História Cavaleiros do Zodíaco - Depois de Gaya - Engano

Estavam todos reunidos no deserto, cercados pelo Grand Canyon. Tudo estava escuro àquela hora da madrugada. Acenderam tochas ao redor e colocaram Kanon e Gaya no meio da roda, com os braços e pernas amarrados por uma corda encantada por Mú.

— Essas cordas não serão suficientes para conter um cosmo muito elevado — Mú alertou.

— Estarei a postos com minhas rosas — disse Afrodite.

— E eu com minha Agulha Escarlate — Milo também falou. 

— Não me importo de enviar esses dois trastes para Outra Dimensão — Saga deu um sorriso sórdido. 

— Acalmem-se. Precisamos descobrir os planos de Gaya, não podemos ser agressivos — Saori falou. — Talvez ela só queira fugir da condenação e tenha desistido de matar as pessoas.

— Nem todo mundo tem o lado bom, Atena. Há aqueles que são completamente tomados pelo mal. Não deixe seu coração bondoso subestimar os inimigos — disse Máscara da Morte. — Por mim, daríamos um fim a essa mulher ordinária agora mesmo.

Ikki se aproximou de Gaya, ficou de pé diante dela e a admirou. Estava um pouco diferente, mas continuava bela e sensual. Lembrou-se dos momentos em que estavam juntos na cama, de como ela o fez delirar de prazer. Shun pesou a mão no ombro do irmão e disse:

— Ikki, não seja tolo.

— Não se preocupe, Shun. Pode confiar em mim.

— Proteja sua mente, meu irmão. Já viu como a Gaya pode ser convincente. Além disso, lembre-se que a Seika o espera na mansão.

Ikki travou os dentes e se afastou, apertando os olhos. Saga deu mais um passo à frente.

— Vamos acabar logo com isso. Vou acender meu cosmo para que Forseti nos veja aqui e apareça para levar esta vagabunda. Quanto ao Kanon, eu me encarrego de trancá-lo mais uma vez na prisão do Cabo Sunion. Garantirei que não saia de lá tão cedo.

— Não tome as decisões em meu lugar, Saga. — Saori falou com a voz firme, surpreendendo Saga e a todos. — Não gosto que se refira a uma mulher dessa maneira. Mesmo que ela tenha cometido erros graves, exijo que você respeite nossos oponentes. Sua boca fala do que seu coração está cheio e o que vejo é apenas ódio e imundícia. Um Cavaleiro de Ouro precisa de uma atitude mais nobre e sábia.

Saga perdeu o ar altivo e se ajoelhou diante de Saori.

— Perdoe-me, Atena.

Kanon finalmente despertou e, ao ver Gaya amarrada ao seu lado, correu os olhos ao redor e os pousou em Saori.

— Atena, não a mate, ela não planeja mais causar mal a ninguém, eu juro. Deixe-nos ir.

— Fique calmo, Kanon. Não vamos matá-la. Porém, os céus exigem que ela seja devolvida à prisão.

— Aquele deus imundo é mentiroso e sórdido. Ele que se vingar, vi a maneira como ele enforcou Gaya. Havia sangue em seus olhos. Não sei como alguém tão perverso pode ser o deus da justiça. Não há nenhuma gota de justiça naquilo que ele faz.

— Não cabe a nós julgarmos os deuses, Kanon. Os céus tem suas próprias leis — Aiolos falou.  

— Há muito que os céus se corromperam. Não percebem? — Kanon ficou de joelhos, com os punhos e tornozelos atados. — Quantos deuses já se voltaram contra Atena, cheios de intenções malignas?

— Não devemos nos meter nos assuntos do panteão, Atena — aconselhou Dohko —, já temos muito com que nos preocupar defendendo a Terra. Entregue logo Gaya e vamos embora pra casa. Sua vida é mais importante e precisamos de você aqui. Kanon está certo quando diz que muitos deuses se corromperam. Sem você aqui, Atena, a Terra estará à mercê de qualquer tirano.

Saori ficou em conflito. Seu coração dizia que entregar Gaya não seria a melhor decisão. Mas seus cavaleiros aconselhavam o contrário e ela precisava confiar na sabedoria deles.

— Chame Forseti, vamos confrontá-lo — Saori ordenou a Saga, que acendeu o cosmo lançando-o ao espaço.

— Não! Atena, eu imploro. Sei que não mereço nem ao menos estar em sua presença, mas eu suplico, deixe a Gaya ir. Você não imagina as atrocidades que esse deus sujo é capaz. Eu repito, não sei como um ser como ele pode ser o deus da justiça, é incompreensível.

Um cosmo poderoso tomou o lugar e bloqueou o cosmo de Saga, impedindo-o de continuar alcançando o céu. Em meio à escuridão do deserto, uma luz dourada começou a brilhar cada vez mais à medida que se aproximava.

— Shaka! — Mú alegrou-se.

O Cavaleiro de Virgem aproximou-se dos amigos, com os olhos fechados. Trazia um livro nas mãos.

— Por que bloqueou o meu cosmo? Atena me deu ordens para enviar uma mensagem à Forseti.

— Não se precipite, Saga. Sabemos exatamente as consequências de se lutar do lado errado. Nunca mais quero cometer tal erro novamente.

A atenção dos cavaleiros voltou-se para Shaka, que se ajoelhou diante de Saori e estendeu o livro.

— Atena, descobri verdades escondidas que são fundamentais para a luta que travaremos em breve. — Ele abriu o livro na página certa e o estendeu à frente. Saori pegou o livro e olhou para Mú, que se aproximou. Era um idioma desconhecido, mas o Cavaleiro de Áries sabia quase todas as línguas e dialetos existentes e extintos.

— É um poema viking!

— Isso mesmo.

Os olhos de Mú se arregalavam a cada verso.

— Então quer dizer que...

— Forseti e Gaya são irmãos adotivos — Shaka revelou, deixando todos atônitos, principalmente Kanon.

— Ele foi criado como filho e a herança seria destinada a ele — Mú continuava a reler o poema.

Shaka ficou de pé diante de Atena e falou em um tom o qual todos podiam escutar:

— O antigo deus nórdico da justiça se casou com uma valquíria e por muitos anos não conseguiram ter filhos. O deus da justiça viu seu tempo se esvair e precisava encontrar um sucessor. Havia um menino, órfão de uma das servas que cuidavam da limpeza do palácio e que havia morrido no parto. Era um filho bastado e nunca ninguém descobriu quem era o pai. O deus da justiça o adotou ainda pequeno e o criou como filho. Deu o nome a ele de Forseti e tudo indicava que ele seria o sucessor do pai. No entanto, os céus tinham outros planos e finalmente a esposa deu à luz uma menina. Sendo filha legítima, ficou decretado que a menina seria a sucessora do pai e assim que ela estivesse preparada, o pai lhe abençoaria e transferiria seu poder e suas riquezas a ela.

Mú tirou os olhos do livro e olhou na direção de Gaya.

— O que aconteceu a seguir? — indagou Atena.

— A criança foi sequestrada e nunca conseguiram encontrá-la. Mesmo devastado, o deus pai não teve outra alternativa a não ser colocar o filho adotivo como seu sucessor. Assim que o pai morreu, Forseti assumiu o poder e baniu a mãe para o reino das valquírias. Ordenou que encerrassem a busca pela irmã desaparecida e se tornou o novo deus nórdico da justiça.

— Forseti usurpou o trono, não foi? — Dohko perguntou a Shaka.

— Por tudo o que investiguei, posso dizer com certeza que ele foi o responsável pelo sequestro da irmã.

— E essa menina é a Gaya? — Saori estava aflita.

Shaka assentiu.

— Como pode ter tanta certeza disso? — Hyoga quis saber.

— Gaya era quem deveria assumir o lugar do pai. Seu nome real é Rättvisa. Eu sei, é impronunciável, é um nome norueguês. Gaya foi o nome que ela recebeu depois de ser encontrada por um ninfa no meio de uma floresta da Noruega, coberta de neve. Dizem que a criança de sete anos estava congelada quando foi resgatada. As ninfas choraram a morte da menina por longos dias até que Odin ouviu o clamor. Ele permitiu que a criança se tornasse um espírito livre e vivesse entre as ninfas, na floresta, crescendo em beleza, estatura e maturidade. Assim que fez doze anos, o cosmo da menina se tornou tão poderoso que as ninfas exigiram aos deuses que Gaya recebesse uma missão. Alfadur, um deus pouco abaixo de Odin, deu à Gaya a missão de ser guardiã da natureza terrena. Desde então era isso que ela vinha fazendo até que decidiu tomar o controle da Terra. Foi quando a conhecemos e a impedimos de concretizar os planos.

— Que história mais maluca, Shaka! Se isso for verdade, Forseti matou a irmã para tomar o lugar dela. Então ele deve ser destituído — disse Aiolos.

Kanon olhava para Gaya com os olhos cheios de lágrimas. As cordas perderam o efeito e ele se soltou, segurando a garota em seus braços.

— Não permitirei que aquele porco coloque as mãos nela de novo. São irmãos, ainda que de criação, e mesmo assim ele a desejou e tentou seduzi-la por muito tempo. Ela me contou que o rejeitava, mas que ele insistia em fazer propostas indecentes. Quando a levou presa, Gaya ficou à mercê desse canalha. Ele deixou-a definhar de sede e fome, para então barganhar em troca de sexo.

Ikki ficou aterrorizado. Nem na Ilha da Rainha da Morte poderia imaginar tanta perversão.

Shun, Hyoga, Seya e Shiryu também estavam escandalizados. Sua mente ingênua não conseguia conceber algo tão escabroso.

— Gaya, meu amor, acorde — Kanon a abraçou e falou em seu ouvido.

A moça abriu os olhos e sentiu uma forte dor.  

— Acho que fui envenenada, meus olhos estão embaçados e meu corpo não se move — ela sussurrou.

— Milo, faça alguma coisa! — Kanon suplicou. 

Milo olhou para Atena, que fez que sim com a cabeça. O Cavaleiro de Escorpião aplicou o Agulha Escarlate, só que dessa vez para sugar o veneno de Gaya.Ela respirou com mais facilidade e conseguiu se sentar. Kanon a amparou.

— Precisamos sair daqui antes que Forseti apareça. Isso tudo precisa ser esclarecido. Se tudo o que Shaka nos contou é verdade, nosso verdadeiro inimigo não é Gaya e sim Forseti — disse Shun.

— O Shun está certo — concordou Hyoga. — Vamos sair daqui.

Um relâmpago cortou o céu e Forseti surgiu diante deles, com sua armadura avermelhada e imponente. Os passos dele eram pesados e seu rosto dava medo ao mais corajoso homem. As amazonas se uniram ao redor de Saori.

— Vamos proteger você, Atena — disse Marin. Shina e June concordaram. 

Todos armaram posição de defesa, menos Kanon, que se ergueu com Gaya nos braços, apertando-a contra o corpo. Não queria perdê-la de novo, havia aprendido a amá-la de uma forma intensa e verdadeira e não sabia o que seria de sua vida sem ela. 

Com um sorriso sórdido, Forseti falou:

— Tarde demais, cavaleiros. Vim buscar minha prisioneira. A quem irão entregar, Atena ou Gaya?