no mesmo cantinho em que Min Yoongi colocara os açúcares. 
  Tão absorto em seu ofício, com muitas idas e vindas da rua até a loja, fora somente na quina ida que o coreano notou estar sendo observado. Eram dois pares de olhos curiosos que, escondidos atrás de um vaso grande de lírios, espionavam-no com um afinco invejável. Encurtou a visão e mirou seu canto inferior esquerdo, constando que, daqueles quatro orbes, dois deles eram caninos e os outros infantis – literalmente falando, pois não eram como os seus, os quais já tinham dezesseis primaveras bem vivenciadas e ainda assim permaneciam perdidas em seus anos de criancices. 
  Não conseguia definir o sexo, mas podia ver que a cabeleira era escura como ônix e a tez dos coelhos de Alice. O miúdo aparentava ter seus oito anos, pensou Jimin. Esgueirava-se pelas flores e folhas frondosas para conseguir um bom ângulo de vigilância. 
  O coreano pouco se importou, a constar pelas vestes maltrapilhas, deveria ser só mais um garoto de rua que se sentiu atraído pelo cheiro dos pães (isso acontecia com muita frequência ali). Sabendo que o outro não faria nada além de observar as delícias da vitrine, já que essa não era tão exposta a ponto de permitir furtos, seguiu com seu serviço, agradecendo por restar somente poucos sacos na carroceria e também achando graça quando a criança tentava impedir o cachorrinho vira-latas de fazer bagunça ou latir e revelar sua espionagem falha. De certa forma, era fofo. 
  Quando finalmente todas as entregas foram postas em seus lugares dentro da pequena cozinha da padaria, o rapazinho se despediu e agradeceu a Min Yoongi que, quando recebeu o pagamento e algumas gorjetas bem avaliadas por parte de Kim Seokjin, assumiu seu posto na carroça antiga e ordenou para os dois cavalos de pelo negro seguirem caminho. 
  E foi por um instante, antes de adentrar novamente a loja junto do patrão, que esse último avistou a criancinha escondida por detrás de seu vaso de flores. Hesitou por alguns segundos, caminhando até à figura miúda com uma calma plena para que nem a criança nem o cachorrinho fugissem de si. 
— Olá... – Disse o mais velho enquanto Park Jimin visava de longe – Qual teu nome? 
  A cabeleira negra se movimentou entre as flores e os dois estrangeiros observara um menino, um miudinho de roupas sujas e rasgadas, levantar-se com um bico nos lábios, todo cheio de marra por terem descoberto seu disfarce tão simplório. O guri, enfezado que só, cruzou os braços finos sobre o peito e bufou irritadiço:
— Oi. Eu não tenho nome. 
— Como não tem nome? Todo mundo tem um! – O chinês não poupou expressões surpresas e logo o Park se aproximou dos dois para saciar a curiosidade sobre o menino.
  Contudo, ao passo que o coreano caminhou até os outros dois, o garotinho arregalou os olhos escuros e corou como os morangos do bolo que estava ao seu lado na vitrine. Agilmente pegou o cachorro vira-latas no colo e saiu correndo dali todo assustado. Assustado pela presença de Jimin, os padeiros constaram. 
  Fora assim primeiro contato entre o adolescente e a criança de rua.

 


  Nos dias que se sucederam, o Sem Nome – apelidado de tal forma pelo próprio Park, que se sentira levemente ofendido quando o outro fugira de si – continuava se escondendo nos vasos de flores da calçada, lançando olhares demasiadamente curiosos loja adentro. O padeiro mais novo gostava de espiar o garotinho também, achava graça no modo como o outro mordia os lábios e enrolava uma ponta de cabelo nos indicadores quando era flagrado por Seokjin, este que se viu apegado ao guri e, sempre preocupado, entregava-lhe um prato de comida todos os dias.
  Park Jimin não poupou os risos baixinhos quando o Sem Nome provou os temperos chineses pela primeira vez e acabou engasgando com a pimenta. O rosto branco avermelhou-se, os olhos lacrimejaram e com um bico nos lábios tentou esconder as tosses que lhe acometiam. Depois daquilo, ficou tão sem jeito que saiu correndo pelos ladrilhos britânicos, fugindo para sabe-se lá onde.
  Mesmo tão habituado à presença do pequenino, o adolescente jamais ousou dirigir-se ao outro. Tinha certo receio... Não sabia com exatidão, mas talvez seu medo se desse ao cogitar que a criança havia recebido moedas para, verdadeiramente, espionar o Park. Seguir seus passos, saber de todo seu cotidiano. Poderia ser um dos mandados de um dos clientes de sua mãe. Já fora enganado da mesma forma outras vezes, as quais, no fim, acabava sem seu salário e com uma faca no pescoço por capangas por quem ele sequer imaginou ter alguma dívida. 
  No entanto, houve aquele dia sem específico em que Park Jimin e Sem Nome, tiveram sua primeira conversa de verdade. Também fora a vez em que o guri surpreendeu a todos que estavam na padaria, desde os clientes até o dono desta. 
  O dia estava mais frio que o comum, anunciando a chegada do inverno europeu. Os senhores do vento estavam animados e, a única proteção do menino de rua era seu melhor amigo, o cão de pelagem cinza por sujeira urbana. Por tal motivo, Kim Seokjin pegou-o no colo e o acolheu dentro de seu estabelecimento, importando-se até em vasculhar o ambiente em busca de um caixote (onde poderia colocar o vira-lata ali, sem que esse perambulasse pela loja) e um cobertor, que não tardou para estar enrolado envolto dos braços finos da criança, fornecendo-lhe um aconchego maior.
  Baseado nas reações anteriores do diminuto, tanto o chinês como o coreano pensaram que ele questionaria tal atitude e agiria com teimosia e orgulho; todavia, Sem Nome estava tão vitimado pelo frio que nem ao menos dissera alguma palavra, contendo-se em se encolher no piso de madeira, bem ao lado de uma prateleira cheia de doces, controlando os espasmos e tremedeiras que lhe acometiam sem perdão algum. 
  Quietinho, o garoto observava o movimento da padaria completamente entretido, atentando-se principalmente na figura de Park, o qual não poupava sorrisos para atender à clientela sempre que o patrão se encontrava ocupado na cozinha. 
  Com uma calmaria costumeira, o dia seguia normalmente, sem grandes alardes. Isso perdurou até o momento em que Park Jimin saiu da cozinha, pela terceira vez naquele dia, com uma assadeira farta de pães recém-saídos do forno, quentes e cheirosos. Em exato instante, os orbes curiosos do menino de rua se encontraram vidrados no adolescente com um brilho que atraiu à atenção de Kim Seokjin. 
  O chinês alto se aproximou do pequeno e dobrou os joelhos para igualar as alturas, não resistindo àquelas bochechas branquinhas e, acariciando-as, perguntou com a voz baixa:
— Está com fome, pequeno? 
  Em resposta, o garoto lhe encarou sério e um pouco receoso, parecia reunir coragem para finalmente dizer:
— Não quero comida, apenas gostaria de aprender os feitiços daquele bruxo! – Em alto e bom som, atraiu à atenção de todos ali como em uma peça teatral que os nobres assistiam.
  Com uma reação em cadeia, os clientes e os dois padeiros se encontraram com os queixos caídos em um semblante geral de surpresa quando o guri ousou levantar o indicador em direção a Park Jimin, referindo-se a ele como um bruxo. 
  Em contrapartida, o coreano franziu o cenho e sentiu um coçar no peito, algo que lhe era totalmente novo. “Primeiro ele fica a me espiar todos os dias desde que surgiu e agora me ultraja de tal maneira diante dos fregueses! Quem esse pirralho acha que é?”, pensou. Não estava, de todo, raivoso, apenas não encontrava razões para que o serzinho agisse desta maneira consigo. Os dois nem ao menos se conheciam, pelo o que Park Jimin pudera se lembrar. 
  Passada toda a surpresa dentro da singela padaria, todos os presentes caíram em gargalhadas pela acusação ilógica feita com tanta ingenuidade. As maçãs coreanas do Park ganharam um tom mais vibrante de carmesim e, nos olhos de Kim Seokjin, uma diversão surgira: 
— Por que chamas meu amigo de bruxo, garoto? – Questionou ansioso por explicações.
— Porque ele é um, oras! 
— Explique melhor... – Um dos clientes se prontificou. 
— Todo dia ele pega um saco de farinha bem grandão e transforma em comida! Todo dia! Ele é um bruxo, como não percebem! O senhor também é um, não é senhor Kim?! – Esclareceu meio emburradinho por ninguém ali considerar sua afirmação. 
 Houve, então, uma pausa. Essa, necessária para que os adultos – e o adolescente estrangeiro – assimilassem o raciocínio do menor e, quando encerrada, mais uma explosão de risadas eclodiu no estabelecimento. Era um encanto pela inocência que as crianças tinham, mas que se volvia embaçada pelas problemáticas adultas tão severas. 
  O menino, ainda com um bico adornando os lábios, tentava compreender a graça em sua fala quando, em um ato inesperado, o até então bruxo tomou-lhe pelas mãos e rumou à cozinha.
  Um arrepio na nuca, as mãozinhas remexendo uma mecha de cabelo, e tão cedo o Sem Nome sentiu o medo tomar conta de si. “Vai me bater! Ele vai me bater por revelar seu segredo!”, repetia em seu interior. 
— Veja bem, não sou um bruxo. Sou um padeiro. – O Park explicou, dobrando os joelhos até que seus olhos estivessem à altura do outro. 
— E o que é isso? – Perguntou completamente atento ao rapaz.
Eu e Seokjin hyung assamos os pães que você vê na vitrine todos os dias. Nós não usamos bruxarias, apenas cozinhamos! – Justificou tranquilamente.
— Eu quero que você me prove, pois! 
— Desculpe-me? 
— Eu quero que você me prove que não é um bruxo. – Insistiu irritadiço. 
  Park Jimin ponderou por alguns segundos antes de alcançar um banquinho velho e coloca-lo rente à mesa que preparavam os quitutes e os pães. Analisou o menininho no fundo dos orbes e gesticulou com as mãos para que ele subisse ali, o que o outro fizera sem pestanejar.
  Percorreu com o olhar por todo o amadeirado, curioso acerca dos diversos ingredientes que jaziam ali. Nunca havia visto aquelas coisas todas; nem os instrumentos para o preparo, nem aqueles condimentos diferentes, sequer sabia o nome daquelas comidas enfeitadas. A instigação aflorando dentro de si para que tocasse e provasse cada uma daquelas delícias. 
— O que é isso? – Perguntou apontando com o indicador para um doce com mel, o qual desconhecia a origem. 
— Um pão doce que o próprio Seokjin hyung inventou... É coberto com mel puro, tem um recheio feito com creme à base de leite e a massa é fofinha e aerada. Prove, é o melhor de todos. – O moreno pegou um dos pãezinhos e levou até a boca do garoto que, hesitante, mordeu um pequeno pedaço do quitute.
  Mastigou devagarinho, apreciando o sabor adocicado que inundava sua cavidade úmida. O coreano observou o alimento descer na garganta alheia, apreensivo sobre a aprovação, ou não, do menino. Degustação feita e a criança já tascava outro pedaço do pãozinho, dessa vez com uma mordida farta, arrancando um sorriso satisfeito nos lábios grossos do mais velho. 
  Bastaram somente mais três abocanhadas para que Sem Nome terminasse de devorar a criação de Kim Seokjin. E uma vez provocada, a barriga vazia do menor passara a resmungar, altiva, pedindo mais daquelas gostosuras. 
— Quer mais? – O Park questionou, recebendo um olhar receoso em resposta. 
  Um aceno de cabeça envergonhado por parte do pequeno e o adolescente já se animava ao separar os doces mais diferentes da loja para que o outro desse sua opinião. Egg tarts, macarons, bolinhos... Nenhum quitute foi esquecido, todos foram provados pelo paladar pobre. 
  Foi uma diversão só, os meninos se volveram animados e o mais velho entre eles, em especial, viu-se enfeitiçado pela risada do garoto de rua. Os dentinhos eram pequenos e contrastavam com os dois dianteiros, os quais eram grandes e brancos, como um coelho. Quando se animava em demasia, mal conseguia respirar, colorindo a pele com um sangue saudável que atiçava os instintos do adolescente ao seu lado.
  Naquele dia, dentro do coração molenga do coreano, um afeto grandioso surgira. O mesmo afeto que também lhe traria tantas desgraças, confusões pessoais e distúrbios, num futuro próximo. 
  Ao anoitecer, quando os estabelecimentos de toda Londres já trancavam as portas e cerravam as janelas, Sem Nome ainda permanecia na padaria; havia permanecido ali, recebendo mimos dos dois estrangeiros e aprendendo a cozinhar com a ajuda de Seokjin. Entretanto, foi no momento em que o chinês mais velho ia apagar as luzes e encerrar o expediente, já despedido de Park Jimin, que um dilema cruel preencheu o interior do Park: deixaria aquele pequenino dormir, mais uma vez, nas ruas molhadas pela garoa insistente que caía na cidade? Não queria, porém tinha consciência de que não era ao todo seguro leva-lo consigo até o cortiço velho em que morava com a mãe. 
  Pensou, pensou. Suspirou duas e piscou cinco, cruzou os braços musculosos rentes ao peito e observou a criança de vestes maltrapilhas se afastar na calçada daquela rua longa e larga. Capturou o ar úmido e bagunçou as pequenas gotas em seu cabelo, não esperou as lágrimas divinas se transformarem em um choro descontrolado, berrou em meio à rua praticamente vazia:
— Ei! Espere! – Colocou as pernas para trabalharem e em tão pouco já alcançava o menino de rua – Se você não tiver um lugar para ficar... Pode vir comigo... – Ofereceu analisando as incertezas do garotinho, que tinha as maçãs marcadas pela coloração escarlate habitual de quando se inclinava à vergonha. 
— Eu posso? – Brincou com os dedos nervosamente. 
  Um “Certamente!” e em poucos minutos os dois inocentes se encontravam frente ao cortiço porco em que Park se abrigava - esse que vigiou muito bem o local antes de levar Sem Nome até sua residência, o menorzinho escondido em seu colo, com o rosto acomodado na clavícula do mais velho, que lhe aquecia do frio que a garoa proporcionou a ambos. 
  As camisas molhadas foram as primeiras a serem jogadas em um canto aleatório da sala de estar do coreano. O rapaz demonstrou certa hesitação antes de despir as calças do pequeno, o qual não ditou uma só palavra desde que decidiram sua breve estadia no apartamento minúsculo do padeiro. As sujeirinhas, que não eram poucas, foram espiadas pelo estrangeiro, que agarrou o corpo diminuto novamente em seu colo e o levou até o outro cômodo, esse que era ridiculamente pequeno e portava duas camas de solteiro, uma penteadeira velha com muitos cosméticos femininos, um baú de madeira e uma banheira circular também do mesmo material – talvez o único móvel de valor dali. 
  A criança fora colocada naquele recipiente enorme e vazio, assumindo um semblante confuso de imediato. Park Jimin, que ainda trajava sua calça e sapatos molhados, mirou-o caridoso e bagunçou os cabelos negros:
— Vou preparar água quente para teu banho, fique aqui e comporte-se. – Avisou e então saiu, sendo obedecido durante todos os dez minutos em que esteve fora do quarto. 
  Durante aquele período, o menino de rua se acomodou no amadeirado, abraçando os joelhos e se encolhendo em busca de calor. Fitou algumas feridas em seu próprio corpo, cutucando os machucados nos joelhos róseos. Em seu âmago, desejava ser mais belo, como aqueles garotos da nobreza que já havia visto por aí, os mesmos que ficavam nas carruagens e só saíam de lá acompanhados de seus tutores, homens velhos e ranzinzas que não gostavam de gente como Sem Nome. O garoto sentiu na pele tal desgosto, não era uma criança bem quista na vizinhança. O senhor barrigudo das verduras, por exemplo, sempre lhe chutava as costelas quando passa por sua tenda. 
-—Ei, continue a cutucar e os machucados ficarão piores, Sem Nome! – Fora tirado de seu breve devaneio pela voz suave do Park, que sorria bonito como nunca. Notou que, como a si mesmo, o outro já trajava somente a ceroula. 
— Perdão. – Pediu, afastando as unhas de sua tez maculada.
  Park Jimin carregava consigo dois grandes baldes com água quente e uma esponja grande cheia de sabão. Despejou com cuidado o líquido morno na banheira onde estava o menor, regulando a quantidade para que sobrasse para o enxágue. Inclinou-se sobre a borda do grande recipiente e, com a bucha em mãos, passara a banhar a pele do garotinho com todo o carinho que poderia ter. A criança admirava seus movimentos com um brilho nos olhos – não tomara tantos banhos dignos na vida, era fedido e imundo como seu cãozinho companheiro, o qual ficara dormindo na porta da padaria chinesa. 
  Ficaram em silêncio por vários minutos enquanto o mais novo se via hipnotizado com a própria pele, agora centena de vezes mais branquinha, limpa e cheirosa; isso até a mente de Jimin clarear em um detalhe que lhe incomodava:
— Chamar-te de Sem Nome me deixa um tanto enrugado, queria poder dar-te um nome, garoto. – O outro nada disse, apenas lhe mirou com os orbes arregalados – Conversei com Seokjin hyung sobre isso outro dia, mas achei melhor decidir agora, uma vez que ele queria te chamar por nomes chineses estranhos... Coreano é bem mais bonito! – Comentava todo nacionalista enquanto esfregava as costas do baixinho – Eu poderia te ensinar um pouco da minha língua também. É irritante ter que falar em inglês, ou chinês, o dia todo... E quando acho um coreano por aqui, a maioria não compreende meu dialeto de Busan... 
— Eu imagino. Você fala estranho, Park Jimin...
— Aish! Mas é claro! Não fale assim com seu hyung, moleque insolente! 
— O meu o quê?
— Hyung! É a forma como você deveria me chamar, e não pelo nome. Tão informal... – Explicou, jogando um balde cheio d’água na cabeleira do menino, terminando seu banho e enrolando-o em uma toalha que havia ali perto. 
— Mas eu não sei falar isso, Jimin! Nem ao menos consigo chamar por Seokjin... Vocês estrangeiros falam estranho demais, têm nomes difíceis demais. Pense bem, por que eu deveria te chamar por isso aí se eu nem sou coreano? 
— Pare de reclamar e vista isso, pivete! – Estendeu um conjunto infantil que já fora seu há muito, vendo graça no quanto as vestes ficaram folgadas no outro, afinal, fora uma criança muito barrigudinha na infância, diferente do magricela a sua frente, de corpo raquítico e frágil. 
  Guiou o menino de rua até sua cama velha e barulhenta, acomodando-se ali junto dele. Contentou-se em se aquecer com o corpo quentinho do guri, uma vez que não poderia se banhar porque havia gastado a cota de água quente com o outro, esse que tinha o rosto ruborizado em vergonha pela proximidade repentina. 
— Preciso de um nome bonito e que você consiga pronunciar corretamente... Eu, particularmente, gosto do sobrenome Jeon. – Comentou enquanto encarava o teto cheio de teias de seu quarto e balbuciava em seu dialeto coreano. 
— Como? Jhonn? Eu pensei que Jhonn fosse um nome, não sobrenome...
— Pare de ser ignorante moleque! É Jeon! – Chiou ao corrigir a criança que passara a pronunciar o seu novo sobrenome de forma baixinha, como que para acertar a pronúncia forte do amigo – Para o nome... Que tal Jeongguk
— Ué, mas aí ficariam dois Jeons
— Acredito que seja mais prático, já que ficaríamos a noite inteira pronunciando novos nomes. 
— Jhonn é muito feio, eu não gostei! – Um bico emburrado surgiu nos lábios do branquelo.
— Já percebi que você é muito reclamão, Jeon Jeongguk. – Apertou o nariz do menino recém-nomeado – E eu gosto de teu novo nome.
  Dito isso, o miúdo cessou suas reclamações acerca de seu nome coreano, contentando-se por simplesmente ter alguém que se preocupasse consigo, que lhe deu algo tão precioso quanto, olhe só, um nome! Anteriormente seu semblante era irritadiço, todavia, seu diminuto coração chegara a palpitar tamanha a felicidade que corria em suas veias.
  Ambos tiveram uma madrugada confortável e plena. 

                                                                                                                  


  Com um nome e sobrenome, Jeon Jeongguk fora tomado pela sensação de, finalmente, ser reconhecido como um ser humano. Continuava recebendo o mesmo tratamento de sempre, alguns chutes aqui e ali do senhor das verduras, as inevitáveis escarradas e os insultos por parte dos nobres e demais comerciantes. Porém, nada disso abalava o guri que recém ganhar seu nome. Esplêndido! 
  Nem tanto.
  Agora o garoto levava sermão pelo nome e sobrenome. Sem ter o que comer, saqueava as tendas e vitrines que ficavam expostas nas ruas daquele bairro, por consequência, das vezes que tais informações chegavam aos ouvidos de Kim Seokjin ou Park Jimin, recebia bons puxões de orelha e berros furiosos que continham o mais alto sotaque na pronúncia de “Jeon Jeongguk”. Não era como se ele realmente se importasse pelos apertões nos lóbulos, bastava apenas ter um nome. 
  Broncas aqui e mimos acolá, o londrino passara a morar junto do coreano, esse que sempre recebia ajuda de seu patrão na criação do mais novo. Tudo no mais profundo sigilo, claramente. Ai do Park se o senhorio do cortiço descobrisse que havia três bocas no setenta e oito! Teoricamente, três; na prática, uma e meia. 
  Em resumo, a criança transbordava felicidade: tinha casa, nome, amigos. Até mesmo seu companheiro canino tivera a sorte grande, ao que o padeiro chinês conseguiu um espaço para abriga-lo nos fundos do prédio. 
  Envolto de tanta alegria pela nova vida, porém, uma problemática perturbava o coração miudinho de Jeon... Uma questão que, hora ou outra, tirava-lhe dos eixos e o fazia pensativo por longos períodos: gostava tanto de Park Jimin! Gostava em uma proporção diferenciada, quase assustadora, no entanto. 
  Não era novidade para si que o adolescente lhe considerava um irmãozinho postiço que acarretava grandes confusões, mas isso não agradava em nada o pequeno teimoso que era. Queria ser adorado da mesma forma que adorava, oras! Desde o instante em que vira Jimin pela primeira, pensava que, se o rapaz fosse mesmo um bruxo, era um dos mais bonitos do mundo. 
  Custava a entender porque o sorriso do estrangeiro era tão estonteante. Os dentes branquinhos em destaque, as bochechas gordinhas ressaltadas no rosto sem imperfeições, os olhos apertados numa fina linha, como se, tal qual os lábios grossos, entortassem num sorriso; o mais belo de todos. 
  E ainda havia o corpo, pois o coreano não tinha o porte magricela dos outros orientais daquele bairro - nem como o próprio saco de ossos que era Jeongguk. A criança admirava aqueles braços cheios de músculos definidos, as coxas grossas e fartas, o abdômen bem formado e a pele um tanto bronzeada demais para a cidade das chuvas. A sensação de uma pessoa saudável era emitida na figura de Park.
  Perdido em sentimentos e ingenuidade, o menino de rua se via contrariado, sem saber o que fazer. Por outro lado, contudo, o asiático também se sentia confuso acerca de seus pensamentos sobre seu pequeno príncipe. O miudinho era uma graça, como as bonecas de porcelana do Senhor Do, que residia na rua de trás. O britânico era quietinho, mas de repente se volvia em um ótimo arteiro, aprontando poucas e boas com todos daquele bairro. 
  Park Jimin saciava-se com a espontaneidade com que o outro levava sua vida. Jeon Jeongguk via beleza em coisas que o coreano considerava banais e que, com o tempo, aprendeu a valorizar. Em seu âmago, desejava guardar a criança em uma caixinha de diamante para que não ficasse tão exposto às ruindades que os homens ofereciam como caramelo. Jeon era uma raridade que deveria ser preservada e, como o egoísta que era o mais velho, mantida sempre aos seus bracos cálidos.
  Amavam-se, queriam-se mais que tudo. Se antes o sonho do menino branco e pobre era ter um nome, um lar, agora volvia-se em ter Jimin somente para si. Contudo, quão errado isso seria? 
  Era pecado. Não importava o ponto de vista, era pecado em tantas maneiras que isso custava lágrimas incessantes dos olhos rasgados do Park, que via-se chorando como um bebê todas as noites. Considerava-se sujo por amar um menino, pior ainda, uma criança! Tornara-se anglicano após a vinda para a Inglaterra, então rezava aos céus para que o seu pequeno príncipe não fosse castigado ao metê-lo em seus pensamentos impuros. Pedia para os anjos para que iluminassem os passos de Jeon, orava para si mesmo: não cederia aos desejos sujos que atormentavam-no. 
  Dormiam juntos, lado a lado, todos os dias. Era o momento de maior dualidade para os garotos - ora a tranquilidade e plenitude se faziam presentes, ora o maior derramava lamúrias escondido. Agraciavam-se com o calor humano d`outro. Jeongguk tinha os músculos do mais velho como o melhor travesseiro do universo, enquanto o último enlaçava suas pernas no corpo miúdo do guri, como uma pelúcia de pele branca e aveludada. 

  Com o passar das semanas ambos os guris volviam-se cada vez mais apegados, inevitavelmente atraídos, andando aqui e acolá juntinhos, ligados por um fio tênue que transcendia a amizade. Gracas à tal, Park Jimin - receoso de não controlar seus formigamentos - optou por afogar os próprios sentimentos em um oceano de desculpas, declarando, enfim, que considerava o menino de rua somente um irmão postico, o qual cuidava como se fosse de mesmo sangue!
  Mimava o garoto, acarinhava-o os fios e as maçãs pálidas do rosto, gritava e dava sermão se fosse necessário, nunca recorrendo às famosas palmadas que, quando menor, já experimentara muito. 
  Contudo, fora em um dia nublado qualquer, no qual a padaria se encontrava vazia e habitada somente pelo adolescente, seu patrão e o coreano que trabalhava na loja de tecidos do outro lado da rua - este que, já há algumas semanas andava arrancando suspiros assíduos do dono do lugar em que estavam -, que todos os três estrangeiros depararam-se com certa movimentação suspeita na rua. Fora o início do causo que arrecadou nas primeiras bofetadas de Jimin no Jeon. 
  O fato é que toda a zorra anteriormente citada fora gerada por três guardas de segurança civil e um garotinho de vestes maltrapilhas. Sim, Jeongguk. O pequeno fugia das autoridades com um pendúnculo de rosa em mãos, espalhando aleatoriamente pelo caminho algumas pétalas vermelhas que se desprendiam em decorrência da brusquidão. 
  Tão cedo o Park já desviava das carroças que vagavam ali fora e tomava a criança em seu colo, esgueirando-se por entre as pessoas tentando despistar as autoridades ao entrar rapidamente no estabelecimento de Kim Seokjin, que já era acometido pelo cheiro saboroso de pão recém-assado. 
  Não era necessário ser um estudioso graduado para entender o que acontecera ali: Jeon fora pego furtando algo e agora estava, teoricamente, foragido. Tendo consciência disso, seu hyung já lhe arrastava para os fundos da loja aos puxões de orelha, visivelmente nervoso, com uma carranca feia assombrando a face. 
  O patrão ordenou que subissem à sua casa, logo no andar a cima e o coreano resolvesse a situação. O mais velho dali entregou o molho de chaves ao jovem, recebendo em resposta quatro reverências de noventa graus em sinal de respeito e um pedido mudo de desculpas pelo alvoroço. 
  Quando na morada de Kim Seokjin, o adolescente sentou a criança em uma poltrona da sala e atentou o seu estado: joelhos ralados, cotovelos esfolados, rosto encardido e coberto de feridas antigas, o cabelo parecia um ninho de ratos e a bermuda - essa que pertenciam a Jimin na infância - continha um pequeno rasgo próximo à barra. Estava deplorável, por conclusão. 
— Explique-se, Jeon. — Mandou, analisando o olhar cauteloso do menino já não mais de rua. 
— Eu queria pegar isto aqui para ti... — Entregou-lhe aquela flor despedaçada, mal tratada como o próprio diminuto — Mas o senhor Mellvile viu e tentou me bater, aí eu corri... 
  Era possível ver em seu semblante tristonho que, de certo, aquele não era o desfecho o qual ansiava. O adolescente deveria manter a postura rígida constante, mas seu coração amoleceu como os cremes que preparava no serviço. Seu príncipe submeteu-se, mais uma vez, ao furto para presenteá-lo. Parecia uma artimanha proposital para que o Park sufocasse cada vez mais naquelas sensações que o amarguravam tanto. 
  Apaixonado. Via-se completamente apaixonado por aquele menino tão mais novo que si e, sem nem ao menos perceber, lágrimas grossas e carregadas de um amor impossível e vicioso. Ah, Jeon Jeongguk era, sem dúvidas, seu ponto mais fraco; seu calcanhar de Aquiles. 
  Com ambas as mãos, segurou firme o rosto menor que o seu, aprisionando o olhar a sua frente com o seu igual, provocando um temor no corpinho infantil. 
— Pequeno, não faça mais isso. Não se arrisque por mim novamente. Há muito, disse-lhe o quão errado é tomar para si aquilo que não te pertence, então leve isso a sério para que não te tirem de mim... Você gostaria de ficar longe de seu hyung e de Seokjin? — Recebeu um aceno negativo em resposta - Muito menos eu. Agora venha, você terá de ser castigado, guri!
  Foram as palavras mágicas para o garoto abrir o bocão e gritar palavras sem sentido enquanto corria para lá e para cá dentro do pequeno apartamento do chinês. Nos lábios finos e pequenos um bico de quem prendia o choro e se preparava para a birra, nas bochechas o escarlate tomava conta. Jeon Jeongguk iniciaria um escândalo, mas não apanharia de Park Jimin. 
  Deu a volta no corpo musculoso do mais velho e saiu correndo, gritando por Seokjin à toda forca, descendo as escadas e se escondendo atrás das costas largas do padeiro. Viu o Park descer os degraus furioso, bufando de raiva pela fuga escandalosa que fizera. 
— Jeongguk, não ouse! — Ralhou irritadiço. 
  Correu atrás de seu príncipe mimado, tornando-se ainda mais competitivo quando esse começou a usar seu patrão como escudo, provocando uma corrida de dois jovenzinhos em volta de um homem feito. 
— Parem os dois! - Kim Seokjin ordenou em alto e bom som — O que está havendo? 
  Ambos os mais novos ficaram calados, com medo de que irritassem de verdade ao chinês. Entanto, isso não durou muito, visto que o último forcou o olhar bravo para os dois e exigiu respostas satisfatórias. Park Jimin, por fim, resolveu contar a situação:
— O problema maior já foi resolvido, mas esse atrevido não quer pagar por suas atitudes desrespeitosas, muito menos ir para casa tomar banho! Fê-me de tolo e saiu correndo pela casa como um furacão! A-tre-vi-do! — Resmungou rabugento. 
— Mas ele vai me bater e me chutar, tio!! — A criança acusou o adolescente com o indicador levantado — Park Jimin é um mentiroso! Vive mentindo pra mim, nunca cumpre suas promessas e também finge que se importa comigo, mas na verdade só quer me surrar! - Protestou, mas foi só em seguida que reparou o teor das frases ditas. Não queria dizer aquilo realmente... Jimin sempre fora como um anjo consigo, jamais ousou lhe maltratar. 
  A mudança de expressão no rosto do coreano mais novo foi visível. Park Jimin tinha o coração destrocado. De alguma forma sabia que Jeongguk não queria dizer aquilo para si, porém, era como se o Pai avisasse que, obviamente, aquele amor deveria ser convertido à fraternidade de uma vez por todas. Fez menção de sair da cozinha, ignorando o miúdo, visando apenas sair rua à fora para esfriar a cabeça. 
  Entretanto, o de trajes inapropriados gritou por si, correndo até seu corpo e o abracando pelas costas, fincando as unhas curtas e sujas em sua camisa. Escorregou e agarrou as pernas do rapaz, chorando alto e soluçando como nunca. Pedia desculpas. O Park então abaixou até a altura de seu pequeno, dando-lhe um safanão nas orelhas e o pegando no colo, acalmando-o com batidinhas nas costas como em um recém-nascido que pedia atenção. 
  Pediu para que o Jeon cessasse as lágrimas, visto que já era grandinho o suficiente para encarar a realidade como um homem. Avisou ao patrão que iria para casa, despedindo-se dele e de Namjoon, levando consigo o menino de bochechas infladas e rosto rubro. 
  Quando chegou em seu apartamento com a criança chorona em seus bracos, agradeceu por não ter topado com nenhum outro morador do cortiço, uma vez que ainda escondia Jeongguk do dono do prédio. 
  Dirigiu-se para o quarto, onde acomodou o corpo pequeno dentro da banheira e tão logo já fora em busca dos baldes com água para lavar Jeon. Quando voltou, lamentou pelos poucos baldes com água que havia conseguido pegar, portanto entrou em outro dilema, já que ele mesmo estava suado e sujo pelo trabalho na padaria e, bem, o guri sempre estava bagunçado, como qualquer outro garotinho de sua idade. 
  Aparentemente o menor percebera sua aflição, pois mordia o canto dos lábios e puxava alguns fios de seu cabelo - hábito que desenvolveu quando se encontrava ansioso -, colocou-se, pois, a falar:
— Banhe-se comigo, Jimin... — O Park sentia sua garganta fechar, como se o mais novo estivesse brincando consigo; o que era aquilo? Um teste? 
  Por fim, arrastou seus pensamentos impróprios para um lado oculto de seu consciente e viu na proposta uma solucão para seu debate interior, mesmo que ela também abalasse suas estruturas. 
— Deve me chamar de hyung, eu já disse. — Resmungou de bico e logo jogou os dois primeiros baldes da água gelada no grande recipiente amadeirado, sorrindo ladino quando o britânico encolheu os membros inferiores, visando se acostumar com a temperatura baixa do líquido. 
  Tirou as próprias vestes, preferindo ficar com a ceroula para não expor seu nu ao pequeno, que lhe fitava atenciosamente juntar-se a si no banho. Jeongguk sorriu com seu ato, atirando-se de bracos abertos ao colo do outro, aconchegando as costas miúdas no peito definido e majestoso de seu hyung querido. 
  Inesperadamente, o Park não sentia mais a malícia tomar conta de si, somente desfrutava daqueles minutos em que passeava com a esponja pelas costas clóricas d`outro, ao passo que lhe entretia com uma fábula de sua terra natal. O Jeon adorava estes momentos em que o seu Park o agraciava com seu tom melódico ao recitar contos e fábulas daquilo que o outro chamava de Coreia. Não sabia muito sobre aquele lugar de onde o seu amado viera, porém imaginava ser bem distante e cheio de criaturas mágicas, como seu hyung descrevia. 
  Subitamente, o garotinho se perdeu em uma locomotiva de questões que lhe intrigavam e postou-se de frente para o mais velho, apoiando as mãozinhas finas nos ombros alheios e captou os orbes do coreano, cujos movimentos cessaram na expectativa das próximas ações do miúdo. 
  Fora então que, quando o menor proferiu a primeira pergunta, Park Jimin sentiu seu mundo desabar: 
— Jimin, o que é amor? 
  Um rebuliço na ponta do estômago, um incômodo no maxilar, o nó na garganta nauseando-o. Não sabia ao certo o que dizer ao outro, mas tentava caçar em seu âmago alguma explicação plausível. Ora, não podia declarar que o amor era aquilo que sentia pelo menor, mesmo porque tais sensacões eram aquelas que o levaria ao purgatório, onde pagaria pelo pecado que era amar Jeongguk. 
— Existem vários tipos de amor. Há aquele entre pai e filho, ou irmãos... Há também o amor entre amigos, como Seokjin-hyung e eu. Ainda há aquele entre homem e bicho, como você e seu cachorrinho... Porém, existe aquele entre amantes, mas esse é tão complicado que nem mesmo os poetas encontraram uma boa definição, então eu não poderei explicar para ti... Dizem que você sente seu coração bater mais rápido, um formigamento na barriga e secura na boca... São muitos os sintomas, por assim dizer, e eles variam de pessoa para pessoa, chegando a levar algumas à loucura. Talvez seja o mais indecifrável, por ser tão ruim, mas ao mesmo tempo tão bom. — Concluiu com um pesar nos ombros, descrevendo tudo aquilo que lhe atormentava. 
  Pelo semblante alheio, havia feito o outro entrar em devaneio, logo, ignorou o próprio desconforto e tornou a ensaboar a escápula de tez macia, mas com cicatrizes passadas. Limpava-o como se fosse a peca de porcelana mais importante da rainha, não resistindo ao reflexo de aproximar o rosto dali, inspirando o cheirinho gostoso de lavanda que aquela pedra grossa de sabão deixara ali. 
— Então eu acho que te amo, Jimin! — Afirmou inesperadamente, causando um aperto doído no coração do maior, o qual sentia efeitos grandiosos através daquela fala inocente do outro.
— Claro; amamo-nos em dobro: como irmãos e amigos... — Murmurou triste. 
— Não! Amo-te como amigo e amante, é claro! — Decretou, massacrando todo o auto-controle do rapaz, o qual levantou-se de supetão e secou o excesso de água do corpo com uma toalha velha que ali havia. 
— Não repita isso novamente, Jeon. Não podemos nos amar como amantes, você nem ao menos tem idade para saber o que é isso! — Disse ríspido, agarrando a criança pelos bracos, tirando-a da banheira com um movimento brusco e a secando de forma agitada e até mesmo violenta. 
— Mas, Jimin, eu sinto tudo aquilo que você disse há pouco quando estou perto de ti! Se aquilo é o amor entre amantes, então eu o sinto por ti! — O coreano, pois, nada disse. Doía-lhe o coração e a cabeça ao ter provas de que aquilo que mais temia acontecera: fora correspondido. 
  Não pôde controlar as poucas lágrimas que escorreram pelas bochechas rechonchudas, limpando-as em seguida quando o garoto passou a lhe afundar em perguntar acerca do descontrole. Todavia, o adolescente optou por somente permanecer em um silêncio fúnebre; sentia como se fosse vomitar se abrisse a boca. 
  Vestiu seu pequeno com uma camisola velha que sua mãe nunca chegara a usar - mesmo porque jamais colocaria as roupas daquela mulher corrompida no corpo puro de seu príncipe -, acomodando-o em sua cama de solteiro. Perdera a coragem de dormir ao lado d`outro naquela noite. 
  Acarinhou a franjinha úmida do mais novo, fitando bem os orbes curiosos e cheios de interrogações, sentindo-se irredutivelmente culpado. Beijou-lhe a fronte e ordenou que fosse dormir, porque prepararia uma refeição para sua mãe. Não que essa fosse uma desculpa tão boa assim, uma vez que a mulher nem ao menos frequentava ali há semanas, até onde tinha conhecimento, porém o outro nada disse, fechando os olhinhos tristemente. 
  Trancou a porta para que o guri não o seguisse secretamente e caminhou a passos cansados até a cozinha miúda que tinha ali no canto da sala, sentando-se no chão frio de uma madeira que rangia de forma medonha. Chorou com todas as suas forcas, visando expulsar suas sensações. 
  Percebido que apenas chorar não resolveria seus problemas, ajoelhou-se sobre aquele solo precário e orou por diversas horas, pegando a primeira faca que encontrara para castigar o corpo imundo que tinha. Mutilou a carne de seu baixo ventre, maculando os lábios inferiores que eram mordidos para conter os gemidos de dor. 
  O íntimo e o quadril farto já se molhavam com o líquido escarlate e viscoso que vazava pelas feridas. Abaixou um pouco mais a ceroula e passou a rasgar também o interior das coxas - outra região que fervilhava quando Jeon Jeongguk estava muito próximo de si, como quando pernoitavam juntos. A tez bronzeada ardia numa dorzinha aguda que aos poucos se volvia insuportável, mas o menino enganava a si mesmo, repetindo em seu âmago que aquilo não era nem um por cento do que deveria sofrer por amar uma criança do mesmo sexo. 
  Conforme as horas passavam e o Park se via próximo à exaustão, atrapalhando-se no recitar sofrido das orações, acabou por ceder a Morfeu, dormindo ali mesmo naquela madeira fria do assoalho, a coluna torta e o corpo manchado de sangue. 
  


  Com o passar das semanas e o sentimento de impotência se alastrando pelo corpo do adolescente, o Park pensava que enlouqueceria a qualquer momento. Parecia bobo, mas achava que Jeongguk ficava mais belo a cada virada de Sol; sem os mal-tratos constantes a que era submetido e a sujeira e perigo das ruas, o garotinho tinha a pele mais branquinha, os fios negros tornavam-se muito mais sedosos e brilhantes e os olhos ganhavam uma magnitude estonteante que destrocava por completo o raciocínio do coreano. 
  O guri, agora sob proteção de Jimin e Seokjin, volveu-se mais suscetível à amizades. Não tinha rédeas na língua agitada e tão cedo já havia agraciado os corações de Namjoon, que vivia no encalco de Seokjin, o senhor e a senhora Zhang, da tenda de verduras, a senhorita Christie e seu minúsculo irmão George, os nativos que visitavam o bairro sempre que conseguiam escapar das aulas particulares, e o conde Jung, proprietário do complexo de prédios onde a padaria se localizava. 
  Claramente ainda havia aqueles que tinham ranco da criança, gracas às suas origens. Infelizmente esses eram a maioria, como a clientela da loja, os tais grã-finos, alguns chineses do bairro, que custavam a acreditar que Jeon não voltaria a furtar os estabelecimentos, e o dono do cortiço em que residiam. Depois de terem sido dedurados por uma vizinha, a meretriz do cinquenta e cinco, Jimin explicou a situação para o homem, o qual ficou totalmente desgostoso, mas aceitou não subir o aluguel pelo fato da mãe do estrangeiro estar sumida há pouco mais de doze semanas. A última notícia que tivera da progenitora fora a de que havia apanhado na rua por um de seus clientes, próximo à casa de ópio em que ficava. Seu patrão sabia do paradeiro da mulher, uma vez que recebia informações obscuras do velho senhor Ho, chefe de Namjoon. 
  O clima entre Jeon e Park era desconfortavelmente estranho. Havia um duelo entre carinho e medo: não resistiam à vontade de tocarem-se, cafunés e abraços eram precisos, mas tinham receio das reações que receberiam como resposta. Se o mais velho o acolhia em seus bracos, segundos mais tarde a criança saía correndo escondendo o rosto rubro entre as mãos. Nessa dualidade, porém, não havia uma sensação que predominasse mais que o amor que sentiam um pelo outro e, por fim, apenas tentavam afastar e manter o tal desconforto o mais longe o possível. 
  De alguma forma, Jimin pensava consigo mesmo que a insistência e a teimosia de Jeongguk volviam sua mente em um redemoinho de pensamentos. O pequeno vez ou outra dizia amar o mais velho, geralmente nas noites em que dormiam abracados ele fazia aquilo; murmurava as três palavrinhas que estremeciam o coração estrangeiro. 
  Via o Jeon como um anjo, com toda a beleza e inocência dos planos; contudo, era inevitável a sua imaginação fértil em puberdade não sonhar acordada com a figura mais velha do inglês. Perdia-se ao fantasiar naquilo que poderia se metaformizar num corpo alto, pálido e com as proporções mias perfeitas que seu Deus com certeza faria. Seria Adão. O Park imaginava-se como a Eva que levaria o menino ao pecado, às ruínas. Só de imaginar o seu príncipe ardendo no fogo por sua culpa, seu peito emaranhava-se em nós. 
  Lá em seu âmago, uma forca estranha gritava para que não se enroscasse tanto nas consequências. O motivo? Era amor! E o amor era aquilo: achar o complemento de um vazio, devorando-o, cuidando-o, transbordando-o sem pensar nas consequências futuras, pois essas seriam compensadas pela reciprocidade do sentimento mais difuso do homem. O amor era o castigo que Deus deu aos mortais por tudo o que fizeram ao jardim supremo. 
  Junto a ele veio o ódio, sentimento de fácil compreensão - se comparado ao seu irmão -, todavia tratado com tanto receio como um Sem Nome na grande e acinzentada Londres. 
  Jeongguk era amor; Jimin era ódio. Irmãos criados pelo Pai com um destino tão angustiante quanto as sensações que causavam. Quando juntos, provocavam reações inesperadas e incalculáveis. 
  Mas o coreano, com toda a sua coragem reunida decidiu ceder àquela forca, ignorando os subterfúgios tolos, os poréns. Gracas ao seu ato, fora numa noite de quinta-feira que o adolescente selara o destino de Amor e Ódio para sempre. 
  O escurecer veio rápido naquele dia; inverno. O frio eriçava os pelos finos dos garotos que, juntos na cama, visavam aumentar a sensação térmica com duas cobertas velhas. Estavam um frente ao outro, olhares conectados. Jimin tentando iniciar um diálogo, formulando frases e mais frases na cabeça; Jeon admirando-e com a beleza asiática diante de seus orbes. 
   Em um ato (não tão) inesperado, o maior levou a mão até as bochechas clóricas do outro, acariciando aquela tez com calmaria e ternura. Suspirou três e cessou o afago, semicerrando a visão, como um reflexo para os pensamentos conturbados que sapateavam em seu interior. Soprou a ponta do nariz miúdo do guri e arrancou-lhe uma risadinha baixa que, naquele instante, não lhe geraram tanto temor:
— Eu te amo.
  Pensou. Sorriu.
— Eu também te amo, Jeon. — Respondeu, causando um olhar surpreso por parte do mais novo. 
— Como amo-te? — Perguntou meio desconfiado. 
— Sim.
  O sorriso tornara-se, então, recíproco. 
— Vindo de ti, há de ter um porém...
— Uma promessa...
— Um pacto?
— Provável. 
— Conta-me. — O menino pediu, assumindo uma postura madura demais para apenas onze primaveras. 
  Hesitou um tanto antes de atender ao pedido alheio, buscando as palavras muito antes ensaiadas frente à penteadeira de sua mãe. 
— Ama-me ao ponto de esperar até seus quinze anos? 
— Até a morte, hyung. 
— Que assim seja; quando completar o décimo quinto, seremos noivos. Até lá, somos como prometidos. Sou teu e você meu. — Propôs. 
— Esperaria o tempo que precisasse, Jimin. — o guri revelou, o tom baixo e sonolento — Precisamos selar nosso pacto...
   E selaram. À sua maneira. Optaram pelo selar de lábios, aquele que há tanto ansiavam. A junção das carnes em uma combinação sútil que beirava os céus. Um tocar tão inocente que talvez Deus pudesse perdoá-los, pensava o coreano. Um singelo encostar enamorado, banhado de infinitos, como parecia ser a dança dos anjos dentro do peito de ambos. 
  Meia-noite, horário em que Amor e Ódio entrelaçaram-se em nós. Para sempre. 


Notas Finais


Obs: no início o jimin diz que o JK aparenta 8 anos, mas na verdade ele tem onze, por isso eu disse "onze primaveras" ;)
Qualquer dúvida quanto à palavras, cultura, ou hábito estranho, perguntem-me, visto que eu incluí muitos aspectos de uma sociedade do século XVIII, obviamente.
Pra quem não sacou, a mãe do Jimin era prostituta em casas de ópio.

É isso aí, espero ver vocês novamente o mais rápido o possível em Stalker ou na terceira oneshot dessa série <3 (VHope promete, mim aguardem u3u)


Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...