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História Carpe Diem (EM PAUSA) - Day Four


Escrita por: poetyeeun

Notas do Autor


Hallo!
Espero, de coração, que gostem. Boa leitura. MWAH!

➡ Capítulo ainda não revisado, perdoem-me se tiver erros.

Capítulo 5 - Day Four


Fanfic / Fanfiction Carpe Diem (EM PAUSA) - Day Four

As ruas da cidade nunca pareceram tão interessantes.

Vez ou outra me flagrava olhando de soslaio para um rapaz que cantarolava uma música qualquer do Ed Sheeran atrás do volante, batendo seus polegares no couro, enquanto um de seus cotovelos estava apoiado para o lado de fora da janela. Não podia ousar olhá-lo por muito tempo, pois era como se estivéssemos conectados por olhares que deviam se encontrar, mas eu me recusava a sustentá-lo. Estava desconfortável, incomodada, e não era apenas por minhas mãos formigarem enquanto agarrava com força a rosa amarela que ganhei logo pela manhã.

Eu nunca havia ganhado flores antes.

Justin mandou-me uma mensagem ainda à noite, pedindo para que estivesse pronta às nove da manhã, e que vestisse algo confortável. Não questionei, apenas enviei-lhe uma resposta, pedindo para que dissesse aonde iríamos, tudo o que recebi foi um desejar singelo de boa noite e sonhos doces. Desejei-lhe o mesmo, enquanto fazia inalação e sorria sob a máscara fria. Minha mãe estranhou meu sorriso, mas sabendo que momentos como esse nunca me agradavam, sorriu para mim. Vasculhei minhas memórias recentes da mesma manhã que partilhei ao lado do lutador de sorriso mais bonito que havia visto em todos os meus anos de vida. E tenho certeza de ter adormecido após soltar um suspiro.

Coloquei-me de pé com duas horas de antecedência, e procurei roupas por todos os cantos meu quarto. Uma jardineira jeans e uma camisa de mangas longas foram as melhores que encontrei. Calcei meus sapatos, e corri para escovar o meu cabelo. Juntei os fios, soltei-os, fiz uma trança, desfiz e tentei fazer duas. Nada deu certo, então, deixe-os como sempre. Soltos e escovados. Sorrateiramente, entrei no quarto da minha mãe e apanhei seu estojo de maquiagem, e cobri meu rosto com um pouco de suas pinturas quase inutilizáveis. Assustei-me com meu próprio reflexo, e tive que gastar alguns minutos, água e sabão para limpar a minha bagunça.

Estive ansiosa durante todo o café da manhã. Meu irmão contou alguma história que atraiu a atenção de todos na mesa, era algo relacionado ao seu trabalho, mas desliguei-me após as primeiras duas palavras. Mal toquei em minhas frutas na tigela, e afastei, sem ao menos perceber, os cereais para um único lado. Minha mãe chamou-me, perguntou se eu queria que ela me levasse ao parque para encontrar Mackenzie, apenas neguei. E quando a mensagem chegou em meu celular, com um simples ‘’estou na porta’’, meu coração passou a esmurrar o meu peito. Despedi-me como na outra manhã, e coloquei-me na varanda, encontrando-o, mais radiante que pouco mais de algumas horas que não o via.

Não importava quantas vezes nos encontrássemos, achava-o mais bonito a cada segundo.

A rosa estendida em minha direção tomou o meu fôlego. Não sabia o que fazer, se devia apanhá-la, cheirá-la e agradecê-lo, ou apanhá-la, cheirá-la e abraçá-lo em agradecimento. Talvez devesse apenas ter voltado para dentro de casa. Escolhi a primeira opção, no entanto. Meu rosto ruborizou. Meus joelhos quase vacilaram. Minha respiração não se sustentava nos pulmões. E tudo foi por ter o seu sorriso voltado para mim.

— Pare de pensar tanto. – replica com a voz sobrepondo a música que tocava. — Sua cabeça irá explodir se continuar com isso.

Ele tinha razão. Eu pensava muito.

— Algo está errado? – umedece os lábios, e não preciso olhá-lo para saber disso. Era quase como uma mania. — Eu fiz algo errado?

Eu queria rir em negação, pois ele não fazia ideia de como estava cometendo uma sequência de acertos.

Esse devia ser o problema. Ninguém nunca havia acertado tanto para me agradar, e isso assustava o inferno para fora de mim.

— Está tudo bem, Justin. – remexo-me sobre o assento. Olho-o rapidamente, avistando um resquício de dúvida em sua expressão de cenho levemente franzido. — Eu falo sério. Só estou pensando para onde pode estar me levando.

Não era uma total mentira.

Estive ansiosa pelo resto da noite, até que os remédios começaram a assumir o controle do meu corpo, forçando-o a relaxar nos lençóis macios, e meus olhos se fecharam. Nunca desejei que uma noite passasse tão depressa.

— Acabamos de chegar. – revela, e estaciona atrás de uma fileira de três carros.

Espio fora da janela e não me deparo com um edifício alto e luxuoso como o do dia anterior, esse era um pouco mais movimentado, e um tanto quanto confuso para mim. Homens altos e muito fortes, vestidos em roupas de malhar passavam pelas portas abertas. Inclinando meu rosto um pouco mais para o outro lado, estreito os olhos ao notar as letras em caixa alta na fachada atrativa.

— Uma academia? – tomada pela confusão, olho para Justin que abria a porta, colocando os pés do outro lado. — Porque me trouxe aqui?

— Você é sempre curiosa assim? – não me espera responder, apenas sai do carro e fecha a porta atrás de si. — Jesus Cristo, mulher! Tenha um pouco de paciência.

A porta do meu lado é aberta, e franzindo o cenho, coloco os pés na calçada. Agarro o apoio da minha mochila, ergo-a para retirá-la de onde havia guardado-a, e Justin ajuda-me, parecendo muito mais fácil com ele erguendo-a enquanto salto do veículo. Deixo a rosa no lugar em que havia me sentado, pois não queria estragá-la de alguma maneira, na verdade, torcia para que ela permanecesse viva até quando chegasse de volta em casa.

— Posso? – Justin simboliza para o meu cilindro já em sua mão esquerda.

Anuo fracamente.

Sentindo a curiosidade me corroer, sigo seus passos, agradecendo silenciosamente por não estarmos seguindo rumo a escadas. Recuo um passo, desviando-me do caminho de um homem musculoso e tatuado que atravessa a porta antes que nós cheguemos perto. Justin não se afasta, e troca um gesto de saudação com a cabeça. Com a passagem livre, atravessamos os batentes e meu olhar corre pelo ambiente impressionantemente povoado por vários homens parecidos com o que encontramos a meio segundo.

Trava-se de uma academia de luta. Havia ringues, sacos de pancada, pessoas saltando por cima de cordas, outras esmurrando luvas das outras, frente a frente. Não fazia ideia do motivo existente por trás da escolha do loiro que continuava caminhando de forma tranquila, arrastando-me junto a ele por estar completamente ligada a mochila que carregava.

— Porque estamos aqui? – sussurro para ele, abaixando um pouco a cabeça, não gostando dos olhares que estávamos recebendo.

— Você disse que queria enfrentar seus medos. – comenta, virando-se de frente para mim. — Essa é a minha maneira de vencer os meus.

Sem ter tempo para pensar, sou arrastada pela mão que de repente entrelaça a minha, puxando-me para perto. Em uma estava a minha mochila suspensa com extrema facilidade, e na outra os meus dedos entrelaçados entre os seus. Era uma sensação de formigamento estranhamente boa.

— Tyler! – vocifera para um homem que se vira depressa, e estreita os olhos. — Pensei que só fosse voltar amanhã.

— Não podia deixar meu melhor lutador sem o auxilio necessário. – indaga, sorrindo minimamente. Seu olhar paira em mim, recuo um pouco para o lado, ficando atrás de Justin. — Essa é...?

— Hope! – em uma ação súbita, o corpo que bloqueava a visão do homem para mim, dá dois passos para o canto contrário. — E esse é Tyler Harrison, meu treinador.

Fazia todo sentido. Sua postura firme comparava-se a de um lutador. Sua cabeça raspada, barba cheia, e seus olhos azuis escurecidos por suas pupilas dilatadas. Tatuagens, e brincos brilhantes em suas orelhas. A camisa com as mangas já curtas, dobradas sobre os ombros, a calça desbotada e com rasgos nos joelhos, um estilo jovial, mesmo que os fios grisalhos que espetavam em seu rosto pudessem dizer o contrário.

Era possível identificar um lutador a quilômetros de distância. Acredito que eles possuam algo único, e inconfundível.

Apenas não saberia dizer o que, mas, talvez, pudesse numerar em uma lista.

— É um prazer conhecê-la, Hope. – acena e mostra-me um sorriso pequeno.

Seu olhar era de pura curiosidade. Ele devia estar se perguntando o que todos os outros ao redor deviam se questionar; o que um lutador como Justin fazia ao lado de uma garota ligada a uma cânula para respirar?

Não poderia culpá-los.

— Pronto para o treino? – Tyler questiona, olhando para o loiro que tinha seu olhar direcionado em mim. De soslaio conseguia senti-lo estimular o rubor em minha pele. — A luta de amanhã é importante, Drew. O colocará a um passo das finais.

— Eu sei. – Justin assobia. — Irei treinar, mas será de uma maneira diferente.

Arrisco-me encarar o grande homem parado em minha frente, e sua sobrancelha esquerda arqueia para cima.

— Confie em mim, cara. – o lutador solta uma risada pelo nariz. — Irei vencer a luta, e todas as outras. Você sabe, eu nunca perco. O cinturão é meu.

Ele nunca perdia.

Era uma verdade que sabia sobre ele, assim como todos ao redor do mundo que tinham conhecimento sobre Justin Bieber. Após cada uma de suas lutas, seu rosto estampava os noticiários de todos os canais televisivos, e até nos corredores do hospital o seu nome era comentado. Ele era idolatrado por ser tão jovem e talentoso. No entanto, isso era tudo o que sabia sobre ele.

Estava entregando minhas emoções nas mãos de um desconhecido.

Isso era um sinal que minha sanidade não estava em sua melhor funcionalidade.

— Vem comigo. – aproxima-se de mim, e ainda segurando em minha mão, puxa-me para segui-lo.

Abaixo minha cabeça ao passar ao lado de Tyler, e evito erguer o olhar para encarar qualquer pessoa da academia. Justin me faz encarar de perto um dos ringues, e sem avisar-me, dá início a movimentos tão ligeiros que só me conscientizo quando estou do outro lado das linhas alternadas entre o vermelho e azul. Eu e a minha mochila estávamos no tatame de um ringue de verdade.

— O que...

— Espere um pouco. Volto logo. – divaga já se afastando, empurrando uma porta de madeira envelhecida.

Retornando, alguns minutos depois, carregando em suas mãos toalhas, garrafas de água e luvas de boxe. Não compreendo o que se passava em sua cabeça, mas assim que ele se coloca para dentro do ringue, caminha em minha direção e para a alguns passos, notando o quão perdida me sentia, completamente imóvel no mesmo lugar em que me deixou.

— Você irá lutar.

— Desculpe? – umedeço os lábios, balançando a cabeça. — Justin, eu não sei se percebeu, mas não sou como essas pessoas... Como você.

— Exatamente! – acaba com a distância entre nós. — Canalize suas frustrações nos seus punhos, e soque esse saco de pancadas o mais forte que conseguir.

Não lhe respondo, apenas sinto seus dedos longos e calejados circularem meus pulsos, e em movimentos rápidos e práticos, meus punhos são envolvidos por luvas macias e cheias. Estava completamente alheia, não compreendendo o que ele estava pensando em colocar-me dentro de um ringue, me empurrando luvas e falando sobre socos. Não fazia o menor sentido.

— Isso é loucura, Justin! – replico, olhando para meus punhos. — O que exatamente quer que eu faça?

Ele sorri, e puxando o velcro das luvas pretas em suas mãos com os dentes, encaixa-as em seus próprios punhos fechados, usando seu tronco como apoio e, agilmente, ele estava tão pronto quanto em todas as lutas que eu assisti. Sua pose de lutador era nítida e implacável, fazia sentido ele estar sorrindo tranquilo, como se estivesse em seu habitat natural, enquanto uma garota ligada a uma cânula para respirar não passava de uma intrusa.

Eu era um gato assustado em uma selva rodeada por leões.

— Venha. – com o braço esquerdo, puxa-me pela cintura, me colocando de frente para um saco de pancadas que estava pendurado por correntes, ficando no meio do ringue. — Lembre-se... Coloque todas as suas emoções aqui... – levanta meus braços, ajeitando-os do seu modo. — Tenha seus joelhos assim... – dobrando o joelho esquerdo, encaixa-o entre os meus, os afastando. — Respire fundo... – com a ponta da luva que cobria a sua mão direita, toca o meu queixo, erguendo-o. — Esqueça que está em uma academia cercada por lutares e monstros da luta. Pense apenas no que lhe desperta incômodo, raiva, medo, angustia, dor. E soque quantas vezes for necessário para ajudá-la a se livrar disso. – olhando-me com cautela, ele sopra contra meu rosto, balançando alguns fios do meu cabelo. — Se não quiser fazer isso, irei entender se começar a me achar um grande idiota. Mas, foi a única maneira que encontrei para me libertar, e se me ajudou, não vejo problema em compartilhar esse método com você. Caso não funcione, eu prometo me esforçar para encontrar outro. Só quero ajudá-la, Hope.

Muitas pessoas queriam me ajudar. No entanto, nenhuma delas pensou em algo tão ousado e, aparentemente, impossível de dar certo. Eu gostava disso, porque era uma forma de conhecer Justin, agora eu sabia que ele também lidava com emoções e, de alguma maneira, me sentia segura ao seu lado, compartilhando algo que não conseguia entender, mas apreciava sentir.

Pisco duas vezes, e respiro fundo. Respiro fundo, sentindo uma leve dor vibrar em meu peito. Não era algo insuportável, apenas comum. Minhas mãos suavam sob a espuma revestida pelo couro vermelho e fino. Concentro-me no saco de pancadas em minha frente, nunca havia visto um tão de perto. Em filmes de luta, que eram os preferidos de Mackenzie, pareciam menores e mais leves, mas analisando-o bem, tenho absoluta certeza de que não teria forças para suportá-lo.

Conto até quatro, mentalmente.

Um, dois... Inspiro.

Três, quatro... Respiro.

Estreitando os olhos, desligo-me das vozes altas e roucas que ouvia preencher o ambiente, e foco apenas em minhas emoções, como Justin disse para fazer. Não tinha ideia de quão libertador poderia ser fazer algo assim, ir contra meus próprios limites, e enfrentar minha racionalidade temerosa. Mas o faço.

Disparo o primeiro soco no saco de pancadas que nem ao menos se mexe, mas algo diferente passa a correr em minhas veias. Era adrenalina, a sensação única de estar fazendo algo errado, e muito imprudente. Embora, muito bom e estimulante.

Solto uma risada que engasga em minha garganta, e olho para o loiro que me analisava com cautela, mas ao notar que toda a tensão tinha me abandonado, ele sorri também, e seu sorriso me faz arfar, enquanto volto a minha atenção para o meu único inimigo mais forte e invencível naquele instante. 

Os próximos socos são mais fortes, e eu sinto tudo.

Raiva por ter sido escolhida para ter essa doença.

Mais um soco.

Angustia por todas as noites assistir minha família se desestabilizar, sem poder fazer absolutamente nada para ajudá-los.

Outro.

Dor por viver com algo que não pode ser arrancado para fora sem que me mate.

Dois socos mais fortes.

Incômodo por todos os olhares penosos que recebo sempre que saio de casa.

Três pancadas brutas.

Medo por saber que não posso lutar, porque é uma batalha perdida.

Muitos socos agora.

Perco-me na contagem, tendo minhas vistas embaçadas pelas lágrimas que começaram a cair em algum momento.

Um misto de tudo por saber que não terei tempo suficiente para estar com ele.

— Hope! Ei, ei, ei... Chega. – sua voz me atinge, e seus braços agarram-me pelos ombros. Encosto minha cabeça em seu peito, sentindo seu cheiro invadir minhas narinas, enquanto as lágrimas salgadas molhavam sua camisa. Eu estava em choque. — Está tudo bem, chega. Você precisa respirar, e se acalmar.

Eu não conseguia.

Não fazia ideia da razão existente por trás dos espasmos em meu corpo trêmulo. Mas eu não tinha mais forças, meus ossos estavam como borracha, e meus pés pareciam estar pisando em algo tão macio que ia além da lona sobre o piso.

— Eu... – um soluço me escapa, e afundo mais o meu rosto contra o peitoral largo de Justin que me envolve em um abraço caloroso. — Desculpe...

— O que? Não! – suas mãos cobrem o meu rosto, e não tenho noção de quando ele se livrou das luvas. — Eu que lhe devo desculpas. Fui idiota, mais uma vez. Devia tê-la levado para tomar um café da manhã em um local seguro ontem, e um jantar essa noite seria o ideal. Irei entender se nunca mais quiser me ver, é só que...

Nego com a cabeça tão depressa que me sinto um pouco zonza. Ergo meu rosto, tentando olhá-lo.

— Estou bem, Justin. De verdade. – as palavras saem por um fio. — Você não é um idiota. Esses encontros... – suspiro, fungando baixinho. — Foram os melhores de toda a minha vida.

Ele não sorri, mas a escuridão de seus olhos desaparece, lentamente. Sua expressão séria suaviza. E seus lábios rosados descolam ao mesmo tempo em que a ponta de sua língua se arrasta preguiçosamente por entre eles.

— Isso me deixa aliviado. – confessa, levando as mãos para o alto de sua cabeça, dando alguns passos para trás. — Se algo lhe acontecesse...

— Nada aconteceu. – corto-o, e piscando depressa para espantar as lágrimas que já não rolavam mais, apenas picavam meus olhos, estendo minhas luvas em sua direção. — Acredito que fui tomada pelas emoções. Acho que há muitas delas em minha cabeça, e deixá-las sair foi bom, só me assustou um pouco.

Ele me analisa por um instante, procurando por indícios de uma mentira. Mas nada encontra.

— Você precisa treinar, Drew! – a voz de Tyler atrai o olhar de Justin. — Não quero estragar qualquer coisa que esteja acontecendo aqui, mas preciso que seu traseiro esteja preparado para amanhã.

Trincando os dentes, o lutador assente e olha para mim, como se estivesse se desculpando e sentindo raiva ao mesmo tempo.

— Desculpe-me por isso. Eu juro que serei rápido. – suspira, inconformado consigo mesmo. — Só preciso mostrar para esse grande imbecil que estou pronto para lutar.

Solto uma risada trêmula, assentindo.

— Não há problemas, Justin. Irei esperar... – girando meu indicador esquerdo no ar, tento apontar para algum ponto fora do ringue. — Treine o quanto for necessário.

Resmungando, ele coça a sua cabeça.

— Devo ser a pior pessoa para se sair em um encontro.

Mordendo o lado interno da minha bochecha, abaixo o olhar.

Ele não fazia ideia de que, além de ser meu primeiro encontro, estava marcando minha mente da melhor maneira.

— Estarei bem ali. – curvo-me para trás, alcançando minha mochila e arrasto-a comigo.

Em passos largos, Justin lança suas pernas e tronco para fora do ringue, erguendo as fitas e agarrando minha cintura com um de seus braços, pousando-me novamente no chão. Minhas pernas estavam um pouco mais fortes agora, e eu tinha certeza que poderia caminhar sem cambalear para desabar. Sorrindo amarelo, distancio-me dele, mas antes, aceito a garrafa de água que se prontifica a me estender antes que marche para longe.

Não olho para os lados, mas ouço os murmúrios dos homens que agem como se fossem moças em um salão de beleza. Ignorando-os, encontro um par de cadeiras para me sentar ao lado do que se parecia com uma recepção, e na parede ao lado observo todos os títulos emoldurados em quadros espelhados e fotos. Em uma das fotografias tenho certeza de avistar Justin, ainda que distante e muito pequeno, era inevitável não reconhecer seu corpo pintado pelas várias tatuagens, e o cinturão que venceu em uma de suas mais belas vitórias.

Ele era incrível, uma verdadeira máquina de destruição.

Se seus oponentes soubessem o quão adorável ele consegue ser, não o temeriam tanto.

Rindo do meu próprio pensamento tolo, solto minha mochila na cadeira ao lado e puxo o lacre da garrafa de água, destampando-a e levando o líquido fresco para a minha garganta seca. Meus olhos saltam para fora assim que se prendem no corpo agitado que saltava de um lado para o outro sobre o ringue. Confiante, rápido, fugaz. Ele socava o saco de pancadas como se pesasse menos que uma pluma, e seu treinador grita com ele logo embaixo, soltando alguns praguejares e palavras sujas para incentivá-lo. Era como se esse fosse o seu alimento, sua fonte pura de êxtase.

Tão rápido quanto um raio, ele socava e dava chutes precisos. E quando o saco de pancadas é lançado longe por seus próprios braços, e um dos lutadores da academia se coloca no ringue, é quando ele dá o seu show. E eu podia assistir tudo de perto, sentindo meus dedos apertarem o plástico da garrafa quase sem água. Era agressivo, sem o menor sinal de que eles não podiam se machucar. Muito pelo contrário. Cada punho que acertava um membro, juntamente com uma joelhada traiçoeira, era para valer, completamente intencional. Perco o fôlego quando Justin sofre dois atritos com o olho esquerdo na luva esquerda de seu adversário, e um encontro com o joelho direito e seu estômago.

Eu queria vomitar.

Contudo, um mar de calmaria me atinge quando ele revida e lança seu oponente na lona, bloqueando seus braços em suas costas. Urros e gritos se espalham pela academia, e eu me encolho, tendo ainda mais certeza de não estar no lugar certo, mas por alguma razão, assim que o par de olhos intensos pairam sobre mim, abro um sorriso sincero.

Tateio bolso da minha roupa e alcanço o meu celular, deslizando o polegar livre sobre a tela, enquanto abria a câmera para registrar um momento que minha melhor amiga pagaria para ver de perto. Certifico-me de fotografar a maioria dos corpos musculosos espalhados na academia, sendo cuidadosa para não ser pega em flagrante. Terminando, envio todas as imagens para ela que não demora em me responder com vários palavrões nos três idiomas que ela conhecia, logo atrás de alguns áudios com gritos e mais palavras que eu tinha certeza não existir em nenhum dicionário.

Guardo meu telefone após soltar algumas risadas, sabendo que lidaria com um redemoinho de perguntas quando a encontrasse, e volto a acompanhar o mais belo homem que tinha sua concentração em saltar sobre cordas, e fazer alguns exercícios para sua musculatura.

Não tinha a menor dúvida de que esse homem era cobiçado por onde quer que passava. Mulher alguma poderia atravessar a rua sem ao menos espiá-lo de canto, mesmo acompanhada por alguém. Ele era lindo, e possuía traços restritos, feitos sob medida apenas para o próprio, a personificação humana de um anjo. Um homem bruto com essência de menino.

Nunca senti atração por alguém que estivesse muito distante do meu alcance. E garotos de colégio não entravam nessa lista. Portanto, Justin é o primeiro, e eu acho que será o único. Sinto-me tão nervosa ao seu lado, e maravilhosamente encantada sobre tudo. Quero saber qualquer coisa sobre ele, ouvir sua voz, ler a seu respeito. Almejo estar dentro. Conhecer seus gostos, manias, medos, sonhos.

Por isso eu aceitei seu segundo convite, sabendo que não conseguiria lhe dizer não.

Estava feliz de estar onde estava.

Perco a noção do tempo, sempre com meus olhos fixos em seus instintos. Depois de trocar um cumprimento com seu treinador, ele se lança para fora do ringue. Caminhando, secando seu rosto com as pontas de uma toalha de rosto que cobria seus ombros, aproxima-se de mim, parando em minha frente, erguendo suas sobrancelhas grossas. Seu rosto estava corado, até a ponta de seu nariz, e as gotículas de suor escorriam por sua cabeça, se perdendo em manchas visíveis em sua camisa.

— Como eu fui? – olha-me esperançoso.

— Foi bom... – torço os lábios.  — Isso, bom.

Seus olhos se estreitam.

— Esforcei-me como um animal em combate para impressioná-la, e tudo o que ouço é que fui bom? – faz beicinho. — Estou ficando sem ideias de como agradá-la, Hope. Isso destrói a autoestima de um homem.

Engulo uma risada, e balanço a cabeça.

— Tenho certeza que esse truque já funcionou para muitas garotas. – minha voz soa com humor, mas não estava honestamente contente em imaginar belas mulheres recendo todas as essas novidades.

— Nenhuma valeu tanto esforço. – diz com seriedade. — E pelo visto, terei que ser melhor para conseguir ao menos um ‘’ótimo’’.

Sinto-me queimando, mas não consigo conter o pequeno sorriso.

Se eu pudesse me dar ao luxo de ludibriar-me com algo em minha vida, que fosse com a possibilidade de ter algo exclusivo de alguém como Justin.

— Irei tomar uma ducha rápida para tirar todo o suor... – faz uma careta. — Volto em alguns minutos. Pode esperar por mim?

— Claro.

— Irei levá-la para almoçar.

Não era um convite, mas sim uma breve informação do que faríamos, eu estando preparada ou não.

Ele se afasta, bagunçando os fios curtos de seu cabelo ao arrastar a toalha já úmida. Com as mãos apoiadas nas laterais da cadeira, balanço minhas pernas e pés que não tocavam o chão.

Não era tão interessante observar qualquer outra pessoa lutando. Eram inegavelmente bons, e muito violentos também, mas aos meus olhos inexperientes e confusos, ninguém se comparava a ele. Nenhum desses caras tinham o seu brilho e incrível leveza.

Talvez eu estivesse encrencada.

Balanço minha cabeça, e continuo me perdendo em pensamentos insanos, enquanto olhava para o mundo que jamais poderia fazer parte.

Justin foi rápido, e quando retornou vestido em novas roupas, mas tão semelhantes com as outras que parecia sempre estar vestindo. Jeans desbotado, uma camisa preta de mangas curtas, o mesmo par de tênis e o cabelo molhado. Simples e incrivelmente irresistível.

— Gostou do lugar? – questiona, logo após de ter escolhido para mim um prato de massas, alegando ser o melhor da cidade. — Pensei que precisasse de um pouco de estabilidade. Sem altura ou aventuras pelo resto do dia.

Soltando uma risada, umedeço os lábios.

— Eu gostei. – afirmo. — De tudo, Justin.

Não fazia ideia de que iríamos a um restaurante requintado. Olheiros não desviaram o olhar de nós dois, e senti-me mais deslocada que antes. Não estava vestida adequadamente para isso, e ele, mesmo que tão casual, parecia estar no lugar certo, trajado com a roupa certa. Era tão injusto.

Relaxa seu corpo largo na cadeira que parecia pequena para ele.

— Então, isso quer dizer que estou conseguindo balançar o seu coração? – eu queria negar, ou assentir, mas apenas encolho os ombros.  — Vou trabalhar duro para isso, Hope. Dê-me apenas um tempo.

Tempo.

Eu queria mesmo chorar.

— Amanhã é um grande dia, uh? – mudo de assunto, estrategicamente. — Todos parecem muito empolgados.

— É o passo que falta para que eu mergulhe nas finais. – brinca com o guardanapo entre seus dedos. — Foi uma temporada difícil. A última luta quase me resultou em um tempo de repouso.

— Mas o seu braço ainda está ferido. – relembro-o, apontando para o inchaço nada natural em sua pele tatuada. — Você devia ter se mantido com a faixa.

— Eu já quebrei todos os lugares possíveis do meu corpo, Hope. Não foi uma grande coisa. – replica. — Não posso ter qualquer tipo de problema até as finais.

Não posso contestá-lo.

— De onde você é? – minha curiosidade trabalha antes que e possa filtrar as perguntas. — Quero dizer, como você começou com tudo isso.

— Sou da Virginia. – sorri. — Fui descoberto no colégio. Eu lutava ilegalmente no subsolo da cidade. Nunca perdia uma única luta, e muitos caras tinham medo de me enfrentar, outros me detestavam por sempre vencer. Era dinheiro fácil em minhas mãos e, naquela época, minha mãe era doente, precisava de alguma maneira conseguir o máximo que pudesse para o seu tratamento. Trabalhava durante o dia em uma oficina mecânica, mas os trocados que ganhava iam todos nas despesas da casa.

— E como sua mãe está?

E o olhar sempre divertido de Justin, fica triste de repente.

— Ela faleceu alguns meses depois. – preparo-me para lhe pedir desculpas por ser inconveniente, mas um sorriso amarelo ergue os cantos de seus lábios. — Está tudo bem. Éramos apenas nós dois, e eu fiquei desamparado quando aconteceu. Perdi completamente a cabeça, e aceitei a luta que me causou os maiores problemas possíveis. Tudo estava sob controle, até que a polícia chegou e invadiu o local, era um ponto de drogas e dinheiro sujo através de apostas e esquemas. Eu não consegui fugir a tempo, pois minha mente estava tão pesada quanto meu corpo, fui preso e passei a noite na cadeia.

— Meu Deus! – levo as mãos aos lábios, cobrindo-os.

— Até hoje não sei como, mas Tyler me encontrou e pagou minha fiança. Eu sabia quem era ele, uma lenda dos ringues. Fui acolhido como se fosse seu irmão mais novo, e aprendi com ele tudo o que faço agora. – sorri, dessa vez, sincero. — Ele me tornou o melhor. Deu-me a chance de terminar o colegial, em seguida a universidade, mas sempre me empurrando de cara para as lutas profissionais. Tivemos muitos problemas, no inicio, ele é um sádico cretino, e eu era um adolescente arrogante e amargurado. Já pode imaginar... – encara o garçom que se aproxima com nossos pratos. — Aquele homem foi o meu salvador, e moldou-me para ser o que me tornei. Se eu sou bom, lembro que preciso ser o melhor. Se sou o melhor, lembro que é necessário continuar sendo.

Tento sorrir para o garçom após sentir o aroma delicioso da massa banhada a molho branco, mas não consigo.

Justin agradece-o, e olha para mim.

— A sua mãe... – limpo a garganta. — Que doença a levou?

Com o olhar vazio, ele encara os meus olhos já marejados.

— Câncer. – responde, simplesmente. — Um fodido e incontrolável câncer.

Qualquer apetite que eu tinha, havia acabado de desaparecer.

(...)

Mal toquei em minha comida, e isso preocupou Justin. Ele pensava que, por alguma razão inexistente, a culpa era sua. Tranquilizei-o como consegui, mas era impossível esconder a minha tristeza.

Ele não era ruim por ter lutado ilegalmente por dinheiro, e não seria se tivesse roubado alguns trocados para isso. Tudo foi feito pela sua mãe que não resistiu a luta. Era doloroso imaginá-lo sozinho, e eu queria apenas abraçar o seu corpo e não soltá-lo, podendo afirmar que tudo ficaria bem, e que me tinha ao seu lado, se isso pudesse significar algo.

— Obrigada por hoje. – murmuro após alguns segundos de silêncio, parada em frente a minha porta.

Seu sorriso ilumina o seu rosto bonito, e ele afunda as mãos nos bolsos de sua calça.

— Eu sou o único que deve agradecer por algo, Hope. – jamais me acostumaria com o meu nome sendo pronunciado em sua voz cheia de vida. — Estou ficando viciado em estar com você.

— E isso é bom? – ergo as sobrancelhas, sentindo-me, pela vigésima vez no dia, corar.

— Diga-me você. – dá um passo para frente. — Irá aguentar lidar com minha insistência para vê-la todos os dias?

Abaixo a cabeça, sentindo uma cortina de cabelo cobrir o meu rosto, bloqueando dele a visão do meu sorriso involuntário.

E antes que eu possa respondê-lo, pensando bem em minha resposta, sinto as pontas de seus dedos tocarem meu rosto, fazendo-me aquietar-me no alto da varanda. Levando os fios do meu cabelo para trás da minha orelha direita, ele acaricia o mesmo lado, sem saber que estava causando uma sensação de incêndio por onde seus dedos corriam.

— Vai me ver lutar amanhã? – sopra em meu rosto, próximo demais para a minha sanidade.

Eu não poderia.

Mas eu queria.

Sim, eu queria estar presente em sua luta.

— Farei o possível. – sou complacente.

Inclino a cabeça para o seu toque gentil, como uma gata manhosa, e isso me envergonha, mas o faz sorrir tão estonteantemente que minha atenção está toda em seus lábios.

Arregalo os olhos ao vê-lo quebrando subindo o último degrau, aproximando nossos rostos. Eu sinto sua respiração quente, seu cheiro de colônia, e seu hálito mentolado. Sou tão pequena, e isso facilita o seu ato tão puro. Um beijo demorado é depositado em minha testa, e eu agarro-me em sua camisa da melhor maneira que posso, fechando meus olhos e suspirando.

— Boa sorte. – sussurro assim que se afasta, alvoroçando a dança das borboletas em meu estômago.

— Se você estiver lá, eu a terei a meu favor. – garante, e desce os degraus de costas, com seus olhos ainda nos meus.

Ele não fazia ideia do que causava em mim. Talvez soubesse, e estivesse assumindo esse controle tão perigoso.

Observo-o partir, e sinto-o levar consigo algo que me pertence. Ou um dia pertenceu.

Giro os calcanhares, apertando a rosa em uma mão, enquanto a outra se mantinha firme em minha mochila. Empurro a porta de casa, e sinto um chiado em meu ouvido, se espalhando por minha cabeça. Dou dois passos para frente, estando completamente dentro, mas não tenho firmeza para permanecer caminhando sem que minhas costas fecham a porta atrás de mim, enquanto meu corpo buscava apoio por conta própria.

Não tenho certeza do que acontece nos momentos seguintes. Estou piscando, mas minha visão fica turva. Eu sei que minha mãe está gritando ao correr para mim, mas não a ouço. Não respiro, porque não consigo. Ainda que lute bravamente para conseguir um pouco de ar até tudo apagar.


Notas Finais




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