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História Catarina: a homossexualidades nos anos 50 - Capítulo Oitavo


Escrita por: xxthays

Capítulo 8 - Capítulo Oitavo


Durante o final de semana ficamos em nossa casa de praia, as crianças faltaram na escola na sexta-feira. Reginaldo queria passar um tempo com os filhos e como não tinha consultas marcadas, decidiu que deveríamos viajar só nós quatro.

- Quero mais um filho – ele disse, antes de deitarmos.

- Pra que? Pra fingir que gosta das crianças uma vez por ano?

- Onde errei com você para ser tão respondona? Não conheço uma mulher de amigos meus que enfrente tanto seus maridos.

- Olha aqui, Reginaldo – falei me virando para ele, após colocar minha camisola – não se dê tanto o valor acreditando que “você errou” em alguma coisa. Você é apenas meu marido, não meu dono.

- APENAS? – ele gritou, se levantando da cama e chegando perto de mim

- É, apenas. Se casou comigo porque quis. Não era isso que eu queria. Paga minhas contas porque quer, e se não estiver contente e quiser o divórcio estou pronta para assina-lo.

- Divórcio, oras, não me casei para ter em meu currículo que sou divorciado. Tenho um trato com seu pai desde que você nasceu. No papel sou teu marido, para a sociedade sou eu quem mando. Eu falo, você obedece. Está mais do que na hora de entender isso.

- É assim que você quer respeito, Reginaldo? Você tem certeza?

- Quero submissão. Você é só uma mulher. Não trabalha, mal limpa a casa e mal serve para me dar prazer. A única coisa que exijo agora é seu silêncio e as cabeça abaixada todas as vezes que eu lhe ordenar algo. Estamos entendidos?

- Cale a boca! Machista opressor de merda. – Falei espontaneamente. Levei um tapa no rosto. Impotência.

- Deite-se. Agora.

                Servir de marionete para satisfazer os desejos sexuais de Raginaldo já era costume. O que estava doendo era meu orgulho, a humilhação de apanhar de um homem, a falta de liberdade para falar o que quero e, claro, a impotência.

                Aquela fora apenas mais uma entre tantas noites onde não tive escolha e fui obrigada a me deitar com quem não queria. Mas naquele dia em especifico, após o ato sexual, uma pessoa apenas veio em minha mente: Catarina.

                Quem era Catarina, além de professora da minha filha? De onde veio, o que fez até chegar aqui, qual era o seu passado, seus sonhos, vontades, medos. Eu queria saber de Catarina.  Aquela mulher tão linda, tão doce e amável. Dona da beleza mais exótica que eu já havia me deparado, de olhar misterioso e sorriso fácil. Catarina. Quem é você?

                No sábado decidimos chamar meus pais e meus irmãos para almoçar em nossa casa, feito família feliz e unida, todos chegaram juntos.

                Amauri estava estudando para ser médico, agora era o padrinho de Rafaela e chegou com alguns presentes tanto para ela quanto para Renato, em seu carro vieram também Antônio e Aroldo, que já eram adolescentes e estavam em uma fase conturbada da vida, onde papai não os entendia e não os apoiava em nada do que decidiam.

                Augusto era o preferido de papai. Fisicamente não se pareciam em nada, mas até falavam com a mesma entonação. Estava estudando para assumir o cargo de delegado da cidade já que papai estava prestes a se aposentar. Guto era papai todinho, o que é uma pena, já que isso o tornou um jovem machista e opressor que só pensava em seu próprio bem. Ele chegou sozinho em seu carro, pois não pretendia ficar até domingo.

                Mamãe chegou perguntando como estava Rafa e papai veio com uma garrafa de whisky cara para agradar Reginaldo. Puxa saco.

                Nossos almoços em família eram cheios de falsidade e briga de ego. Papai fingia adorar o fato de que Reginaldo estava sendo cada vez mais reconhecido em sua área, mas torcia firmemente para que ele abandonasse o cargo e Amauri pudesse assumir o posto.  Papai queria mesmo que a Família Bongiovanni dominasse a cidade de San Pitter.

- E Antônio, o que pretende fazer da vida? – Reginaldo perguntou

- Esse daqui vai ser dentista. Escreve o que estou falando, vai ser o melhor da cidade! – Papai respondeu enquanto colocava comida na boca.

- Já disse que não sei se quero fazer isso – Toni respondeu apático

- Mas já estamos no processo de convencimento...

- Ótimo! Toda cidade precisa de um bom dentista, Antônio! E não será muito difícil tomar o lugar do Doutor Márcio. Aquele lá parece que não sabe nem quando é dois mais dois. – papai e Reginaldo riram, mas ninguém mais viu graça além de Augusto.

- E Aroldo? Já pensou no que quer?

- Aroldo será presidente! Fará direito para concorrer à prefeitura de San Pitter.

- Mas que ótima notícia!  Então quer dizer que teremos um político na família?

- Não, eu já disse que vou ser professor. – Aroldo respondeu com voz grossa e cansada, como quem já falara sobre esse assunto repetidas vezes.

- Professor, oras, que coisa de menininha. – Reginaldo brincou.

- Fora Ana Luiza, Aroldo é a segunda menina da família – Augusto brincou de forma rude, papai e Reginaldo riram. Aroldo se retirou.

- Vocês são nojentos. Fui atrás de meu irmão, que estava na beira da piscina.

                Aroldo era o mais novo, aos 17 anos sabia exatamente o que queria, mas era barrado por meu pai.

- Ei! Não fica assim. – Me sentei perto dele.

- Eu não aguento mais ser chamado por mulher simplesmente por querer ensinar.

- Não se preocupe, eles são machistas, não entendem que qualquer um pode ser o que quiser. Profissão não tem gênero.

- Tudo pra eles tem gênero. Tudo. Eu juro que não sou gay, Aninha, juro! – Disse nervoso.

- Se acalme! Não leve isso como uma ofensa. Ser gay é só amar outro homem, tá tudo bem se você for.

- Mas eu não sou. Não teria problema nenhum em assumir pra você se eu fosse. Mas não sou. Só quero ser professor.

- Eu tenho uma amiga pra te apresentar – Pensei em Catarina.

- Quem?

- A professora da Rafa. Ela é uma pessoa iluminada, cheia de pensamentos desconstruídos. Talvez se você conversar com ela, vai se sentir mais à vontade para seguir seu sonho.      

                Naquele dia percebi que não eram apenas as mulheres que sofriam com os pensamentos machistas da sociedade. Meu irmão estava sofrendo com comentários preconceituosos apenas por querer ser professor. Ah, sociedade... se todos fossem como Catarina o mundo seria tão diferente.

                Era meia noite quando Augusto decidiu ir para casa.

- Filho, está tarde. Durma conosco, vá amanhã cedo. – Mamãe pediu.

- Não, mãe, combinei de tomar algumas cervejas com meus amigos ainda hoje. Em 40 minutos chegarei em San Pitter, fique tranquila.

                Ele foi, mesmo após algumas doses de whisky, entrou no carro e seguiu caminho.

                Fomos todos embora ao final da tarde no domingo, havia acabado de chegar em casa quando recebi um telefonema de mamãe. Augusto ainda não estava em casa.

- Ele deve estar em algum outro lugar, mãe, não se preocupe.

- Eu sinto que ela não voltou pra casa, Ana Luiza. Eu sinto! Até seu pai que vive me chamando de exagerada foi até a delegacia para ver se há algum registro que possa dizer onde o Guto está.

- Vou pedir para Reginaldo ir atrás disso também. Mas fique tranquila, por favor, se acalme.

                Reginaldo estava cansado e hesitou um pouco a ir até o hospital para ver se havia alguma ocorrência em nome de Augusto por lá, mas foi e não demorou a me ligar.

- Ligue para sua mãe e venham imediatamente até o hospital, tenho notícias.

                Ele não quis me dar nenhuma informação por telefone, fiquei aflita, mamãe não parava de chorar e papai estava claramente abalado com a situação. Rafaela e Renato ficaram na casa de meus pais, junto de Aroldo. Meus outros irmãos também foram até o hospital.

- Ele bateu o carro em uma árvore e foi encontrado hoje às 13h perto da entrada de San Pitter. Não havia ninguém no local, Augusto perdeu muito sangue e precisa com urgência de sangue.

- E como podemos achar sangue pra ele, doutor? Nós podemos pagar. – papai disse

- Apenas através da hemoterapia. É um tratamento que exige muito dinheiro e pessoas dispostas a fazer a transfusão de sangue. O que é muito difícil de encontrar em San Pitter.

- Eu posso doar meu sangue! Todos aqui podemos. – Papai disse imediatamente, enquanto mamãe estava em estado de choque. – E ainda hoje mando alguns homens até São Paulo para procurarem pessoas que aceitem fazer a transfusão, duvido que não venham se pagarmos bem.

- Sim, sim! Há restrições para doação de sangue? – Perguntei.

- Não, só devemos ter certeza do tipo sanguíneo de todos os envolvidos. Pelo que vi na ficha médica, Augusto é O- o que dificulta um pouco as coisas.

- Como assim?

- Augusto é doador universal, não receptor. Esse tipo sanguíneo é muito raro de ser encontrado. Provavelmente apenas os irmãos e o pai vão poder doar, já que pude ver que Dona Alice é A-, consequentemente Francisco é O- também. De qualquer forma peço para que todos vocês façam o exame para sabermos se todos estão aptos a fazer a transfusão de sangue.

- Podemos chamar Aroldo também, vou busca-lo enquanto fazem os exames dos demais.

- Doutor Francisco, não recomendo que o senhor o traga aqui para isso. Caso ele realmente seja homossexual, é proibido realizar a transfusão.

- Homossexual?

- É, vocês não disseram que ele é a mulher da família?

- Sim, dissemos – papai ficou calado e apenas aceitou. Fomos todos até a sala de exames.

                Foram horas e horas dentro do hospital, todos aflitos, cansados e esperando a hora de fazer a transfusão de sangue, e aguardando qualquer sinal de melhora de Guto.

                Papai estava exausto e devastado, até que Reginaldo voltou para nos chamar.

- Senhor Francisco, sinto lhe informar que o senhor também não pode doar sangue a Augusto.

- O que? Como não? Sou pai dele!

- Desculpe dar tal noticia em uma situação tão inapropriada.

                Ninguém estava entendendo nada. Olhei para mamãe, ela estava literalmente em choque. Não se mexia, nem piscava, seus olhos estavam arregalados e seu corpo tremendo.

- O senhor não é pai do Augusto. – Reginaldo disse rapidamente.

- Como assim? Eu sou pai dele sim, somos parecidos em tudo. Não brinque em uma hora dessa, Reginaldo, por favor.

- Precisamos levar o primeiro até a sala de transfusão. Recomendo que seja Amauri, por ser mais forte e por isso poder doar mais.

- VOCÊ ESTÁ BRINCANDO COMIGO? – Papai o segurou pelo colarinho de seu jaleco branco – NÃO BRINQUE COM ESSAS COISAS! MEU FILHO ESTÁ EM PERIGO!

- Por favor, acalme-se. Isso o senhor deve conversar com sua mulher – Os dois olharam para mamãe, que continuava estática.

- Alice, diz que ele está errado para que eu possa ir até a sala e salvar o nosso filho, diz Alice! DIZ! – papai se dirigiu até mamãe e a balançou pelos ombros – DIGA ALGO!

- Estamos perdendo tempo, preciso que alguém me acompanhe até a sala de transfusão.

- Eu vou. – Amauri se prontificou – Por favor, se resolvam.

- O que está acontecendo aqui? Meu Deus! O que está acontecendo, isso só pode ser um pesadelo. – Papai dizia inquieto, andando pelo hospital.

- Pai, se acalme! – Antônio disse.

- COMO POSSO ME ACALMAR SE ESTOU CASADO COM UMA VAGABUNDA! – Se dirigiu até minha mãe e a bateu no rosto. Ela continuou imóvel.

- NÃO BATA NELA! – Me levantei

- Cale a boca ou vou te bater também, revoltadinha de merda. O único lado bom de tudo isso é que talvez você também não seja minha filha.

- CALE A BOCA! É POR ISSO QUE MINHA MÃE TE TRAIU! PORQUE VOCÊ É UM NOJENTO. – Ele me bateu.

- Senhores, por favor, contenham-se. Vocês estão em um hospital. – Uma enfermeira pediu

- VOCÊ SABE QUEM EU SOU PRA ME MANDAR FICAR QUIETO? – papai chegou perto dela e apontou o dedo – Além de delegado da cidade de San Pitter, sou sogro do DONO desse hospital. PORTANTO, CALE A BOCA A SENHORITA.

- Estou apenas fazendo meu trabalho, este ambiente é privado e tem leis internas. Qualquer ato que vá contra as normas do hospital é passível de expulsão do local. Contenha-se. – a enfermeira se retirou, sem abaixar a cabeça, o que deixou meu pai ainda mais nervoso.

- Enfermeirazinha de merda.

                Achei muito bom alguém conseguir conter meu pai de tal forma, ele estava descontrolado e muito nervoso. Foi para casa e eu fiz questão de deixar mamãe no hospital.

- Essa traidora vai comigo.

                Tentei segura-lo, pedi mil vezes para que não fizesse nada com minha mãe e deixasse-a conosco esperando notícias de Guto. Mas papai era mau, queria depositar toda sua raiva em minha mãe e assim o fez.

                Foram para casa, fiquei junto de Amauri e Antônio esperando para reversarmos nas transfusões de sangue. Fui a última a ser chamada por Reginaldo.

- Ana Luiza, você também não pode doar sangue para Augusto.

- O que? Como não? Eu não sou irmã dele?

- Eu não quis piorar as coisas – me puxou de canto, longe de meus irmãos – mas você é a única filha biológica de Francisco e Alice.

- O que? – Comecei a tremer.

- Acredite, sua mãe teve quatro filhos de outro homem.

- Não é possível, Reginaldo! Não é possível.

- Eu sei que tudo isso é muita coisa pra vocês digerirem no momento, mas a noticia boa é que provavelmente não precisemos mais de sangue. Augusto já está apresentando melhoras, então é capaz que não seja necessário nada além do que já temos.

- Eu sou a única filha dele? Você tem certeza?

- Sim, eu tenho.

                Respirei. Não sabia o que mais me doía naquele momento. Mamãe estar apanhando em casa, mesmo com seu filho internado, papai não ser pai de meus irmãos ou eu ser realmente filha dele. Por alguns instantes agradeci a Deus a hipótese de não tê-lo como pai.

                Já estava tarde, Amauri e Antônio não queriam sair do hospital antes de algum sinal de melhora concreto de Augusto. Ficamos. Eu estava aflita, todos estavam quietos. Decidi ligar para casa de meus pais.

- Aroldo, posso falar com papai?

- Papai não está aí? Ele não vem pra casa desde que vocês saíram.

- O que? – pensei no pior

- O que está acontecendo Ana Luiza? – Ele ficou nervoso.

- Nada, não é nada. As crianças estão bem? – Troquei de assunto.

- Sim, estão bem. Já estão dormindo.

- Aroldo, por favor, leve-as à escola amanhã. Ficarei no hospital provavelmente até o amanhecer e estarei cansada.

- Fique tranquila, por favor, me mande notícias.

                O pior estava acontecendo, sei que estava.

                Saímos do hospital às 7h da segunda-feira, quando Augusto já estava dando sinais de melhora. Em casa, pela primeira vez, Reginaldo pediu para que eu me deitasse em seu peito.

- Durma, foi uma noite difícil.

- Tenho medo do que ele pode ter feito com minha mãe. – Falei me aconchegando em seus ombros.

- Infelizmente é o destino de mulheres adulteras, não devemos nos meter nisso. – Ele disse, pela primeira vez em sete anos, fazendo carinho em meus cabelos.

                Adormeci. Acordei com Elvira, nossa empregada, batendo na porta. Abri.

- Dona Ana Luiza, Senhor Aroldo está na porta querendo conversar com a senhora a todo custo!

                De imediato pensei em minha mãe.

- Aroldo? Tá tudo bem? Onde estão as crianças?

- Acabei de deixa-las na escola. Aninha, estou muito preocupado. Papai e mamãe não apareceram até agora, fui até o hospital ter notícias do Guto e eles também não estavam lá. Por favor, me conte o que aconteceu.

- Aroldo, sente-se. – Sentamos no sofá – Descobrimos que papai na verdade não é pai de Augusto e não é seu pai também. Nem do Mau, nem do Toni. Eu sou a única filha dele com mamãe.

- O que, como assim? Não brinque com essas coisas, Aninha.

- Queria tanto estar brincando, irmãozinho. Tanto! Daria tudo pra não ser filha dele também. Mas o destino nos prega peças horríveis.

- Não sei o que pensar.

- Todos nós precisamos de um tempo para entender o que está acontecendo.

- Como descobriram isso?

- Fizemos exames de sangue para a Hemoterapia, precisávamos ter certeza que todos os sangues eram compatíveis....

- E o do papai não era...

- Nem o meu.

                Aroldo foi embora do mesmo jeito que eu tinha passado toda aquela noite, em choque. Não demorou muito para o telefone tocar, quem atendeu foi Reginaldo, enquanto eu estava no banho.

- Sua mãe está morta. – Ele disse enquanto eu me vestia.

- Morta?

- Não precisamos discutir sobre quem fez isso com ela, o que nos resta é cuidar do enterro e...

- MEU PAI MATOU A MINHA MÃE? ISSO SÓ PODE SER UM PESADELO, REGINALDO, POR FAVOR! DIGA QUE É UM PESADELO! – Meu desespero era tanto que mal consegui chorar. As lágrimas estavam presas.

- Ana Luiza, por favor, vista-se. Vamos cuidar do que é necessário, seus irmãos não terão maturidade para lidar com a situação.

- Ela está morta. – sentei na ponta da cama, apenas de roupas intimas

- Era um dos homens que trabalham na delegacia de seu pai.

- Como ele pôde? ...

- Ela teve o que mereceu.

- Por favor, não compactue com as maldades de meu pai. Ninguém tem o direito de matar outra pessoa. NINGUÉM!

- Adulteras morrem da mesma forma que traem.

- Cale a boca.

- Me recuso a discutir com você nessa situação. Vista-se e vamos cuidar do que devemos.

                Mamãe estava morta. Sem direito de defesa. Meus irmãos agora nunca saberiam de quem são realmente filhos. Mais uma adultera morta por ser adultera. Por ser mulher e querer coisas além de sexo às sextas e conversas sobre como está o tempo. Morta. Mamãe, morta, por papai.     

                Alice Lessa Bongiovanni, doce, jovem e uma excelente mãe. Traiu seu marido que não lhe proporcionava nada além de bens materiais. Ela não tem do que reclamar, ele dizia, dou-lhe uma casa, roupas finas e joias caras, não tem do que reclamar. Mas ela tinha.

                Faltava amor, olhos nos olhos, abraços inesperados e gratidão. Na cabeça de papai, só ela deveria ser grata por ser sustentada e mimada com material, ele não deveria agradece-la por receber massagens nos pés sempre que queria e transar quando bem entendia. Só ela deveria agradecer por ter um marido rico, ele não tinha que agradecer por ter uma mulher presente, afinal, ela não fazia mais do que sua obrigação.

                Era 17h, hora de buscar as crianças na escola. Augusto já estava acordando, papai não saiu do bar desde cedo e meus irmãos ainda estavam em choque. Cuidei de todos os preparativos para o velório, que seria as 21h.

- Dona Ana Luiza, já está tarde. Quer que eu busque as crianças na escola para a senhora?

- Não precisa, Elvira, vou trocar de roupa e já saio para busca-los. – Dentro de mim, alguma coisa só queria sair da minha realidade e olhar Catarina, mesmo que por alguns segundos.

                Fui até a escola e, de longe, como sempre, a observei falando tchau para a última criança que estava indo embora. Peguei Renato. Fui para a sala da Rafa.

- Quanto tempo, Analu! Não nos vemos desde sexta. – ela sorriu e meu coração tão angustiado amoleceu.

- Pois é, as coisas não andam muito fáceis.

- A Rafa me disse que dormiu na casa dos avós, mas quem a trouxe foi o Tio Aroldo... Está tudo bem com você?

- Está...

                Ela me olhou, eu a encarei. A abracei.

- Não, não está. – Desmoronei, as lágrimas saiam sem precisar de esforço algum. Ela me abraçou. Me senti aquecida e em casa. 



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