História Caídos no Inferno - A primeira morte

5 dias se passaram desde a introdução de Nicholas a escola. No sábado que sucedeu o jantar, ele já estava no prédio descarregando sua mudança que era composta de quase nada. 

A chuva passou então as aulas retornaram ao seu ritmo habitual. 

"Bom dia senhorita Marks!" Os alunos me cumprimentam educadamente no corredor como de costume. 

Ao passar em frente a enfermaria, vejo que Nick já está na porta usando seu jaleco e com o sorriso branco que nunca sai do seu rosto, dando a impressão de que ele é retardado.

"Muito bom dia Alex. Você está incrível hoje!" Ele acena enquanto eu passo.

"Eu sempre estou incrível Nicholas!" Ele ri feito um idiota depois de me chamar de narcisista.

Seguindo a rotina eu converso com todos os meus colegas que já chegaram, com exceção de Bob que ainda não apareceu, porém antes que eu consiga evitar Jean, ele surge não sei de onde e põe sua mão pesada sobre meu ombro.

"Hey bonequinha eu quero falar com você!" Eu suspiro me preparando para o que ele possa vir a falar "hoje você deve estar livre depois da aula… você não gostaria de…"

"Não!"  

"Por favor Alex, eu prometo que vou me comportar… eu não entendo porque você me odeia tanto, eu nunca te fiz nada!" eu reviro meus olhos e encaro o homem que está parecendo mais uma criança pedindo doces para os pais fora de hora, bizarramente mais educado do que o habitual.

"Jean… eu saio com você com uma condição: É a primeira e a última vez!" O olhar de vitorioso dele é nojento. "E eu só estou aceitando isso porque tenho esperança que você morra antes da última aula!" Eu me jogo dentro da sala que ele possa dizer qualquer coisa.

Os alunos chegam aos poucos. Minha primeira turma do dia é a quinta série. Essas crianças me deixam deprimida. Em todo o tempo que eu sou professora nunca vi uma turma tão desanimada e silenciosa.

"Certo crianças, eu quero que vocês desenhem qualquer coisa aí. Sejam criativos!" Sem questionar ou dizer algo elas pegam seus lápis de cor e canetinhas e começam a rabiscar nas folhas brancas.

É entediante ver eles desenhando. Resolvo fazer o mesmo. Em não muito tempo o esboço começa a tomar a forma de um automóvel.

"Ah Lilly eu sinto tanto sua falta…" eu suspiro profundamente enquanto olho para o desenho. Lilly era como eu chamava o carro que eu tinha a uns 10 anos atrás. Ela era um Chevy Impala 67 azul. Eu amava tanto aquela garota. Nossa história de amor acabou quando eu arrebentei ela em uma árvore, em uma noite de primavera. Foi o dia mais triste da minha vida.

Eu amasso a folha e lanço na lixeira acertando em cheio. 

O sinal toca e as crianças vão saindo, deixando as folhas em cima da minha mesa. 

Eu olho sem compromisso ou interesse para as obras de arte, porém meus olhos param numa em especial.

"Eu odeio meu trabalho…" 7 criaturas deformadas, uma delas tinha duas cabeças inclusive. "Eu me lembro de ter pedido pra eles desenharem os professores... Eu já devia imaginar… Saphira!" 

Os trabalhos vão parar no fundo da gaveta e eu afasto o medo dessa menina com um gole de vodka que está disfarçada de água na minha garrafa.

As aulas continuam passando como tartarugas, e o recreio mais rápido do que eu possa acompanhar. Isso é torturante.

Robert não apareceu na escola pela primeira vez. Não deu satisfações a ninguém. Mas nenhum de nós pareceu se importar com isso.

"Só faltam mais duas aulas… aguente firme baixinha!" Barney me acompanha até minha sala.

"Puta merda faltam só duas aulas... Barney me mata logo pelo amor de Deus!" Eu agarro a camisa do mais alto implorando por uma salvação quando lembro do inferno que me espera depois da escola.

 "Que desespero é esse…" ele começa a rir do meu pânico.

 "Eu vou ter que sair com aquele pedaço de lixo depois da aula, Barney acabe com meu sofrimento!" 

"Você e o jean? Saindo juntos? Isso é uma coisa que eu quero assistir de camarote! Boa sorte no seu encontro senhorita Marks…" ele continua andando enquanto eu paro em frente a sala e grito com ele.

"Barney você é um traidor… víbora!" 

Eu nunca estive tão desesperada em minha vida. Ter que sair com a pessoa que eu mais detesto nessa cidade e pior do que qualquer coisa.

"Algum problema professora Alex?" Uma das alunas do primeiro ano pergunta quando percebe minha inquietação.

"N-nada criança…" a garrafa já está na metade. 

Então o agradável som de recados do senhor Florean deixa todo mundo surdo.

"Alunos, professores, funcionários. A escola tem uma notícia deveras triste para todos. A poucos minutos fui informado pelo Doutor Morgan de que o professor de educação física Jean Gray teve um mal súbito e veio a falecer de ataque cardiaco. O corpo já foi removido pelo doutor. Estão todos dispensados das aulas pelos próximos 3 dias em que a escola ficará fechada em luto… tenham um bom dia!" 

Todos ficam em silêncio. 

"Não brinca…" eu digo para mim mesma enquanto tento processar a informação que mais parece uma brincadeira de mal gosto. "Eu… eu estou livre!" Não consigo conter a alegria que brotou no fundo do meu coração.

"Professora? Está tudo bem?" 

"Tá brincando garota? Está tudo perfeito!" Pego minhas coisas e levanto "Não ouviram? Estamos todos dispensados!" Eu saio sem olhar para trás, saltitando como uma criança. Não poderia ter acontecido milagre maior.

"Alex nós sabemos que você não gostava dele mas você está feliz por que ele morreu. Isso é doentio até pra você!" Zack olha para mim e acena em desaprovação.

"Você não entende por que não era você que ia ter que sair com ele! Isso é tão aliviante!"

"Alex… você tem problemas!!! ao menos finja que você não odiava tanto ele!" Nós entramos no prédio quando vemos o que parece ser o princípio de uma briga entre Robert e Nick. As mãos do ruivo estão na gola da camisa salmão do médico que está sendo forçado na parede. Nem em um momento de tensão ele deixa de sorrir, idiota.

"Continuamos nossa conversa depois doutor Morgan!" Bob solta ele e sobe as escadas enfurecido xingando algo em espanhol. Ele mudou de simpático e alegre pra arrogante em tempo record.

"Porque pararam? Eu adoro uma briga! Aliás por que vocês estão brigando?" 

"Sinto muito que tenha presenciado essa cena deselegante Alex, mas eu e Robert tivemos uma pequena desinteligência…" Nick arruma a camisa amassada e toca na maçã do rosto onde eu consigo ver um leve hematoma vermelho.

"Ele te bateu?"

"Foi apenas um soco, não foi nada demais… ele deve estar de mau humor! Aproveitando que estão aqui, vocês foram avisados que o senhor Gray faleceu não é?" 

Chega a hora do transporte do corpo. Fomos todos obrigados a prestar o último respeito a Jean na escola.

Minhas orbes quase giram 360 graus com a melação dos rapazes em cima daquele defunto. Robert foi também e sua cara de réu era pior do que a minha. Depois da cerimônia, todos, menos Nick, voltamos para casa. 

O ar está leve como se um grande peso tivesse sido removido. 

Mas por que eu sinto que essa paz não vai durar tanto tempo?